t^s\ A N N A E S „ HISTÓRICOS DO ESTADO o ■ss D O MARANHÃO, EM QUE SE DA' NOTICIA DO SEU DESCOBRIMENTO, e tudo o mais que nelle tem fuccedido defde o anno em que foy defcuberto até o de 171 8: OFFERECIDOS AO AUGUSTISSIMO MONARCA D. JOAÕ V. NOSSO SENHOR. POR BERNARDO PEREIRA DE BERREDO, Do Confelho deS. Mageflade, Governador , e Capitão General, que foy do me/mo EJlado , e de MazagaÕ. ■ LISBOA, , (28) Na Officina de FRANCISCO LUIZ AMENO , ImpreíTor da Congregação Cameraria da Sa nta Igreja de Lisboa. JVL DCG. XLIX. Com as licenças neceffarias* 5 ^ ■N. • 3 . *1 ^ "Is £ N? FFEREÇO a Voffa Magefiade os Annaes Hiíloricos do Eílado do Maranhão , ef critos por Bernardo Pereira de Berredo , Governa- dor , e Capitão General , que foy do me/mo Eftado. aii EJla MP mmM - ■ SENHO FFEREÇO aVoJfa Mageftade os Annaes Hiíloricos do Eílado do Maranhão , ef- critos por Bernardo Pereira de Berredo , Governa- dor , e Capitão General , que foy do mefmo E/lado. aii EJla 1 F/la Obra , Senhor, quê fea Author, quando falece o, tinha prompta para fe imprimir , experimentaria jjem duvida a me/ma infelicidade, que outras muitas tem experimentado com a morte de feus Author es , fepu- ma pejfoa ReUgiofa, que lhe ajfiftio na ultima enfer- midade, e que conhecia d bondade da mefma Obra pe- la haver appr ovado por ordem do Santo Oficio , naÔ advogaffe pela fua impreffao. A elegância com que eftá efcrita , a judiciofa averiguação dosfaólos , que nellafe referem , afarão digna da ejlimaçaÔ de to- dos os eruditos ; mas o que certamente a faz mais eflimàvel , he fer a primeira, que fe tem efcrito do Eflado do Maranhão , que fendo huma nobre por- ção dos vafliffimos Domínios de Vojfa Magejiade na America , delle naÔ havia Hifloria alguma particu- lar. Ffies motivos , que me perfuadiraÕ a imprimil- la , também me animarão a dedicalla a Vcffa Ma- gejiade , julgando a minha oferta digna da fobera- na grandeza , e profunda fabedoria de Vcffa Ma- gejiade , que Deos guarde os muitos annos , que os feus fieis vajfallos defejao. Frcmcifco Luiz Ameno. . PRO ■ ■ n i PROLOGO. ob ;, ■ l ■ . -UANDO paíTey a governar o Eftado do Maranhão , tinha já inftrucções daquelle vaíliffimo Pai? j e ta5 copiofas , que até me chcguey a lifongear da cega fanrafia , de que levava comprehendida a principal parte dos intereíTes delle ; mas detido com tudo de reflexões defapaixonadas , que pru- dentemente me advertiaõ do certo perigo a que caminhava na cenínra dos fabios , quem nas matérias praticas fe fiava fó das efpeculações de alheyas noticias ; buirias vezes menos ver- dadeiras por mal examinadas , ou por vicio dos ânimos j e ou- tras, já condemnadas pelas ordinárias revoluções do tempo ; recatey de forte a minha vangloria , que por mais que me aconfelharaõ com toda a efficacia alguns Miniílros dos de me- lhor conceito , que fizeííe logo huma larga reprefentaçaÕ íb- bre o mefmo aíTumpto , pois feria fem duvida muito bem at- tendido , confiantemente lhes refpondi , que amava tanto o ferviço do Principe , e a minha opinião , que nada arrifcaria , fem que as minhas próprias experiências me pozeíTem palpá- veis os documentos folidos. da utilidade publica j porque no cafo de que entaõ erraííe o meu entendimento na eleição da propoíla , nunca me podiaÕ accufar da ligeireza delia ; e com efFeito , depois que o meu zelo exercitou bem as fuás funções no termo de dous annos , formey hum projecto , que fe a for- tuna , que lhe regulou todas as medidas > também Ihegran- geaíTe I ■» ,. geaffe as merecidas attenções , feriaõ muitas as conveniências da Fazenda Real , e de íumma importância as defte Reino , e as daquelle Eílado no augmento , e circulação de todos os feus géneros. Bem fentio o meu animo efte contratempo ; porém tra- tou ío de remediallo no modo poffivel j e ainda que os roeyos, que me cabiaõ na jurifdicçaÕ, eraõ muy coarctados , tive tan- ta ventura na applicaçaõ delles , que no meu governo , naõ fó crefceraõ muito as rendas Keaes 7 mas também o comer- cio. No exercício defías obrigações , e de todas as mais do meu miniílerio , empreguey todo o tempo 7 que lhes era pre- cifo , e o que me ficava ocioíb , ou furtava ao defcanço , nas indagações das memorias do Eílado 5 até que chegando-me fucceíTor para o governo delle , e naõ podendo recolherme lo'go a Portugal por falta de monçaõ , tomey a empreza de oçcuparme todo em juntar matérias para o edifício de huma Hiíloria ? que moílraíTe bem a todo o Mundo o quanto fe dilataõ os vaílos Domínios Portuguezes : no que continuey com huma exacçaÕ taõ efcrupuloía , e taõ cheya de zelo > que naõ deixey Archivo , que naõ examinaíTe com os meus próprios olhos j edos fuccefTos militares, ou achey as noti- cias nas originaes atteftações dos feus Commandantes , ou nos regi ftos das Patentes dospóftos, que ferviraõ as mefmas peíToas de que fallo. Também me vali de alguns manufcritos , principalmen- te nas guerras dos Francezes , e Hollandezes ; porém depois de conferidas bem as fuás relações com as minhas memorias , e com hum animo taÕ inteiro , que naõ houve paixaõ , que me defviaíTe da verdade , que he a alma da Hiftoria , e redu- zido já o primeiro embrião a forma de Annaes , principiey a lançar as primeiras linhas dentro dos limites da chronologia mais rigorofa. Neíle trabalho tao cuftofo gaíley perto de hum anno , que me dilatey naquelle Eílado , depois de aliviado do gover- no delle : e reftituindo-me a Lisboa , entrey entaõ em mayo- res fadigas $ porque para haver de aíTentar hum eftylo , que fícaíTe fícaíTe fendo menos faítidiofo à pureza da língua \ fem faltar aos preceitos dos Meitres da Hiftoria , fiz huns largos eítu- dos nos mais celebrados \ afíim vulgares , como Latinos ; até que ainda muito mais obrigado das íuielifíimas inítigações do zelo \ que da lifongeira fatisfaçaõ própria , puz a ultima niaõ neftes *Annaes Hi/loricos , procurando em tudo feguir , quanto fe fez poffivel às pequenas forças da minha intelli- gencia , as fabias inftrucções do Italiano Agoftinho Mafcar- do, eas do P. Meny Francez , que ex profeílb tratarão deite mefmo alfumpto com univerfal aceitação do Mundo erudito* Para as noticias do primeiro defcobrimento do rio Ma- ranhão, até que os Franeezes fundarão na Ilha de $. Luiz a Fortaleza deite nome debaixo da. condií&a dos Senhores de la Ravardiere ) e de Racily \ me ; aprovèitéy das Relações , de que a diante ofFereço hum Catalogo ;• e deífe tempo por diante , até o dia em que tomey poíTe do governo do Eítado , me fervi então dos Archivos delle , e outros manu- fcritos deindifputavel credito. Agora fendo tanta a eíterili- dade de Efcritores de toda a America Portugueza , como pondera bem o Marquez de Alegrete Manoel Telles da Sil- va, no erudito Prologo da fua rei e^antiífíma Hijlorta da Aca- demia Real; coníí derem defapaixonadamente os mais dou- tos juizos os eítudos , que me cuítaria a collecçaõ de tao fieis memorias. .ai ■; ■ - . Neítas mefmas , de que me vali para o apparato da minha Hiftoria , fe acharáõ muitas encontradas ; porém de- ve entenderfe , que entre todas ellas efcolhi fempre as de mais fegura opinião : e para que das outras , fuppondo-fe ignoradas do meu conhecimento , fe naò formaífe critica , que podeíTe deixallas duvidofas , eítampey o Catalogo, dei- xando defeguir o authorizado methodo do grande Tito Lí- vio , nas repetidas conteitaçoes no corpo da Obra , para o juizo das melhores noticias , por me parecer , que eíta for- ma facilitava mais ao Leitor a memoria delias , para os in- tereíTes^ da fua inftrucçaô , poupando-lhe o trabalho da con- tradição dos argumentos , que fó fefaz fuave no elegante eftylo doEfcritor Romano. AI- I n im l.i Alguns Amigos de vaíliíííma erudição inftantemente me perfuadiraÕ , a que continuaffe a eíla Hiíloria também a Natural .; porém depois de ler aos Padres Jofcph da Cof- ta, eSimaõ de Vafconcellos , da Companhia de Jefus , a Pinçon deRebus Brqfilicis , e com mayor cuidado ao Pa- dre Freyjoaõ Bautifta Labat, nos Annaes Hiftoricos , que imprimto em Pariz no anno de 1722 com o titulo de Nqqfí«o uoi J " irmi '' ' . ■ ih ■ : ; )m^ : , I -■■ O Sí I 1 1 António Veriffimo Pereira de La- cerda. D- Catharina de Borbon. io Francifco Pereira de Lacerda. D. Luiza Concórdia de Lacerda. 9 O Eminen- tiflimo Cardeal D. Jofeph Pe- reira e Lacerda. D. Maria Eugenia de Portugal. 9 António Pereira de Lacerda. 8 Bernardo Pereira de Berredo , Go- vernador de Portalegre. Catharina Francifca de Avalos. 7 Ambrofio Pereira de Berredo, Al- mirante da Armada de Portugal. D. Joanna de Menezes. £ D. Marianna de Portugal. António Pereira de Berredo. $ D. Cecília de Portugal. D. Rodrigo de Caftro. 4 D. Martinho de Portugal. D. Catharina de Soufa. io D. Catharina de Borbon. António V eriííim. Pereira de Lacerda. Ii 9 D. Joaõ de Al- 9 OEminent. roeida. Card. Patriarca Djoanna Cecília de D. Thomás de Noronha. Almeida. 8 D. António de Almeida , II. Con- de de Avintes. D. Maria Antónia de Borbon. 7 D. Ltifc-.de Almeida , I. Conde de Avintes. D. Ifabel de Caílro. 6 D. Maria de Portugal. T>. Luiz de Almeida. $ D. Manoel de Portugal. D. Margarida de Mendoça. 4 D. Francifco de Portugal. D. Joanna de Vilhena. ? D. AfTonfo de Portugal. D. Filippa de Macedo. 3 D. AfTonfo de Portugal. D. Filippa de Macedo. (f a D. AfTonfo , Marquez de Valenqa. D. Brites de Soufa. V^ a D. AfTonfo , Marquez de Valença. D. Brites de Soufa. ■ \r~ 1 O Senhor D. AfTonfo , I. Duque de Bragança. A Duqueza D.Brites Pereira. Por Por naÕ fazermos mais extenfa eíla memoria , diremos fomente , que Bernardo Pereira de Berredo - avô do noíTo Author , era primo com irmaõ de Simaõ Corrêa da Silva , Conde da Caftanheira , e de fua irmã Dona Francifca de Al- buquerque ; avó paterna de Manoel Ignacio da Cunha , Fi- dalgo bem illuílre defle Reino j e que pelo cafamento de feu irmaõ Francifco Pereira de Lacerda com Dona Luiza Con- córdia de Lacerda , tornou a entrar na fua Familia , naõ fó o fangue de Francifco Pereira de Lacerda , de quem falíamos acima , mas também o dos Almadas , Senhores de Pombali- nho , por fua terceira avó Dona Maria de Menezes , que era filha de D. Antaó de Almada , e de fua mulher Dona Vicen- cia de Caftro , filha de Ruy Pereira da Silva , filho de João da Silva , Senhor de Vagos , progenitor dos Condes de Avei- ras , e de fua mulher Dona Joanna de Caibo , filha de D. Dio- go Pereira , II. Conde da Feira j de forte , que António Ve- rifíimo Pereira de Lacerda , fobrinho de Bernardo Pereira de Berredo , e Senhor hoje da Cafa de feu pay , conta por hu- ma , e outra linha muitos avós illuílriffimos , e tem parenteA co dentro do quarto gráo com muitas peííoas de grande qua- lidade da noífa Corte $ e por fua quarta avó Dona Marianna de Portugal , eftá no mefmo gráo com os Marquezes das Mi- nas. Porém o que mais illuítrou o explendor deíla Familia , foy a fagrada Purpura Romana, que digniffimamente veílio D. Jofeph Pereira de Lacerda , Bifpo do Algarve ? doCon- felho de Eftado de EIRey D. JoaÕ V. noíTo Senhor , o qual era irmaõ de António Pereira de Lacerda , pay de Bernardo Pereira , a quem dedicamos eíla memoria. Também adver- timos , que fe Deos lhe confervaífe mais tempo a vida , feria mais perfeita a impreíTao deites *Annaes ; porque feriaÕ im- preíTos em dous Tomos , com todos os Mappas necerTarios pa- ra fe conhecer a grandeza , e fituaçaõ daquelles dilatadiffimos Paizes. Em ultimo lugar oíferecemos huma Carta , que nos efcreveo o M. R. P. M. Bento da Fonfeca , da Companhia de Jefus , e Procurador Geral do Maranhão , em a qual naõ fó faz juizo da Obra , mas também de algumas noticias mo- dernas , que o Author naõ podia faber. c CARTA am W CARTA £>0 M.K.P)M.:BENTO DA FONSECA, da Companhia dejefus, Procurador Geral do Maranhão. . Pv. P. M. . Gradeço a Vofla Paternidade a antecipação , qiíe me faz dos Annaes Hiftoricos do Maranhão , e fico obrigadiílimo a Vof- fa Paternidade deftafua obfequiofa lembrança. Hontjém mos entregou o Porteiro deite Collegio , e fupponho, que por defcuido os demorou hum dia na fua maó. Logo os li cor? gofto grande ; e he louvável , que feu Author Bernardo Pereira i Berredo no meyo dos cuidados dos Governos do Maranhão, e de Ma* zagaó , que ambos fez com grande tacerto , e rara prudência , tivefle huma applicaçaó taõ profícua à Republica , como digna da fua capa- cidade , que moftra nefta Obra , quando a fua profilFaó , e applicaçaó parece que toda fe empregava na arte militar , que com notório brio, e valor exercitou em ambos os feus Governos. No do Eftado do Ma- ranhão tive a fortuna de o conhecer, fendo Governador, e Capitão General delle. No de Mazagaõ he bem publico nefte Reino o brio, e valor , que em repetidas acções exercitou contra os Turcos , fendo muy poucas as Gazetas , em que naó viífemos proezas fuás. O que naõ fey refolver he , fe devemos mais nefta Obra ao Au- thor , que a compoz , fe a V. P. , que a publica. O Auhor a tirou das memorias, que havia difperfas nos Cartórios do Eftado ; V. P , fem mais motivo que o do amor às letras , e honra da Nação , a refuícitou das cinzas em que certamente ficaria fepultada com feu Author ; pois fó ao cuidado , e induítria de V. P., fera concuríb algum do Author , ou de coufa fua , deve o beneficio da luz publica ; com que bem mof- tra V. P. o muito que fabe naõ fó cultivar as letras , mas também efti- mar os profelTores delias. Contém efta Obra os d efcobri mentos do Eftado, e defcripçaó de feus rios. He fenfivel , que fó depois da vida do Author tiveílemos as noticias , que fe defejavaõ de alguns. E como fey o muito que V. P. hecuriofo, e amante de noticias Geográficas, comeria occaíiaõ , em obfequio a efta honra , com queV.P. me trata, lhe quero participar as noticias dos rios Negro , Madeira , e Topajoz , que faltaõ no Li- vro Xdefta Obra ,.§. 728 , 729., e 733. No anno de 1739 ^ e foube , que o rio Negro fe communicava com o rio Orinoco , por Cartas que efereveraó osPadres Miílionarios, da Companhia dejefus , da Província do novo Reino de Granada , ao R. P. Achiles Maria Avogadro , da minha Companhia , e da Provin- da cia do Maranhão , que fe achava no dito rio Negro defcendo, e pra- ticando índios à nofla fanta Fé , e examinando outros , que os Portu- guezes refgatavaõ no dito rio por efcravos. Por eítas Cartas , e com eíta occaíiaó fe foube, que o rio Negro tem perto de três mezes de viagem navegável , que defce do Poente para o Nafcente quaíi paral- lelo ao rio das Amazonas , que por hum braço fe communica com o no Orinoco , e que do Pará fe pôde por rios , e por agua , fem pôr pé em terra , fubir , e defcer até à Cidade de Guayanna , e Ilha da Trin- dade , que lhe fica fronteira ; ficando certo , que todo o continente de Guayanna fica fendo huma Ilha cercada domar, e dos rios Amazo- nas , Negro , e Orinoco. O rio Madeira corre do Sul para o Norte , e defemboca no rio Amazonas em altura de 2. gr. e 20. min. de latitude auítral. Do Pará até a boca do dito rio fe gaftao três femanas de viagem. Foy defcuber- Ib™ ?, n S ,^ adeira a Primeira vez pelo Sargento mor Francifco de . r Mello Palheta no anno de 1725. No de 1728 fundou o Padre Joaô de bampayo , da Companhia de Jefus , da Província do Maranhão , huma Aldeã de índios junto às primeiras cachoeiras do dito rio , que diítaõ da boca delle coufa de vinte e cinco dias de viagem. Da dita Aldeã fu- bio o Padre Sampayo pelo rio acima até as Aldeãs dos Padres da Com- panhia da Província do.Peró, e gaitou até as primeiras dezafeis dias ern canoa baftantemente grande 5 e referio , que os ditos Padres nas cabeceiras do dito no , e feus braços tinhaô dezafeis Aldeãs de índios ate Santa Cruz de la Sierra , em que tem as fuás cabeceiras o dito rio , e lhe dao o nome lá de rio Mamore. Duas vezes defcerao depois diíto Portuguezes das noíTas Minas do Matto Grofío , que agora fe creou Governo , e foy por feu primei- ro Governador D. António Rolim , irmão do Conde de Vai dos Reys o anno paíTado , os quaes vieraõ ao Pará por eíte rio Madeira O pri- meiro foy hum Manoel Telles , que affiíte ainda hoje no Maranhão , e os fegundos foraó Miguel da Silva, eGafpar BarbofaLima, aííiíten- tes ambos na Capitania do Pará. Por relação deites fe tem a noticia , que defde o Matto GroíTo até certo riacho, ou braço do rio Madeira, legaítao três dias de jornada por terra; e embarcándo-fe , fe gaítaó ate huma das Aldeãs chamada S.Joaquim , dez dias de viagem : e def- ta ate a boca do rio Madeira , dezafeis dias , por fer grande a corren- teza dono Conforme eíta relação, fe he verdadeira , fe chega do Matto GroíTo ao Pará em quarenta e quatro dias , contando-fe quinze, como lao da boca de Madeira ao Pará. He taó conítante eíta noticia , que nouveraô muitos votos para que o Governador do xMatto GroíTo roiie para o dito Governo pelo Pará , e por eíte rio Madeira. a- íl° V?P a J° z fe defcubrio o anno de 1747 , na forma que aqui direy. Das Minas do Matto GroíTo fahio hum Mineiro chamado joaó de òouia de Azevedo com o fim de defcubrir Minas nas cabeceiras do dito no. Com effeito fe achou ouro em hum braço do dito rio , cha. c ii mado mado Arinos, de que deu conta aElRey, com a amofira , o Inten- dente das Minas do Matto Groílò , e fe lhes deu o nome de Minas de Santa Ifabel. Eftas Minas defcubrio Pafcoal Arruda. Em companhia defte foy Joaõ de Soufa de Azevedo, que com o mefmo projecto dei- ceo pelo dito rio Arinos a baixo ; e cahindo na mãy do no Topajoz , achou ouro em outro riacho, que nomeya rio das Três Barras. Ke- folveo ie dahi defcer ao Pará , onde chegou , e fez feu negocio com- prando varias fazendas , com que voltou pelo mefmo no Topajoz pa- ra o Matto GroíTo. De tudo ifto deu conta a EIRey o Governador, e Capitão General do Eirado do Maranhão Françifco Pedro de Mendo- ça GorjaÓ , a qual eu vi. Referio eíle JoaÓ de Soufa ? que do Matto Groílo ao rio Arinos feraó quinze dias de jornada por terra, e muito menos das Minas do Cuyaba. Do rio Arinos à boca dos Topajoz feraó vinte e cinco dias de viagem depois de facilitada , e da boca dos To- pajoz ao Pará faô dez dias de viagem. Que o rio Topajoz corre , e defce do Sul para o Norte , parallelo ao rio da Madeira. Que tem fuás cachoeiras , ou faltos , e parece que mayores , que os do rio Ma- deira. Eftas faô as noticias , que faltarão ao Author , e por ellas íe fica fabendo todo o interior da noíTa America Portugueza •, porque fó fal- tava a parte das Minas dosGoyazes , que fe fabe já com evidencia ef- tarem nas cabeceiras do rio Tocantins , que defemboca no das Ama. zonas junto à fua boca. E fao muitos os Portuguezes , que delias tem defcido ao Pará pelo rio Tocantins. Com eftas noticias fica certo fcr a demarcação do interior da noífa America cortando pelo rio Madei- ra ao Matto GroíTo; e defcendo defte a baixo até aboca do rio da Prata, pelas bordas defte até a noíla Colónia do Sacramento, ainda que parte defte Certaõ para cá do. rio da Prata , entre efta , e o Bra- fil , tem varias Povoações , e Aldeãs de índios Caftelhanos. Eftas no- ticias faô as que tenho o gofto de participar a V. P. , em âttençaó ao que me dá com a antecipação deílas noticias hiftoricas do Maranhão. Fico para fervir a V. P. como tanto feu obrigado. Deos guarde a V. P. Collegio de Santo Antaõ , 14 de Junho de 1749. DeV.P. Muito amante , e obrigado fervidor í Bento ia Emjeca. LICEN- ")». L ENÇAS. Do Santo Officio. Cenfara do M R P M Doutor Fr. Jofeph Pereira de Santa Anna y Keligiofo de No ff a Senhora do Monte do Carme r, Qualificador do Santo Officio , &c. E.mo E RM o SENHOR. VI, como VoíTa Eminência foy fervido mandarme, os Annaes doEíia* dodoMaranUõ efoitos por Bernardo Pereira de fíerredo do Conie lho de S. Mageílade , Ca P iraõ General que foy do mefmo Eftado e de Mazagao 3 exceilente Obra , pela qual ie fará no Mundo memoíavel o grande talento do Author , fempre bem" conhecido , mas por cft? m Tlt r.ormente provado. Nella contemplo hum efpelho da verdade , ond Tojfuccef- fosfe repreleçtaõ com tanta alma, que .pintados por Apelles , nunca no manoa os delmeana tao v.vos para attrahirem os olhos , como rVefte Volume os eZ" me o Author para os comprehender o entendimento. Nada falta a efta hX m para me recer na Republica literária as primeiras eftimacões > porque os iZ mos delia fao os mais próprios', alocução a mais clara, o eftylo o maí natu ral , o conc.lo fem defeito; o diffufo fem pleonafmo/e finalmente 7materiã a ma,s fecunda para oceupar curiofos, para enriquecer memorias , e para acon- selhar aos mefmos Hiftoriadores, Felicidade foy daquelle Eftado- adi quem EulSârtf tXn Ê>> edCPOÍS erC, Tf mMV* , e em ffigg* ciares acertos. Porem o mayor confiíle em naõ conterem eftes eferitos cou- Conven o do C 2£ i T 9 ' TA Author pede para a im P»' mir - Rea! convento do Cai mo de Lisboa , 7 de Outubro de i 7Af 6. Doutor Fr. Jojeph Pereira de Santa Anna. Cenfura do MR. P. D. Caetano de Gouvea , Clérigo Regular da JJtvtna Providencia , Académico da Academia Real da Hi floria Portugueza, &c. E.m° E R mo SENHOR: P ?.l 0Td p m jf 7°!? Eminencia »S os Annaes do Ejiado do MararihaS, que ef- ífe™ 1 r "ir Pcreira de Berredo > Governador , e Capitão General que roy do mefmo Madoj e para expor a VoíTa Eminência o juizo, que formo def- 1 exceilente Ubra, me parece, que fe pelo acerto com que feu illuftre Author governou aquelle vaftifllmo Eftado , fez hum grande fervico ao feu Príncipe, e «a ma ratna , o nao fez menor à Republica das letras na cômpoficaÔ deites An- naes; m* III/ ! I! I naes •, porque cflaS efcritos com toda a elegância , decência , e verdade dignas da nobreza da matéria, e da do Author. A primeira obmaqaõ de hum Hiftonador , depois de dar buma exafta noticia do Paiz, de que çfcrcve a Hiftoria , he referir com verdade todas as ac- ções, affim civis , como militares, e expollas com a mefma grandeza com que foraõ executadas ; e deíla forte íómente as fabe referir bem quem as fabe obrar. Pode o Author dos prefentes Annaes defempenhar perfeitamente eíta grande obnVacaÕ 5 porque depois que na guerra , que fe moveo fobre a fueceflao de Hefpanha deu do feu valor os mais honrados teitemunhos , paliou a gover- nar o Eftado do Maranhão, em que os naÕ deu menos illuftres da fua prudên- cia e re&idaõ. Efte mefmo juizo faraõ todos os que com fabia attencaõ le- vem eftes Annaes , dando VoíTa Eminência licenqa para fe imprimirem , pois na5 contém coufa alguma contra a Fé , e bons coftumes. Lisboa , na Cala da Divina Providencia ,15 de Novembro de 1746. _ V. Caetano de Gouvea , Clérigo Regular. VIftas as informações , pôde imprimirfe o Livro de que fe trata ; e depois de impreíTo , tornará para fe conferir , e dar licença que corra , fem a qual naõ correrá. Lisboa , 1$ de Novembro de 1746. Fr. RoJrrgo de Maneafiro. Silva. Abreu. Almeida. Do Ordinário. Cenfura do M. R. P. D. Jofepb Barbofa , Clérigo Regular da Di- vina -Providencia , Chronijla daSerenijJima Ca f a de Bragan* ça , Académico da Academia Real , &c t EX. MO E R. M0 SENHOR. VOíTa Excellencia me ordena, que diga o meu parecer fobre os Annaes do Eftado do Maranhão , compoítos por Bernardo Pereira de Berredo , Go- vernador , e Capitão General daquelle mefmo Eftado , e de Mazagàõ. Muito deve aquelle Eftado à MuíTre penna deite Author; porque delle tínhamos uo poucas noticias , como eraÕ as que fe achavaÕ em algumas breviffimas Relações, a que a fua raridade fazia quaíi inviflveis , como a alguns livros manufçritos , a que a pobreza dos feus Authores naõ deixou fazer públicos pela falta de meyos , e a avareza dos que os pofíuem , os tem efeondidos , e prezos , como fe foítem reos de taõ feyos crimes, que naõ mereceííem a liberdade da imprefíaÕ. Nao he aquella Província taõ efteril , que naõ merecaÕ Ter fabidos os fuccefíos , que nella houve , como o faõ os de outras , que já lemos em vários volumes impref- fos. A irrupção dos Francezes naquelle Paiz quaíi fe ignorava , e a teima deita naqaÕ na fua Conquifta, em que D. Dk>go de Menezes, Jeronymo de Albuquer- que, e Diogo de Campos em differentes occafiões fuftentaraõ a nofía juftica com tanto valor, como razaÕ, aqui fe eftaÕ lendo em huma diffufa narração; as coufas naturaes quafi oceultas naquellas terras, havendo já delias alguma breve noticia, aqui íe deferevem com penna muito liberal , e os fucceflbs civis , e militares ., aqui aqui os Ievaõ os curíoíbs com toda a íridívídiraqaõ, efr.rítos com verdade efeito íiibnja. O eílylo he : grave , fem aftecftacaõ y iempre coríftárrte ; e nas matérias Ecclefiaíticas, em que parece fatalidade commua íèr b eílylo mais 'humilde nef- te nobilíílímo Efcritor he fempre igual ao mais que efcreve. Merece o Author hum louvor muito particular ; porque entre as occupaqoes de hum Governo te- ve tempo para eferever como Plínio a Hiftoria Natural daquelle Paiz , como Livio a Militar, e a^ Politica como Tácito. Como neit.es Annaes naõ levo cou- fa alguma contra a Fé , ou bons coftumes , me parecem dignos de que fe im- primaõ. Lisboa , neíla Caía de N.. Senhora da Divina Providencia de. Clérigos Regulares, 21 de Dezembro de 174o. D.Jofeph Barboju , Clérigo Regular. POMe imprimirfe o-Livro,. que fe. aprefenta , e 'depois '; torne -para áB confe- rir , e dar licença para correr. Lisboa , 22 de Dezembro de 1746.', 1 ■ . „'.k : : vs ,' \ 10. Do Defembargo do Paço. • -:.-: ára sàá .. - \'•> s& c r<„ ■-■'..: .is-,- ; ■ . ■. zcír:ííj,íjf) 9 r ns u f ' J^, ORdena-me VoíTa Mageílade , que examine os Annaes Wijlpricos do FJladú dô Maranhav , eferitos por Beruardo Pereira ■de' 'Berredò ',; ôoveínadoí- , e Capitão General que foy do meímo Eftado , e certamente íaG beneméritos de mayor applaufo, com que o Mundo literário celebrou os de Tácito 5 pois com- petindo com elles na elegância do eílylo, os excede na verdade da narraqaõ. De todos os opulentos Eftados , que compõem o vaíliíTimo Domínio , que Vofía. Mageílade poíTue na America, merece a primazia o do Maranhão, ornado pro- digamente pela natureza de medicinaes plantas , preciofas pedras , e diverfos me- taes : porém entre tantas excellencias lhe faltava , para complemento da fua glo- ria, huma penna, qUe as fizeífe patentes a todo o Mundo. Efta famofa empre- za tinha relervado a Providencia para o Author , que naõ fatisfeito de exercitar o feu prudente juizo , e zelofa rectidão no tempo que governou aquelle Eftado, fe empenhou a dilatarlhe a fama neftes Annaes , onde obfervando exaclamen- te os preceitos da Hiftoria , narra com igual pompa , que verdade , os fuecefíbs políticos , e militares , acontecidos na diuturna carreira de cento e oito annos , íervindo-lhe de condutoras para o acerto a Chronologia , e Geografia , em que he profundamente erudito. Os heróicos argumentos , que deu do Teu valor na Campanha, e de prudência em o Governo, fé admiraõ continuados nefta Hifto- ria : e como todos cedem em beneficio da Pátria , e obfequio de VoíTà Mageíla- de , fe faz acredor da licenqa para que fe publique. Voíia Mageílade mandará o que for fervido. Lisboa, 9 de Janeiro de 1747. Diogo Barhja Machado. Que 1 Ue fe pofía imprimir, viílas as licenças do Santo Officio , e Ordinário ; c depois de impiefíb , tornará à Mefa para fe conferir , e taxar , e dar licença para correr , e fem iflb na5 correrá. Lisboa , 17 de Janeiro de 1747. Almeida. Carvalho. Mouraê. Iílo eftar conforme com o Original , pôde correr. Lisboa , 1$ de De- zembro de 1749- Alança/lro. Silva. Abreu. Amaral Almeida. Trigofi. 0'dc correr. Lisboa, is, de Dezembro de 1749. £>. jojípb, ArceliJpo\âe Lacedemonfa. Axaõ em mil e duzentos em papel. Lisboa , sa de Dezembro de 1749. Marquez, Ptefidente. Ataíde- Faz. de Carvalho. Almeida. Carvalho. Cajlro. CATALOGO DOS LIVROS, E RELAÇÕES MANUSCRITAS, em que fe achaó algumas memorias do Ef- tado do Maranhão. Ntonio Galvão. Defcobrimentos do Mundo , até a Era de Joaõ de Barros. Década 2. Manoel Severim de Faria. Fida do infigne Hiftoriadcr Joaõ de Barros. O Capitão Simaó Eftaço da Silveira. Relação fummaria das cou- fas do Maranhão. O Padre Simaó de Vafconcellos , da Companhia de Jefus. Hifio- ria do Brafil. O Conde da Ericeira D. Luiz de Menezes. Hifioria de Portu- gal Reflaurado , Tomo I. Francifco de Brito Freire- Nova hufitania. A Sebaítiaõ da Rocha Pitta. Hifioria da America Portuguesa. Pedro de Magalhães. Tratado das coufas do Brafil , efcrito no anno de 1575". Razão- de Guerra entre Portugal , e as Provindas Unidas dos Paizes baixos. ImpreíTa em Lisboa no. anno de 1657 , e no meímo eftampada também a fua tradução na lingua Caftelhana. O Padre Frey João Jofeph de Santa Therefa , Carmelita Defcal- ço Portuguez , que efcreveo na lingua Italiana : Ifioria delle Guerre dei Regno dei Brafile. O Padre Fr. Rafael de Jefus , Religiofo Beneditino. Cafirioto Lufitano , I. Parte. O Padre Fr. Domingos Teixeira , Religiofo de Santo Agoftinho. Vida de Gomes Freire de Andrade , Parte IL Relação da jornada de Jeronymo de Albuquerque para a Con* quijla do Maranhão. Manufcrito da grande Livraria do Con- de da Ericeira , fem nome do Author. Relação do fuccedido em Portugal , e mais Provindas do Occi- dente defde Março de 1624 até todo Fevereiro de 1625. Ma- nufcrito da Livraria do Conde de Vimieiro , h. 149 , fem nome do Author. Relação geral de toda a Conquifia do Maranhão. Manufcrito da mefma Livraria, n. 158, fem nome do Author } porém efcre- d veo-a veo-a Fr. ChriftovaÓ de Lisboa , tio do Secretario das Mercês Gafpar de Faria Severim , e na mayor parte trata da Hifioria Natural. Fr. ChriftovaÓ de Lisboa, Bifpo eleito de Congo, e Angola, tiij- toria Natural, e Moral do Maranhão, e Para. Manufcnto da Livraria de D. António Alvares da Cunha. Relação Hifiorica , e Politica dos Tumultos do Maranhão. Ma- nuferito de Francifco Teixeira de Moraes. Relação hrevijfima de todo o EJlado do Maranhão , e particular- mente do grande rio das Amazonas. Manufcnto do Padre tr. Jeronymo de S. Francifco , Reiigiofo Capucho de Santo Antó- nio , anno de 1692. Cláudio d' Abbeville. Hifioire de la Miffion des Peres Capuctns en l y Isle de Maragnon , & terres circenvoifins. Mercúrio Francez. lmprellb em Cologni , anno 161 7, Tomo III. Suitte de P .Hifioire de /' Augufie Regence de i- Reine Maria de M.edices. Joaó Laeth. Defcriptio utriufque America. Também eftá eferi- ta em Francez. O Conde Pagam Relation de la gr and Riviere des Amazones. Agoftinho de Zarate. Hiftoria dei Peru. Francifco Lopes de Gomara. Hifioria dei Pérú. Garcilafo de la Vega. Hifioria General dei Peru, Parte II. O Padre Alonfo de Ovalle , da Companhia de Jefus. Breve Re- lacion dei Reino de Chile. O Padre Manoel Rodrigues, da mefma Companhia de Jefus. Ma- ranon , y Amazonas. Fr. Marcos de Guadalaxara. Hiftoria Pontifical, Parte V. . Sandoval. Hiftoria de la Ethiopia. O Bifpo Monte-Negro. Itinerário. Pedraita , Bifpo de Panamá. Hiftoria dei Peru. O Padre Vargas. Hiftoria de las índias. D. Sebaftiaõ Fernandes de Medrano. Geografia , ò Moderna Def- cripeion dei Mundo , j fus Partes , Tomo 11., Livro. IV. i AN- 11, I ANNAES HISTÓRICOS DO ESTADO DO MARANHÃO. LIVRO! SUMMARIO. |||lp|f! NTRODUCÇ*AO a Hijloria. Primeiro def ^!Ml cohrimento do rl ° Maran/ia ^- Etymologia dejie ÍS| nome , quefe communicou a todo o E/lado. Def ™ 2 ^ crevefe efie. Diogo de Sor das , ejerony mo Fur- tai fazem armamentos por Cajlella , para penetrar o rio Maranhão , mas nenhum o confegue. Entra pela Coroa de Portugal na mefma emprezajoao de Barros, efahe delia com peyor fortuna. Continua o empenho Luiz de Mello da Syha com bajiantes forças; mas comfuccejo pouco diffe- melhante. Cefat as expedires navaespara o descobri- mento do mefmo rio j epela parte do Reino do Peru o con- fegue por terra Gonçalo Pijarro. A jornada dejie Gene- ral com os trabalhos delia atéfe recolher a Cidade deQui- A to t 'Y' mm 2 Annaes Hiftoricos to , donde tinha fahido. O Capitai Francifco de Orelha- na, defertor do Exercito do mejmo General, poemofeu nppellido ao rio Maranhão , e o nome de Amazonas. Paf Ja aHefpanha , onde lhe dá omefmo titulo, que lhe fi- cou defde aquelle tempo. Pede o Generalato dafua Con- qtiijla , que confegue depois de alguns annos j porém en- trando nella chora a mefma defgraça dosfeus anteceffo- res. Novo Juccejb , que pertence também ao rio Ma- ranhão , ou das Amazonas. O General Pedro de Orfua intenta de novo , pela parte de Quito , ejla mefma Con- quijia , em que experimenta a ultima defgraça. EJcre- vem-fe os motivos , com todos os mais fiiccejos delia. Outros Commandantes tomao medidas , pela parte do Reino do Peru , para a repetiqao de/ia jornada 3 mas nao fe chegai aseduzir a pratica. < SCREVO a Hiítoria do Mara- nhaÕ , ( pprçao mayor da Ame- rica, nos vaftos domínios Portu- guezes ) que reftituido ao feu le- gitimo Soberano ha cento e vin- te annos , os fataes influxos de inimigo Planeta o confervaõ ain- da nas mantilhas ; quando podia fer taõ agigantado nas riquezas , que , como empório delias , fe viífe refpeita- do da grandeza do Mundo. Bem conheço , que as da fua mefma vaftidaõ também concorreriaÕ para huma tal infenfibilidade , por faltarem já no Corpo Lufitano os vigorofiffimos efpiritos , de que neceffitava para animar hum de taõ largas medidas ; depois dos muitos , que heroicamente tinha repartido o feu illuftre fangue pe- las nobres Conquiílas Africanas , Afiaticas , e da mef- ma America ; porém o certo he , que fe o zelo politico do noíTo minifterio exercitaíTe fó as fuás funções nos mais •ji . do EJlado do Maranhão , Liv. I. 5 mais feguros intereíTes da Monarquia, lhe feriaõ de mayor importância os do Maranhão , que os de todo o Braíil nos mais encarecidos brados da fama. 2 No primeiro defcobrimento das índias Caftelha- nas ■, acompanhou ao famoíb Chriílovaõ Cólon , por Capitão de hum dos navios da fua conferva , Vicente Yanes Pinçon, Náutico fciente daquellas idades ; e co- mo era homem de grande efpirito , unido depois com feu fobrinho ( outros dizem irmaõ) Aires Pinçon, am? bos de gr.oíTos cabedaes , fe refolveraõ a bufcar novas felicidades naquelle novo Mundo. 5 Para a pratica de tamanho proje&o obtiveraõ li- cença dos Reys Catholicos D. Fernando , e D. Ifabel $ mas de baixo da claufula , de que nao tocariaõ nos des- cobrimentos de Cólon , e Almirante já aquelles mares Indicos Occidentaes j e armando à fua cufta quatro na* vios , fe íizeraõ à vela do porto da Villa de Paios em 13 de Novembro de 1499. 4 Tomarão a Ilha de Santiago , que he huma das de Cabo-Verde , conquifta Lufitana, da qual fahiraõ em 1 5 de Janeiro do anno feguinte j e fendo os primei- ros Caftelhanos , que paíTaraõ a Linha Equinocial , def- cobriraõ ao Sul , na altura de oito grãos, o Cabo de Santo Agoílinho, a que chamarão da Confolaçaõ ; on- de defembarcando , efcreveraõ ambos, e alguns dos Companheiros , em troncos de arvores , ( depois de vi- toriofos da oppofiçao forte de hum grande numero de bárbaros , que naquelles paizes fe chamaô Tapuyas ) naõ fó os feus nomes , mas também os dos Reys , com o anno , e dia , em que alli aportarão. 5 Correndo a Cofta ao Poente , entrarão na boca formidável do grande rio das Amazonas , queafuajuf- tiflima admiração intitulou Mar Doce ; e repaífando a Linha para a parte do Norte , na altura dedous grãos, e quarenta minutos, defcobriraõ o. Cabo , a que dan- A ii do . - 4 Annaes Hifioricos t do entaõ o mefmo nome delle , he conhecido hoje tam- bém pelo dos Fumos ; que dobrando outra vez ao Po- ente , em diftancia de quarenta léguas , entrarão em hum rio , a que Vicente Y anes Pinçon deu o feu nome, e appellido ultimo, que ainda fe confervaõ 5 mas como feguindo o mefmo rumo , até a altura de dez grãos , fe acharão no Golfo de Pareá , adiante já da Ilha da Trin- dade , defcobrimento de Cólon , fe recolherão à fua pátria , depois de dez mezes e meyo , com menos dous navios , que naufragando em huma tormenta , fez mui- Gaivaõ , Def- to mais fenfivel efta fatal perda a da fua equipagem j££%£ COmo tudo efcreve Antonio Galva õ è nos feus Defco- 1499. Irimentos do Mundo 5 e mais fuccintamente o Jefuita ?ag al nS. CaP ' 7 ' AI ° níb de ° valIe > na breve Kel *Çrí do Reino de Chile. 6 He muito provável , que o celebre nome Mara- nhão fe communicou à chamada Ilha de S. Luiz , e deita ao Eftado pelo famofo rio , que intitulou Mar Doce o defcobrimento dos Pinções ; mas neceífaria- mente devo moílrar a fua verdadeira etymologia . de- pois de aífentar com os Padres Manoel Rodrigues , e Samuel Fritz, da Companhia dejefus , que Orelhana, Amazonas, e Graõ Pará faõ todos, appellidos do mef- mo nome. 7 Que feja o Graõ Pará o natural entre todos elles, fe faz indifputavel 5 porque he corrupção de Paranagua- fú , que quer dizer Mar grande na lingua geral Ameri- cana , nome genérico de todos os rios de disforme gran- deza 5 e que o de Amazonas , e Orelhana tenhaõ o feu principio no defcobrimento de Gonçalo PiíTarro , o ve- remos também no lugar a que toca. Reíla pois o exame da verdadeira origem do nome Maranhão ; que fendo o Maranon , y ultimo entre os efpecificos , pela DiflertaçaÔ doP.Ma- tZ7 n0d Rodri § ue s, mofírarey fem duvida, que he o pri- meiro com a fua própria etymologia , convencida já de menos attendivel , a que lhe quer dar o mefmo Jefuita. Ef- (ti.í do E/lado do Maranhão , Liv.I. $ 8 Efcreve efte Author, que o rio Maranhão fe chamou afíim das traidoras maranhas de Lopo de Aguir- re contra o Capitão Pedro de Oríua , na fua expedi- ção de 1560 5 aífeveraçaõ , que de nenhuma forte pô- de fubfiftir , quando António GalvaÒ" no anno de 1499 dá já o mefmo nome a efte grande rio. 9 He verdade , que no mefmo lugar lhe chama também Amazonas : porém efta memoria naõ faz per- der a força ao meu argumento ; porque chegando as fuás até o anno de 1550 , como precedeo dez a expe- dição de Gonçalo Piííarro, que deu principio a efte il- luftre nome pelas relações do Capitão Francifco de Orelhana , naõ ha antinomia , que o contradiga ; o que naõ fuccede com o de Maranhão pelas maranhas de Lopo de Aguirre , fendo pofteriores outros dez annos ao ultimo defcobrimento de António Galvão , e três à fua vida 5 que immortalizada com as mais heróicas ac- ções , acabou na Corte de Lisboa em 1 1 de Março de 1 557 no piedofo officio de Enfermeiro do Hoípital Real de todos os Santos. I o O mefmo Jefuita Manoel Rodrigues , nas novas Mara&on , y Reflexões do feu fegundo Livro , fe inclina também , a Amainas , liv. que admirados os primeiros defcobridores do rio Mara- * ca P ,,4m n - nhaÕ da immeníldade das fuás aguas , íe perguntariaõ fe feriaÕ do Mar , e reípondendo-fe , que non ; porque eraÕ doces j unindo-fe a hum a eftas duas fyllabas com huma plica fobre o íi , ( que no idioma Caftelhano ferve de h ) fe chamaria Maraíion f que he Maranhão na lín- gua Portugueza ; e aííim parece efta a fua natural ety- mologia , ou ao menos a que pode tirarfe com mais propriedade da harmonia das vozes. I I Porém lendo eu o Catalogo dos Meftres da Or- Buliarium % dem de Santiago, logo no principio do Bullario Mfo. f fi Z^ t in % acho , que foy o fexto D. Fernando Gonçales de Mara- Ejp^thA , an. non , que fendo eleito emMayo de 1206 , morreo em W- No- ;•• ) ' 6 Annaes Hifioricos Novembro de 121 o ; e fe muitos mais de trezentos an- nos , antes da expedição de Vicente Yanes Pinçon , ha- via já eíle nobre appellido nos domínios de Hefpanha, fundamentalmente me períuado , a que o tomou eíle fa- moíb rio do feu primeiro defcobridor pela parte da ter- ra do Reino do Peru , por fer o de que ufava , como ef- Silveira , pag. ; . creve o Capitão Simaô Eílacio da Silveira, na Relação Summaria f que imprimio em Lisboa no anno de 1624; e com mais exa&as indagações Frey Chriftovaõ de Lisboa , Biipo eleito do Congo , e de Angola , na fua Hiftoria manufcrita do Maranhão , e Pará , que intitu- la Natural , e Moral. O que fuppofto, efta devemos crer, que he a verdadeira etymologia do rio Maranhão 5 quando a primeira , que lhe dá ojefuita Manoel Rodri- gues fe convence de menos attendivel - 7 e na fegunda íè naõ encontra mais authoridade ; que a das Reflexões deíle Religiofo. 1 2 Naõ fe pode com tudo negar , que Vicente Ya- nes Pinçon , e Aires Pinçon , na navegação do Ocea- no , foraõ os venturofos defcobridores do rey de todos os rios j e também parece , que he producçaÕ legitima do paíTado diícurfo o celebre nome Maranhão , que trasladado à chamada Ilha de S. Luiz , pelo naufrágio de Aires da Cunha , como referirey no lugar a que to- ca , fe dilatou depois a todo o Eftado. Refta agora mof trar a defcripçao defte nos mais exaclos cálculos das pre- fentes memorias 5 porque ainda que faya da rigorofa or- dem da Chronologia , aífeguro melhor neíle lugar a or- dem da Hiftoria. 1 5 Ha baftantes annos , que fe feparou a Capitania do Seara do governo geral do Maranhão , que princi- pia hoje a baixo da ferra de Hypiapaba ; mas he fem du- vida , que a verdadeira demarcação do Eftado fica fe- tenta léguas do Cabo de Santo Agoftinho , nas vifinhan- ças dos baixos de S. Roque , quatro grãos , e trinta mi- nutos doEftadoâo Maranhão, Liv.I. 7 mitos ao Sul da Linha , cento e vinte cinco léguas a ci- ma ainda do Preíldio de N. Senhora do Amparo , que he o do Seara j e correndo a Coíla Leíle, Oefte, pelo longo efpaço de quatrocentas cincoenta e cinco léguas, acaba o feu domínio , com o de toda a America Portu- gueza , no rio de Vicente Pinçon, a que os Francezes ehumaÓWiapoc, hum grão, e trinta minutos ao Nor- te da Equinocial. 14 O mefmo rio he também a demarcação das ín- dias Caftelhanas por hum padrão de mármore , que mandou levantar em fitio alto junto da fua boca o Em- perador Carlos V. , como efcreve Simaõ Eílacio da Sil- veira , referido por Frey Marcos de Guadalaxara 5 e re- Guadalaxara , conhecida eíla baliza ha mais de hum feculo fó pela tra- ?£ ?0 t n f caí > í paic 5» iiv# $• dição de antigas memorias fuccefli vãmente continua- cap.j. das , a defcobrio no anno de 1725 João Paes de Ama- ral , Capitão de huma das Companhias de Infantaria da) guarnição da Praça do Pará. 1 5 PaíTados muitos annos, como faltavaõ povoado-* res aos Caftelhanos para a vaftidaÔ das fuás Conquiftas , occuparao Francezes piratas a Ilha de Cayena no de 165 5 j e ainda que lançados fora pelos Hollandezes , e eftes também depois de algum tempo pelos Inglezes, tornarão a cobralla dos mefmos invafores , vencidos de novo pelos primeiros , de baixo da condu&a do Almi- rante de Zelanda Jacobo Binkes : fó fe chegarão a eíla* belecer nella com a força das armas , commandadas pe- lo Conde de Eftrèes em 19 de Dezembro de 1676 ; mas havendo já feíTenta e hum annos , que a Naçaô Portu* gueza pacificamente povoava o grande paiz do Mara- nhão , ( que lhe pertencia de juíliça defde o feu primei- ro defcobrimento pela notória divifaô daquella linha imaginaria , que repartio todos os da America por au- thoridade Pontifícia ) fe moftra bem do me.fmo padra6 de Carlos V. , que o rio de Vicente Pinçon era a certa i ba- w 8 Annaes Hiftoricos baliza defta nova Colónia Franceza pela parte do Nor- te da Capitania do Graõ Pará. 16 Subindo o grande rio das Amazonas na mefma derrota de Lefte , Oefte , já repaflada a Linha para a parte do Sul , he fem comparação muito mais crefcida a vaflidaõ do Eftado j porque até topar com os limites do Reino do Peru , defronte da Provinda dos Encabe- íados y ( Tapuyas taõ bárbaros , como bellicofos ) fe achaõ mais de mil léguas , que juntas às da Coita , con- íidere-fe bem o quanto fe dilata eíle iiluftre domínio ! O fundo delle também o regulaõ com igual proporção os prudentes cálculos da Geografia ; mas naô eftá ain- da de todo defcoberto , principalmente pela banda das Amazonas 5 e fó fim fe fabe , que por differentes rios , feus collateraes , fe navegou já mais de dous mezes com viagem fucceííiva , que deixando de fe continuar por menos efficacia dos defcobridores , ou por jufto receyo da fua innumeravel gentilidade , nos confervamos hoje nas mefmas incertezas. 17 Divide-fe o Eftado do Maranhão em duas prin- cipaes Capitanias , huma do mefmo nome , que he a cabeça delle 5 outra do Graõ Pará , que he a mais dila- tada. A do Maranhão comprehende também a do Cu- má , chamada vulgarmente de Tapui tapera , de que he Donatário Franciíco de Albuquerque Coelho de Car- valho , e a vaftifíima do Piauhy. 1% A Cidade de S. Luiz , povoação Capital da Ca- pitania do Maranhão , acha-fe fituada em huma das pon- tas da Ilha defte nome no meyo de dous profundos rios, que quaíl acirculaS. Tem pouco menos de mil vifi- nhos , com Bifpo Diocefano, hum Collegio de Religio- fos da Companhia de Jefus 5 e além de outras Igrejas, em que entra também a Cathedral , e a da Mifericor- dia , três Conventos mais , o de N\ Senhora de Mon- te do Carmo , o de NoíTa Senhora das Mercês da Or- dem âo JE/lado do Maranhão , Liv. I. 9 dem Calçada , e o de Francifcanos da Província Ca- pucha da Conceição. He de benigno clima , e bem provida dos frutos neceíTarios para a fuítentaçaõ da vida humana. 19 Pela banda do mar , que comprehende a mayor porção do Teu recinto, he bem fortificada da mefma natureza j e fe a dous baluartes , que lhe difpoz a arte, também accrefcentaíTe , além da antiga Fortaleza da bar- ra da invocação de Santo António , outras defenfas ex- teriores , ( a que já tinha dado principio o Governador Bernardo Pereira de Berredo com os adiantados funda- mentos de huma Fortaleza regular na chamada Ilha de S.Francifco, que fendo viílnha da Povoação, fe de£ penha fobre o mefmo canal , por onde entraõ todos os navios ) ficaria fem duvida inexpugnável , tanto por eíla parte , como pela da terra , achando-fe aífiílida de proporcionada guarnição j porque ainda que em algu- mas prayas das da mefma Ilha do Maranhão podem defembarcar os feus invafores , como he precifo , que marchem desfilados por eílreitos caminhos , abertos todos de humas fazendas para outras por entre denfas matas, para afua total deítruiçaõ fobraõ os noflbs ín- dios. 20 Fica a Cidade dous grãos e meyo ao Sul da Li- nha , e tem a Ilha fete léguas fó de Nordeíle a Suduef- te , e quatro de Noroefte a Suefte 5 porque ainda que Simão Eftacio da Silveira , e Francifco de Brito Frei- Sílveír. pag. to, re , que o traslada , lhe dao grandes ventagens na lon- Nova Lufiu- gitude , e latitude , ( que outros muitos Authores dei- crevem também com variedade ) efta minha demarca- ção confiadamente poíTo aíTeverar , que he a verdadei- ra, por fer tirada dos meus próprios exames, quando governey aquelle Eílado. 2 1 Huma grande bahia fepara a Ilha da terra firme da parte de Leíle ,. pela diílancia de duas léguas, e três B pe- w lo Annaes Hifloricos pela de (Deite 5 mas pela do Sul fó hum pequeno rio , chamado dos Mofcjuitos , com menos largura de tiro de efpingarda. A mefma Ilha fe chamou também de To- dos os Santos, nome , que lhe poz Alexandre de Mou- por fer dia deíla feílividade o em que deu fundo na ra bahia daquella Capital com a Armada , que a refgatou do poder dos Francezes no anno de 1615 ; como fe ve- rá na ordem chronologica. Peia bocadoPiriá, que lhe fica a Leíle, tem 22 já entrado muitos navios 3 porém a fua barra he fem- pre perigofa, o que naofucçede pela banda de Oefte, principalmente depois de montada a Coroa Grande 5 porque ainda que no mefmo canal tenha pouco fundo com a maré vafia , creíce tanto na enchente , que a podem falvar as mayores embarcações fem o menor re- ceyo , e de todas ellas he também muy capaz o feu fur- gidouro. 25 A Villa de Santa Maria do Icatú ( que fica na diftancia de vinte e cinco léguas da Cidade de S. Luiz pelo rumo do Suduefte ) pertence também à Capitania do Maranhão , e o feu mar he de baftante fundo pa- ra navios grandes 5 porém neceffi ta de fcientes práticos para introduzillos. A Povoação tem poucos morado- res , e a mayor parte de pobres cabedaes. 24 Hum dos principaes rios da terra firme da Capi- tania he o chamado Itapicurú , diílante vinte léguas da Cidade de S. Luiz pela banda do Sul, por onde tam- bém bufca o feu nafcimento na direitura da Capitania do Piauhuy $ mas na fua fubida , parlados três dias de viagem , até lhe falta fundo para a navegação de ca- noas grandes. Foy povoado de engenhos de aífucar, e outras lavouras dos frutos do Paiz ; porém afugenta- dos os cultivadores do terror dos Tapuyas , fó fe con- fervaraõ muitos annos fetenta de curtos cabedaes jun- to da fua boca , e hum dos engenhos de pouco rendi- mento , do EJlaâo do Maranhão , Mv. I. 1 1 mento , amparado tudo da defenfa de hum Forte de baítante força para a oppofiçao dos mefmos bárbaros ; dos quaes muita parte já hoje reduzida à obediência do Eftado , fe vay alargando a Povoação. 25 Saõ também do mefmo continente , onde he ge- ral a fertilidade , os rios do Mony , o do Iguará , eodo Pindaré. O primeiro entra no mar da Villa do Icatú , pelo rumo do Noroefte da Cidade de S. Luiz. Tem hum engenho , que moe pouco aíTucar , e mediana ca- pacidade para eílas lavouras j porém nas margens ha muitas arvores de jandiroba, de cujas frutas fe tira azei- te com grande abundância , que ainda que amargofo , além de fer medicinal , he também muito útil , aííim para as luzes , como para a fabrica do fabaõ , e outros minifterios. 16 O Iguará corre da parte do Suduefte da Capita- nia do Piauhuy , deixando nelía a fua humilde produc- çaõ . Tem na boca da barra huma cafa forte para fegu« rança dos comboyos de ouro das Minas geraes , que coítumaÕ paíTar por terra do mefmo Piauhuy para o Maranhão. Compõem -fe os feus campos de larguifli- mas matas com preciofas madeiras , e principalmente pelas fuás margens : he também abundante de excellen- tes baunilhas. 27 O Pindaré , que he grande creador de gado va- cum , caminha a Leite de huns efpaçofos lagos ? onde fe prefume a fua origem , com a viíinhança de ricas minas de ouro ,.eno feu dilatado certaÕ ha muito pao cravo j porém o pouco fundo , que fe lhe acha na fubida , he também taõ cheyo de afperos rochedos , ( a que os na- turaes chamaõ cachoeiras ) que a navegação , que lhe difficultaõ no Inverno, de Veraõ fe faz impraticável pela falta de agua 5 com tudo já fe tem intentado o feu defcobrimento por repetidas expedições, mas com pou- ca fortuna. Bii O 12 Annaes Hiftoricos 1% O príncipe foberano de todos os rios da Capita- nia do Maranhão he o celebrado Meary, que tem a fua boca quarenta léguas da Cidade de S. Luiz pelo ru- mo do Sudueíle : em embarcações , que forem de qui- lha naõ pode nevegarfe j porque como na entrada do mar eípraya muito , fica com pouca agua , e perigoíbs baixos , que fó fe falvaó nas canoas com a maré cheya ; porém fubindo-o por difFerentes rumos , porque he todo de voltas , fe caminhou já dous mezes e meyo , fempre com largura de vinte , trinta , e quarenta braças j e or- dinário fundo de três , quatro , e cinco , fem que até agora fe lhe defcobriíTe o feu nafci mento. 29 As fuás margens ( que fó pela diílancia de dez léguas fe achaõ povoadas com menos de fetenta mora- dores ) conítao também de fermofas campinas com mui- tas fazendas de gado vacum ; mas na mayor parte de matas efpaçofas , a que fe feguem taó dilatados cam- pos , que ainda fe naÔ fabe quaes fejaõ os limites da fua vaílidaõ. Suílentou já féis engenhos de aífucar de grof- fo rendimento $ mas no tempo prefente fe confervaõ fó três de pouca utilidade , por falta de fabrica , defampa- rados todos os mais dos fenhores delles por fobrado re- ceyo do gentio de corfo , quando eítas terras parece , que as creou a alta Providencia para a mefma cultura 5 porque facilitou por hum tal modo o trabalho delia ; que as plantas de hum anno duraõ mais de trinta fem muito beneficio. 30 A corrente deite famofo rio he taó arrebatada ; que encontrando-fe vinte léguas da fua boca, Nordefte, Sudueíle , com a enchente do mar, a fufpende de forte, que por largo tempo lhe difputa o triunfo .; refultando deite fatal combate, por caufa darepreza da maré, ou fluxo, e refluxo das mefmas aguas, humas ondas taó fortes , e encapelladas, ( a que os naturaes chamaõ Po* ror oca) que depois de vencidas, tudo quanto vafou em quaíi do afiado do Maranhão , Liv. I. i $ quafi nove horas , enche em menos de hum quarto , fi- cando a maré caminhando ainda para cima três horas completas com taò rápido curíb , que parece que voa. 3 1 Mas com fer taÕ violenta eíia tal Pororoca , que atemorifa o feu eftrondo em mais de cinco léguas , dan- do a entender foberbamente , que traga os meímos mon- tes , nunca perigaò nella . naõ fendo por defcuido , ou temeridade , as embarcações que navegaÔ o rio 5 por- que como tem íitios ( a que chamao E/peras ) privile- giados de tamanha fúria , vaõ feguindo a fua viagem com todo o focego , logo que fe abranda , como expe- rimentou o Author deíla Hiíloria y paífando a eíle gran- de rio para fazer a guerra de mais perto ao gentio de corfo. O mefmo prodígio da natureza , e com mayor perigo fe admira também no mar de Araguarí , onde defagoa o rio das Amazonas pela parte do Norte da Ca- pitania do Grão Pará 5 e de outro femelhante efcreve Diogo de Couto na enfeada de Cambava , junto da Ci- ^ t0 > DâCa f dade de Cambayete. 3 2 A Villa de Santo António de Alcântara ) Povoa- ção de mais de trezentos vifinhos , he a cabeça da Ca- pitania do Cumá \ e capaz furgidouro para todo o lote de embarcações , com huma bahia de quatro léguas até à Cidade de S. Luiz , a cujo Suduefte tem o feu princi- pio no mefmo fitio do Cumá ; e caminhando delle pelo rumo de Oefnoroefte , na direitura do Pará 7 acaba com cincoenta léguas de coita na bahia do Toriuguafú , já com os marcos da Capitania do Cayté , chamada tam- bém do Gurupy 5 porém o fundo , conforme o Cartaz da fua Doaçaõ , fe dilata até Reinos eftranhos. 3 5 A Capitania do Piauhuy ( de que he cabeça a Villa da Mocha ) confina com a do Maranhão pela par- te de Lefte : com a de Parnambuco pela de Suduefte : com o Governo da Bahia pelo mefmo rumo : pelo do Sul com as Minas geraes : e pelo de Oeíte , que naõ ef- tá 14 Annaes Hifioricos tá ainda de/coberto fundamentalmente fe preíume , que com o rio dos Tocantins , que he do continente da Ca- pitania do Graõ Pará. 34 Entre muitos, o íeu principal rio , he o da Par- nahiba , o qual depois de penetrar com curfo arrebata- do huma grande parte do feu vaílo certaõ , defagoa por féis bocas no Oceano de huma pequena Povoação , a que dá o nome na diftancia de quarenta léguas da Cida- de de S. Luiz $ mas oíferecendo taõ mal feguro furgi- douro a embarcações de quilha , ainda medianas , que os mefmos Pilotos , que lhe certificaõ quatro braças de fundo , lhe achaõ taõ pouco na entrada da barra , que naõ podem montalla fem evidente rifco , nem com a ma- ré cheya. A Capitania he muito abundante de gado vacum , de que tiraõ os feus moradores groííòs cabe- daes , por fer o único fuftento das Minas do ouro , e principal ajuda para o da Cidade da Bahia de todos os Santos. 3 5 Efta he a defcripçaõ , ainda que fuccinta, da Ca- pitania do Maranhão , que corre a Coita para a do Graõ Pará , Lefte , Oeíle \ com declinação a Oefnoroefte. 36 A Cidade de NoíTa Senhora de Belém he a ca- pital Povoação da Capitania do Graõ Pará, e a princi- pal do comercio do Eílado. Tem mais de quinhentos vifinhos de luzido trato : Igreja Epifcopal novamente erecta, e além de outras as de hum Collegio da Compa- nhia dejefusj e quatro Conventos de Religiofos , de NoíTa Senhora do Monte do Carmo , de Mercenários Calçados , e de Capuchos de Santo António , e da Pie- dade. Acha-fe fituada em huma Peninfula , hum grão, e trinta e cinco minutos ao Sul da Linha, com taõ er- rada planta na efcolha do terreno, tanto por pantanofo, como pela-íua irregularidade para as defenfas da difci- phna Militar, que ainda tendo algumas, affim interiores, como exteriores , em que fe conta huma mais capaz na entra- do Eflado do Maranhão , Liv. I. 15 entrada do rio da invocação de Santo António j a mais forte de todas he a dos perigos da fua barra ; que lhe fi* ca na larga diílancia de mais de féis léguas. 37 O clima foy nocivo 5 porém depois que Te lhe meteo gado vacum , eílá faudavel: padece alguma fal- ta de peixe frefco , que naõ deixa fentir huma abun- dância grande de tartarugas , que entre a defpropor- çaõ de muito mayor vulto , fe femelhaÕ bem aos noíTos cágados j e de todos os frutos do Paiz > em que entra o cacao 7 a que lá chamaõ cultivado : naõ he também menos foccorrida de plantas de café de boa qualidade. 38 As fuás terras, na viíínhança da Cidade, faõ pouco proveitofas para plantas de aífucar ; porque as que hum anno fe fabricaÕ ; fervem fó para outro j com tudo ha nellas dezanove engenhos j e fe aos feus lavra- dores lhes naõ ataíTe as mãos a falta de fervos , he tan- ta a fua actividade para efta cultura , que até venceria a mefma natureza na abundância das fafras , ainda naô bufcando fitios mais apartados da Povoação 7 de que fe utilifaflem com menos trabalho , o que facilmente defcobririao com igual commodidade dos tranfportes de agua. 39 Confina efta Capitania com a do Maranhão pe- lo rumo de Lefte , com declinação ao Sueíte : pela par- te do Norte com a Colónia de Cayena , domínio de França : pela do Noroefte com a de Suriname , con- quiíla Hollandeza ; e Leíle , Oeíle , fubindo o grande rio das Amazonas , com o Reino do Peru nas índias Caílelhanas. 40 Pertence-lhe a Capitania do Cayté , de que he Donatário o Porteiro mor Jofeph de Mello de Soufa s a Villa da Vigia , do Senhorio Régio ■: a Ilha grande , chamada dejoannes, de que he Barão , e Donatário António de Soufa de Macedo ; e a Capitania do Camu- tá , de que he Donatário Francifco de Albuquerque Coelho 16. Annaes Hijloricos' ,H..i m Galvaõ *5 5^- Coelho de Carvalho , todas com poucos moradores. 41 A grande bahia de Belém do Pará naõ fe forma do rio das Amazonas , como vulgarmente fe prefume j mas fim das bocas do Mojú , Acará , e Guamá , rios também muito caudalofos , e povoados da mayor parte dos engenhos de aíTucar , e mais lavouras da Capitania; e na defcripçaõ delia naõ comprehendo com a de outros rios , a do Monarca de todos os do Mundo defcoberto, por refervalla para lugar mais próprio. 42 Depois que Vicente Yanes Pinçon , e Aires Pin- çon defcobriraÕ pela parte do Norte hum taõ illuílre rio, ou mar de agua doce > defejaraõ muitos aventureiros femelhante fortuna no trabalhofo exame dos feus vaílos Certões 5 e perfuadido das efperanças mais lifongeiras , o intentou com erTeito no anno de 153 1 Diogo de Sor- das já com o titulo de Governador .; mas quando affe-, gurava a felicidade do fucceíTo na força de três nãos , que conduziaò a feu bordo para o defembarque feifcen- tos Soldados , e trinta e féis Gavallos , fe lhe malogrou no meyo da viagem com a perda da vida. 43 PaíTado pouco tempo feguio também a mefma expedição Jeronymo Furtai com cento e trinta Compa- nheiros ; mas naõ a chegou a concluir , ou foíTe por falta de práticos , ou por novo projecto 5 porque fem ver o rio Maranhão fe empregou fó na Fundação , e Po- voação de S. Miguel de Neviry , e na de outros Luga- anno res j como tudo efcreve António Galvaõ nos feus Def cobrimentos do Mundo. 44 Por eíles mefmos annos difpoz o Senhor Rey D. JoaÕ III. a Povoação da grande Provincia de Santa Cruz , que a vulgaridade chama do Brafil ; ( defcobri- mento a que a força dos ventos venturofamente condu- zio ao taõ illuílre , como famofo Capitão mor Pedro Alvares Cabral , na viagem da índia Oriental do anno de 1500) epara melhor facilitar a cuftofa pratica de ta ma- do Ejlado do Maranhão , Liv. I. 17 tamanho projecto 7 repartio o Paiz em doze Capitanias, que acertadamente diftribuío por homens de mereci- mento com o titulo de Donatários de juro 7 e herdade. Ao celebre Hiíloriador Joaô de Barros coube a do Ma- ranhão 7 ( quei conhecido já eíte famoíb rio pela banda do Norte , também fe reputavaõ os Certões delle } e mais terras , que fe lhes feguiíTem , por huma parte do mefmo Braíll 7 na verdadeira arrumação da linha imagi- naria ) e ponderando com maduro juizo as muitas def- pezas , de que neceflítava huma tal empreza , fe refol- veo a intereíTar nella a Aires da Cunha , e a Fernando Alvares de Andrada , Thefoureiro mor do Reino , ( pay de Francifco de Andrada , Chronifta mor ) oíFerta , que ambos aceitarão , perfuadidos das mais alegres efperan- ças de importantes fortunas. 45 Erao ricos os focios deíla Companhia ; e que- rendo todos authorifar também a nobreza do fangue nas orientações da grandeza dos ânimos , fizerao os mayores esforços , que até aquelle tempo fe tinhaõ vif- to , nao entrando nelles braço foberano 5 porque arma- rão em guerra dez navios com novecentos homens ; e cento e treze cavallos , ( António Galva6 diz cento e trinta ) e amigavelmente conferido o governo da Arma- da a Aires da Cunha , fe fez elle à vela do rio de Lisboa no anno de 1535 7 acompanhado de dous filhos do mef- joaõ de Barros mo João de Barros. 46 Com profpera viagem chegou eíle Fidalgo à chamada barra do Maranhão , que he hoje a principal entrada da Ilha deíle nome 5 mas como fendo defconhe* cida de todos os Pilotos, lhes faltou a fciencia para os acautelar daquelles perigos , que prudentemente deviao íupporlhe , já como ordinários na mayor parte delias , naufragou nos feus baixos com toda a Armada 5 e ainda que na pequena Ilha do Boqueirão , ( conhecida tam- bém pela do Medo ) que lhe fica na boca , fe falvou a C nado Decad. 1 . liv. 6. cap. i. in fin. :-v ■■ 18 Annaes Hifloricos nado alguma da gente , que logo contrahio amifade com os Tapuyas feus habitadores, como naõ bailava para a Povoação , principalmente na total falta dos meyos neceíTarios , paíTado algum tempo , voltou a Portugal , a bordo dos navios piratas , que navegavaÕ aquella Cof- ta. 47 Affim refere todos os fucceíTos deita expedição Severim de Fa- o Chantre da Sé de Évora Manoel Severim de Faria, na ' pdS ]0 ' na Vida , que efcreveo de Joaõ de Barros ; e fendo taÔ exacta a indagação das fuás memorias , que naõ neceífi- ta de outra authoridade , para que fique fem difputa a verdade delias, a comprova também com o traslado Defcobrimentos de António GalvaÕ , nas formaes palavras , que fe fe- àoMunâo, an- g ueni . ^ tamhem a ^ rio Maranhão hum Fidal- go Portuguez , que fe chamava Aires da Cunha ; levou dez navios , novecentos Portuguezes 7 cento e trinta ca- vai los j fez grandes gajlos , em que fe perderão os que armarão ; e o que mais perdeo nijfo foy J oaÕ de Barros y Feitor da Cajá da índia , que porfer nobre , e de condi- ção larga , pagou por Aires da Cunha , e outros que lá falecerão 1 , com piedade de mulheres , e filhos , que Ihefi- caraó , 0'c. 48 Fr. Marcos de Guadalaxara , inteiramente tras- ladando a Simaõ Eílacio da Silveira , faz também efta relação , no lugar já citado da fua Hi/toria Pontifcal ; a que accrefcentaÕ ambos as circunílancias , de que a gente , que efcapou do naufrágio , fabricara na Ilha de S. Luiz ( onde dizem fe chama o Boqueirão ) huma For- taleza , de que ainda alli havia veftigios , em que fe co- nheciao pedras brancas de Alcântara ; mas que de ne- nhuma deílas taes pefíbas fe achavaõ memorias ; e fó fim os indícios , de que do feu trato com a gentilidade daquelle Paiz, feria producçaõ huma Naçaõ muito bel- licofa , que de novo fe tinha defcoberto entre os rios Mony ? e Itapicurú ; porque além de fe diítinguir de todas 1 do Eftado do Maranhão , Liv. I. 19 todas as outras no valor , e nas armas , criava barbas como os Portuguezes , a que chamavao os feus Peros , (que fignifica Pedros ) pela razaÔ fem duvida de fe íi- nalar mais na fua eítimaçaõ algum do mefmo nome. 49 Porém examinando eu eítas mefmas noticias com a finceridade de verdadeiro Hiítoriador , as acho fabulo fas nas partes principaes ; porque o Boqueirão lie Ilha chamada deite nome 7 como já fica referido , e como tal abfolutamente feparada da de S. Luiz j e nem da Fortaleza , nem das pedras de Alcântara , com que o Capitão Simão Eítacio a dá por fabricada , ha tradi- ção alguma no Eílado do Maranhão , quando mal po- de crerfe , que no efpaço fó de oitenta annos ( que fe nao contao mais defde o de 1 5 3 5 , em que foy o naufrá- gio de Aires da Cunha até o de 161 5 , em que Jerony- mo de Albuquerque fe eítabeleceo na Ilha de S. Luiz ) tiveíTe já o tempo confumido huma obra de tanta dura- ção y e com tamanho eílrago , que nem lhe deixa/Te os fundamentos para memoria delia. 50 Por efta mefma chronologia fe condemna tam- bém , como difcurfo menos attendivel , o do mefmo Ef- çritor , em quanto à afcendencia do Gentio Barbado ; e fó fim fe faz crivei na continuada tradição de diferen- tes memorias , que dos Portuguezes , que falvarao as vidas deíle fatal naufrágio , ficou hum entre aquelles bárbaros naturaes \ que fe chamava Pedro ; que tendo o officio de Ferreiro , grangeou por elle grandes eítima- ções , fabricando da muita ferragem \ que fe tirava dos navios , que deraõ à coita, os inítrumentos de que necef- fitavaõ , que para todos he a mayor riqueza j até que ex- tingo já eíte material , accrefcentou muito a fua fama no nobre exercicio de Soldado 5 porque contando fem- pre pelas occafiÕes as fuás vitorias 7 chegou a confe- guir huns taes refpeitos de Senhor na veneração de tan- to gentilifmo, que os feus Principaes ( titulo dos Sobe- C ii ranos 20 Annaes Hifloricos ranos de todos os Tapuyas ) lhe oíFerecíaõ as filhas pa- ra mulheres próprias -, c eícolhendo huma , de que dei-» xou dous filhos herdeiros do feu nome, entendendo el- les , que era univerfal aos Portuguezes 7 daqui nafceo chamarem-lhes Peros. 5 1 Do mefmo naufrágio teve também o feu princi- pio na chamada Ilha de S. Luiz o appellido de Mara- nhão j porque as relíquias delle , querendo ennobrecer a fua defgraça , efpalharaÕ de forte as erradas noticias de fe haverem perdido na formidável boca do rio defte nome, ficando na diftancia de mais de cem léguas, que por nenhum outro fe conhece hoje toda aquella vaíliffi- ma Regia ô Portuguèza. '$u Foyfem duvida grande a infelicidade de Aires da Cunha j mas eraÕ ellas no defcobrimento do Mara- nhão taõ apreíTadamente repetidas , que ao mefmo tempo , que fe chorava eíta pela parte de Portugal , já fe difpunha outra pela das índias Caítelhanas y porque o Marquez D. Francifco PiíTarro , Gonquiílador famo- íb do Reino do Peru , depois que com a morte do feu companheiro , e competidor D. Diogo de Almagro íè vio fenhor pacifico do governo difpotico de hum tao vaílo Paiz , parece que temendo os fataes eíFeitos da ocioíidade entre tantos efpiritos bellicofos , ou nao cabendo ainda o feu no dilatado âmbito de mais de fe- tecentas léguas , ( que fe nap contaô menos Norte , Sul dos Charcas a Quito ) entrou no projecto de outra nova Conquiíla além deftes limites tao efpaçofos $ e queren- do melhor aíTegurar o defempenho das fuás efperanças, chamou ao Cufco ( Corte do feu governo , e antiga dos Reys Incas ) a feu irmaô Gonçalo PiíTarro , que fe achava fundando a Cidade da Prata , entaõ com titulo deVilla.' 55 Tinha noticias o Marquez , ( fem duvida tam- bém pelas que deixaria do rio Maranhão o feu primeiro defco- do E/lado do Maranhão , Liv. I. 2 1 defcobridor ) de que fora dos domínios de Quito , e de todos os mais que fenhorearaõ os Reys Incas , havia outros nam menos avultados com muita canella 5 e dan- do Jogo efte mefmo nome à fua Conquifta , a encarre- gou ao grande valor de Gonçalo PiíTarro com a renun- cia daquelle governo , que fendo a porta para a fua en- trada , acertadamente lha quiz facilitar na jurifdicçaõ independente para as aííiftencias dos foccorros 5 empre- za, que elle aceitou menos ambiciofo dos intereíTes que lhe promettia , que da gloria do nome 5 porque gene- rofamente difpendendo dos cabedaes próprios mais de noventa mil cruzados , formou hum Corpo de duzen- tos homens , em que os cem eraõ de cavallo j e mar- chando com elles da mefma Cidade do Cíifco , chegou à de Quito , cabeça deíle Reino , com quinhentas lé- guas de caminho , depois de confeguir repetidas vito- rias na forte oppoíiçaÕ de Exércitos de índios levanta- dos. { 54 Pedro de Puelles , Soldado valerofo , que tinha a feu cargo aquelle governo , lho entregou logo 5 e af- íiílido elle do feu poder, e actividade , adiantou de for- te a expedição , que dentro em pouco tempo , refor- çadas as fuás Tropas de novos foccorros , fahio de Qui- to no Natal de 1559 com trezentos e quarenta Solda- dos , dos quaes eraõ montados cento e cincoenta , e mayor numero de quatro mil índios , deixando por feu Lugar Tenente ao mefmo Puelles. 55 Os índios , além das fuás armas , naÕ fó carre- gavaõ fobre os hombros muitas munições de guerra , e boca , mas também ferro , machados , cordas , e pre- garia de difFerentes bitollas , para a fabrica de embar- cações , quando foíTem precifas ; e para fubfiftencia mais fegura de toda efta gente ; a feguiaõ perto de qua- tro mil porcos , e ovelhas ; que fendo ellas das mayo- res daquelle Paiz , onde fao ordinariamente de corpos avul- Annaes Hifioricos avultados, naõ ajudarão pouco a mefma conducçaõ. 56 Em quanto caminhou Gonçalo PiíTarro por aquellas terras, que obedecerão aos Reys Incas , naõ fentio accidente , que o embaraçaífe 5 mas logo que paíTou os feus limites , entrando na Provincia a que cha- maõ dos Quixos , fe vío já acomettido dos bárbaros Tapuyas feus habitadores , quando pafmados elles , af- íim do numero das Tropas Caftelbanas , como dos ca- vallos , em que hiaÕ montados , fe retirarão com tal confternaçaõ para dentro dos matos , que naõ fahiraõ mais das fuás afperezas. . jj Vencidas poucas marchas tremeo a terra taõ horrorofamente , que abrindo varias bocas , tragou al- gumas das habitações daquelle gentilifmo j e depois de hum diluvio de fogo, em fucceííivos rayos, fe feguio logo outro de agua 5 até que já paflados mais de qua- renta dias, procurando Gonçalo Piííarro atraveíTar a ferra nevada , o confeguio ainda com tanto trabalho , que indo bem prevenido para elle, fe lhe gelarão muitos dos índios ; e os Soldados também por fugirem, do frio, largarão todo o gado com os mais mantimentos , que conduziao, fó com asefperanças de que achariaõ outros na primeira Povoação do mefmo caminho , que leva- vaõ , como íe tiveíTem conhecimento delle. 58 Com eíla confiança tao imprudente fe alimenta- vaõ das mefmas fadigas j porém depois de longas jor- jadas de hum efteril deferto , as chorarão todas malo- gradas com o fentimento do feu fatal engano 5 porque chegando à Provincia, e povo de Zimaco , ( fituado nas faldas de hum volcao efpantofo ) além de acharem pouco com que matar a fome , que já os opprimia , foy taõ fuccefliva a tempeftade de agua , em dous me- zes que alli fe detiveraÕ , que fendolhes precifo bufcar o fuílento natural pelo meyo delia , lhes apodreceo muita parte da roupa, com que fe cobriaõ. Eílas do E/lado do Maranhão , Liv. I. 2 j 59 Eftas terras eraô as da canella , que bufcava Gonçalo PiíTarro $ mas o feu grande coração afpiran- do já a mayores emprezas , fe refolveo a paífar a diante; e deixando naquelle mefmo íitio muita parte da gente com ordem para o ir feguindo pelas fuás pizadas , fe naõ achaíTem guias, efcolheo fó a mais robufta para o fof- frimento de novos trabalhos , que vencendo também a conftancia dos ânimos, verdadeiramente Hefpanhoes, até huma Província chamada da Cuca ? mais povoada de gentio , como fe vio bem hófpedado do feu Princi- pal , efperou perto de dous mezes pelos mais Compa- nheiros. 60 Por efta Província corre hum foberbo rio , que com o nome delia he hum dos tributários mais opulen- tos do grande Maranhão , ou Amazonas j o qual feguin- do Gonçalo PiíTarro mais de cincoenta léguas fem po- der vadiallo , chegou a hum canal , talhado de huma pe- nha , com duzentas braças de elevação , e vinte pés de largo 5 e defejando logo porfe da outra banda para àtÇ- cobrir aquellas fortunas , a que o conduziaõ as fuás ef- peranças , venceo o feu valor huma tamanha difficul- dade 7 depois das fadigas de formar huma ponte de ma- deira fobre o mefmo canal , a pezar também da oppofi- çaô de alguns índios guerreiros ; mas he certo , que afugentados brevemente dos fataes erTeitos dos arcabu- zes , que defconhecidos da fua rudeza , lhes chamavao rayos , como os Mexicanos. 61 Conduzio logo as fuás Tropas pela outra mar- gem , penetrando rochedos , e com tanta penúria de mantimentos , que fó fe alimentavaõ das hervas , e raí- zes do campo , até que depois de muitas marchas taõ trabalhofas , entrou em terras abundantes , onde achou índios menos bárbaros ; porque comiaõ paõ de milho groífo ( e veftiaõ roupas de algodão ; mas informado bem de que nos caminhos , que fe lhe feguiaõ . encon- traria na larga diílancia de mais de oitenta léguas) tomou novas medidas para melhor adiantar as fuás ; porque elegendo por Commandante do bergantim , com a guarnição de cincoenta Soldados , ao Capitão Francifco de Orelha- na , Official dé muita diftinçaõ , poíitivamente lhe orde- nou , que navegando a toda a diligencia , pozeíTe em terra a carga , que levava , logo que chegaíTe à junção dos rios , com a defenfa que lhe pareceíTe neceíTaria pa- ra a deixar fegura ; e que fem tratar mais , que de refa- zella de mantimentos , voltaíTe a encontrallo para re- mediar as afflicções de tantos Companheiros. 6$ Com eftas prudentes inítrucções fe poz a cami- nho Francifco de Orelhana ; e era taõ rápida a corren- te das aguas , que fem remos 7 nem velas fez em três dias a fua viagem j mas tomando terra no fufpirado fi- tio dos Thefouros , como depois de exames repetidos naõ achou nelle mais que penhafcos , femelhantes aos que tinha deixado , fe refolveo a bufcar fortuna em ou- tros novos defcobrimentos i defattendendo já as expre£ fas ordens de Gonçalo PiíTarro , fó com a defculpa , de que fe intentaíTe ( para lhe dar parte da infelicidade do fucceíTo ) a fubida do rio , naõ podia vencella em mui- tos mezes ; e também naõ fabendo os que gaftaria o mefmo General natrabalhofa marcha, que trazia , fe o efperava naquelle lugar , confumiria o tempo fem uti- lidade , quando com muita fua o poderia aproveitar bem nas continuadas indagações das promettidas pre- ciofidades , como principal fim de tantas fadigas. 66 Nas apparencias defte falfo difcurfo quiz elle re- buçar a verdadeira traição do animo , que defcobrio lo- go ; porque contradizendo-o o Padre Frey Gafpar de Carvajal , Religiofo de muita authoridade , ( que fe- guindo de Quito efta expedição com zelo Apoíloliço , 20 Annaes Hijloricos [ hl! fe ofFereceo com o mefmo para acompanhallo ) e hum Cavalhero moço, natural da Cidade de Badajoz, que fe chamava Fernão Sanches de Vargas com os fortiííi- mos fundamentos , de que faltando a tantos Compa- nheiros aquelle bergantim , que era a única taboa para a fortuna da fua falvaçaõ , fentiriaõ todos a fatalidade da ultima conílernaçaõ , por mais que fimuladamente fe moílrou convencido para fobornar com menos emba- raços , os que feguiaÕ ao Vargas. Tanto que o confe- guio, nao fó o tratou , e ao Religiofo com pezadas in- jurias , mas paífou também a exercitar com o primeiro a mayor crueldade , manclando-o lançar no mefmo de- ferto , de que fugia ; para que a vida \ que lhe deixava , lhe fícaíTe fervindo de morte mais penofa ; e fazendo-fe à vela , declarou melhor no dia feguinte a infidelidade do feu procedimento, renunciando o poder, que levava de Gonçalo PiíTarro , para obrar daíli em diante como independente , eleito já dos levantados por feu Com- mandante General ; parece , que entendendo , que def- culpava bem a fua aleivofia com o exemplo do famofo Cortez na Conquiíla do Império Mexicano : como fe as injuílas defconfíanças de Diogo Velafques , que atre- vendo-fe temerariamente à fua mefma honra , o empe- nharão na defenfa delia , fe pode/Tem também verificar no generofo animo, com que fiou delle Gonçalo Pif- fano até as riquezas , que lhe meteo a bordo. 6j Com huma acçaõ taÕ fea fe difpoz com tudo para outras de diíferente femblante ; mas hiaõ-lhe fa- hindo tao cuílofas , que nos defembarques , que fazia obrigado daneceífidade, até nas barbaras mulheres acha- va oppofiçaõ , e ordinariamente a mais guerreira ; mo- tivo porque dandolhes o celebre nome de Amazonas , o tomou logo delias aquelle grande rio chamado do Ma- ranhão 5 ( além do de Orelhana , que lhe deixou ao mef- mo tempo o feu appellido , como primeiro defcobridor da do Eftado do Maranhão , Liv. I. 2j da Tua inteira navegação ) porém depois do penofo tra- balho de buícar fempre os mantimentos com a força das armas , teve o alivio de os encontrar com abundância em índios mais domeílicos , que recebendo-o de paz, fe admirarão tanto da figura da embarcação , como da gente , que levava , por tudo fer eílranho à brutalidade do feu conhecimento. Satisfeito de tao boa hofpeda- gem , fe deteve nella alguns dias , que utilifou também na conftrucçaÕ de outro bergantim. • 68 A commodidade defta fegunda embarcação , a deu também a Orelhana para fe fornecer com toda a largueza dos mantimentos neceíTarios para a fua via- gem , que foy logo feguindo ; e como as ambições /com que negou a obediência ao feu Commandante, o con- duziaõ a Caftella para folicitar o Generalato daquella Conquifta > que chamava já das Amazonas , chegando brevemente à formidável boca deíle illuftre rio , atra- veííbu duzentas léguas de mar do Norte até a Ilha Mar- garita , onde o deixarey occupado todo nas novas pre- venções para fazerfe a vela , em quanto continuo na re- lação dos últimos fucceíTos da expedição deGonçaJo PiíTarro. 69 Efte em tudo irmão , ainda que illegitimo , do grande Marquez D. Francifco PiíTarro , logo que def- pedio ao Capitão Francifco de Orelhana , fe forneceo de mais canoas , com que fez dez , ou doze , e outras tantas balfas , de que fe fervia nas paíTagens do rio de huma a outra banda , fe topava montanha , que reco- nhecia por invencivel 5 mas como o trabalho deftes tranfportes junto com o das marchas levava muitos dias, tinha já confumido dous mezes , ( alentando fempre os feus Companheiros com as efperanças de achar no ber- gantim o natural alivio , de que neceffitavaõ ) quando fe viraõ todos laílimofamente defenganados na junçaõ dos rios j porque naquelle íitio os informou bem da trai- Dii çaõ Annaes Hijloricos çaõ de Orelhana o valerofo Fernão Sanches de Vargas , que a milagres da fua conftancia fe havia fuílentado taõ dilatado tempo , em folidaõ taô afpera , fó das hervas do campo. 70 Sentio eíle accidente Gonçalo PiíTarro ; mas o feu grande coração , que a todos refiftia , o venceo com tal gloria, que communicando os mefmos alentos às defmayadas Tropas , as difpoz logo para novas fadigas na continuação da fua marcha , que avançou mais cem léguas na defcida do rio , fem que melhoraíTe de fortu- na j até que já cedendo às fuás femrazoes , tomou a pru- dente refoluçao de retroceder todo o caminho , fe lhe foíTe poffivel ; e conformando-fe também com ella a re- íignada obediência dos fubditos , fe armou o valor dos últimos esforços para a repetição de tantos perigos. i 7 1 Dos quatro mil índios , com que fahio de Qui- to , confervava ainda perto de dous mil, e dos cento e cincoenta cavallos oitenta , que tudo mais fe tinha confumido na trabalhofa marcha de quatrocentas lé- guas ; mas entendendo bem , que no feu regreflb \ pe- las afperezas das mefmas pizadas , inutilmente facrifi- cava eíle cançado reílo das fuás Tropas , fem que po- deíTe melhorallas na fubida do rio , quando a oppofiçaô das fuás correntes a ameaçava muito mais perigofa , buf- cou outro caminho ao Norte delle , por ter já obferva- do , que por aquella parte eraõ menos os lagos , e os pântanos , e também as montanhas ; e entrando logo nefta nova empreza , já lhe naõ parecia ta5 difficultofa. 71 Porém a poucas marchas , nao fó foy encon- trando os mefmos trabalhos , de que hia fugindo , mas outros mayores, principalmente na eílerilidade do Paiz; porque chegou a tanto , no dilatado traníito de trezentas léguas , que fe vio obrigado a fuíl entar a gente dos cavai- los , e cães , com que deu principio à fua retirada ; até que extinguindo-fe aquelle alimento, lhe tinhaõ falecir C > do ão Eftado do 'Maranhão , Liv. I. 29 do todos os índios com a mayor parte dos Soldados , quando fahio a terras mais abertas , e enxutas com abun- dância de diíFerentes caças voláteis , e terreftres ; e re- fazendo então todo aquelle Corpo as forças naturaes , perigo famente debilitadas , fe fervirao também eíles va- lerofos Hefpanhoes das pelíes dos veados para cobrir as carnes , expoílas já áo horror dos olhos pela falta de veílidos , que naõ fentia menos a fua modeília, . 75 Oitenta Companheiros eraÕ fomente os que re£ tavaõ a Gonçalo Piííarro j porque além dos índios ., perdeo também duzentos é dez , a que accrefcentando ps cincoenta da deferçaõ do Capitão Francifco de Ore- Ihana, fazem os trezentos e quarenta, com que entrou na fua expedição ; e hiao eíTes poucos tao desfigurados, que até huns aos outros fe defconheciaõ ; mas tanto que pizaraõ os limites de Quito , efquecidos já dos tra- balhos paífados , fe lembravaõ fó defte prefente goílo ., dando por elle a Deos as devidas graças com as bocas na terra. 74 Avifou logo à Cidade de Quito , que achou def- povoada da principal parte dos moradores (em que também entrava o feu Lugar Tenente no governo geral Pedro de Puelles ) pela occafiao da guerra , com que al- terou todo o Peru D. Diogo de Almagro o moço , de- pois doinfulto, com que tirou ávida ao Marquez D, Francifco PiíTarro , Capitão General daquelle vaílo Im- pério $ porém nelle era tao eftimado pelas fuás virtudes Gonçalo Piífarro , que a Cidade cheya de alvoroços , com a noticia da fua chegada , ainda lhe fez o prefente de hum grande refrefco com doze cavallos , e féis veíli- dos , conduzido tudo por doze peífoas das primeiras delia. ■ j$ Na diílancia de mais de trinta léguas encontra- rão eíles Deputados ao feu Governador ; porém elle ainda que eítimou a generoíidade da orTerta com ex- prefsoes V 1 '■ 5° Annaes Hifioricos prefsões muito affeóliiofas , fe aproveitou fomente do refrefco , que abrangia a todos ; porque como naõ biaõ veílidos , e com cavallos à meíma proporção, lhes quiz fer companheiro , fem a menor difFerença , no trabalho da marcha ; e perfuadidos de exemplo taõ louvável, os mefmos menfageiros o feguiraõ em tudo até dentro de Quito , onde recebido nos princípios de Junho do anno de 1 542 com as mais feílivas acclamações , foy no meyo delias a primeira acção da fua chriílandade , a de buf- car a Deos no ineffavel Sacrifício da Miífa , a que aífíf- tio com huma geral edificação daquelles moradores. 7 6 Mais diíFuíamente efcrevem os íiicceíTos defta expedição Francifco Lopes de Gomara , e Agoílinho de Zarate , Hiíloriadores celebres dos Defcobrimentos, e famofa Conquiíla do Peru j e feguidos ambos , com Garciliafodeia poucas addiçoes , do Inca Garcillaíb dela Vega, na Vega , part. a. fecunda parte dos feus Commentarios , traslada a todos liv. ?. pá '. 1 \ 9. " , e 162. ' o Padre Manoel Rodrigues , no feu Maraiíon , y Ama- Maranon , y zonaSm Amazonas, liv. - r r . r ., . « i.cap.a. 77 Mas na latisfaçao de alguns reparos, parece que fe efquece eíle Jefuita do mayor de todos ; porque encarecendo os Authores , que fegue , os trabalhos de Gonçalo Piífarro pela pobreza , e efterilidade do Paiz , fe naõ lembra elle , de que referem ao mefmo tempo a preciofa carga de ouro, e efmeraldas , que meteo a bor- do do bergantim , com que defertou Francifco de Ore- lhana , fem que algum informe donde fe tirarão tama- nhas riquezas : o que fuppofto , devemos entender , que já as conduziaõ do Peru eíles Conquiftadores com as es- peranças de fe eílabelecerem nos Defcobrimentos , a que os levavaõ aííim os intereífes , que lhes promettiaõ , como os da fua fama ; natural difcurfo , que naõ con- vencem de menos attendivel as memorias mal averigua- das da Relação Summaria do Capitão Simão Eftacio da Silveira , copiada também por Frey Marcos de Gua- dalaxara, do E/lado do Maranhão , Liv. I. 31 dalaxara , na fua quinta parte da Hijloria Tontifical. Guadalaxara , 78 Efte foy o fucceíTo da expedição de Gonçalo pas * 2Ú0 ' Pifíarro , que encaminhada ao defcobrimento da canel- la , taó cuítofamente produzio o do grande rio Mara- nhão 7 conhecido defde aquelle tempo pelo celebre no- me das Amazonas j e porque pertencem à meíma jorna- da , e por confequencia ao argumento deíla minha His- toria as ultimas noticias da deferçaõ do Gapitaõ Fran- cifco de Orelhana , as darey agora neíle lugar 7 por fer o que lhe toca na verdadeira ordem da chronologia. 99 Deixey a Orelhana na lha Margarita preoccu- pado todo das mais vaftas idéas na viagem de Hefpanha, que confeguio com felicidade ; e ajudada eíla do cabe- dal do roubo , perfuadio de forte as encarecidas pre- ciofidades do famofo rio das Amazonas ao Emperador Carlos V. , que depois de alguns annos , naõ fó lhe fez mercê da fua Conquifta com o governo delia , mas tam- bém para facilitarlha lhe mandou pôr promptos três na- vios com a boa equipagem de mayor numero de qui- nhentos homens , em que entravaÕ muitos de conheci- da diftinçaõ pela do nafcimento. 80 Com efta Efquadra fahio do porto de San-Lucar em 11 de Mayo de 1549, taõ lifongeado das fuás ef- peranças , que fó àquelles , que o feguiaõ , tinha por venturofos $ porém fazendo efcalla nas Ilhas Caná- rias , e de Cabo- Verde , a fua gente fentio de forte a corrupção dos ares , que lhe faleceo muita parte del- ia ; e continuando na mefma derrota já com tamanha perda , experimentou a ultima logo no principio da fubida do rio \ que bufcava ; porque depois de force* jar quanto lhe foy poííivel para vencer as fuás corren- tes em duas lanchas , a que fe achava reduzido , naõ fó tornou a retroceder até a fua boca , mas com tanta deígraça , que retirando-fe pela Coita de Caracas à Ilha Margarita , dizem , que alli morrera com o mayor nume- 32 Annaes Hijioricos ■ Ovalle 13?- P a 2- numero dos poucos Companheiros , que lhe haviao fi- cado. Garcillaíb de 8i O Inca de Garcillaíb de la Vega, na fegunda la Vega , pare. p arte dos feus Commentarios , feguindo também a Fran- ja, pag, i 4 ). e ^.^ L p £s fe Gomara , e Agoílinho de Zarate , diz , que Francifco de Orelhana morrera no mar , antes de checar aonde pretendia , e que os feus Companheiros fe efpalharaõ por diverfas partes ; porém nefta authorifa mais as minhas memorias o merecido credito do Jefuka Alonfo de Ovalle ; na breve Relação do Reino de Chile. 82 PaíTados poucos annos navegava a Coíla do Brafil , bufeando fortuna em algum novo defcobrimen- •to', Luiz de Mello daSylva, illuílre filho do Alcaide môr de Elvas António de Mello , e de fua mulher Do- na Margarida de Lima ; e forçado dos ventos , correo a Coíla do Maranhão até tomar porto na Ilha Margari- ta , onde encontrando ainda alguns Soldados dos da de- ferçaÔ, e fegunda jornada do Capitão Francifco de Ore- lhana , voltou a Portugal taÕ perfuadido das riquezas daquellas terras pelas informações que lhe deraÕ , que as pretendeo com grande efficacia pelo defpacho dos feus ferviços , e obteve a graça delias com o titulo de Capitania , que já fe achava vaga , por defiftir da fua Povoação o íeu primeiro Donatário JoaÕ de Barros de- pois do naufrágio de Aires da Cunha , que taÕ fóra eíle- ve de meter horror ao valor Portuguez , que lhe fervio de eftimulo \ mas EIRey D. João , que conhecia bem , que para a conquifta , e povoação de taÕ vafto Paiz neceffitava eíle Fidalgo de mayores esforços , que os dos feus cabedaes , quiz moftrar de forte a diílinçaõ , com que o tratava ? que generofamente o ajudou tam- bém com três navios , e duas caravelas 5 e vendo-fe ; el- le com hum poder mais proporcionado ao projecto da fua expedição , lhe deu logo principio > ta 5 cheyo de animo , como de efperanças. Com -W do Eflado do Maranhão , Liv. I. j 5 $5 Com eíla Armada fe fez à vela Luiz de Mello dano de Lisboa j mas como poucas vezes fahem ver- dadeiras as felicidades , que aííeguraõ fó as lifongeiras promeflas do Mundo , antes de montar a chamada barra do Maranhão , naufragou nos léus baixos : com fuccef- ío, porém , menos infeliz , que o de Aires da Cunha j porque das fuás embarcações , íalvando-íe ainda huma caravela , que tomou a nado com alguns Companhei- ros , fe recoíheo nella a Portugal ; e continuando-lhe a grandeza de EIRey , laftimado também da fua átí- graça, o defpachou logo para a índia ..> donde reco- lhendo-fe para a fua pátria depois de muitos annos no mez de Janeiro do de 1575 , tao cheyo de gloria Mili- tar , como de riquezas , com o confiante animo de as empregar generofamente no defcobrimento do mefmo Couto, "Decai, Maranhão , fe perdeo na nao.S. ■Francifco , de que era ^ ca P- 2 7-infin- Capitão Pedro . ou Francifco Leitão de Gamboa , que o mar tragou fem duvida , porque naõ houve mais mo* ticia delia. 84 Outro fucceíTo , que pertence também ao de£ cobrimento do famofo rio das Amazonas ., referem SI f]p l l ã > ReU r mao Eftacio da Silveira , e Frey Marcos de Guadalaxa- Tas cou/hTTo ra , trasladando ambos a Pedro de Magalhães, no Tra- Maranhão. tado das coufas do Brqfil , que efcreveo no anno de 1 $j$ Gua^ahxam^ pelas formaes palavras , que fe feguem : Indo certa Na- Hiji-Pemif. iív! çaú dejle gentio bufe ando novas terras , em cjue habitar , s ' cap ' 5 ' ( que defeu natural faú como Siganos , amigos de andar pelo Mundo ) atravejaraà algumas jornadas para o Po- ente , onde encontrando com outra NaçaÕ fua contraria , que lhefahio pelas efpaldas , e fendo mais poderofos , os obrigarão a meter je muito pelo CertaÕ $ e dos trabalhos do caminho, e dos confliãos da guerra , morrerão muitos, e os que efeaparao foraò ter a huma terra , onde haviao Povoações muy grandes 7 e de muitos vi/m lios 7 entre os quaes erao tantas as riquezas , que havia ruas muito com- E vridas 34 Annaes Hífioricos pridas de Ourives , quefife occupavai em lavrar peças de ouro y e pedraria , com os (juaes fe detiver ai alguns tempos 5 e vendolhes levar ferramentas , lhes perguntarão de quem , ou porfie meyos as haviai % e elles os informa- rão , como da parte do Oriente , da banda do mar , habi- tavai huns brancos , cjue tinhai barba , de que as alcança- rão. Entai lhe der ai os outros os mejmosfinaes dos Cas- telhanos do Peru , dizendolhe , que também da outra par- te do Poente tinhai noticia haver gente femelhante , e lhe der ai a troco das ferramentas certas rodellas todas chapeadas de ouro , e ornadas de efmeraldas , pedindolhes, que as levajem para mojlrar aquellas gentes y que tinhai as ferramentas , e que lhes diffejjsm , que a troco daqueU las peças , e outras femelhantes , lhes quizefem levar fer- ramentas , e ter communicaçao com elles 7 que ofzejjem, que ejlavao prejles para os receberem com muito boa von- tade , e que partidos dalliforai ter ao rio das Amazonas ; e navegando por elle a cima dous annos , chegar ai a Pro- vinda de Quito f ( terra do Peru ) onde logo for ao conhe- cidos por gente do Brqftl y e contarão fua jornada , e ofe- recerão as rodellas , que for ai vendidas por grande pre- ço. 85 Addiciona entaõ Simaõ Eftacio , copiado tam- bém por Guadalaxara , que conforme as noticias de Pe- dro de Magalhães , ( que elle dá por muy certas ) eftes índios taõ ricos , faÕ os habitadores do Lago Dourado , a que os do Peru chamaõ Paytiti , o qual vinha a ficar no Certaõ Portuguez do mefmo rio das Amazonas ; de£ cobrimento , em que fe haviao confumido infinitas gen- tes , e Capitães Caftelhanos 5 porém eu fó me admiro, de que crefcendo fempre a ambição dos homens , fe te- nhao paíTado tantos annos depois deftas memorias 7 fem o feliz achado de tamanhos thefouros. 86 Com tudo he fem duvida j que eílas informa- ções taõ efpeciofas influíaõ muito na fadiga dos animosj por- do Eflado do Maranhão , Llv. I. j j porque depois de tantas , e tao fucceífivas infelicidades, intentou ainda o triunfo de todas Pedro de Orfua j e defpachado pelo Vice-Rey do Reino do Peru D. An- dré Furtado de Mendoça , Marquez de Canhete , com o titulo de Conquiftador das Amazonas , íà-hio da Cida- de do Cufco no anno de 1560 já com muitos Soldados , fendo dos primeiros, que o feguiraõ , hum D. Fernando de GufmaÕ, moderno na terra , e outro mais antigo , que fe chamava Lopo de Aguirre , de ta6 vil figura , como nafcimento. %j Era Pedro de Orfua hum Cavalhero muito e Mi- mado no Peru pelas boas partes , de que fe compunha o feu merecimento 5 e chamados também aquelles Hef- panhoes das novas efperanças deíla expedição , quando chegou a Quito , fe achava já com mais de quinhentos , em que entravaÕ muitos de cavallo , todos taõ luzidos, como bem armados ; mas prudentemente advertido das trabalhofas marchas, com que atraveíTando Gonçalo PiíTarro a Província dos Quixos, tinha bufcado o Ma- ranhão pelo rio da Cuca , ou dos Cofánes , procurou defcobrir outro caminho menos arrifcado , e o confe- guio com grande fortuna ; porque depois de fabricar as embarcações , que lhe parecerão neceflarias , entran- do pelo rio Yutai ( a que o Padre Chriílovaõ da Cu- nha , feguido do Padre Manoel Rodrigues , chama Yetaú ) por hum braço , que fe communica com o de Yuruá , paíTou a eíte , que o meteo no mefmo Ma- ranhão , ou Amazonas na altura já de cinco grãos ao Sul da Linha. 8 8 Alegre , com razão , da felicidade deíles pri- meiros pafíbs , fe aíTegurava já a mefma no fucceíTo dos últimos ; mas quando os apreííavaó as impaciências das fuás efperanças , lhos atalhou a morte ; porque amo- tinando-fe contra elle a mayor parte dos feus Soldados , capitaneados por D. Fernando de Gufmaõ , e Lopo de E ii Águir- Annaes Hiftoricos Aguirre , traidoramente lhe tirarão a vida ; e paffando logo a defatino mais abominável , acclamarao Rey ao tal D. Fernando 7 que defvanecido com taõ alto titulo , o recebeo de taõ poucos fubditos , fem mais outro do- mínio y que o daquelles penhafcos. 89 Foy a principal caufa da íublevaçaÕ huma bella Dama , de que fe acompanhava Pedro de Orfua ; por- que namorado da fua fermofura o infame Aguirre , in- fluío,nos ânimos daquelles Hefpanhoes huma acção taô feya, para faciar o feu appetite ; e affiftido depois dos mefmos complices , deu novos exercicios à fua aleivo- íia , comettendo a fegunda de matar também ao ridí- culo Rey, que tinha acclamado. 90 Porém neílas maldades naõ pararão ainda as de taõ vil homem 5 porque conílituido , em premio delias , no governo abíbluto > aíTacinou por vezes mais de du- zentos daquelles mefmos , que lhe obedeciaõ ; e com os que ficarão , por mais unidos à fua tyrannia , defembo- cando o rio das Amazonas , fe tranfportou a Margari- ta y que faqueou com novas crueldades ; mas paffando logo a outras Ilhas , para continuallas , foy vencido , e morto pelos feus moradores ; tendo também por ultima comettido já a mayor de todas na innocente vida de hu- ma menina , a que elle mefmo havia dado o fer , com o pretexto bárbaro , de que lhe naõ chamaflem filha do traidor , como fe as memorias depois de regiíladas nos bronzes das eftampas , naõ fícaíTem fendo de eterna du- ração. 91 Mais fuccintamente , e com alguma variedade \ referem os fucceíTos deita expedição os Jefuitas Alonfo 0//«?,pag. 155. de Ovalle , e Manoel Rodrigues; porém lendo eu ao Amaxônas ; \il Inca Garcillafo de la Vega, na fegunda parte dos feus a. cap.5. Commentarios , me vejo nefta obrigado a preferir as fuás memorias , como teftemunha ocular de muita porçaõ delias. Al- do EJlado do Maranhão , Liv. I. 37 92 Alguns annos depois pretenderão também da parte do Peru o defcobrimento das grandes riquezas do farnofo rio das Amazonas Vicente de los Reys Villalo- bos , e Alonfo de Miranda , Governadores ambos da Província dos Quixos , e o General Jofeph de Villa- Mayor Maldonado , que muito antes o tinha fido j po- rém a todos atalhou a morte a venturofa pratica das fuás idéas , como efcreve Alonfo de Ovalle, no lugar a cima referido. I ffliMiMlM ^ ANNAES .1 j:\ J i s . : . [j ró9 , ■ F 19 ANNAES HISTÓRICOS DO ESTADO DO MARANHÃO. LIVRO II. . SUMMARIO. ' OVOS fuccejfos infelices dos exploradores do Maranhão. Hum Capitai Francez arriba a mefma Ilha , e deixando nella o Senhor Des- Vaux ,fe recolhe a França. Repetidas de/graças no feu dejcobrimento , intentado da parte do Brafil. Pajfa a Variz o Senhor Des-Vaux , e encarece aauelle minifie- rio as efperanças do Maranhão. Vay examinallas o Se- nhor de la Kavardiere , e volta com a certeza delias. Sue- cede no governo geral do FJiado do Brqfil D. Diogo de Menezes , e toma medidas para ejia Conauijla , mandan- do por Capitai do Seara a Marti m Soares Moreno. Le- vanta ejle hum Forte no mefmofitio , e na enfeada delle rende huma nao de Hollanda. Dá outra a cofia com o terror FWP»- 40 Annaes Hijíorlcos \ma terror dejla noticia. Paja D. Diogo de Menezes para a Bahia de todos os Santos 5 e defamparado dosfoccorros o. Capitão Martim Soares , fe vê no ultimo perigo , de aue o j alva a fua conjlancia, O Senhor de la Ravardie- re aju/la huma Companhia para ejiabelecer huma Colónia no MaranhaÚ, e parte com o Senhor de Racily hum dos feus Sócios fará a mefma Ilha , onde levanta huma For- taleza. Volta a França o Senhor de Racily , e fica o Senhor de IqRavardiere no Maranhão. Mojirafe a in- jufiiça dejla expedição 1 , por pertencerem todas aquellas terras ci Coroa de Portugal. Succede no governo geral do Ejladó do Bra/il Gajpar de Soufa. A Corte de Ma- drid expede pofitivas ordens, pura a Conquijla do Mara- nhão , e he nomeado Comm and ante delia Jeronymo de Al- buquerque , que faindo de Parnambtico , levanta o Forte de Noja Senhora do Rofario. O Governador Ga/par de Soufa intenta de novo a expedição' do Maranhad , que também fe encarrega a Jeronymo de Albuquerque. Avi- fa por Lisboa Martim Soares , que aquella Ilha he po- voada de muitos Francezes > e o Governador toma a re- foluçad ultima de conquiftalla. 93 E fem duvida , que íe faziaõ cada dia mais formidáveis as de£ graças dos exploradores do Ma- ranhão j mas ao mefmo tempo fe inculcavaS taõ certas as efpe- ranças da ília opulência , empe- nhadamente encarecida da con- tinuada tradição de difFerentes memorias , que para o feu exame fe atreveo ainda Gabriel Soares , morador do Braíil a tentar a fortuna por aquella banda , afíifti- dp de bom Corpo deTropas j porém depois das tra- èalhofas marchas de pouco menos de trezentas léguas de do Lftaâo do Maranhão ) Liv. II. 41 de afpero CertaÕ , na direitura do Peru , chegando às cabeceiras do rio de S. Francifco , e à ferra Verde , já perco do governo dos Charcas, que he daquelíe Reino ; além de fentir neíla expedição a fatalidade de feus ante- ceíTores , chorou também a de perder nella muitos dos Companheiros , que o tinhaÕ feguido. 94 Neítes meímos annos , e alguns ainda antes dei- les , iníultava a Coita do Brafil hum Capitão Francez, chamado Rifault; o qual eftreitando a communicaçao com os índios feus habitadores , chegou a còntrahir com «lies huma tal amifade , que hum dos Principaes mais poderofos , por nome Ovyrapive \ o convidou', para que bufcaíTe por aquelias partes alguma fortuna , ma- yorque a de pirata ; porque fem duvida a encontraria muito favorável em outros novos defcobrimentos ; e para melhor prova da fidelidade, com que o perfuadia, lhe ofFereceo também a aífiílencia da fua peííoa. 9; Facilmente fe deixou elle penetrar de taõ effi- cazes incentivos ; mas como para tamanha expedição neceffitava de mayores esforços , os foy fazer a Fran- ça ; e ajudado do cabedal dos roubos, com a focieda- de de outros nacionaes , amigos fempre de novidades , voltou com effeito ao Brafil em 14 de Mayo do anno de 1594 com três navios bem fornecidos de boa equi- pagem , e taÕ lifongeado das fuás efperanças , que já as tratava como infalliveis ; porém brevemente as cho- rou todas malogradas 5 porque pela defordem dos me£ mos Companheiros , e também conftragido de hum for- te temporal , arribou à Ilha do Maranhão já com a per- da da fua melhor nao. y 96 Bem hofpedado nefte íítio dos muitos Tapuyas, que o habitavaõ , fe deteve algum tempo , até que in- fluído de novos projedos , fe recolheo a França , dei- xando na vivenda dos mefmos gentios alguma parte da fua equipagem à obediência de^hum Gavalhero moço , F natu- 42 Annaes Hifioricos natural do Condado de Turena , que fe chamava Car- los , Senhor Des-Vaux ? parece , que fiando da íua boa capacidade , que foubeíTe inclinallos aos interefles da Naçaõ y como lhe fuccedeo 5 mas porque a noticia de todos os eflèitos , que verdadeiramente produzio a com- municaçaodeíleFrancez, toca a outro lugar , feguirey a ordem dos fueceííos , nas indagações do mefmo Ma- ranhão. 97 Depois da infeliz entrada de Gabriel Soares , fez outra por mar , com o mefmo fucceííb , Pedro Coe- lho de Soufa , entaõ morador na Povoação da Parai- ba , e bem conhecido naquellas Conquiftas pela nobre- za do feu nafcimento , que deveo a huma das Ilhas dos Açores j mas ainda que tinha confumido nefta grande empreza hum groíTo cabedal , menos ambiciofo da fua útil reftauraçaÔ , que da gloria do nome , intentou por. terra a repetição da mefma jornada ; e maduramente ponderando o Governador do Eítado do Brafil Pedro Botelho os grandes intereíTes , que promettia ao fervi- ço do Principe , e utilidade publica ; além de permit- tirlha com demonílraçoes de muita honra lhe accref- centou a da patente de Capitão mor delia , para melhor aífegurar, na authoridade do caraóter , a obediência dos fubditos , caminho fempre o mais trilhado para a felici- dade dos grandes projectos. 9 8 Empenhado mais deíles novos eftimulos , fe poz em marcha no mez de Junho de 1605 , feguido de mais de oitenta Companheiros , naô menos generofos no fa- crificio das fazendas , entre os quaes hiaô alguns práti- cos na lingua dos índios , e deíles oitocentos de guer- ra ,( e naõ oito , ou dez mil , como efcreve Abbeville) taõ cheyos todos de alegres efperanças , que nenhum duvidava da felicidade do fucceíTo ; mas para melhor aíleguralla o militar difcurfo do Commandante , fepa- rando parte defta gente , a meteo a bordo de dous ca- ravelões ? do EJlado do Maranhão, Liv. II. .4-5 ravelões , que encarregados a hum Piloto Francez de muita intclligencia naquella Coíla , navegavao fempre junto da terra na obfervaçaõ dos feus movimentos. 99 Encaminhou Pedro Coelho a fua marcha ao Seara , e tirando daquelle deftri&o alguns índios mais domefticados, com a viíinhança dos prezidios da Coíla, a continuou em 28 de Outubro à ferra de Ybiapaba , aonde chegando em 20 de Janeiro do anno feguinte , depois de confeguir repetidos triunfos , na oppofiçaõ de Mel Redondo , hum dos mayores Potentados daquelle Paganifmo , logrou por ultimo o do feu rendimento j porque vendo eíle bárbaro , que fem que lhe valeíTem as aífiítencias de muitos Francezes piratas , de que era Commandante Monf. de Mombille , lhe tinha efcalla- do o Capitão mor três Fortificações , qiie lhe paredão inexpugnáveis , abandonou as que lhe reftavaõ , que eraô outras tantas j e a efte terror , feguindo-fe logo o da fua total conílernaçaõ , fereduzio à obediência de Portugal com mais de trinta Aldeãs pòpulofas ; mas com a honra ainda de algumas favoráveis Capitulações* negociadas pelos mefmos Francezes ; como também ef- creve , com relação pouco diílemelhante , o Padre Cláudio de Abbeville > na fua Hifioriada MijjaÕ do ciaude deAi> Maranhão 1 . Com o rendimento de Mel Redondo fuílenta- 100 va Pedro Coelho o principal domínio da f ferra de Ybia- paba , que fendo já famofa pela eminência* da f ua Subi- da , que leva quatro horas , fe faz muito mais na lon- gitude , e latitude 5 porque a primeira pafla de oitenta léguas , a fegunda de vinte , com huma campanha taõ admirável pela fermofura da planície , como pela fartu- ra , com que a fertiliza hum cryílalíino rio , que a rega 5 mas como era copiofamente povoada de índios de di- verfas Nações , defconfiando ainda da fidelidade Portu- gueza , o grande Principal Júriparí (que quer dizer De- Fii monio) bevillc , Htjl. d' P 'Mitfion des Veres Capucins en U Isle du Maragnon , & terres circon- VOÍJifíS. 44 • Annaes Hiftoricos monio) até fe atreveo a difputar as fuás ifenções com a força das armas $ e por mais que nos repetidos encon- tros de hum mez íbube bem caíligar tamanha oufadia o valerofo braço do Capitão mor , nao podendo já fub- íiftir nefta guerra , aíTim por fuperiores ordens , que ti-» nha recebido, como por falta de foccorros , fe achou obrigado a abandonalla , retirando-fe ajaguaribe, íitio naquelle tempo , e também no de hoje , da jurifdicçaô de Parnambuco. Sentio amargamente Pedro Coelho efte peza- do golpe da fortuna adverfa \ mas o feu grande coração querendo ainda difputarlhe as forças , intentou a fua fubfiftencia naquelle mefmo íitio com novos proje&os ; e conduzindo da Paraiba a fua familia , praticou logo o de huma Colónia , a que chamava a Nova Luíitania ,• e à Povoação delia ( com os princípios já da fua fun- dação ) a Nova Lisboa 5 porém como a corpo de tao altas medidas faltava a proporção de braço foberano , naõ avultavao muito todos os esforços das fuás effica- çias , que fazia também menos vigorofas a relaxação da difciplina nas vivas inílancias , com que o Governador Pedro Botelho pretendia a Joya dos Tapuyas , tratan- do-os como efcravos fem verdadeiro titulo 5 porque au- thorizando-fe com eíle máo exemplo hum procedimen- to taõ ínjuílo^ paíTarao as defordens a tamanho excef- fo , que depois de vendidos todos os prizioneiros nas occafiões da guerra , ( o que entaÕ nao era permittido ) padeceo a mefma tyrannia muita parte daquelles , que com tanto valor , como fidelidade , haviaõ fido compa- nheiros ? aííim nos perigos , como nas vitorias. 102 Nefta expedição faz o Padre Abbeville huma digreflaÕ longa , que intitula : Hjjioria de huma certa Perfo/wgem y quefe chamava Defcendente do Ceo 5 e af- fenta logo , que a fua fatal morte fuccedida no arroja- mento deftemido , com que os Portuguezes aífaltaraõ a Po- doEJlaâo do Maranhão, Liv.IL 4? Povoação , em que fe achava bem fortificado o Princi- pal Juriparí, tinha fido a total occafiaÕ da retirada de Pedro Coelho ; mas pelas minhas exa&iífimas indaga- ções , nas mefmas memorias, fico claramente conhe- cendo , que ou foy tudo fabula da barbaridade daquel- les Tapuyas , ou da malícia dos Francezes , que lhes aííiíliraô ., de que facilmente fe deixou fuggerir a finge^ leza defte Religioíò. 105 Nefte mefmo tempo acometteo a. Bahia de To- dos os Santos huma Armada Hollandeza , commanda- da pelo General Paulo Vvancarden ; e ainda que malo- grou o projecto deita expedição a valerofa refiílencia dos feus jmoradores , parecendo ao Governador, que necefíitava de melhores defenfas todo aquelle Eftado , defpachou para Hefpanha ao Sargento mor delle Dio^ go de Campos Moreno , já no fim do anno de 1604, com a commiíTaõ de reprefentar com toda a efficacia ao Minifterio daquella Corte a importância defta de- pendência. .1 04 Também o encarregou o meírno General de íblicitar meyos proporcionados a grande Conquifta do Maranhão , encarecendo bem os intereííes delia ; mas ainda que na juftiflima ponderação das qualidades do primeiro ponto voltou a Parnambuco , deferido nelle inteiramente , nefte fegundo foy defattendido , por fe acharem já preoccupados os principaesMiniftros, das taõ repetidas , como efcandalofas informações das ty^ rannias de Jaguaribe ; e deftituido Pedro Coelho de to^ dos os foccorros , fevio reduzido a tal eftado , que já com o perigo de experimentar o ultimo na geral defer- çao dos mais fieis amigos , fe recolheo à fua antiga ca- ía da Paraíba , feguido a pé de fua mulher , e todos os feus filhos ; alguns delles de taõ tenra idade, que fal- tandolhes forças para o foffrimento dos trabalhos , os acabarão dous com as mefmas vidas , merecido caftigo . . j do ' Annaes Hifloricos ' do feu procedimento no cativeiro , a que condemnou tanto gentilifmo , fem refpeito algum, nem ainda ao direito das gentes nos privilégios da hofpitalidade , que defaggravou bem , no modo poffivel , a grandeza ca- tholica de Filippe III. \ porque naõ fó mandou refti- tuir todos os efcravos à fua liberdade } mas também aos pátrios domicilios , muito melhorados de fortuna , no groíTo cabedal 7 que difpendeo com elles. 105 Obfervara5 cuidadofamente o fucceflb deíla expedição os Religiofos da Companhia de Jefus 5 e pa* recendolhes , que eraõ muito das obrigações do feu Apoftolico caracter , os intereífes que promettia na re- ducçaõ de tantos bárbaros ao grémio da Igreja , a re- petirão com licença do Governador no anno de 1605 r fem mais outras armas , nem ainda para a defenfa na- tural , que as de fetenta índios à ordem de dous Padres, que fe chamavaõ Francifco Pinto , e Luiz Figueira. 106 Com taõ pequenas forças , animados fó das generofas influencias dos feus grandes efpiritos , entrou o zelo ardente deftes dous Varões em huma empreza tao arrifcada j e já aíTegurados na amifade dos Portu* guezes , todos os índios do Seara foraõ penetrando as afperezas do Paiz até mais a baixo da Ybiapaba ; mas infultados dos muitos Tapuyas daquella grande ferra , depois de fervir de facriflcio à fua fereza a venerável vi- da do Padre Pinto com a de muitos índios feus auxilia- res ; a ficou devendo o feu Companheiro ao refugio dos matos. 107 Ufanos da vitoria fe retirarão logo aquelles bárbaros 5 e com eíla noticia, defaíTombrado o Padre Luiz Figueira ,■ bufcou o campo do combate , onde fe- pultou amortalhado no mais amargo pranto o religio- fo cadáver de feu Companheiro , que depois de alguns tempos deu claros teftemunhos do virtuofo efpirito , de que fe animava neíla vida 5 porque trasladados os feus oífos do Eftaâo do Maranhão , Liv. II. 47 oíTos à populofa Aldeã de hum grande Principal , cha- mado Algodão ( viíinha do prezidio do Seara ) pelos íeus mefmos índios , foraõ taes os prodígios , que creo a piedade obrou Deos porelles, que fe chegarão a ve- nerar como fantas relíquias. i o 8 O Padre Figueira , com os poucos índios , que lhe tinhaô ficado , fe recolheo ao Seara , donde paífou logo à Povoação do rio Grande , a diligencias do Sar- gento mor doEftado do Brafil Diogo de Campos, que entaõ fe achava vifitando aquella Fortaleza. 109 Neíle melmo anuo governava já toda a Ame- rica Portugueza D. Diogo de Menezes , Fidalgo de tan- tas virtudes , que para o efplendor do feu illuítre nome, lhe flcavaõ íbbrando as honrofas memorias dos feus ef- clarecidos Afcendentes ; e informando-fe com tanto zelo , como legalidade , da dilatada Coita Leíle , Oeíte, que comprehende a do Maranhão até as índias Caíte- lhanas : depois de ponderar fundamentalmente o gran- de perigo , que eftas corriao , fe fe introduziíTem na- quellas terras as Nações eílrangeiras , fez ao Minifterio de Madrid , fobre a mefma matéria , humas taõ vivas reprefentaçoes , authorizadas com a relação de huns pi- ratas Francezes , aprezados na boca da Bahia de Todos os Santos , que acabando então de conhecer a Corte a importância deitas noticias , lhe paífou logo pofitivas ordens , para empenhar todo o feu cuidado no ultimo exame j o qual confeguiraõ com tal indagação as acer- tadas providencias da fua actividade , que bem inítrui- do o mefmo Miniíterio , o encarregou de reduzir a pra- tica as fuás medidas : e porque deite tempo por diante acho já ajuítada com os fucceíTos a computação delle , darey principio aos meus Annaes com a mais rigorofa chronologia. 110 Era grande o efpirito de D. Diogo de Mene- zes , e influído mais da efficacia do feu ardente zelo do Anno 16 Annaes Hifeoricos do ferviço do Príncipe , e utilidade publica , regulou de todo ofeu proje&o para a Conquifta do Maranhão io. no anno de 1610, tratando juílamente todas aquellas terras , como legitimo Património do Reino Luíítano , por lhe ficarem dentro dos limites da linha imaginaria , que por repetidas Capitulações ,. e Breves Pontifícios , xepartio os defcobrimentos de toda a America , entre a fua Coroa, e a de Caftella , como já deixo referido j mas ao mefmo tempo ós VafTallos de França intentavao também a occupaçaÕ de hum tao vafto domínio , fem mais outro titulo , que o das fuás indunrias , affiílidas ■das armas. 1 1 1 O Capitão Rifault ; pirata Francez , tinha dei- xado na chamada Ilha do Maranhão ao Senhor Des- Vaux , como já fica efcrito no lugar a que toca ; e na* morados todos aquelíes bárbaros feus habitadores , af- fim do valor, a que deviaõ fempre as fuás vitorias , co* mo da afabilidade do natural, de que era dotado , fe penetrarão tanto das fuás fuggeítóes, que voluntária»- mente fe fugeitaraõ a huma Colónia da mefma NaçaÕ , que elle lhes orTerecia , de baixo das promeíTas , de que nao fó os defenderia de feus inimigos , mas também os ínftruiria na verdadeira Religião , e coílumes da Europa. 1 1 2 Com a felicidade da negociação ponderou bem aquelle Francez as qualidades de taÕ fértil Paiz ; e am- biciofamente perfuadido dos intereffes , que lhe aíTègu- ravao, paíTou a Pariz , onde encareceo ao grande Hen- rique IV. os importantes , que fe feguiriaS à fua Coroa da povoação deílej mas defejando efte Monarca mais cabaes noticias para haver de tomar a refoluçaÕ ultima em tamanha empreza , encarregou a Daniel de la Tou- che, Senhor de Ia Ravardiere , affiftido também do mefmo Des-Vaux , o ocular exame da fua reiacao , já com as promeíTas , de que fahindo verdadeira , funda- ria logo naquella Ilha huma boa Colónia. Na do EJlado do Maranhão , Liv. II. 49 115 Na fiel obediência de taõ íuperior ordem, fe Atino i6io, embarcou promptamente Ravardiere para o Maranhão, aonde chegou com profpera viagem ; e pelas exa&iffi- mas indagações de féis mezes completos , vendo bem confirmadas as do feu Companheiro o Senhor Des- Vaux, voltou para Pariz para dar conta da fua com- miífaõ a EIRey íèu Amo -, heróica vida, que achou já infultada pelo abominável parricida Francifco Ra- -villac, defde o dia 14 de Mayo , ornais fatal para to- lhe principiou a levantar huma decente Igreja , para a qual já levava Capellao com os ornamentos neceíTarios, generofamente diílribuidos pela devoção de D. Diogo de Menezes ; e para a fua natural defenfa , entrou tam- bém na fundação de hum Forte da mefma invocação , muito capaz de duzentos Soldados ; obras , que avulta- rão com poucos dias de trabalho pelos foccorros de feu amigo o grande Principal Jacaúna. 117 PaíTado pouco tempo crefceraõ muito os cré- ditos defte Official na opinião de tantos bárbaros 5 por- que demandando aquelle prefidio hum navio pirata dos rebeldes de Hollanda , o abordou taõ deílemidamente y aííiílido de algumas canoas dos feus mefmos índios j aos quaes a femelhança da fua cor ( por fe valer da in- duftria de fe tingir delia para o mefmo fim ) parece , que do Eflado do Maranhão, Liv.il. 51 que fazia por conta da inveja muito mais tfficazes os Annoióii, honroíbs eítimulos da imitação , que com poucas horas de combate , fendo já defpojo do feu valente braço qua- renta e dous dos inimigos , fe renderão os mais com a embarcação à mercê da fua piedade. 1 1 8 Eternizou Martim Soares a fua fama , e ao mefmo tempo a reputação das armas Portuguezas nas acclamações daquella vitoria , que fe fez ainda muito mais importante pelas confequencias ; porque chegan- do as noticias delia à vifinha bahia de Mocoripe , em que fe achava outra embarcação comerciando com os índios ; preoccupada do fufto , levou o ferro com arre- batamento taõ precipitado , que depois de perder no efcaler , que tinha hido a terra , alguma parte da fua equipagem , como a pouca, que ainda lhe reílava de huma enfermidade contagiofa , que padecia , nao era a que bailava para poder marear o pano , foy dar à co£ ta dalli quinze , ou dezafeis léguas , onde tragou o mar com os piratas , que eítavaõ a feu bordo , a preciofa. car- ga de marfim, e ouro , que conduziaõ da Coda da Mi- na j parece , que difpondo a alta Providencia, como jufto caíligo , que o mefmo elemento , que lhes facili- tou aquelfe roubo, o depofitaífe para fempre nas fuás entranhas com os authores delle. 119 Já nefte tempo havia paíTado de Parnambuco f>ara a Bahia de Todos os Santos , com dependências de muita importância , o Governador D. Diogo de Mene- zes , e ainda que deixou bem recommendadas as affiften- cias do Seara, como para a prompta expedição delias faltava o grande efpirito da fua zelofa actividade , na omiíTao culpável de feus Subalternos , defamparado o Capitão Martim Soares de todos osfoccorros, fe che- gou a ver no ultimo perigo ; porque difcorrendo fobre eíle defprezo a maliciofa brutalidade de tantos Tapuyas, (fuggerida também das finiílras praticas de hum per- G ii veríb J2 Annaes Hifloricos d' Uffil I. 4! Annoi6n. verfo Catholico , que lhes perfuadiaõ ? que elle os fu- geitava fem íuperior ordem para os fazer a todos efcra- vos , como diícipulo de Pedro Coelho nas tyrannias de Jaguaribe ) intentarão por repetidas vezes affegurar as fuás liberdades com o fatal eílrago daquella nobre vida ; porém como tinha cabal conhecimento do idioma dos mefmos bárbaros , e era mayor a fua conftancia , que os accidentes da fortuna , foube vencer eftes valerofai- mente , até que foccorrido de Parnambuco , naõ fó grangeou a fua fegurança , mas também novos crédi- tos. 120 Nefte eílado fe achava o militar proje&o do Governador D. Diogo de Menezes para a Conquifta do Maranhão , quando o Senhor de la Ravardiere , que tinha concebido grandes efperanças da povoação da- quella Ilha , vendo , que a Rainha Maria de Medices , que governava a França na menoridade de feu filho Luiz XIII. , occupada em mayores cuidados , naõ at- tendia a efte taõ efficazmente como elle queria > com permiíTaõ fua ajuílou huma Companhia com Nicolao de Harlay , Senhor de Sancy , Baraõ de Molle y e de Groz-Boiz , dos Confelhos de Eílado , e Privado ; e Francifco de Racily , Senhor deite Lugar , e dos Au- melles , para que unidos os cabedaes de todos, lhe for- neceífem as forças neceíTarias para poder reduzir a pra- tica as fuás idéas , na útil fundação , e eílabelecimento de huma nobre Colónia. 1 2 i A eíles três Sócios , em nome de EIRey Chrif- tianiííimo, paíTou Patentes a mefma Rainha Regente de feus Lugar-Tenentes Generaes nas índias Occiden- taes y e terras do Brafil , com data do primeiro de Ou- tubro , mas o Senhor de Racily , que para entrar nefta Companhia , attendeo muito menos aos intereíTes tem- poraes , que lhe promettia , que aos eternos na reduc- .çaô daquelle gentilifmo ao grémio da Igreja , para mof trar \ do FJiado do Maranhão , Liv. II. 5 J trar melhor o feu ardente zelo, logo que fe ajudou com Anno ióir. Ravardiere, pedio com inílancias para primeiros Fun- dadores da verdadeira Religião , em hum Paiz tao bár- baro , alguns Religiofos Capuchinhos , exemplares vir- tudes , a que profeífava huma efpecialiffima devoção defde a íua infância ; e louvando Maria de Medices pretençaõ taõ catholica , a infinuou por Tua Real Car- ta de 20 de Abril defte prefente anno ao Padre Leonar- do , Provincial da meíma Ordem , na fua Província de Pariz. 122 Propoz logo em Capitulo eHe digno Prelado a eleição de fogeitos para tao Apoftolico emprego , pa- ra que fendo ella Canónica , menos parecefle dos ho- mens , que do Efpirito Santo 5 e aíTentando-fe por uni- forme acordo , que fe pediíTe ao fupremo Paftor do feu Seráfico rebanho , o Padre Jeronymo de Caílelferrete , fe lhe íizerao promptamente as neceíTarias reprefenta- çòes 5 porém elle , que conhecia bem , que afiegurava mais o acerto da efeolha nas primeiras difpoíições do Padre Leonardo , lhe transferi© todos os feus poderes por duas Cartas do mefmo theor 3 huma na lingua Ita- liana , outra na Franceza , eferitas em Roma com data ambas de 5 de Julho. 125 Tornou entaõ o mefmo Prelado a convocar Capitulo Provincial , e por folemne eleição foraõ no* meados para Miííionarios de tanto Paganifmo os Pa- dres Ivo de Eureux , Arfenio de Pariz , Ambrofio de Amiens , e Superior de todos Cláudio de Abbeville , ( a quem fe deve eíla relação ) Religiofos , que mof- trarao bem as fuás virtudes na refignaçaõ da obediên- cia , proteftando-a com a mais profunda fubmiíTaÕ aos pés do Prelado. 124 Em 28 de Agofto , dia {inalado no Mundo Ca- tholico pelas fieis memorias do Doutor da Igreja Santo Agoftinho , fahiraõ de Pariz eftes Apoftolos do Occir. dente v Annaes Hifioricos Ânnoióii. dente na direitura de Cancalle , Povoação do Ducado da pequena Bretanha , e porto deílinado para os apref- tos defta expedição $ mas como para ella fe necefíitava ainda de muitos , quando o Inverno fe achava tao vifi- nho , fe detiveraô alguns mezes no mefmo lugar , affif- tidos também da eftimavel communicaçaõ do Senhor de Racily. - 125 O Senhor de la Ravardiere , e o de Racily eraô os Commandantes de tamanha empreza j mas fen- do indiftin&os , aííim nos intereíTes , a que os convida- va , como na authoridade do governo , fe achavaõ muy diíFerentes na Religião , por íeguir o primeiro a errada feita de Lutero , da qual também levava muitos fequa- zes , ( ainda que calla eílas verdadeiras memorias a cul- pável politica de Abbeville ) e o mortal inimigo do gé- nero humano , que conhecia bem , que efta expedição ameaçava já ao feu tyranno Império huma fatal ruina , intentou eftorvalla na divifaõ dos ânimos Francezes ; porém o Senhor de Racily , aííiftido fempre das influ* encias do zelo mais catholico , os reduzio todos a hu- ma taõ fegura conformidade \ que ficarão vencidas com grande gloria fua as poderofas forças de tao diabólicas fuggeftoes. 126 Nefte mefmo tempo , que chegava já ao novo anno de 16 12 , entrou em Cancalle o virtuofo Bifpo de Sant-Malló , Cidade , e porto da Provincia de Norman- dia , com o ardente zelo , naõ fó de benzer os Reaes Eftandartes da França , mas também os navios defta expedição , que fe apreftavaô a toda a diligencia para fazerfe à vela ; e com eneito deu principio à fua fun- ção em 25 de Janeiro, efcolhendo efte dia da conver- faõ do Apoftolo S. Paulo , para perfuadir a de tantas almas , pelo argumento de huma eruditiflima Oração. 127 Com magnifica folemnidade benzeo logo efte exemplar Prelado quatro Cruzes , que poz nas mãos dos quatro io Eftado do Maranhão , Liv. II. 5 ? quatro Miííionarios com todas as ceremonias do Ritual Anno ióii. Romano , depois os Eftandartes da Naçaô , conduzi- dos pela Nobreza delia, e ultimamente as armas do Se- nhor de Racily ; porque ainda que o principal proje&o do feu fervor catholico fe tinha encaminhado à ben- ção dos navios , afíim o máo tempo , que corria para entrar no mar , como outras razões mais particulares ( que também diífimula politicamente o Padre Abbevil- le , por naõ fallar na religião de Ravardiere , que fe achava a bordo ) o obrigarão a cometter efta função aos Miííionarios. 128 Entaõ fortificados todos os Francezes daquel- le armamento , na união dos ânimos , para o eftabeleci- mento da Nova Colónia , flzeraÔ huma folemne pro- teftaçaõ de obediência aos feus Commandantes , que aíTmaraõ os principaes Cabos , e Nobreza , no mefmo porto de Cancalle , em o primeiro dia do mez de Mar- ço ; e dadas já todas as providencias neceíTarias para a viagem , fe efperava fó favorável monção para levar as ancoras. 1 29 Eraõ três as nãos , de que fe compunha efta Ef- quadra , com a equipagem de pouco menos de quinhen- tos homens de mar , e guerra ? a Almiranta , ( fallan- do no eftylo Francez) que governavaõ os dous Lugar- Tenentes Generaes , e tinha o nome da Regente , em obfequio de Maria de Medices : a Vice-AImiranta , que levava a feu cargo o Baraõ de Sancy , ( filho , ou irmaõ do terceiro Sócio nefta Companhia ) e fe chama- va a Carlota : e a ultima , que hia à ordem do Cavallei- ro de Racily , ( irmão do Commandante , Senhor defte Lugar ) e fe diftinguia pela foberana invocação da Se- nhora Santa Anna. 1 5 o Toda a equipagem fe achava já a bordo , im- paciente com a dilação da fua partida , quando pelas féis horas e meya da manhã do dia 19 de Março ( bem conhe- 56 Annaes Hifloricos ■ar Anno i6i2. conhecido no Mundo Catholico pelo Teu grande Orago o gloriofiííimo S. Jofeph ) fe fízeraõ à vela os Senhores de la Ravardiere , e de Racily , taõ cheyos de efperan- ças , que fendo muitas as faudades , que deixavaÕ a to- dos os Francezes , era mayor o numero das invejas por conta das fortunas , que reputavaõ já como poíTuidas nos promettidos intereíTes da fua jornada ; e lifongeira- mente favorecidos de hum vento bonançofo, neíle prin- cipio delia , até fe aíTeguravaò com os mais alegres ai* yoroços a felicidade da navegação. 131 Mas o demónio , que naõ pode em terra em- baraçar huma expedição , que fe fazia formidável ao feu infernal ódio, intentou no mar a mefma empreza , in- fluindo de forte todas as fuás fúrias na inconílancia dos ventos, que no breve termo de quatro horas , trocadas as bonanças em tormentas , foraÕ taõ horrorofas as que padecerão aquelles três navios pelo largo efpaço de no- ve dias , que já naõ podendo fupportallas , fe apartou da conferva a chamada Santa Anna j logo a Vice-Al- miranta , e pouco depois fe achou também a Almiran- ta na invencível força de correr com o tempo : a pri- meira arribou aFalmout, a fegunda aDartmout, e a ultima a Pleymout, portos todos de Inglaterra. 132 Cada hum dos Commandantes deftes navios , entendendo já, que fó teria fido o venturofo na falva- çao da fua equipagem , fentia como própria a infelici- dade dos Companheiros 5 mas os Senhores de la Ra- vardiere , e de Racily , que para confolarem eílas af- flicções , receberão logo as alegres noticias , de que duas embarcações Francezas haviaõ arribado huma a Falmout , outra a Dartmout 5 já nas bem fundadas ef- peranças, de que eraõ as mefmas , que lhes faltavaõ, diligentemente as avifaraõ , para que bufcaíTem o por- to de Pleymout j e com erTeito entrarão nelle dentro de poucos. dias o Baraõ de Sancy, e o Cavalleiro de Racily do Jijlado do Maranhão , Liv.II. S7 Racily com inexplicáveis alvoroços de toda a Compa- Aano 1612. nliia. 155 ConfeíTavaõ todos a publicas vozes o generofô acolhimento, quetinhaõ devido aos Inglezes j e con- tinuando ainda nelle o Governador de Pleymout , com toda a Nobreza daquelle porto , ajudarão de forte à a&ividade dos Senhores de la Ravardiere , e de Racily, que com poucos dias de trabalho ; bem reparados já do paíTado deílroço todos os úús navios , fe acharão pron> ptos para feguir viagem. 1 54 Pelas fete horas da noite de 25 de Abril larga- rão o pano com vento favorável 5 porém taõ bonan- çofo , que às oito da manhã do feguinte dia , fe acha- vaõ ainda em Inglaterra , ao través do Gabo de Lizart j mas como a alta Providencia fe declarava já por eíla ex- pedição , o mefmo tempo , que levavaõ , refrefcou lo- go de tal forte , que em 7 de Mayo fe viraõ entre Forte ; Ventura , e a Graõ Canária. 1 3 I' <■'* 58 Annaes Hifloricos ■ H ] * Annoi6i2. veraõ nella cinco dias até o de 18 domefmoMayo, em que continuando a fua viagem por entre as Ilhas Poreuguezas de Cabo- Verde , entrarão na Coíla de Guiné, que correrão de longo até a Linha, com ra- zão ) temerofos do venenofo clima daquelle vaftiífimQ Paiz. 157 Em 1 3 de Junho fe acharão de baixo da Equi- nocial, que paíTaraõ fem calmas , felicidade pouco or- dinária na navegação j e em 17 , na altura já de quatro grãos ao Sul , encontrarão três grandes navios Portu- guezes , que vinhâÕ da índia Oriental ; mas reco- nhecendo-fe huns , e outros , na ordem naval , conti- nuarão todos as fuás derrotas , ferh outra alguma ac- ção. 1.5 8 PaíTados poucos dias , no de 23 do mefmo Ju- nho , às fete horas da manhã , principiarão a defcobrir a Ilha de Fernão de Noronha pela diftancia de dez léguas; mas ainda a tomarão naquella noite ; e no feguinte dia ( em que celebra a Igreja o prodigiofo nafcimento do Precurfor de Chriílo ) ancorarão defronte delia , que demora na altura de três grãos , e vinte e cinco mi- nutos. 139 Tem efta Ilha cinco para féis léguas de circum- ferencia ; e pareceo tao agradável aos Francezes , que faz o Padre Abbeville as mais encarecidas exprefsões , aííim dos intereíTes , que podiao tirarfe da fua habita- ção , pela fertilidade do Paiz , como também da fer- mofura delle. 140 Nefte íitio taõ deliciofo acharão os Francezes hum Portuguez com dezafete , ou dezoito Tapuyas de luim , e outro fexo , defterrados todos da Capitania de Parnambuco , como diz Abbeville , (.fe nao foíTem fu- gidos, que he o mais provável) e os Padres Capuchi- nhos principiando a dar os claros teftemunhos do feu ardente zelo na falvaçaõ das almas , nao fó difpozeraõ logo do Ejlado do Maranhão , Liv.II. £9 logo huma Capella, em que celebrarão o inerTavel Annoi6i2. Sacrifício da Miífa j mas também inílruidos alguns dos mefmos bárbaros nas primeiras doutrinas da ver- dadeira Religião , lhes adminiftraraõ o Sacramento do Bautiimo , e a dous , depois delle , o do Matrimo- nio. 141 Os Senhores de la Ravardiere , edeRaciIy P que da cafualidade defte tal encontro tirarão logo no- vos argumentos para a felicidade da fua expedição ? a communicaraõ com toda a confiança , affim ao Por- tuguez , como aos índios j e obrigados elles dos aga- zalhos , que tinhaó recebido, naõ fó fortalecerão as fuás efperanças com as noticias , que lhes deraô do Maranhão , mas também lhes rogarão , que os ad- roittiíTem à fua companhia 5 o que confeguiraõ dos dous Commandantes, fem que neceííitaífem da repe* tiçaõ das mefmas fupplicas $ porque no feu defpacho entravaô já com conhecido empenho dos intereíTes próprios. 142 Na fertilidade defta Ilha fe refrefcaraõ os Fran- cezes até 8 de Julho ; e fazendo-fe à vela às féis horas da tarde , na manhã de 1 1 principiarão a defcobrir y com inexplicável contentamento , a terra do Brafil , a que brevemente fe avifinharaõ tanto , bem fervidos dos Ven- tos , que ao Meyo dia atraveífaraô a bahia de Moucu- rú pela curta diílancia de meya légua ; e coíleando a meíma terra às cinco horas da tarde do dia feguinte , furgiraõ no Cabo das Tartarugas , dous grãos , e qua- renta minutos ao Sul da Linha , com dez grãos , e hum terço da variação da agulha. 145 Neftefitio, que acharão também muito apra- íivel todos os Francezes , íe detiveraô doze dias , gofto- famente divertidos na caça , e na péfca , em que admi- rarão , além da abundância de hum , e outro género , huma prodigiofa variedade 5 e na manhã de 24 do mef- H ii mo Annoi6i2. Annaes Hiíloricos mo Julho, continuando a fua derrota, paíFaraÕ junto do rio CamuíTy , defcobrindo já a grande ferra de Ybia- paba. 144 No feguinte dia viraõ o principio das áreas brancas , chamadas Lançoes ; e no de 26 , embocando a barra do Periá , deraõ fundo defronte da Ilha de Upa- onmery , conhecida defde aquelle tempo pelo glorio- fo nome de Santa Anna , que lhe poz o Senhor de Racily , em memoria da feita , que lhe dedica a Igreja Catholica todos os annos nefte mefmo dia. 145 No mefmo furgidouro acharão dous navios de Dieppa , Villa , e porto de mar do Ducado de Nor- mandia , Província da França ; de que fe naÕ admira- rão, porque fabiaÔ bem, que muitos piratas feus na- cionaes havia muitos annos , que viviaô dos roubos , com que infultavaÕ todas as Codas do Brafil. 146 Deites Francezes tirarão também os dous Com- mandantes informações da Ilha do Maranhão , que lhes ficava ainda na diílancia de doze léguas -, mas por mais que fouberaõ , que naÕ teriaõ , que vencer para a fua entrada, nem a menor oppoílçaõ ; querendo com tu- do facilitar mais o feu projecto nos feguros exames da difpofiçaõ , em que fe achavaõ todos aquelles bárbaros, lhes mandarão logo por Embaixador o feu antigo hof- pede Senhor Des-Vaux, que os acompanhava} por- que havendo fido pelas fuás mefmas diligencias o prin- cipal agente da expedição , neceíTariamente a recebe- rias" como defempenho da obrigação , em que o tinhaô pofto. 147 Naõ fe enganarão elles nas fuás medidas ; por- que o Senhor Des-Vaux , logo que entrou na principal Aldeã dos Topinambazes, (habitadores únicos de vin- te e três , de que fe compunha a povoação de toda a Ilha ) vio também recebida a fua peíToa , como a em- baixada j e juftifíimamente fatisfeito do fucceíTo delia > fe do miado do Maranhão , Liv. II. 6í fe recolheo à fua Efquadra , onde informou os Com- Armo 1612. mandantes Generaes dos alvoroços , com que os efpe- ravao todos aquelles índios. 148 A efte tempo já os Miííionarios tinhaõ prepa- rado huma grande Cruz ; e poíla em terra a mayor parte da equipagem , no dia 29 foy íolemnemente conduzida aos hombros do Senhor de Racily , e muita mais No- breza , pela diílancia de mil paíTos , até huma pequena planície com pouca elevação , onde a collocaraõ de- pois de a benzerem , e logo a Ilha , já com a foberana invocação da venturofa May da Puriííima Virgem Nof- fa Senhora ; catholico aór,o , a que fe feguio o da mais ' devota adoração. 149 Mas quando depois de concluídas todas eftas ceremonias, fe preparavaõ os Francezes para a entrada do Maranhão, como os dous Commandantes , informa- dos já da vontade dos índios , tratavao fó de aflegural- la na fugeiçaõ de todo o Paiz ., cavilofamente rebuça- da na efpeciofa capa das fuás induftrias , fe adiantou lo-< go o Senhor de Racily , acompanhado do Senhor Des- Vaux , com huma boa parte da equipagem a bordo das lanchas , e efcaleres de todos os navios , e defembar- cando na mefma Ilha, fe logrou bem o novo projecto ; porque já confirmadas as concebidas efperanças daquel- les Tapuyas , pelo agrado do modo , nao houve entre elles demonftraçaõ alguma , em que deixaíTe de fe reco- nhecer a mais verdadeira abonaçao da fua promettida fi- delidade. 150 Logo o Senhor de Racily fez também enten- der aos Topinambazes pelo Senhor Des-Vaux , que os Padres, que trazia para osinftruir na verdadeira Reli- gião , naõ tomariaõ porto naquella Ilha , fem a total certeza , de que feriaõ recebidos com a profunda vene- ração , que fe lhes devia pelo feu cara&er ; e bem aíTe- gurada dos mefmos bárbaros , os avifou à Ilha de Santa Anna , , M' Anno 1612 m &" 'tá:, •1 : ''', Hi. '! '.iií! 1 62 Annaes Hifloricos Anna, para que no dia 6 deAgoílo feachaíTem no Ti- tio de Javireé ( chamado entaõ por eíle nome , hoje defconhecido. ) 151 No dia ílnalado , pelo Senhor de Racily , en- trarão os quatro Capuchinhos em Javireé , affiftidos do Senhor de Pizieu , Cavalhero do Delfinado , Provincia da França , e de taô grande diílinçaõ 7 pela qualidade do feu nafcimento , como pelas virtudes , de que fe or- nava j e o Senhor de Manoir , pirata Francez , que con- fervava naquelle mefmo Titio huma Feitoria dos feus roubos , achando-fe nella com muita parte da equipar gem de três navios mais , também de Dieppa , os man- dou logo comprimentar a bordo da lancha , em que hiaõ. 152 Chegou entaõ [ o Senhor de Racily ; e como já fabia , que naõ podia a lancha lançar a gente em ter- ra por falta de fundo , defpedio logo algumas canoas , ( embarcações fem. quilha , de que fe fervem todos os índios ) que breviffimamente a puzeraõ na praya , on- de fe feftejaraõ huns , e outros Francezes com as de- monstrações mais affeóhiofas ; mas entre ellas princi- piou a entoar o Padre Abbeville o fagrado Hymno de acçaõ de graças , que continuou em huma devota Pro- ciíTaõ ; aífiílida já de grande numero de Tapuyas. 153 Com o fim defte acto fe conduzirão logo os Capuchinhos com o Senhor de Racily , e o de Pizieu , à morada do Senhor de Manoir, que na mefma noite lhes deu hum feílim ao ufo da França com mefa ta5 ma- gnifica , que fe efquecerao todos dos regalos da Euro- pa ; mas naõ o Senhor de Racily dos cuidados da fua expedição ; porque acabada a cea , fe defpedio do Se- nhor de Manoir ; e aííiílido dos feus Companheiros , paíTou por mar a outro vifinho lítio , deílinado já para cabeça da nova Colónia. i 154 Aqui paíTaraõ todos orefto da noite ; e algu- mas do E/lado do Maranhão , Liv.IL 63 mas das feguintes, debaixo de frondofas arvores taõ vi- Atino 1612. ílnhas do mar, que quaíi cahiaõ fobre elle ; mas nao fe contarão muitos dias, fem que fe viífem aífiílidos de tantos Tapuyas, e com demonílrações tao agradáveis , que até para o defcanço corporal tiveraõ logo fuffici- entes accommodações , fabricadas por elles de páos das mefmas arvores , tecidos de ramos de palmeira brava, a que chamaõ Pmdova , que também lhes ferviaÕ de te- lha para fe cobrirem , como fuccede ainda hoje. 155 Os Miífionarios efcolheraõ hum aprafivel fitio para o feu Hofpicio Religiofo , que as robuftas forças dos mefmos Tapuyas , breviflimamente defoccuparaõ dos corpulentos troncos, que o cobria Õj porém em quanto nao cabia no tempo a fabrica de huma Capella, levantarão nelle altar portátil, de;baixo de huma Ten- da de Campanha ; e celebrarão as primeiras MiíTas em 12 de Agoílo , dia de Santa Clara , com tanto concur- fo , como reverentes admirações daquelle Faganifmo. 156 A efta hora tinha já tomado ormefmo fitio o Senhor de la Ravardiere 5 e defejando ambos os Com- mandantes eílabelecer nelle a fua fubfiftencia com ma-, yor fegurança , defenharaõ logo huma Fortaleza na ponta de hum rochedo, que fe defpenha fobre ornar; fundação , que affiílida da fua actividade , ajudada dos índios , crefceo tanto fem tempo, que tendo ainda pou- co de trabalho , fe achava já taõ capaz de défenfa , que lhe montarão vinte groíTos canhões de artilharia. 1 57 Junto da mefma obra fe fabricou também hum grande armazém , onde fe recolheo abundância de dro- gas, que osFrancezes levavaÕ por comercio ; e na dif tancia de mil paíTos , em que ficava o fitio , efcolhido já pelos Miííionarios , principiou, a levantarlhes o feu Hofpicio miltidaõ de Tapuyas com empenho taõ pro- digiofo , que fem muitos dias de trabalho, tinha já o nome de Convento de S. Francifco. Difpoz . v?*-* ~ Ánnaes Hijíoricos Annoióia. 158 Difpoz logo o catholico zelo do Senhor de Racily , que em final da vitoria , que havia confeguido a verdadeira Ley , fe arvoraíTe o fagrado Eftaoidarte das fuás Armas na Cruz de Jefu Chrifto ? depois também de fe benzer a terra para purificarfe dos peftiferos ares de tanto Paganifmo j e com eíreito fe executou tudo no glo- riofo dia da Natividade de NoíTa Senhora , oito de Se- tembro , com as mefmas ceremonias , que já fe tinhaô praticado na pequena Ilha de Santa Anna ; mas com concurfo muito mais numerofo , no meyo do qual de- clarou o Senhor de Racily à Fortaleza a invocaça5 de S. Luiz , em perpetua memoria do pupillo Rey Chrif- tianiffimo Luiz XIII. , e à bahia a de Santa Maria , af- íím em obfèquio da religiofa celebridade- daquelle me£ mo dia , como por lifonja à Rainha Regente Maria de Medices. 159 A eíle tempo já os Francezes esforçavao as operações da fua induílria ; porque com ella grangean- do o agrado dos índios , fe tinhaÕ muitos efpalhado pe- las Aldeãs em pequenas Efquadras, para mais docemen- te lhes darem a beber , no venenofo copo da fua fugei- çaõ , o aborrecimento da Portugueza , de que confer* vavao vivas memorias pelo procedimento do Capitão mór Pedro Coelho na ferra de Ybiapaba , e Jaguaribi j mas o Senhor de Racily , para fazerlhas horrorofas , in- troduzindolhes nos corações o mefmo veneno com mais actividade, determinou com tudo a vifita da Ilha j e vencidos logo alguns embaraços 7 que fe lhe oppunhaÕ, fahio da Fortaleza de S. Luiz no dia 28 de Setembro , acompanhado fó de quatro criados , e poucos mais Ta- puyas , de feu irmão o Senhor de la Aunay , do Senhor Des-Vaux , ( também como interprete de hum , e ou- tro idioma ) e dos Capuchinhos Cláudio de Abbeville , eArfenio dePariz. ] 60 Foy plauílvelmente recebido eíle Çommandan- te do EJíaâo do Maranhão , Liv. II. 6 J te de todos os índios j e em huma das Aldeãs , que fe Anno 1612. chamava Janovarem , admirarão elles no dia 50 do mef- mo Setembro as primeiras ceremonias do Sacramento do Bautifmo , adminiílrado pelos Miffionarios em huma menina de dous annos , que grangeou também por eíla fortuna a do foberano nome de Maria. 161 PaíToulogo o Senhor de Racily a Juniparaô, Povoação capital de toda a Ilha , onde fe deteve até 5 de Outubro 5 e continuando os Miffionarios no fervo- rofo zelo das fuás Apoílolicas doutrinas, (traduzidas pelo Senhor Des-Vaux , e hum índio Catholico , que fe chamava Sebaíliaõ , pratico também na lingua Fran- ceza ) as efcutavao aquelles bárbaros com tantas atten- ções , que parecerão ao Padre Abbeville huma milagro- fa penetração da verdade , fem advertir a fua fmgeleza , que todas aquellas exterioridades naõ eraô mais, que huma ruftica imitação do mefmo que viaõ , como fuc- cede fempre a eíla gente em qualquer qualidade de acções. 162 Seguio Racily a fua viílta pelas jmais Aldeãs ; depois de deixar na de Juniparaô ao interprete Sebaf- tiaõ , para explicar fempre aquelles gentios os myfte- rios da Fé j e os virtuofos Miffionarios exercitando bem o feu efpirito, bautizaraô duas crianças mais de dous para três annos na Aldeã de Timbó , donde Racily vol- tou logo para Juniparaô. 163 Nefta Povoação acharão já os Capuchinhos acabada a obra de huma Capella de madeira , em que deixarão trabalhando hum copiofo numero de índios j e levantando o feu altar portátil , repetirão nella em 10 de Outubro , com mayor apparato , o Sacramento do Bautifmo , que conferirão em primeiro lugar a dous fi- lhos , e duas filhas do Principal damefma Aldeã, que fe chamava Japiguaçú , apadrinhados pelo Senhor de Racily , e de feu irmaõ o de la Aunay , que lhes deraõ I os 1* Annaes Hijloricos Annoióis. os nomes de Luiz, Carlos, Arma, e Maria, elogo a féis peíToas mais , que julgarão capazes ; porém ainda antes do ineffavel Sacrifício da Mifía , também adminif- traraõ o Sacramento do Matrimonio ao interprete Se- baftiaõ , que o contrahio com a recém Catholica Anna, fílha mais velha dejapiguaçú. 164 Foy grande a complacência, que receberão de Ma folemnidade os virtuofos Miílionarios ; porém a ella fe lhes feguio logo a dor mais penetrante , na me- lancólica noticia , de que no dia antecedente havia paf- fado da vida caduca para a eterna o Padre Ambrofio de Amiens , que tinhaÕ deixado na Fortaleza de S. Luiz j e como era hum fogeito de tantas virtudes , que ainda antes de fe apartar do feculo já o conftituiaõ verdadeiro Religiofo , naõ fe empregou fó nos Companheiros a feníivel magoa da fua falta , porque abrangeo bem a to- dos os Francezes. 165 Com eíla novidade tomou logo o Senhor de Racily a refoluçaõ de apreíTar mais a fua viílta 5 e no feguinte dia 1 1 de Outubro , deixando ao Padre Arfe- nio em JuniparaS , paíTou com Abbeville a outras Al- deãs , onde foy recebido com as ordinárias demonílra- ções de gofto j porém na terceira chamada Tgapó ( que na lingua Tapuya fígnifica lugar pantanofo ) alterou de forte os focegados ânimos daquelles bárbaros o difcurfo de hum delles de muy provedos annos , que fe achou obrigado Racily a fufpender a fua jornada. 166 Ouvioaquelle velho, na coftumada arenga do Senhor DeS-Vaux , que os Francezes fem os intereíTes de fugeitallos , generofamente lhes offereckõ a fua pro- tecção para os defender da tyrannia Lufitana , trazen- do-lhes também ao mefmo tempo o mayor bem de to- dos no conhecimento da verdadeira Religião , que fó podia refgatallos do infernal cativeiro do Paganifmo } e dasmefmas memorias, com que abominando o proce- dimento do miado do Maranhão ', Liv.II. Sj dimento dos Portuguézes pretendia exaltar o da fua Annoióii. Nação , fez o tal Tapuya taô forte argumento , que toda a rhetorica defte Francez ficou emmudecida ; por- que recitando os antigos fucceíTos da fua longa idade , lhe moftrou com clareza , que todos os principios da- quella prefente expedição , eraõ taõ parecidos aos das paíTadas , que capitulava como cruéis , que prudente- mente a deviaõ temer os Topinambazes, como ruina ul* tima da fua liberdade. . i 1 6j Inílou com tudo o Senhor Des-Vaux para con* vencer eftes fundamentos de menos verdadeiros ; po^ rém Racily, que percebeo bem a commoíTaÔ dosani-, mos, fezfufpender todas asdifputas, com o jufto re- ceyo , de que fuílentando-as a authoridade daquelle bárbaro , os deixariao mais endurecidos y e diílimulando ofeu fentimento, íê recolheo à Fortaleza de S. Luiz dentro de poucos dias , com o pretexto , de que necef- fitava da aíliftencia da fua peííoa $ mas communican- do a David Migan ( outro Francez interprete da lirígua Tapuya ) todas as circunstancias do prefente cafo - 7 el- le , que também tinha grande aceitação entre aquelles gentios , paíTou à tal Aldeã , onde repetindo os mefmos argumentos do Senhor Des-Vaux , com mayores esfor- ços , teve a fortuna de reduzir o velho , e por confe- quencia a todos os fequazes , que refpeitavaõ fó a fua opinião pelo credito delia. 168 Com a felicidade defte fucceffb ficou toda a Ilha do Maranhão a obediência dos Francezes $ mas os dous Commandantes , querendo eftender o feu domínio^ mandarão embaixadas à terra firme de Tapuitapéra , e deCumá, fitios naquelle tempo, eíle de onze Aldeãs > o primeiro de dez ; e fem a mais leve repugnância da numerofa gentilidade , que as povoava, fe fubmeteo to* da de baixo da fua protecção com grandes intereíTes do rebanho Catholico. I ii Ven- 1 Anno 1612. Annaes Hifioricos 1 69 Vendo-fe entaõ os Senhores de la Ravardiere, € Racily no domínio pacifico do Maranhão r formarão novas maquinas para diffimular a notória violência do feu procedimento 5 porque fazendo perfuadir a todos os índios pelos feus interpretes , que para melhor fe affe- gurarem na protecção da França deviaõ procurar , que o Real Eftandarte da Naçaõ foíTe por ellês arvorado naquelle mefmo fitio: reconhecido já como cabeça da Colónia , fe penetrarão tanto defta fuggeftao alguns dos Principaes de mais authoridade , que aíTim o pretende- rão j e os dous Commandantes deferindo à fupplica co- mo Verdadeira fatisfaçaõ própria > fmalaraò dia para a funçáõ , que também fe mandou logo publicar por to- das as Aldeãs. 170 Fóy o primeiro de Novembro o efeolhido para tefta ceremonia ; e como osFrancezes feguiao nella a intenção politica dos antigos Romanos , também os imi- tarão nos apparatos j porque os Commandantes logo que poftaraÕ toda a Infantaria na ordem militar , aíTiftida de multidão de índios, entregarão o Eílandarte a féis Prin- cipaes dos de mayor nome 5 e pegando ambos nas duas pontas delle, marcharão em triunfo até junto da Cruz, lugar já deítinado para a folemnidade. 171 Aqui fizera Õ alto , e depois de huma breve arenga do Senhor de Ia Ravardiere , que recommen- dava aos Francezes a obrigação , em que fe confti- tuiaõ por aquelle a&o, e outra maís longa de Racily, que feguindo também o mefmo aíTumpto , fe encami- nhava principalmente à conílancia dos índios , arvora- rão logo os féis Principaes as Armas da França , como publico teftemunho da poíTe , que lhe davaÕ de taô vafc todominiòj a qual receberão os dous Commandantes -com toda eíla formalidade , fem advertir a fua paixão > que fe lhe ha de ter muito refpeito aos ferviços , que nella me fizerem para lhes man~ dar por elles deferir as fuás pretençoes , honras , e mer- cês ', do EJlado do Maranhão , Liv.II. jj ces 5 e para ejle efeito vos encarrego muito , fie tenhais Annoiói^. particular cuidado de faber , o fie cada hum fizer emfiia obrigação 1 , de que lhe pa fareis fuás Certiddes , em que ef- pecialment efe declare o procedimento do pretendente , a quem tocarem , para eu me inteirar de tudo com toda a par- ticularidade. 191 Além deílas Cartas, recebeo outra o Governai dor , com expreíTa ordem para reíidir na Capitania de Parnambuco, por fer o íitio mais conveniente para dar calor à expedição , que pelas fuás mefmas informações , fe lhe mandava encarregar a Jeronymo de Albuquer- que , Fidalgo da Cafa Real , e morador na Villa de Olinda , que para mayor honra , juíliííimamente mere- cida das fuás virtudes , teve também efpeciaes recom- mendações da mefma Mageftade. E como o zelo de Gafpar de Soufa procurava em tudo diftinguirfe , de- clarando logo a nomeação defte Commandante , armou a toda a diligencia quatro barcos em guerra , que fem mais guarnição , que a de cem homens , a fazia avultar com grandes ventagens a qualidade delia , por fe com- por também de muitas peíToas conhecidas , que bufca- vaõ fó na gloria das acções a eternidade da memoria. 192 Com eíle armamento fahio Jeronymo de Albu- querque do rio do Recife no primeiro de Junho, don- de cofteando a Capitania de Parnambuco, até muito a baixo do Seara , que corre no mefmo continente , levou oCommandante daquelle Prefidio Martim Soares Mo- reno , fubftituindo no feu lugar a Eftevaõ de Campos 5 e chegando ao buraco das Tartarugas , que defemboca no grande parcel de Jericoácoára , fez na entrada delle huma pequena fortificação de páo a pique, com o nome de NoíTa Senhora do Rofario ; a que JoaÕ Laeth , na fua DefcripçaÕ das índias Occidentaes , erradamente chama Cidade , ou Villa. 195 Daqui deílacou logo a Martim Soares em hum dos - 1 j 'M 78 Annaes Hifioricos . 1lll I li '' ' k Armo 161 3. dos quatro barcos da fua conferva , guarnecido dos me- lhores Soldados , com a importante diligencia de reco- nhecer a procurada Ilha do Maranhão , como o mais pratico naquelle Paiz , pela muita affiftencia , que tinha feito no Seara 5 e para haver de continuar a fua expedi- ção , ficou efperando as informações , de que neceífita^ va j mas vendo lhe tardavaÕ , quando fem ellas naõ po- dia paiTar a mais vigorofas operações , com taõ poucas forças , guarneceo o Forte de NoíTa Senhora do Rofa^ rio com quarenta Soldados , de que nomeou Comman- dante a hum fobrinho feu ; e acompanhado de algumas pefíbas da fua primeira confiança , fe retirou por terra a Parnambuco no mez de Agoíto , depois de defpedir por mar o refto da gente para feguir o mefmo caminho , que todos concluirão com feliz fueceflb $ porém com defagrado do Governador , por entender , que os pou- cos progreiTos daquella jornada , reípondiaÕ mal às con* cebidas efperanças das fuás medidas. 194 Sem outra novidade , que mereça memoria , te- ve fim oanno de 16 [3 neíla parte da America ; mas na Anno 1914. entrada logo do de 16 14, naõ fuecedia aífim nos domí- nios da Europa ; porque fazia já formidável eftrondo hum grande armamento dos Hollandezes , que divulga- va a fama fe encaminhava ao mefmo Brafil ; e achan- do-fe na Corte de Hefpanha o Sargento mor daquelle Eftado Diogo de Campos Moreno , por haver paiTado a Portugal com a dependência do jufto defpacho dos feus muitos ferviços , recebeo novas ordens para conti- nuallos nas mefmas Conquiílas , aííiftindo também à ex- pedição do Maranhão , que já naquelle tempo convida- va muito as attenções dos primeiros Miniílros. 195 Procurou efeufarfe defta jornada Diogo de Campos , juílamente queixofo de ver defattendidas as reprefentações do feu merecimento 5 mas fem outra al- guma íatisfaçaõ , que a daquellas promeiTas mais efpe- ciofas do afiado do Maranhão , Liv. II. 79 ciofas , de que os Soberanos fe coftumaõ fervir em fe- Atino 1614- melhantes cafos , bufcou como Soldado o melhor pre- mio das fuás acções na repetição delias 5 e paflando lo- go a Lisboa, onde felhe havia aíTegurado acharia já prompto hum luzido foccorro de quatrocentos homens, que fó fe fiava dos bem acreditados acertos de lua con- ducla ; também defenganado deílas efperanças , depois da paciência de baftantes mezes , fe vio obrigado a fa- zer viagem fó com alguns Soldados , e poucas munições de guerra. 196 Com feliz fucceílb na jornada defembarcou no Recife de Parnambuco em 26 de Mayo j e achou taõ avançadas as providencias para a Conquifta do Ma- ranhão, que também eílava declarado por feu Comman- dante Jeronymo de Albuquerque , que já o tinha fido da expedição do anno paífado 5 porque ainda que naõ fa- hio delia com aquellas ventagens , que pretendia o ar- dente zelo de Gafpaf de Soufa , bem conheceo efte Fi- dalgo o juíliíicado procedimento da fua retirada j mayor- mente quando repaífava a devida memoria das honrofas acções de toda a fua vida. 197 Nefte tempo havia já três mezes , que o preíi- dio deNoífa Senhora do Rofario fe fuftentava fó das hervas do campo 5 mas na debilidade das forças natu- raes acreditou de forte a conftancia do animo , que intentando huma madrugada a fua interpreza trezentos Tapuyas do mefmo deftri&o , com o mais bárbaro ar- rojamento , foy taõ valerofa a oppofiçaÕ entre as fom- bras da noite , que conhecendo bem eftas racionaes feras , com a primeira luz do dia , o feu fatal eftrago , reduzidos todos à conílernaçáõ mais horrorofa , af- feguraraõ o feu focego nas empenhadas diligencias da noífa amifade , que facilmente confeguiraÕ j porque os Portuguezes fempre foraõ taõ promptos na fatif- façaõ das fuás oíFenfas , Como no perdaõ delias , quan- do i 8o Annaes Hifloricos !'# ,w Hhl i * : Annoi6i4. do o folicíta a fubmiflaõ dos mefmos culpados. 198 Com eftas noticias ; que chegarão logo ao Go- vernador Gafpar de Soufa , defejou elle aproveitarfe , como fciente Capitão , de huma conjuntura taõ favo- rável para as medidas do feu projecto j mas conhecendo bem , que os muitos apreftos , que ainda lhe faltavaô , naturalmente naõ cabiaõ na apertura do tempo , a que fe achava reduzida a neceííidade da guarnição dò Forte, quando era igual , a que também fentia nas munições de ^ guerra 5 acodio a ambas com o prompto foccorro de hum caravelaÕ , guarnecido de trezentos Soldados à or- dem do Capitão Manoel de Soufa de Eça , natural de hu- ma das Ilhas dos Açores , e Provedor dos Defuntos , e Aufentes na Capitania de Parnambuco , donde fahio em 28 de May o. 199 Com a viagem de doze dias , felizmente con- cluío a fua eíle Commandante em 9 de Junho 7 enchen- do de alegres alvoroços a valerofa guarnição daquelle Prefidio $ e como a fama lhe prevenia já as azas para re- montar a fua memoria , logo no dia 12 arribou fobre el- le huma nao Franceza de boa equipagem > commanda- da pelo Senhor de Pratz , Fidalgo de muita diftinçaõ > que levava a feu bordo o fornecimento de trezentos ho- mens para a nova Colónia de S. Luiz , com huma Mif- faõ de doze Capuchinhos , que governava como Com- miíTario ( que também tinha fido na fua Província de Pa- riz , como já fica referido ) o Padre Arcangelo de Pem- broch , Religiofo taõ illuííre no fangue , como nas vir- tudes. 200 Hia informado o Senhor de Pratz , de que nao paífando a fabrica do Forte da débil força de pao a pi- que , fó fe compunha entaÕ a fua defenfa de vinte e cin- co homens mal armados j e fazendo para a fua invafaõ o prompto defembarque de duzentos , principiou logo a repetir os vivas da vitoria ; mas o Capitão Manoel de Soufa , . do E/lado do Maranhão , Liv. II. 8l Soufa , que obfervou bem tantas ventagens inimigas , naõ fe querendo ainda aproveitar das dos feus reparos , na oppofiçaÓ ddhs , fahio ao Campo fó com dezoito Companheiros 5 e cobertos todos da fragoíidade do ter- reno , por onde os Francezes encaminhavaÕ já a fua marcha na melhor difciplina , os atacou em hum paííò eítreito , com tao pezados golpes , que os que lhe naõ ferviraõ do mais nobre defpojo , na meíma refifteneia , aíTeguraraõ precipitadamente a falvaçaõ das vidas na fua embarcação 5 procedimento , que depois defculpa- vaõ com o juílo receyo de ferem caftigados , por terem entrado na acçaõ fem fuperior ordem 5 como fe naõ fl- zeífe muito mais grave o feu delicio a meíma defeza ! 201 Nefta occafiaõ, como em todas as mais ante- cedentes , fe íinalou o Capitão Domingos de Araújo com a felicidade de fer elle o único para as noíTas me- morias , entre os Companheiros de Manoel de Soufa 5 enaõ fallo também no Commandante doPreíidio, fo- brinho dejeronymo de Albuquerque ; porque fó eíla diílinçaõ lhe refervou a inveja , fem duvida por querer impedirlhe na do feu próprio nome as immortaes recom- mendaçÕes da pofteridade , deixando-as ainda muito mais penhoradas nas expectações de taõ nobre appelli- do. 202 Quando chegarão as alegres noticias deíle fuc- ceífo a Gafpar de Soufa , já defde o dia 22 de Junho , ti- nha defpedido ajeronymo de Albuquerque para a Po- voação da Paraiba com cinco barcos grandes , ou cara- velões , em que levava os fornecimentos neceíTarios pa- ra formar hum corpo de todos os índios daquellas viíí- nhanças 5 e pofto elle em terra , fe empregou logo neíle proje&o com grande adividade. 205 O Sargento mor Diogo de Campos também trabalhava cuidadofamente na expedição da Armada , que fe apreftava para a mefma Conquifta do Maranhão ; © L mas Anno 1Ó14, 82 Annaes Hiflo ricos %. Ánno 1614. mas com o diíTabor de ferem poucas as embarcações pa- ra a commodidade de tanta gente , e fem os provimen- tos , que eraõ preci íbs para fuftentalla 5 porque fó os homens de mar 7 e guerra haviao de chegar a trezentos , depois da união de Jeronymo de Albuquerque , além do copiofo numero de índios armados , com que engroíTan- do elle cada dia mais as fuás forças , adiantava já os alo- jamentos com grande fortuna. 204 Naõ fazia também pouca confufaõ a dos avifos do mefmo Commandante , fobre as medidas ultimas da fua jornada.} porque feguindo nellas a variedade natural dos Tapuyas, humas vezes aífegurava, que entraria por mar , e outras por terra 5 quando nefta parte fe offere- ciaõ tantas difficuldades , principalmente aos Religio- fos da Companhia de Jefus , que até as tratavaõ por in- vencíveis ? regulando-fe bem pelas cuílofas experiências da ferra deYbiapaba. Mas na oppofiçaÕ de tantos dif- curfos melancólicos , confervando fempre o Governa- dor a mefma conftancia , para dar delia mais evidentes provas , na a&ividade das providencias , mudou a fua cafa da Villa de Olinda ( hoje Cidade ) para a Forta- leza do Recife. 205 O Capitão Martim Soares, que deixey o anno paífado na primeira entrada de Jeronymo de Albuquer- que encarregado dos exames do Maranhão > executou efta diligencia com huma tal fortuna , que já bem infor- mado , intentou bufcar o íeu Commandante 7 rompen- do a corrente das aguas na fubida da Corta , que fora de monção fe faz invencivel ; mas rebentandolhe hum dos maftros , nefta mefma força arribou em popa às índias Caílelhanas ; das quaes paífando a Sevilha , deu logo conta no Minifterio de Madrid , do que tinha achado , com as certas noticias , de que aquella Ilha eftava povoada de muitos Francezes ; e por Portugal também as mefmas a Gafpar de Soufa , com o Piloto do E/lado do Maranhão , Liv. II. 8 5 SebaftiaÕ Martins, e mais alguns Soldados, dos que ha- Anno 1614. viaõ fido feus companheiros na viagem , para melhor o inílruirem na relação delia. 206 No dia 24 de Julho chegou eíle aviíb ao Go- vernador , com pofitivas ordens da Corte de Madrid , para fe empenhar todo na Conquifta do Maranhão , que também de novo fe lhe mandava encarregar ajerony- mo de Albuquerque 5 e ainda que em tudo as tinha elle já obedecido , ou lhes eftava dando inteiro cumprimen- to , por difpoílçao do feu exemplar zelo , esforçou mais a mefma efficacia, parece que affiílido de efpirito profé- tico 5 porque fazendo todos formidável o poder dos Francezes , na relação de Martim Soares , que authorifa- va muito o Piloto Sebaftiao Martins , com os feus Com- panheiros , como teftemunhas oculares 5 por mais que conhecia a grande força dos argumentos , já fe oíFendia delles , como inimigos da fua mayor gloria , nas eleva- das ponderações da heroicidade do feu animo. 207 Com tudo entendendo , que o Sargento mor Diogo de Campos pela fua muita capacidade , e largas experiências nos fucceíTos da guerra , dava o mayor corpo a todos os difcurfos , na approvaçaõ delles , pe- lo diíTabor de fe achar obrigado a obedecer naquella Conquifta a Jeronymo de Albuquerque, aííim nefta at- tençaô , como por evitar prudentemente as muitas def- ordens , que coftumaÕ feguirfe da caprichofa contradi- ção dos pareceres , quando falta nos Cabos a união des- apaixonada , que fe faz precifa para o acerto das refo- luçõs, lhe mandou paíTar huma Provifaõ de adjunto / e collateral ( como elle lhe chama ) do mefmo Com- mandante , ficando porém efte fempre fuperior na de- cifaõ dos votos , e expedição das ordens ; porque fó em feu nome fe haviaõ repartir , e dar à execução em todos os cafos. 20S Com eílas honras , que no fentido mais eíTen- L ii ciai ^Iêêêê*M 84 Annaes Hifioricos Anno 161 4. ciai fó deviaõ tratarfe como efpeculativas , por ficar fendo nellas mayor a iíènçaÕ , do que a authoridade , fe focegou Diogo de Campos j e trabalhou com tal ef^ ficacia nos apreftos da Armada , que dentro em poucos dias eílavao jápromptas as embarcações para fazerfe à vela 5 mas faltando ainda huma larga defpeza no forne- cimento das farinhas , chegou ordem da Corte de Ma- drid a Gafpar de Soufa , para a remeífa dos effeitos dos dizimos . donde fó podia tiralla , com a comminaçaõ de penas graviffimas aos feus tranígreífores j encon- trando já, ou defattendendo com eíle novo avifo a grande Conquiíla do Maranhão , taÕ empenhadamente recommendada. 209 Bem advertia eíle Fidalgo , que os Miniftros daquelle Miniílerio , defatinando nas felicidades de Por- tugal , como hydropicos da fua ruina , fó acertavaó nel- la j mas entre as mais activas afflicçÕes do feu zelo , prevalecendo fempre os defafogos naturaes da magnani- midade , continuou 110 primeiro empenho ; e para dar principio, à fua execução , fez que íahiífem logo dous caravelóes , para que com a gente , e munições de guer- ra, e boca, que poderão levar, fe encaminhaífem a Je- ronymo de Albuquerque, que fuppunhajáno rio Gran- de , com os novos reforços para as fuás Tropas , dos muitos moradores , e índios guerreiros , que voluntaria- mente o hiaõ bufcando. 210 Tinha já regulado eíle General as fuás inílruc- çoes para tamanha empreza ; porém fazendo efcrupulo, de que nellas fe deixava vencer , com algum exceífo , das generofas praticas do feu grande efpirito , com me- nos attençaõ às arrifcadas inconílancias do tempo, lhe pareceo accrefcentar , que limitava as fuás medidas do fitio da Titoya , rio da Cofia do Maranhão , até a Ilha do Periá j à qual chegando Jeronymo de Albuquerque , lhe ordenava também , que fe fortificaíTe , naõ paífan- do ão Eftado do Maranhão , Liv. II. 8 j do a mayores progreíTos , fem huma nova refoluçaõ fua, Anuo 1614. ou da mefma Corte , que informaria cuidadosamente com as certas noticias da capacidade daquelle Paiz. 211 Os Capuchos de Santo António parece , que ja prognoílicavaô ao grémio da Igreja os muitos inte- reíTes , que lhe grangeou eíla expedição ; porque ofFe- receraõ para ella dous Religioíbs , forte que coube aos Padres Frey Cofme de S. Damião , e Frey Manoel da Piedade 5 o primeiro , que havia fido Guardião no feu Convento da Paraiba $ e o fegundo da principal Nobre- za do Brafil , e grande Theologo 5 e fendo ambos de huma vida exemplar , e illuftrados das mayores virtu- des , deixarão bem canonizado , por todos os princípios, o acerto da efcolha. 2 1 2 Também fe offereceraô para a mefma Conquif- ta alguns particulares , dos quaes foy hum Francifco de Frias de Mefquita , Engenheiro mor do Eftado do Bra- fil j e outro Gregório Fragofo de Albuquerque , que aceitou o poílo de Capitão de Infantaria , fem mais íol- do , que o de Soldado rafo ; o que fervio de taÕ útil ex- emplo , que todos os outros fe accommodaraõ com o mefmo. 213 Formaraõ-fe quatro Companhias de feíTenta homens cada huma, com os que já feguiaõ ajerony- mo de Albuquerque ; e foraõ eleitos para feus Capitães ( além de Gregório Fragofo, fobrinho do mefmo Com- mandante ) António de Albuquerque feu filho , Manoel de Soufa de Eça , que fe achava no Forte das Tartaru- gas , e Martim Calado de Bitancour , que tinha chega- do de Lisboa com o Sargento mor Diogo de Campos , para fervir na mefma expedição ; mas naõ fe incluíaô nefte pequeno Corpo de Infantaria os Aventureiros , que feparados delle havia de mandallos nas occafiões o Cabo , que fe lhes nomeaíTe. 214 Tudo fe achava já a bordo das embarcações , quan- Sé "H.l Annaes Hifloricos Anno 1614. quando entrarão algumas da Capitania do Rio de Janei- ro com baílantes farinhas j e mandando logo Gafpar de Soufa , que fe tomaíTem até féis mil alqueires , com as que eftavaõ embarcadas , a inftancias também de Dio- go de Campos , que nao ceifava de lhe reprefentar , que neceífitava aquella Armada do provimento de féis mezes ; pois nos foccorros 7 que liberalmente lhe pro- mettia ? mal fe podia aífegurar a fua fubfiftencia , fem huma notória repugnância das experiências militares , nas contingências da fortuna. Bem fatisfeito elle neíla parte , recebeo as ultimas ordens para largar o pano , com geraes applaufos dos feus Companheiros 5 porque chamados todos das lifongeiras vozes das fuás efperan- ças , fentiaÕ já com impaciência as dilações daquella partida. ml 1 '1.: Mn • ANNAES 8 7 ANNAES HISTÓRICOS DO ESTADO DO MARANHÃO. LIVRO III. SUMMARIO. Sargento mor Diogo de Campos Jahe do rio do Recife com a Armada para a Conquijla do Ma- ranhaÕ , efe incorpora no rio Grande com o feu Commandante General J eronymo de Albuquerque. Con- tinua ejle afua derrota até a bahia do Iguapê. Defem- barca , e marcha por terra com todos os índios até o Sea- ra , navegando Diogo de Campos na direitura do me fino Frefidio. Nel/e torna a embarcar J eronymo de *Albu- querque com toda a gente , que ofeguia ; e corre a Co/ia até dar fundo na enfeada do Forte das Tartarugas , on- de toma terra com a mayor parte das fuás Tropas. Sa- hedelle depois de demoli ido ; efazendofe avela , chega a Ilha J '!.■ ões de mayor honra. •254 As embarcações ficarão todas guarnecidas com militar acordo ; porque ainda que o íitio era pouco fe- guro , por fe achar expofto ao furor dos ventos , o de- mandavaõ muitos piratas para o reígate de differentes drogas, que naõ ha perigo a que fe naõ arroje a ambi- ção das riquezas: porém Jeronymo de Albuquerque, por mais que defejava o dos encontros inimigos para mayores créditos da fua mefma fama , temendo jufta- mente o que o ameaçava no deíigual combate de qual- quer temporal , procurou evitallo no vifínho abrigo do rio CamuíTy : mas como depois de bem examinadas as difficuldades da entrada , e penúria da terra , fe defco- briraõ nelle mais arrifcados inconvenientes , fe fugeitou aos que padecia, e elegendo como Varaõ prudente o menor de dous males na precifaõ da fua eícolha. 25 5 NaÕ podia elle fepararfe muito defte deílricto , fem regular primeiro as ultimas medidas do feu proje- cto j aíTegurando bem , na fua devoção , todos os Ta- puyas da ferra de Ybiapaba , e os Taramambezes do fi- tio da Titoya, aquelles , que já communicava com boa amifade , e os Taramambezes , que a confeíTavaõ naõ menos verdadeira à memoria do Capitão Martim Soa- res , do tempo que paíTou ao Maranhão nos exames da Ilha $ porque ainda no cafo , de que as allianças de tan- tos bárbaros lhe naÕ ferviíTem para o reforço das fuás Tropas , a fua oppofiçaõ lhe feria arrifcada , fe fe achaf- fe obrigado a marchar por terra , por lhe ficarem todos na retaguarda 5 e entrando logo na taõ prudente , co- mo militar pratica dos mefmos difcurfos , mandou avi- far da fua cheirada o poderofo Principal JuriparíguaíTú, ( que ílgnifica Demónio grande ) convidando-o para a confe- ^^Hj^Hs^isa m% li! 4 Annaes Hijloricos Anno 1614. conferencia dos intereíTes de ambos os partidos nas con- fequencias daquella jornada , também com a lembrança dos promptos foccorros, que liberalmente havia ofFe- recido para ella. 2 3 6 Defte negociado fe promettia já o Capitão mor humas grandes ventagens , para aíTegurar o feliz êxito da íua expedição 5 porém os Soldados do Prefidio das Tartarugas , que tinha Õ cabal conhecimento , de que a infidelidade daquelle gentio, refpondia bem às preroga- tivas do feu mefmo nome , defenganaraõ logo as fuás efperanças com as verdadeiras informações, de que pe- dindo elle com muitas inftancias dous dos feus Compa- nheiros para fazer agueira a outros Tapuyas inimigos, depois de confeguir com as influencias do feu valor a vitoria de todos , naõ fó alimentara por muito tempo a brutalidade da fua gula do abominável paílo dos venci- dos , mas também refervava para ultimo prato os feus bemfeitores , como defempenho o mais generofo nos documentos bárbaros da fua fereza , laftimofa defgraça , porque paíTariaõ fem humano remédio , a lhes naõ aco- dir o prefervativo dos avifos de fua mulher, fabendo moflrar nas mefmas compaixões , que nem o parentefco do fangue , nem o contraindo nos eílreitos vínculos do matrimonio lhe faziaõ defconhecer os invioláveis privi- légios da gratificação , e hofpitalidade. 237 Ouvio com horror o Commandante Portuguez eftes defenganos , e naõ tardou muito a confirmação delles na repoíla daquella fera racional , que mandou lo- go por dous dos feus VaíTallos ; porque efcufando-fe , tanto da conferencia , como dos foccorros , com o pre- texto de huma enfermidade contagiofa , que padecia to- da a fua Província ; depois de encarecer com as mais affectadas exprefsões os eílragos delia , proteílava ain- da, que com as primeiras refpiraçoes defempenharia a fua palavra : mas Jeronymo de Albuquerque , que co- nhecia • " do Eflaâo do Maranhão 9 Liv.III. '97 nhecia já o total defprezo , que merecia , naõ querendo Annoi6i4. com tudo accrefcentar perigos à fua jornada , nas òe{- confianças deíle bárbaro , fe moílrou muito fatisfeito das novas promeíTas 5 e celebrando com grande pompa , aífím Ecclefiaftica nas folemnidades da Igreja , como Militar em vários exercícios da Infantaria , a feita de iNoíía Senhora do Rolado, na prefença dos mefmos menfageiros , os deípedio cheyos de agazalhos , levan- do nos aíTombros de todos aquelles apparatos as mais poderofas recommendações para o feu refpeito. 238 Entrou-fe logo em confulta fobre as operações daquella Armada em taõ eílreita íituaçaõ , e pareceo com uniformidade , que fe naõ devia já empenhar na arrifcada pratica das primeiras medidas , quando lhe fal- tavaõ os mais folidos fundamentos nos foccorros dos ín- dios , que nas vifmhanças do Maranhão tiravaõ fem du- vida todas as efperanças , por fe fupporem muito mais unidos à correfpondencia dos Francezes 5 mas como ao mefmo tempo também fe conhecia , que aífim a retira- da , como à confervaçaÕ daquelles portos fícavaÕ fendo naõ menos perigofas , mayormente para a reputação 5 para falvar efta , na favorável mediania de huns taes ex- tremos , votarão todos , que fe occupaíTe o fitio da Ti- toya ,. primeiro íinalado nas inílrucções de Gafpar de Soufa. 259 Para a execução deíle novo proje&o fe chama- rão logo os Pilotos , mas como nenhum delles tinha noticia alguma da entrada da Titoya , quando Sebaftiaõ Martins aíTegurava fó a do Periá , também apontado nas mefmas inílrucções , mandou Jeronymo de Albuquer- que formar aífento da repoíta de todos , para melhor juíliflcar o feu procedimento nas contingências da for- tuna } e efcolheo a jornada do Periá , como refoluçaõ muito mais generofa. 240 De 29 de Setembro até 1 2 de Outubro fe con= K fervou ■ ¥ mi por fuppolla ainda o mefmo Piloto nas melhores medi- das mais de dezafeis léguas 5 caminho, que naõ fe po- dendo vencer fenaÕ já com huma hora de noite , a eíTa mefma fe ventilou a fua entrada , que aíTegurava Sebaf- tiaõ Martins pelo conhecimento , que tinha delia , pro- telando também , que lhe faltava o de outro furgidou* ro , para efperar o dia , metido já em huma Coita taõ e£ parcelada 5 e que para haver de bordejar até que ama- nhecefíe , além de confiderar naõ menor perigo na volta da terra , a do mar fe lhe reprefentava muito mais medo- nha , por eftar eíle embravecido , quando todas as em- barcações hiaõ no fundo delle , naõ tendo fortaleza , ain- da de todo defcarregadas , para a oppoíiçaõ da fua fúria. 242 Deixou-fe fuggerir o Capitão mór da efficacia deites difcurfos , em muita parte mais encarecidos , do que verdadeiros ; e fem outra defculpa , que a lifonja do vento , que levava na popa , embocando o canal no def- cabeçante da maré com todo o pezo da agua , foraõ en- trando âoEJlado do Maranhão, Liv. III. 99 trando as mais embarcações guiadas dos faroes da fua Anno 1614. Capitania , com hum arrojamento taô deftemido , que parecia temerário j porque tocando algumas delias , nas reílingas de varias coroas , ou francos de área naõ fa- ziaõ mais demonftraçaõ , que a de guiarem para o mar ? por pouparem o fufto às que fe lhes feguiaõ ; até que vencidas três léguas de rio , favorecidas fempre da for- tuna , furgiraõ todas com a mefma às dez horas da noite. 243 Saltou logo em terra Jeronymo de Albuquer- que com o Sargento mor Diogo de Campos , e muita parte das fuás Tropas , para aííegurar militarmente , no dia feguinte, todo o mais refto do defembarque , quan- do houve/Te inimigos , que fe lhe oppozeífem 5 e fendo o Alferes Sebaftiaô Pereira Tinoco nefta acção o pri- meiro, foy o que deu o nome àquelle fido nas acclama- ções do Apoftolo Santiago , que levava na fua bandei- ra, como Patrão de Heípanha. 244 Amanheceo o dia 14 , e achando-fe o Capitão mor fem mais outro contrario , que o da folidaõ daquel- la Ilha , depois de dar as providencias , que lhe parece- rão neceífarias para o defembarque , e alojamento das fuás Tropas , determinou nella a fua fubfiílencia , na fiel obfervancia das inftrucções de Gafpar de Sotifa j mas para poder eftabelecella com fundamentos mais fe- guros , tomou poííe de todas eílas terras , como Pro- curador da Coroa de Portugal , a quem fó legitima- mente pretenciaÕ , authorizando o mefmo documen- to , com o final publico da noíTa redempçaõ , na Cruz de Jefu Chrifto , que mandou logo levantar com a de- vida folemnidade, que nas religiofas proteftações da verdadeira fé raras vezes deixa de diílinguirfe a Naçaõ Portugueza. 245 O Engenheiro mor Francifco de Frias bufcou lo- go fitio para a fundação de hum a Fortaleza ; mas achan- do alguns com fufficiente capacidade, pelo que tocava à N ii planta M •llsv ioo Annaes Hiftoricos Anão 1614. planta do terreno , os condemnava a falta de agua ; e ainda que efta fe remediava facilmente abrindo-fe poços, a que chamaõ Cacimbas , efcarmentados os Soldados de Noffa Senhora do Rofario, do muito que ellas lhe foraõ damnofas , fuppondo-as çaufa única das enfermi* dades, que padecerão , confternaraÕ de forte com ef- tas noticias todos os mais da Armada , que já havia pou- cos, que naõ aborreceíTem aquella Ilha como mortal veneno i que tanto pode huma aprehenfao , mayor- mente nos ânimos menos, generofos : procuravaô com tudo defmentir todas as calumnias ,. que lhes refultavaõ defta repugnância , com outras provas de grande honra , dizendo também a publicas vozes , que para as medidas do feu proje&o, fe devia efcolher outra Praça de Ar- mas muito mais vifinha aos inimigos ; porque naquella os que naõ morreíTem de fede, com mayor laílima, do que gloria , fó peleijariaô com as feras. 246 Era neftes difcurfos o primeiro voto o Alferes SebaftiaS Pereira \ e o peyor he , que fe agradava delle o Capitão mór , lifongeado já das efperanças , de que com os índios do Maranhão teriaõ mayor força as intel- ligencias das fuás praticas , por coníiderallos menos bár- baros , confumindo o tempo por eíle motivo na fufpen- faÕ das providencias , para fe dar principio à fortifica- ção , que já fe achava defenhada , íem que baftafíem as vivas inílancias do Sargento mór Diogo de Campos pa- ra reduzillo j até que finalmente lhe refpondeo a todas , por defengano ultimo ; Que naõ havia de quem fe guar- dajfem ; porque os Francezes do Maranhão , ou osfuppu- nha fabula dos Tapuyas , na relação de Martim Soares , ou erati t ao poucos , que fe nal) atrevi aà afahir dafua ef~ treita habitaçad j pois de outro modo fe nal) podia perfua- dir , a que humã NaçaÓ , que dava Uçúes a todo o Mundo , nas efcolas da guerra , fe efquecejje tanto das fuás doutri- nas no desamparo daqueíla barra , fendo numa porta fran- ca do Eflado do Maranhão , Liv. III. 10 r ca para a mefma Ilha , termos em que tomava a refolu- Armo 1614. çao de demandalla pejbalmente , ainda quefòfoje nos ca- ravelas , quando a navegação para os navios fe prefumif- fe mais perigo/a i por fer ejle o fim da fu a jornada, afim nos penf amentos da Corte de Madrid , como também nas difpofiçoes do Governador Ga/par de Souja. 247 Vio-fe furprendido do arrebatamento defta re- íbluçaõ o Sargento mor j mas fazendo ainda novos ef- forços para removeJIa , lhe diíTe : Que o prcjeão de hufcar a Ilha do Maranhão era temerário , deixando aquellefitio , que fendo entrada franca para ella , como ponderava \ podia nelle ajegurar a fua fuhfflencia , com os inter ejes mais importantes no credito das armas ; e que fe as noticias de Martim Soares , depois de bem exami- nadas , fe achafem mentir of as , naõfe perdia o tempo na fua indagação, por fe ficar aproveitando na fortificação 1 daquella barra, que pelos J eus mefmos fundamentos era fempre precifa ; quando também devia confiderarfe , que a grande nao , que havia feito o de f embarque no Prefidio das Tartarugas , efiaria furta no principal pojio dos Fran* cezes com outras muitas embarcações de mais , ou menos força , que fe/ariai formidáveis a todas as da Armada , na difputa de hum combate naval , deftituidas ellas dos meyos naturaes para a oppofiçao 1 : o que tudo fuppoflo , fò lhe parecia conveniente a confervaçat daquellefitio , avi- fando-fe logo de todos os fuccejfos da jornada , affim a Por- tugal, como ao Governador GaJ par de Souja , na confor- midade das fuás inflrucçoes ; porque ainda no cafo , de que fahifem verdadeiras as informações do poder inimigo , já nao podia embaraçar a uniaõ dos foccorros , ajegurada a entrada delles na defenfa da barra ; accrefcendo mais a circunfancia , de que confeguida com a vifinhança , e com- municaçao dos Taramambezes a fua amifade , feria ejia fummamente damnofa aos mefmos Francezes ; porque pro* fejando os taes Tapuyas hum infernal ódio a todos os To- pinambazes •I V Annaes Hifioricos ■ AÍMG1614. pinamhazes do Maranhaà > fe accrefcentava com amef- ma allianqa , ainda mais cjue o numero , a reputação 1 da- auellas Tropas na conjlernaçab' de tantos bárbaros. 248 Moftrou-fe Jeronymo de Albuquerque de al- guma forte convencido da efficacia deftes difcurfos 5 e entrando logo na pratica delles , armou hum batel de féis remeiros com igual numero de Soldados , que entre- gou a Belchior Rangel ) natural do Rio de Janeiro , (moço de grandes efperanças \ e com muita noticia dos idiomas da America) affiftido também do Alferes Efte- vaõ de Campos , de Pedro Teixeira , Francifco Tava- res , e Manoel da Sylva ; dos Pilotos Sebaftiaô Mar- tins , e João Machado, com ordem para reconhecer a chamada Ilha do Maranhão , tomar lingua nella , e exa- minar bem a fua barra. 249 No dia 1 5 fez o Capitão mor a fua expedição com grande aceitação do feu adjunto Diogo de Cam- pos , e na fua mefma companhia paíTou logo também á examinar, affim por mar , como por terra, os melho- res fitios para a commodidade do feu alojamento , mof- trando bem neftas prevenções , que já queria dar princi- pio à regular defenfa delle para aíTegurallo : porém ten- do gaftado mais três dias nos mefmos apparatos , fem fè pôr mãos à obra, clamava o Companheiro contra a fua dureza , ou contra as ignorâncias da fua difciplina , mas fem utilidade j até que aífuftado da dilação de Belchior Rangel , o procurou na fua Tenda para lhe dizer , que na manhã feguinte fe trataíTe fem falta da fortificação ; porque na tardança do batel difcorria já com melanco- lia , temendo-o preza dos Francezes ; e que ainda no cafo , de que fahiífem mentirofos os feus penfamentos , como efperava do favor divino , fempre a defenfa natu- ral era taõ prudente , como neceíTaria para a oppofiçaõ dos accidentes da fortuna nos fucceíTos da guerra ," co- mo já fe tinha fundamentalmente ponderado. Ficou — do Eflado do Maranhão , Liv. III. i o 5 25:0 Ficou taõ fatisfeito deita refoluçaõ o Sargento Annoi6i4. mór Diogo de Campos , que fez os mais honroíbs elo- gios dos acertos deJla ; mas receofo ainda de que fe in- teipozeíTem novas demoras na Tua execução, chamou logo ao Engenheiro mór Francifco de Frias, e na mef- ma noite fe meterão todos em hum efcaler, efcoltado de outros, na diligencia de defcobrir fitiomais na bo- ca da barra ; o que confeguindo com a commodidade de huma lagoa de agua doce , fe elegeo para a obra , com expreíTa ordem de fe principiar no feguinte dia j empenhando-fe nos feus progreífos todos os esforços da mais zelofa actividade. 251 Difcorriao ainda os dous Commandantes fo- bre o mefmo aíTumpto , quando fe divifou huma peque- na luz já na entrada da bahia ; e mandando-fe logo re- conhecer , fe achou , que era da embarcação de Bel- chior Rangel, que chegando à prefença de Jeronymo de Albuquerque , lhe deu formal conta do bom fuccef- fo da fua commiíTa5 , com a noticia , de que defcobrin- do todos os canaes até junto à Ilha do Maranhão , na5 encontrara Francez algum , nem embarcação fua j mas íolim, defronte da mefma Ilha, hum fitio, chamado Cruaxenduba, muito accommodado para o alojamento daquellas Tropas , e fubfiftencia ddhs , por fer regado de hum aprafivel rio, que fobre fazello deleitavel, o - fertilizava ao mefmo tempo para todo o género de la- vouras j e que o caminho era taõ coberto, por fef^ guir todo por entre muitas Ilhas , que facilitava a fua occupaçaõ já como fegura. 252 Todos os Soldados, que alli fe achava Õ , in- formados pelos Companheiros de Belchior Rangel , das mefmas noticias , que elle communicava ao Capitão mor , entrarão logo nas impaciências de verem tratar da Fortificação do Periá ; e articulando fobre efta ma- téria algumas palavras defcompoílas , que nao fó offen- diaõ vi 104 Annaes Hifloricos |,M. Anno 1614. diaÕ na fua defordem a difciplina militar , mas também o refpeito dos mefmos íuperiores ; outra vez rebuçavao tamanha infolencia na capa efpeciofa da commoçaõ paf- fada , dizendo a gritos , que procuravaõ fó a vifinhança dos inimigos , para poderem grangear nas perigofas fa- digas da guerra aquellas fortunas , que fe malogravaõ laftimofamente no feguro focego da infenfibilidade : co- mo fe a mais rendida obediência, na profiíTaõ da mefma milicia , naõ foíTe fempre o mais firme degrao para fe fubir à immortalidade da memoria ! Porém Jeronymo de Albuquerque , fem a menor demonftraçaõ para o caíligo defte defacato , fe recolheo ao feu quartel , já occupado todo nos alvoroços de novos proje&os. 255 Entendia com tudo Diogo de Campos, que com a manhã próxima , que era a de 19, fe daria prinj cipio à Fortaleza , como fe aíTentara ; mas o Capitão mór depois das noticias de Belchior Rangel , mais en^ durecido no aborrecimento defta pratica, do que os mefmos Soldados , interpondo difter*entes efcufas até o dia 21 , neíle mandou meter a bordo das embarcações toda a carga delias 5 e obedecidas pontualmente as fuás ordens , muito a pezar da repugnância do Companhei- ro , fefez àvéla nofeguinte, bufcando já no novo Ti- tio de Guaxenduba, parece que guiado de fuperior def* tino, o theatro mais elevado para as publicas repre- fentações da fua mayor gloria - 2 74 Depois da trabalhofa navegação de quatro dias eom o continuo fuílo de hirem tocando as embarca- ções quaíi todas as horas , até chegarem algumas vezes a ficar em feco encalhadas no lodo , entrarão todas no mar de Guaxenduba em 16 de Outubro ; e cheyos de viftofos pavezes , e galhardetes , taõ foberbamente fe oílentaraõ defronte da Ilha do Maranhão , que atemo- rizados os feus moradores de huma tal novidade , a com- municaraô à Fortaleza de S. Luiz , pelas ligeiras poílas de 1 • do E/lado do Maranhão • Liv. III. t o f de varias fumaças , bem correfpondidas por toda aquel- Armo 1614, la Cofta , difpoííçaõ fem duvida muito antecipada na providencia dos Francezes. 255 Occcupou logo a Armada com vento em po- pa a enfeada do mefmo íitio de Guaxenduba ; e defem- barcando o Commandante General todas as Tropas ? que hiaÕ a feu bordo fem a menor difputa dos inimigos , fe refoJveo a fortificallo como Praça de Armas para a a fua Conquiíla 5 mas fobre a planta da nova Fortaleza> que fe formava de féis baluartes , no rifco do Engenhei- ro mor Francifco de Frias , houve brevemente grandes contendas j porque Jeronymo de Albuquerque, fugge- rido logo das informações barbaras de alguns Tapuyas, já fe defgoftava daquelle Quartel , ideando outro , co- mo mais feguro ( nas ponderações vaílas da fua muita finceridade ) no rio de Mony , junto da boca do Itapi- curú , chamado também eíle o prodigiofo Maranhão > nas erradas noticias de varias tradições. 2$6 Deixou-fe com tudo convencer de razões mais forçofas, muito à fatisfaçaõ do feu Companheiro , e do Engenheiro mor 5 mas para melhor fegurar a felicida- de deíla obra , nos feus primeiros fundamentos , man* \em prizao efle Principal 5 porém tao fuave , e afíiftido nella taõ generofamente , que pa- ra moftrar , que naõ defconhecia a fua obrigação , deti informações individuaes das forças dos Francezes , e das medidas , que tinhaõ tomado para a mina daquellas Tropas , afTegurando , que todos os paíTos importan- tes , afíim de mar , como de terra , que podiaõ facilitar a fua retirada , fe achavaõ já bem guarnecidos 5 a que também accrefcentou , que os índios da primeira ca- noa , que haviaõ bufcado aquelíe alojamento com as boas praticas de amifade , e os cinco que levarão do mefmo para introduziílas com mayor efficacia íias Al- deãs da Ilha , depois de confeíTarem no rigor do tormen- to eftas formaes noticias , com todas as mais do poder Portuguez, eftavaõ ainda carregados de ferros na For- taleza deS. Luiz, com o jufto receyo , de que reftitui- dos à liberdade , fe malograria o feu projecto com os O ii avifos à '< iq8 Annaes Hiftoricos >'. Annoi6i4. avifos delle j e para confirmar a verdade deíles, ulti- mamente diíTe , que na manhã feguinte appareceriaõ duas lanchas de guerra , com o defignio de reconhecer o mefmo Quartel , que determinavaõ atacar dentro de poucos dias. 262 Naõ bailarão com tudo eftas taõ efpeciflcas declarações para o defengano dejeronymo de Albu- querque 5 porque era tal a fua cegueira , que efperava ainda que os Tapuyas da Ilha , bufcando a fama do feu nome , rompeíTem as medidas dos Francezes no total abandono do feu partido , até enchendo-fe da louca complacência, de que a vigilância na guarda dos portos era fó a que retardava a execução 5 mas como tinha muitos defpertadores para o feu cuidado , tratou logo , com todo , de fazer avifos a Parnambuco do perigofo eílado da fua fubfiftencia 5 e para melhor aíTegurallos , os difpoz também por duas vias nos caravelões dos Pi- lotos SebaftiaÕ Martins , ejoaô Machado, a ordem ambos do Capitão Martim Callado Betancour , que fe retirava muito enfermo com o Almoxarife Francifco Mendes Roma. 265 No dia 2 domez de Novembro , {inalado já do Principal prezo, fe principiarão a verificar as fuás noticias ; porque na manha delle appareceraÕ ao mar de Guaxenduba as duas lanchas dos Francezes 5 e co- mo eíles no fitio de Itapary , que ficava defronte , tinhaô também hum Forte da invocação deS.Jofeph, difpa- roulogo duas peças de artilharia , como final de guerra, a que refponderaõ os Portuguezes com igual numero , arvorando-fe ao mefmo tempo todas as bandeiras da Na- caÕ. 264 Na maré da tarde fe foy chegando para o Quartel , com as demonftrações de reconhecello huma das lanchas , guarnecida de vinte e cinco homens go- vernados pelo Senhor de Pratz , Fidalgo de tanta diftin- çao , rm do Eflado do Maranhão , Liv. III. 1 09 çaõ , que além da grande do feu merecimento pelas ac- Anno 1614. çÕes próprias , moílrava também a dos feus illuftres progenitores na honrofa infignia de Gentil-homem da Camera de EIRey Chriftianiífimo : mandou logo ata- callojeronymo de Albuquerque por Belchior Rangel no caravelao do Piloto SebaftiaÕ Martins , affiftido de vinte Soldados j mas como a lancha demandava muito menos fundo , quando eftava já perto de abordalla , fe lhe meteo no meyo de huns baixos -, e fendolhe precifo defviarfe delles , pelo certo perigo , que corria, fe reco- Iheo aGuaxenduba com efta jufta magoa. 265 Sem outra novidade fe fizeraõ à vela na manhã de 5 os dous caravelões já deílinados para os avifos de Parnambuco , comboyados de três armados em guer- ra ; e defpedindo-os pela barra fora livres de peri- go , fe recolherão no feguinte dia com a mefma fortu- na ; porque huma grande nao dos inimigos , que fe achava furta na enfeada de AraíTagí , diftante quatro lé- guas da fua Fortaleza , nao pode embaraçallos , por te- rem paífado mais de duas a barlavento delia. 266 Os Francezes defejavaõ com anciã alguma Iin- gua do alojamento dos Portuguezes , para fe informa- rem com individuação das fuás defenfas , e verdadeiras forças 5 mas nao podendo confeguilla pelas cautelas, com que fe guardava , fe valerão no dia 7 da cavilofa induftria de levantar huma bandeira branca fobre hum banco de área , que fica fora da agua no meyo do ca- nal do mefmo fitio de Guaxenduba ; de que avifado o Capitão mor , ordenou logo a Belchior Rangel , que em hum caravelaÒ , guarnecido de vinte Soldados, re- cebeíTe a paz , que lhe ofFereciaô naquelle final delia , obfervado religiofamente até entre os mais bárbaros gentios ; e como já fe perfuadia pelas erradas praticas da fua fingeleza , a que era diligencia dos Tapuyas da Ilha , nas empenhadas pretençôes de fua amifade , dif- poz i : M« ê lio Annaes Hiftoricos . ' i 1 Hl 1" ". % ! , Anno 1614. poz também , que para o feu tranfporte , daquelle lugar em que fe achava 6 até bordo do caravelaõ , foffe na fua companhia huma boa jangada. 267 Chegou Belchior Rangel aponta do banco, e defpedindo a dita embarcação , na forma da ordem que levava j como eftas taes demandaõ pouca agua , por ferem todas razas de fundo , fe foy metendo à ter- ra 5 porém os Soldados , que hiaÓ a feu bordo , naô querendo tomalla fem evidentes provas de fidelidade, já com o receyo de algum engano , lhes aproveitou taõ prudente cautela , no que claramente reconhecerão, vendo muitos Francezes diffimulados entre os índios ; mas como já eítavaõ em pouca diftancia , por mais que logo fe fízeraó ao mar , ainda fupportaraõ huma grande defcarga de mofquetaria 5 e fe o caravelaõ os naõ foc- correra com a fua lancha muito bem armada , flcariaõ defpojo de tao abominável procedimento nas doutrinas da guerra. 268 Com eíle fucceíTo fe recolherão todos a Gua- xenduba , fem outro movimento dos inimigos , que con- tinuarão na mefma inacção até o dia 10, em que appa- receo huma canoa grande no vifinho fitio da Mamuna 5 mas logo que faltarão na praya os índios delia , fe viraõ cortados de huma embofcada ; e ainda que dous dos mefmos Tapuyas , lançando-íe ao mar , o paíTarao a na- do pela diftancia de duas léguas , todos os mais fazen- do virtude da neceííidade , fe foraõ meter nas mãos dos Portuguezes , dando a entender na fua diligencia , que as procuravaÕ como amigas. 269 Foraõ conduzidos eftes prizíoneiros à prefen-' ça de Jeronymo de Albuquerque j porém como elle no fucceíTo paíTado havia ficado mais ofFendido da vil ac- ção daquelles Francezes ( indigna de contarfe entre os eílratagemas militares ) do que defenganado da fua ce- depois de os tratar com a mais intima confían- gueira , ca ~ do Eflado do Maranhão \ Liv. III. n t ca, osdefpedio na fua mefma embarcação cheyos de Anno 1614. fobornos j mas permittio a alta Providencia , que hum dos mefmos índios , que tinha fua mãy em Parnambu- co ( naõ querendo com as efperanças de fe reítituir de tamanha perda ; feguir os Companheiros ) confeíTaíTe , que aquelJa canoa hia reconhecer o alojamento por or- dem dos Francezes j porque na feguinte madrugada determinavaõ a interpreza dos noífos navios \ e que lo- grada eJJa com a felicidade , que já fe promettiaõ , pa£ íavaõ logo ao fitio da Fortaleza , aífim por mar , co- mo por terra. 270 Pelo Capucho Frey Manoel da Piedade , que era muito pratico nas linguas Tapuyas, teveeftas noti- cias o Sargento mór Diogo de Campos já perto da noi- te y e puxando logo por muita parte da Infantaria , avi- fou ajeronymo de Albuquerque, que com ella fe hia meter a bordo das embarcações , para defendellas com a vida até a ultima gota de fangue ; mas chegando à praya o mefmo Commandante , quando já eílava para fe embarcar o Sargento mór , lhe embaraçou a execu- ção , dizendolhe com prudente difcurfo , que naõ con- fervava os feus Soldados para facriflcallos na defenfa barbara de quatro taboas podres j e fó íím na daquella terra , de que já tinha tomado poífe em nome do feu Príncipe. 27 1 Replicou ainda Diogo de Campos , pergun- tando com vozes alteradas , qual feria a defcarga , que fe havia de dar ao mefmo Senhor de tamanha perda , além da que também ficava fentindo o credito das ar- mas y principalmente na opinião ruftica de todos os Ta- puyas ? Mas refpondeo-lhe o Capitão mór , que pelo que tocava à fua parte, lhe paíTaria por efcrito as attef- tações , que lhe procuraífe 5 e em quanto à reputação das Tropas Portuguezas , que tinha elle a fua também aíTentada nas acções da honra, que naõ neceííitava de novos ê fui 112 Annaes Hifloricos A' Anno 1614. novos teítemunhos para abonar aquella , por mais que foffe tal a ília defgraça , que naõ podefle dallos no ul- timo deftroço dos Francezes , como efperava da jufti- ça da caufa j e focegada já efta alteração , fe expedirão logo as ordens neceíTarias , para que todas as embarca- ções fe abicaíTem à terra , diípondo-fe delia a fua defen- fa no modo poffivel. 272 Era Commandante General da Colónia do Ma- ranhão , como já fica referido , Daniel de la Touche , Senhor de la Ravardiere , peflba de tanta diftinçaõ pe- lo efplendor da fua qualidade , como pela do nome , que feria fem duvida dos mais illuftres de toda a França , pelas acções da fua vida , principalmente nos fucceífos da guerra com o exercício de grandes empregos , fe na parte mais eíTencial da immortalidade lho naõ efcu- recera com merecida laílirna o deteílavel erro do Lute* ranifmo. 275 Tinha empenhado efte General toda a effica- cia das fuás diligencias para o cabal exame do alojamen- to de Guaxenduba j mas ainda que naõ tirou delias to- do aquelle fruto , que pretendia , como já fe fuppunha com fufficientes informações das fuás poucas forças ,' pela confiflàõ dos cinco Tapuyas , que poz a tormen- to : entrando no projeóto preliminar de furprender as embarcações , armou logo para a pratica delle hum grande numero das fuás , aííim de quilha , como razas , que eílavaõ já promptas na enfeada do Forte de S. Jo- feph , quando recebeo as ultimas noticias por aquelles índios , a que deu liberdade Jeronymo de Albuquer- que com huma confiança mais imprudente , do que ge- nerofa na mal merecida fatisfaçaÕ da fua amifade ; e para melhor aífegurar a felicidade defta expedição , lhe nomeou por Commandante o feu Lugar-Tenente Ge- neral Monfieur de Pizieu, affiílido do Senhor de Pratz , e do Cavalleiro de Racily , taõ conhecidos todos pelas acções âo EJlado do Maranhão , Liv. III. :n j acções próprias , como pela memoria dos Teus efclare- Atino 1614. eidos Aícendentes. 274 Para a madrugada do dia 1 1 difpoz Ravardie- re eíla interpreza ; porém como pelas noticias do ante- cedente já os Portuguezes fe achavaõ prevenidos para o mefmo golpe , logo que Pizieu fe foy avifinhandó ao noíTo Quartel , diíTimulado ainda com a capa das fom- bras , ( que naquella noite appareceraÕ mais eícuras ) para fe moftrar , que naõ baftavaõ ellas para o rebuço na vigilância de hum zeloíb cuidado , fe difparou na Fortaleza huma peça de artilharia , que fervio também de romper o nome. ^ 275 Vioentaõ efteCommandante, que naõ podia já aproveitaríe das primeiras idéas j e para diminuir o feu perigo , antes que elle crefceíTe , encaminhando a luz do dia às pontarias das noíTas balas , fem a menor op- pofiçaõ entrou a enfeada de baixo das fuás ; porque os Marinheiros , que fe achavaõ nas embarcações com a diligencia de encalhallas em terra , lançando-fe ao mar , tratarão fó de fe falvar a nado, como facilmente confeguiraõ. 276 Fez elle logo preza em duas das mayores, e huma das pequenas , que ficavaõ mais largas ; porque ainda que a artilharia da Fortaleza inceíTantemente la- borava , era com pouco fruto ; mas como outras três , ultimo^ refto da Armada , por fe levarem melhor à terra, eftavao defendidas de todo o fogo ; naõ querendo Mon- fieur de Pizieu apurar os exames da fua fortuna , fe fatif- fezdaquella, recolhendo-fe ao feu Quartel de S. Luiz cheyo de vangloria , fem advertir efte Commandante , que fó podia juftiííimamente merecella nos argumentos das forças inimigas , que lha cederão de barato. 277 Daqui por diante fe continuarão as hoftiíidades com muito calor de ambas as partes, affim por mar, como por terra j mas fendo grandes as ventagens , P com M w : ti4 II J. Annaes Hijlòricos ~ Anno 1614 com que fempre fahiaõ de todos os encontros as Tro- pas Portuguezas , fe chegou a ver em huma tal conf- ternaçao todo aquelle Corpo com a falta do natural íuf- tento ( por fe naõ atreverem já os noííbs índios a forne- cello da Campanha , com razão temerofos das embofca- das inimigas ) que reduzido tudo à ultima miferia , de- fejavaÔ muitos em huma acçaô geral o remédio de to- das, ou na felicidade da vitoria, ou nos eftragos delia, naõ menos honro fo monumento às immortaes recom* mendações da poíteridade. i í 1 .. i ANNAES «M ní ANN AES HISTÓRICOS DO ESTADO DO MARANHÃO. LIVRO IV SUMMARIO. NTENTA Jeronymo de ^Albuquerque novos caminhos para a introducçaÕ de alguns joccor* ros , que efperava de Parnambuco , efe lhe ma* lo gr ao as diligencias. De/cobre Diogo de Cam- pos huma conjuração dos Soldados , e a ftif oca prudente- mente. Entra o Senhor de la Ravardiere com grande po- der na enfada de Guaxenduba , e põem em terra muita parte das fuás Tropas a ordem dofeu Lugar-Tenente Ge- neral Monfieur de Pizieu. Fortifica-fi ejle dividido em dous Corpos ; e Jeronymo de ^Albuquerque atacando am- bos jica vitoriofo com a morte do me/mo Commandante. DemonJlraçÕes publicas dojentimento de Ravardiere pe- Pii lo ■F"* 'w: ã )! Iió Annaes Hifloricos ■■iii 4ti Annoi6í4- lojuccejo das fitas armas. Efcreve ejle ajeronymo de Albuquerque com arrogâncias militares , e e//e //te re/- rw«M V,i& ■ iiii n8 Annaes Hifioricos ■ li Atino 1614. zirdehuma tal defordem ; mas que para faharem afia honra de taú grande perigo com novos créditos para ella p - efperava ainda que a mejma pólvora , que intentava^ voar, a metejfem primeiro de baixo dos pés dos inimigos ,fe aca- Jo nos bufcajfem antes da união 1 dos próximos foce orr 'os 5 para cuja entrada fe dijpunhao já caminhos Jeguros , e que ã elle , por premio do ferviço de avifallo, lhe guardaria Jempre ojegredo ; efem que pafajfe a exprefsões de ma- yor inteireza , o deixou lutando comafuamefma confu- fad". Approvou Jeronymo de Albuquerque o maduro acordo de Diogo de Campos , e fe deraõ logo dhTimula- das providencias para a guarda da pólvora. 281 Ao mefmo tempo foy nomeado Belchior Ran- gel , com feíTenta Soldados , e trinta índios dos melho- res frecheiros , para reconhecer todas as entradas da Ilha das Guayabas , como primeira difpoíiçaõ para o proje- €to do Periá $ e já pondo-fe em marcha no dia 17 , co« mo eílava diípofto , recebeo a ordem , para que achan- do naquelle fitio algum corpo dos inimigos , ou volan- te , ou fortificado , o atacaífe no quarto da Alva , que do bom fucceífo feria final hum fó fogo na ponta mais vifinha , onde apreíTadamente Te repetiria também o mefmo , fe neceflitaífe de foccorros. 282 . Sahio do Campo eíle Official com excellentes guias ; mas tomando o caminho da praya , que naõ ti- nha mais que quatro léguas , nunca acertou com elle , fendo conhecido da mayor parte dos Soldados , e de todos os índios , que o frequentavam a toda a hora ; e depois do inceífante trabalho de vinte e quatro , atra- veíTando muitos riachos com agua , e lodo pelos pei- tos, fe recolheo ao mefmo Quartel no dia 18 , acciden- te que logo no feguinte mereceo bem fundadas ponde- rações de myfteriofo 5 pois he fem duvida , que fe Bel- chior Rangel faltaíTe no combate , além do perigo , que corria o feu deílacamento na feparaçaÕ do principal cor- po, 'I do Eflaâo do Maranhão , Liv. IV- 119 po , ficava também efte mu to debilitado para a oppo- Annoi6i4. fiçaõ de huns inimigos taõ poderofos. 285 O Sargento mor , que era nefta parte o mais empenhado, fe molhou também o mais fentido ; e co- mo lo fiava daquella diligencia a felicidade dos foccor- ros , fe oíFereceo para executalla por mar na mefma noi- te , affiítido do Engenheiro mor Franciíco de Frias ; mas armando logo dous bateis com a força de vinte Sol- dados , quando efperava com impaciência pela reponta da maré para fazerfe à vela , achou occupada a noíTa enfeada de muitas inimigas , amanhecendo nelía o Se- nhor de la Ravardiere com huma Efquadra de fete na- vios de alto bordo , e quarenta e féis canoas , guarne- cidas humas , e outras embarcações de mais de quatro- centos Soldados , em que entrava toda a Nobreza da Colónia , e quatro mil índios. 284 Da mefma Almiranta, como Capitão experi- mentado y obfervou bem eíle General , aííim a irregula- ridade do acampamento Portuguez , como a da Fortale- za de Santa Maria ; porque efquecido o Engenheiro mor FrancifcQ de Frias de todas as regras da fortifica- ção , levantou aquella- em huma eminência taõ vifmha de outra muito mais elevada , que naõ fó lhe fervia de padrafto , mas também de cabeça de trincheira para o ataque mais vigorofo , fem ao mefmo tempo tratar de demolillo , fendo-lhe poffivel , ou de ganhallo com al- guma obra exterior ; e Ravardiere aproveitando-fe def- tas ventagens , difpoz coberto delle hum prompto def- embarque de duzentos Soldados , e dous mil Tapuyas , todos frecheiros , à ordem do feu Lugar-Tenente Gene- ral Monfieur dePizieu. 285 Dividio efte Commandante o feu deftacamen- to em dous iguaes corpos ; e encarregando o da van- guarda ao Senhor de Pratz , fe adiantou elle de tal mo- do na diligencia de faltar em terra, que entendendo Pi- zieu ? 120 TMI.il! Annaes Hiftoricos 'VJ m Anno 1614. zieu, que lhe levava toda a gloria na felicidade da em- preza , para entrar nella com alguma parte , fe lançou ao mar já perto da praya com impaciência a mais vir- tuofa , por defculpar na fermofura da meíma acção aquella defordem da difciplina militar : feguiraõ os mais o feu exemplo, que também imitarão todos os Ta- puyas. 286 Ainda que Jeronymo de Albuquerque naõ po- dia impedir o deíembarque dos Francezes , pela natural defenfa do íítio , puxou logo por oitenta Soldados para obfervallo de mais perto ; porém melhor aconfelhado , deíiílio daempreza, quando marchando já com doze Arcabuzeiros o Sargento mor Diogo de Campos para foftello em qualquer accidente , por mais que vio , que elle fe retirava , o fubítituío com tudo no mefmo proje- cto. Oppuzeraõ-felhe alguns dos inimigos , que fe qui- zeraõ fmalar nas primeiras difpútas do valor ; mas ca- hindo dous deftes defpedaçados a feridas com hum tanv- bem dos Portuguezes , fe dividirão huns , e outros , por naõ empenharem todas as fuás Tropas na^força das inf- tancias : prudente acordo de Diogo de Campos , reco- nhecido já o poder dos contrários. 287 Cada hum dos índios inimigos, além das fuás armas ordinárias, levava hum feixe de fachina 5 e lan- çando-os todos no alto da montanha , íè principiou a fortificar no mefmo fitio a toda a diligencia Monf. de Ia Faus com bom corpo de Tropas , foftido também de outra defenfa exterior à ordem de Monf. de Canonvil- le , Soldado velho , e de grande nome. 288 Monf. de Pizieu levantou promptamente no fitio da praya féis trincheiras de pedra folta , cobertas das obras da montanha , naõ fó como eftrada de com- municaçaõ , mas também para melhor fegurar a da fua Armada ; e como a feu bordo fe confervava ainda o Commandante General com o refto das forças , que tinha do EJlado do Maranhão \ Liv. IV. 121 tinha conduzido para aquella empreza, efperavajá com Anno 1614. impaciência o ultimo avifo , para fe unir com todas as que eítavaõ em terra , aííiftido da artilharia neceíTaria , que mandava com fetecentos índios o Capitão Mat- theus Malhart, Official de muita diílinçaô pela do feu valor , e procedimento. 289 Vio-fe logo Jeronymo de Albuquerque por to- das as partes impoíTibilitado para efperar da fua conílan- cia a união dos íòccorros , que podiaõ deixallo com for- ças para a proporcionada oppoííçaõ dos inimigos; porque os dous quartéis de Pizieu o reduzirão a taó regular íitio, que até lhe tinhaõ tomado a agua; e aprendendo já nos paíTados erros da difciplina militar os mais acertados do- cumentos para a emenda delles, entendeo que fó a fegu- rava em huma acçaÕ geral j mas com tudo naÕ queren- do fiar fó das reflexões próprias humas confequencias taõ cheyas de perigos , propoz prudentemente a todos os feus Officiaes os fortes argumentos , que o períuadiaÕ a huma tal eleição ; e merecendo efta taó univerfal appro- vaçaõ , que chegou a tratarfe como feliz vaticínio , fe poftou promptamente fora da Fortaleza , encomendando a fua defenfa ao Capitão Manoel de Brito Freire, fem ou- tra guarnição que a de trinta Soldados , e todos enfermos. 290 Separou entaõ, com advertência militar, hum pequeno Corpo de referva , que encarregou ao Capitão de Infantaria Gregório Fragofo com a mayor parte dos índios alliados , que commandava o Capitão Madeira 5 e de todo o refto das fuás poucas Tropas formando também à imitação dos inimigos dous batalhões iguaes, que fe compunha cada hum delles de fetenta Soldados ? e quarenta Tapuyas , entregou hum ao Sargento rnór Diogo de Campos ; e pofto já na tefta do outro para dar huma publica fatisfaçaõ do feu procedimento 9 fal- lou com brevidade nefte mefmo fentido. 291 Bem fey Amigos , e Companheiros.., que e/ia m i- q ' nha 122 Annaes Hifioricos * Atino 1614. nha refoluçaÕ feria condemnada em todo o Mundo com a nota de temerária , fe a occqfiao em que nos puzerad os inimigos , e ajufiiça da noja caufa , a naã approvajem como precifa. Os Francezes nos tem tomado todos os portos do 720/0 alojamento, naõ nos deixando mais cami- nho para afubfijencia natural , de que todos os dias ne- cejfítamos f que o que abrirem a cada hora os nojos bra- ços a força dosfeus golpes, efperando fem duvida que con- fumidos nós da repetição dejie trabalho , que as mais das vezes fahirá também infrutuofo , ou debilitada a nature- za f vergonhofamente lhes rendamos as armas para f ai- var as vidas , ( que oferecerão já como regalado pafio as racionaes feras , de quefe acompanhai ) ou que todos asfa* crifiquemos a hum defefperado fojrimento , com mais in- juria , do que gloria : o que mofrao 1 bem no cuidado com que fe fortificai) , fendo ta"o monjlruofas as fuás ventagens no numero das Tropas ; ef obrando ejias ponderações , pa- ra que provocado o vojo valor pelos efiimulos da honra , os trate já com o de/prezo de vencidos , primeiro que ataca- dos -, fegura mais o nojo triunfo o infallivel direito , com que pretendemos a rejituiçao dos próprios domínios , o ocu- pados porejes Ejlrangeiros , como legitimo património , fem outro algum titulo , que o da violência das fuás ar- mas. O quefuppojo r valerofos Amigos , por mais que re- conheço a qualidade delias , além da fua grande dejgual- dade , ainda antes da batalha vos convido já para os ap- plaufos- da vitoria '• nao vos pareça demqfiada a minha con- fiança , porque a ponho toda nos vojos efpiritos , fortale- cidos do Senhor dos Exércitos ', por inter cejaà da noja Proteâlora Maria Santiflima. 292 Com eftas breves exprefsões do Teu taõ gene- rofo , como catholieo fentimento 7 que merecerão bem as mais honrofas acclamações de todos os ouvintes , ja como prefagios do fucceííò , ordenou ao Sargento mor Diogo de Campos ? que atacaíTe com o feu Batalhão os : Fran- âo E/lado âo Maranhão ) Liv. IV. 123 Francezes da praya , que elle bufcava os que fe fortiíi- Anno 1614; cavaõ na montanha , por fer acçaõ mais perigofa , don- de também lhe faria final para entrar na mefma , de que o encarregava. 295 Moveraõ-fe ambos ao mefmo tempo , levando Jeronymo de Albuquerque na fua vanguarda avançado delia o Capitão de Infantaria , que também o, era dos Aventureiros , Manoel de Soufa de Eça , com o Enge- nheiro mor Francifco de Frias , e o Sargento mor Dio- go de Campos no mefmo lugar, o Capitão António de Albuquerque. 294 Marchava Diogo de Campos fobre os inimi- gos coberto dos matos , como quem fabia aproveitarfe bem das ventagens do fitio -, porém alguns Soldados , que nas vifmhanças do perigo lhes hia parecendo mais horrorofo , fe moviaõ já com paflbs ta5 pezados , que < mais moftravaÕ que os retrocediam 5 o que percebendo efte Commandante , com huma piftola na maÕ , fe vol- tou a todos , dizendo com tanto defafogo , como feve- ridade : Qtiefe ncíò podia perfuadir , a que huns homens tao valerofos duvidajfem de entrar na peleja , quando ertíó os mefmos , que havia poucos dias fe tinhao amotinado no Veria por aquella mefma occqfitíè ; mas que tivejfêm en- tendido , que fe neíla houvejfe algum , que fe efqueceje da jua honra, procurando vergonhofamente a falvaçati da vida , primeiro do que ejia , acharia na boca daquel- la pijlola a fua fatal perda : que Jizejfem todos o que lhe viffem fazer a elle : advertindo também , que o ar- rojamento dos Francezes nunca pajfava da primeira fú- ria , queveriaÔ logo rebatida. E fufpendendo efte dif- curfo fem a menor alteração , ordenou pelo feu Aju- dante ao Commandante da Referva Gregório Frago- fo , que fe puzeíTe na retaguarda de todos os índios , para que ao mefmo tempo, que elle atacaíTe os ini- migos pela tefta das fuás trincheiras, os ac.omettçflkp.er- ÇMi lo 1 Wtii 124 Annaes Hiftoricos m ■. j. ■■Cl Anno 1614. lo flanco da praya , para confundillos na diverfaó. 295 A efta hora , recobrados já do primeiro fuílo , pelas influencias do generoíb efpirito do feu Comman- dante , ainda aquelles que fe moítravaõ mais timidos , bufcavaõ todos os mefmos perigos , como feguros da vi- toria ; mas efperando com impaciência o final do com- bate para lhe dar principio , lhes fufpendeo os alvoroços hum Trombeta de Ravardiere , que faltou na praya to- cando a chamada 5 o qual conduzido à prefença do Sar- gento mor , lhe entregou huma Carta para Jeronymo , de Albuquerque , que abrio fem dilação ; porque como tinha cabal conhecimento da lingua Franceza, que naõ entendia o Capitão mor , lhe pareceo , que naõ devia retardar as informações delia , quando a vifinhança dos inimigos o naõ deixava feparar do feu Corpo 7 e no pró- prio eftylo da fua primeira traducçaõ , em que fó a acho, dizia nefta forma. 296 Senhor de ^Albuquerque. O voffo atrevimento he incomparável 9 vindo cometter na minha peffoa ao ma" yor Monarca da Chriftandade com o [eu Povo , e Reino y do qual eu tomey yojfe com os meus Companheiros ha perto de três annos , tendo commifsoes , e letras patentes de EU Rey meu *Amo para ejie efeito , e vinte Capuchinhos , guarnecidos de muy boas mijsoes do Rapa 5 por tanto eu vos pergunto : Oh Albuquerque , onde ejlá ajuftiça da vof fa caufa ? Efe De os vos pôde ajudar , vindo fem algum di- rei to a perturbar os nqjfos limites , e a tranjlornar por al- gum tempo os bons efeitos , que aqui fe colhem em todas as coufas ? Eu nao 1 deixo de rogar a Deos , que vos man- de o cajligo y que mereceis , turbando-vos em tal forte o ef- pirito , que naõ aceiteis a graça , que como Chrijiao y e co- mo Nobre vos quero fazer , por duas razoes principaes j a primeira pela coroje de Itaver ou fado vir dentro dos limi« tes Francezes % acomettendo hum grande numero de bra- vos Fidalgos, onde eufou o menor , e incapaz dahon-. ra* do EJlaâo do Maranhão , Liv. IV. 125 ra , que tenho de os mandar: a outra razaÕ mais for- Anno 1614. te he a prevenção > que faço a perda do fungue ChriJlaÕ , que naõ pojb ejiorvar , jenai guardardes as condições fe- guintes , afim como dejejao todos os meus Francezes \ por- que tenho hum numero infinito de Salvagens , que naõ de- jejao mais que abocanharvos , e as voffas gentes , e execu- tar em vós , e nos vojfos todas as fortes de carneçarias , gozando delias , e de outras mortes ; e com tudo eu por defviar ejles inevitáveis males , porque os naõ defejo , ve- de fe vos quereis render por meu prizioneiro de guerra , com todos os voffos Soldados , e Salvagens 5 porque fazen- do-o y vos prometto fobre minha honra, e aelles todos de vos fazer todas as cortezias emvqjfas pejfoas., que puder- des defejar de hum verdadeiro ChriJlaÕ , e Fidalgo Fran- cez j e naõ querendo aceitar ejie favor 7 dando-me a pena de pôr os pés em terra > e plantar a bateria das minhas pe- ças, naõ tendes que efperar de mim nada , mais que o' que as leys da noja arte permittem 5 afim que , pois naÕfois ignorante , e tendes as qualidades , que eu hey vijlo em vof- fos pafjaportes , naõ confieis nosfoccorros , antes Jeguray a vojfa vida , e dos voffos , que ejlá hoje pojla no vento , e mais quando vós vedes o ejiado em que ejloupara lhe rom- per a cabeça , antes que vejaõ o voffo Fortes) e antes que cheguem a mim , tem que fazer com huma nao de qua< trocentas tonelladas , que tenho a entrada da barra com hum pataxo; afim que , eu vos concedo o termo de qua- tro horas para receber a ley de vofo benfeitor , e fer~ vidor , je fizeres para voffo bem , o que vos digo a cima, ~ Kavardiere. 32 Se defej ais de me\ "mandares hum dos vojfos Cavalleiros , pode vir feguramente 5 1 porque vos dou minha fè , e palavra de o tornar a mandar em f aliando com elle ; e porque vos naõ ignoreis ,e osvof fos o ejiado em que ejlou , e vós vos achais , ahi vos mando parte das Cartas, que eltes efcreviaÕ. Badano Campo Francez , diante do Forte de Santa Maria dos Por* I2Ó . Annaes Hiftoricos % i \ Anuo 1614. Portugueses, no Maranhão a 19 de Novembro de 1614, 297 Em breviffimos termos avifou promptamente Diogo de Campos a Jeronymo de Albuquerque defta novidade ; e conhecendo bem , como taÕ bom Solda- do , que era máxima de Ravardiere , para adiantar na fufpenfaõ das armas todas as fuás obras , lhe aconfelhou também que fe naô queria, que efte General a ficafle logrando , com o fatal eftrago das mais juftas medidas , entraíTem logo na batalha , que elle fó efperava o pri- meiro final para atacar os inimigos nas fuás trincheiras 5 mas o Capitão mor, que fe achava nomefmo penfa- mento , quando neceffitava de menos incentivos a va- lentia do feu animo , deu a melhor repofta na diligencia da fua marcha. 298 Obfervou bem Monf. de Pizieu eíla refolu- çaõ , e ainda que a tratou com o defprezo de temerária, nas ventagens das fuás Tropas, aífím pelo numero , co- mo pelas defenfas de que eftavaô cobertas , lhes deu lo- go todas as ordens convenientes , para fe reduzirem às ajuftadas regras da boa difciplina 5 mas quando já meti- das na forma de batalha , as provocava menos para as arrifcadas contingências delia , do que para o caftigo do noíTo arroj amento , que chamava atrevido , fe achou obrigado a encarregar aos braços o officio da língua j porque o -Sargento mor Diogo de Campos , recebido o final do combate , o atacou taõ vigorofamente , que forçada já a primeira trincheira , defmayavaõ os ânimos dos feus Soldados na valentia dos golpes Portuguezes ; quando foy foccorrido do fegundo Corpo da monta- nha , entendendo efte contendia elle com todo o po- der das armas inimigas , e que metido entre os dous fo- gos , o deixariaõ vencido. 299 Entrou entaÔ pelo flanco da praya o valerofo Capitão Madeira , Commandante do principal Corpo dós índios alliados , foftido da referva 5 e Jeronymo de Albu- '■-'. - do Efiado do Maranhão, Liv.IV. 127 Albuquerque , que tinha feito hum largo gyro por den- Anno 1614= fos arvoredos , para encobrir a ília marcha , vendo tam- bém delia o furor da contenda , fe introduzio a toda a diligencia no feu mayor perigo j accidentes que naô fen- do efperados dos Francezes , os coníternaraÕ de tal for- te , que já empenhavaõ os últimos esforços , mais pe- los intereíTes da confervaçaõ própria , que pela honra do triunfo. 3 00 Era com tudo taõ valerofa a fua oppoílçaõ ? como a conftancia , que lha difputava j e multiplican- do -fe os eftragos na mefma força dos argumentos , me- tia já horror aos inimigos a multidão dos feus cadáve- res j porém nada bailando para vencer a fua fortaleza , fe contendia fobre a primazia das acções , com tanta igualdade na grandeza delias, que duvidava da fenten- ça a inclinação da mefma fortuna namorada de todas j até que defmentindo neíla occaílaõ o nome de cega , quando mais fe esforçavaõ ambos os partidos para o merecimento da juftiça , com a morte de Monf. de Pi- zieu a declarou pelos Portuguezes $ porque o grande corpo dos Tapuyas , que ainda fe mantinha nas ultimas trincheiras , como fó fe animava do generofo efpirito deite Fidalgo , defamparado delle , as abandonou ver- gonhofamente , e todas as mais Tropas feguiraõ logo a neceflidade do exemplo 5 mas a tempo já , que tinha fei- to illuftre a de/graça de todos o valor da nobreza. 301 O Senhor de Ia Ravardiere , que obfervava do mar o feu fatal deílroço , intentou impedir o precipi- tado curfo delle , com a diverfaõ de hum defembarque pela parte da Fortaleza ; mas além da dificuldade de achar a maré muito vaíla , lhe fez taõ vivo fogo o Ca« pitaõ Manoel de Brito Freire com a fua pouca artilha- ria , que tirou fó aquelle General deílas ultimas experi- ências da fua fortuna as mais feguras acclamações para a vitoria das armas Portuguézas. : Com 128 | Annaes Hifioricos AM101614* - 302 Com tudo, ainda as relíquias dos vencidos fe retirarão às fuás defenfas da montanha , que fuftenta- vao Monf. de la Faus , e Monf. de Canonville com poucos Soldados , entre hum grande numero de índios 5 masjeronymo de Albuquerque prudentemente receo- {o , de que unidas a eílas mefmas forças as que confer- vava Ravardiere a bordo da Armada , chegaíTem a pôr em contingência a fegunda gloria deíle dia 5 incorpo- rando-fe com o Sargento mor , os atacou nas mefmas trincheiras com valor deílemido. 305 O Capitão António de Albuquerque, Luiz de Guevara , fobrinho de Diogo de Campos , e António Grizante , moço bem conhecido pela nobreza do feu nafcimento , fe diftinguiraõ tanto neíla acçaõ , que os dous últimos eternizarão a fua memoria nos eftragos das vidas, depois de aíTaz vingadas 5 e abraçado o pri- meiro das eftacas, qué já hia rompendo , foy ferido de duas balas, que o paCaraõ do peito a efpaldas 5 até que confumido o refto do dia em femelhantes golpes do fu- ror da difputa , fe refervou para o feguinte a decifaõ delia fobre as mefmas armas , por fe nao fazer mais fan- guinolenta na confufaõ das fombras ; mas defmayado o animo de feifcentos Tápuyas , que era o principal Cor- po dos inimigos , ( fem que lhes baftaíTem para recobrai- lo as generofas influencias dos feus Commandantes , que fazia muito mais a&ivas o nobre íangue de Monf. de la Faus derramado de hum braço ) abandonarão am- bas as defenfas naquella mefma noite com vergonhofa fuga j e feguida também de todos os Francezes , como forçados do deftino , ficarão devendo aífim huns , co- mo outros afalvaçaõ, e as fuás liberdades ao deícuido da snoífas fentinelías , que naõ he muito foíTe o feu fo- no taõ pezado , quando defcançava no favor da fortu- na. 3 04 Aos dous Commandantes Generaes fe deveo fem do EJlaâo do Maranhão , Liv.IV. 129 fem duvida a mayor parte da vitoria ; mas também fe A1M101614. íínalarao nella o Engenheiro mor Francifco de Frias de Mefquita , o Capita5 mor do mar Salvador de Mello e Albuquerque , o Sargento mor Balthafar Alvares Pef- tana , o Capitão Gregório Fragofo de Albuquerque \ que governava o Corpo da referva $ o Capitão Manoel de Soufa de Eça , que levava a vanguarda do que mar- chou pela montanha -, o Capitão Sebaftiaõ Pereira Ti- noco , que foy dos primeiros nos mayores perigos j- p Alferes Pedro Teixeira , natural da Villa de Cantanhe- de ; Mathias de Albuquerque , filho fegundo do Capi- tão mor ; o Sargento Mattheus Rodovalho, que foc- correndo o mefmo Commandante perigoíàmente com- batido de três Francezes valerofos , pagarão todos o empenho , em que os puzeraõ as obrigações da fua hon- ra com o preciofo cabedal das vidas ; o Sargento Pedro de Couto Cardofo , Francifco de Medina, João de Sa- linas , natural da Marciana , na Andaluzia , Reino da Monarquia Caftelhana ; e outros muitos, a quem a ava- reza do tempo enterrou os nomes para ufurparlhes a im- mortalidade da memoria , que também grangearãõ em todas as funções do feu miniílerio os dous Religiofos de Santo António Frey Cofme de S. Damião , e Frey Ma- noel da Piedade com novos créditos das fuás virtudes no conftante defprezo dos mayores perigos. >1 305 Durou a força do combate defde as dez horas da manha , até perto das quatro da tarde , fem que os Francezes foífem foccorridos da fua Armada em todo eíle tempo : ao principio por defprezar Ravardiere a oppoííçaõ das noífas Tropas , à vifta das ventagens das fuás , que fe achavaõ em terra : depois , porque já naõ podia tomalla , nem nas fuás lanchas , por fer eíla toda pantanofa junto da praya , e eftar a maré muito valia para faltar nella , nem nas canoas ( onde naÕ tendo qui- lha lhe feria muy fácil ) por ficarem emfeco, ou foíTe R por Ip Annaes Hiftmcos - 1 i-i,i Anuo 1614. por defcuido da fua foberba confiança , ou por difpofi- çaõ da alta Providencia '.; e ultimamente obfervando do mar a fua dnígraça , por naõ fazella muito mais crefci* da l entrando também com igual parte nos eftragos del- ia y mas como pareceo por tantas circunílancias mila- groá a felicidade do íucceíTo , o quiz attribuir a pieda- de Çatholica ao foberano auxilio de Maria Santiffima , implorado pelo ardente zelo de Jeronymo de Albuquer- que no {eu primeiro movimento $ à qual Senhora , já cpm.o nòVo^titulo da Vidoria , rendeo por cila as devi- das graças. . 30Ó Dos Francezes fe acharão fobre o campo de batalha, cento e quinze, em que entravaõ trinta de co- nhecida qualidade , e nove prizioneiros , alguns dos quaes fe íinalaVaô pela mefma ; porém fazia mais illuf- tré v -a defgraça de todos a companhia do feu Comman- dahts Monf. de Pizieu , que fe contava nos primeiros , Fidalgo Catholico Romano , e de taõ alta jerarquia , <|ue era >primo irmaô de Margarita de Montmorancí , Princçza de Conde. 1 307 Da parte vencedora honrarão também amefc ma-fepulífura ( além de Luiz de Guevára , e António Gfizante , eíle natural da Cidade de Braga , e o primei- ro de Tatigere ) Francifco de Beça , do Reino de Caf- tella j Joaô da Mata , do Eítado do Brafil ; Pedro Alva- res ,. da. Filia .de Viana 5 Amaro de Couto , da Corte de Lisboa ; Manoel de Loureiro , da Villa de Abrantes 5 Mattheus Gonçalves , do Lugar do Mondego ; Bartho- lomeu Ramires, de huma das Ilhas dos Açores 5 e Do- mingos Corrêa ( Me ftre de hum dos caraveloes) da Gra- ciofa, : ■ J : 508 Ficarão feridos, naô fallando já no Capitão António de Albuquerque ( que fe finalou bem nas ac- ções deite dia ) o feu Alferes Chriílovaõ Vaz ; outro que fe chamava Eflevaõ de Campos , Belchior Rangel, ■joq oSar- do E/lado do Maranhão , Liv. IV. 1 51 o Sargento Mattheus Rodovalho, Pedro Baftardo , Armo 1614. Domingos Martins , AíTenço Fernandes , Joaõ de Oli- veira , Francifco Paes , Bartholomeu Carrafco , Ma- noel Lopes , Gonçalo de Soufa , Braz Mendes , Jorge daCofta, Roque deMefquita, Joaõ de Mandiola, e Francifco de Velafco , ambos Caftelhanos 5 merecen- do todos pela diílinçao do feu procedimento as invejas do Mundo nas recommendaçoes da pofteridade. 3 09 Dos índios inimigos efeaparaõ ío dos valero- fos golpes Portuguezes os que fugirão delles 5 e ainda muitos deftes, falvando-fe também dos rigores do fogo, experimentarão nas lifonjas da agua femelhante perigo , perecendo afogados ; infelicidade , em que lhes fízeraõ companhia alguns dosFrancezes com epitáfio mais in- juriofo. , 310 O defpojo foy de grande importância ; mas quando também comprehendia o das quarenta e féis ca- noas da conferva da Armada ? como fe achavaõ todas defamparadas , as reduzio a cinzas a defordem dos In* dios ; e as mais embarcações recolhendo a feu bordo os poucos fugitivos , quepuderaõ bufcallas , fe conferva- raõ no mefmo fitio, onde foy tal a confternaçao, e def- alento , que neceffitou Ravardiere de toda a conftan- cia do feu animo , para refufeitar huma pequena par- te dos que fe achavaõ já amortecidos. 311 Os Portuguezes defeançaraõ o reílo da noite , fem mais fadigas , que as do feu cuidado ; porque ainda que os prizioneiros deraõ noticias individuaes das forças da Armada , com as que efperava por inílantes no foc- corro de feifeentos , ou fetecentos índios Topinamba- zes da terra firme do Cumá , que na uniaõ dos fugitivos podiao attenderfe como formidáveis ; como ao mefmo tempo certificava hum Principal da Ilha , que pafiou ao Campo depois da batalha , que os inimigos fe achavaõ todos reduzidos à coníternaçaõ ultima com o fatal ef- R ii trago « ê 132 Annaes Hifloricos % Amo 1614. trago daquelle dia , tratou fó Jeronymo de Albuquer- que de fegurar nas fuás providencias a felicidade dos fucceífos futuros. 312 Amanheceo o dia 20 do mez de Novembro > taÕ alegre para os vencedores , como melancólico para 1 os vencidos 5 e fizeraõ eíles a fua dor taõ publica , no abatimento das infígnias, que até a Real da mefma Al- miranta fe via também como todas as outras defarvora- da 5 mas como o mar fe achava ainda occupado dos mefmos inimigos , fó as repetidas congratulações de hu- ma tal vitoria , podiaõ fervir de defafogo na oppreífaõ dos ânimos. 3 1 3 PàíTadas poucas horas fe verificarão as infor- mações dos prizioneiros ; porque -appareceo o foccorro dos índios do Cumá em dezafeis canoas grandes , que encaminhavaõ as fuás proas à terra do rio Mony , para fazer o feu defembarque ; mas Jeronymo de Albuquer- que , que fe achava já bem prevenido para a oppofiçaõ, lho mandou logo difputar por cem Arcabuzeiros a or- dem do Capitão Manoel de Soufa de Eça , que mar- chando fempre pela praya à viíla da Armada , occupoií o íltio , que demandavaÕ as taes embarcações ; o que advertido delias , voltarão promptamente na outra ban- da do mefmo rio. 3 1 4 Com efte movimento tomarão terra muitos da- quelles bárbaros -, mas encontrando logo a alguns dos vencidos , que os informarão da fua deígraça , afugen- tados delia , antes que a vafante da maré facilitaífe a paífagem do rio , como já efperavaõ com impaciência os vitoriofos , fe fizeraõ todos na volta do mar com tal confternaçaõ , que defviando-fe da Armada, ( fem que baftaífem para reduzillos a feu bordo, nem huma peça, que lhe difparou a Almiranta , nem o efcaler , que dei- tou fóra ) fe recolherão às fuás Aldeãs , e ao mefmo tempo o deftacamento Portuguez ao feu Quartel de Gua- do E/lado do Maranhão , Liv. IV. 1 5 J Guaxenduba , onde fe occupou com as mais Tropas to- Anno 1614. do o refto do dia nos religiofos exercícios da fepultura dos cadáveres. ■ 315 O Senhor dela Ravardiere tinha fido fempre taõ favorecido da fortuna nos empenhos da guerra, que por mais que apurou todos os feus esforços na prefente defgraça , para accommodarfe ao foffrimento delia , naõ fahio.com tudo até o dia 2 1 do recolhimenro da fua camera , onde para a natural confolaçaõ nem admittia companhia ; porém difíimulando. fó como juílo nojo ? pela fenfivel perda dos feus amigos , e parentes , o que igualmente era mortal impaciência da fua vaidade ; da ." qual dando ainda mais evidentes provas , efcrevéo a Je^ ronymo de Albuquerque nefte mefmo dia a Carta , que fe fegue , que traslado também na fua primeira traduc-? çaõ , como farey a todas. v , 316 Senhor de Albuquerque. Eu vos mando e/lapa^ rafaber a verdade da guerra , que fazeis , e quereis fazer aos meus Francezes -, porque até aqui naó quiz praticar» vos nada daquillo , que toca a nojja arte , por ver que que- brais todas as leys objervadas em todas as guerras , af~ Jim Chri/iãs , como Turquefcas , ou feja em crueldade , cufeja em liberdade das fegur idades , que os homens to- mao huns com os outros para os feus parlamentos ; e retendo os Trombetas , que vos mandaÕ 7 pejjbas livres pelo meyo de todos os inimigos , fazeis que em vos vejamos pratica- das leys novas em nojos ofícios : pelo que vós nxtò tereis honra já mais com pejfoas de merecimento , nem fareis mais que abocanhar a carne chrijiti ; mas ajufiiça divina vos cafiigará , como o mereceis , e me dará graça para que vos , e os voffos proveis a cortezia Franceza , cahin- do nas minhas mãos , a qual eu vos prometto t auefaberey executar fobr evos , e em vingança das vojas crueldades. Os vojos Salvagens , que cá tenho: no Forte de S. Luiz > faõdoze, a quem faço melhor tratamento ., quepojfo: por tanto / 1 5 4 Annaes Hijíoricos Armo 1614. tanto nao vos enjoberbeçais por haveres efpantado hun$ poucos deSalvagens , -as quaes Vos deixarão nas mãos al- guns oitenta homens dos meus Francezes , governados pe- lo meu Tenente General ' > mancebo ', e bravo Capitai ex- perimentado na guerra r fejâ mais a houve , quefoy mor- to na primeira occ a fiaÒ y em que aqiiije achou,. Também havia outro bravo , e experimentado na guerra , chamado Monf. de Pratz , o qual me veyo achar depois da defenfa, que fez fazer aos Francezes , e Sahagens , para que nao tiraffem . em modo algum f em quanto durava .0 parlamen- to 5 e eHa foy a caufa , porque vos a taò barato preço o dejlruifies , contra toda a ley da guerra , violando tudo o que nellafe pratica. O Senhor de Fratzjufpendeo a fúria dos Francezes j porém vendo a vojfa dejordem , e o atre- vimento ,: e valor dosfeus , os acompanhou pelejando , ate quefe viofenhor do campo , e depois fefah >ou, e ejlà com faude , aonde me ajftjlirá bravamente a tomar razoa dos vojfos cruéis efeitos : porque vós fomente tivejles a honra dejicar com a Fraca , a qual eu ejpero render bem cedo j porque ainda me Hcoii ajfaz gente de bem para executar o meu defejo , (em ter necefidade daquelles , que mandey ao Pará , os quaes efpero cada dia , e outros muitos de Fran- ça ; e ajfim efperarey a vojfa repqjlajobre o que a cima di* go , a qual me podeis mandar fobre a minha fé y e pala- vra , que nunca já mais quebrey , nem o farey em nenhum tempo ; porque tenho vinte e cinco annos de Governador de gentes : pelo que fe vos mojirais Chrijlaò 1 , fazey boa guerra aos meus , e mandaime o meu Trombeta , fenaò quereis , que a vojfa vijlafaça enforcar em vinte e quatro horas todos os vojfos , ajfim Portuguezes , como Sahagens. Ejle vojfo mortal inimigo, p Ravardiere. ~ Diante do Forte de Santa Maria aos 2 1 de Novembro de 1614. 3 17 Recebeo eíla Carta o Capitão mor Jeronymo cie Albuquerque 5 e tratando as vivas exprefsões de al- guns dos feus termos , como licenças militares , muito pro- H < do EJlado do Maranhão J Liv. IV. i 5 J próprias cia arrogância Franceza nas mais pezadas af- Anno 16.14- nicçoes do animo, cuidou fò dos pontos mais eííen- ciaes na fubftanciã. delia , refpondendo a todos noíè- guinte fentido. 3 1 8 Senhor Ravardiere. E/Rey Catholico de Hef panhanoffo Senhor me mandou a ejle rio Maranhão com c Capitão , e Sargento mor de todo ejíe EJlado do Brqfil , Diogo de Campos, meu Collega , e muitos homens Mv* bres , Fidalgos , e Cavalleiros de diverfas gerações de Portugal, de que realmente eu tenho muita honra , e tau* to me 'fio da fita companhia , que tenho dousfi lhos comigo vejla empreza , na qual nunca me perfuadi , que tinha parte o Chrijlianifimo Rey de França , nem os Franca zes nobres , quefe nomeao \ pois lie de crer , que fendo o a meu Rey Emperador defe novo Mundo ha mais de cento e doze dnnos , que.nao dará parte delle a outro Príncipe \ efe lha der, que lha nat tornará atirar: pelo que f obre o titulo^ da nojfa vinda nao ha que difputar 5 que fe os Reys a hao de averiguar, mal faz quem faz a guerra , efem as armas ef enfadas fati as palavras. Ror averiguar du- vidas , efaber quem cjlava neja Ilha , mandéy os dias pujados os meus Indios.com a paz k me/ma Ilha , e toma- raõ-nos os Francezes delia $ vier ao outros abufearme com engano , dijjimuley , e mandey-os livres : depois vieraõ os Francezes de Itaperi a ejia coroa de área , que me jaz de- fronte , e puzeraõ bandeira branca , a que logo acodi com hum barco , em que hia hum f lho meu, e hum Capitadda Cafa Rangel , para ver fita falia i, e tanto que entende- rão poder damnar os meus , lhes atirarão 1 cruelmente mui* tos golpes de arcabuz , e mofquete. Eijaqui , Senhor Ra- vardiere , quem por três vezes rompeo , e violou aley das gentes , e o primor da guerra , e quem fe faz incapaz dà fidelidade. Rafadas, ejlas coufas vierao os Francezes a tomar dous pobres caf cos de navios deformados a meus po- bres marinheiros , : os quaescjlavub'. a boa fé no mar de El* ■■ Rey ê w Annaes Hijloricos :.*4:iiii Anno 1614, R^y nojo Senhor , j em fazer em mal apejoa alguma , e foy a interpreza a noras , e termos pouco valentes : em fimjicamos lafiimados de tanta oujadia , e má vfinhan- ça. Pajado ifio , Senhor Ravardiere , vieraío huns Fran- cézes em numero grande com todas as forças do Ejlado dos índios dejlas Comarcas , enganados para nos come* rem , e tirarem ávida a fome, e fede , e ao cutelo 5 e andando-nos apercebendo para anoja defenfa , manda- raÔ hum Trombeta , naàfeyde quem , o qyal queria , que dentro de quatro horas nos rendejemos j e em quanto fal- tava com o meu Companheiro Diogo de Campos , a gente Franceza defembarcava , os Salvagens fechegavao , e os Francezes ajluciofamente fe fortificava^ ; fendo afjim ' que cada crime dejles he intolerável. Pelo que feguindo- fe o efeito pela noja parte , começando a D eos graças , o Trombeta ficou falvo , e a voffo ferviço , e vos dou pala- vra de o mandar quando for tempo , por minha cortezia f e voja boa attençaò j naôpelo merecimento' da caufa , que já vay declarada para diante, dos que da nojja arte mais entenderem. Do fangue , quefe derramou dos France- zes, ePortuguezes, Deos hetejlemunha, que naÓ tenha €ii a culpa , a quem a tiver elle dará a pena : por tanto , fe os meus que lá ejlaõ enforcardes , mal fareis aos vojos que cá tenho , que f ao nove com o Trombeta , e hum voffa Tambor ; mas ifoferá como vos quizerdes. Todos os mor- tos Francezes fiz enterrar como pude , naÚ como mere- cem : fe delles algum he necejario aos vojos , podem li- vremente vir por ellefem nenhum inter effe : a muitos jal- vey a vida ; mas os Salvagens que vem comigo , confejjb quefaú mais cruéis que os vojbs , nat para comerem car- ne humana ; e afim he fabula , que faltou perna , nem braço a nenhum Francez , e ijiofobre minha honra , an- tes a hum Soldado meu valerofo da Cafa Grizante , que morreo pelejando dentro já da cerca , os vojfos Tapuyas , cu Salvagens lhe cortarão hum braço , e fem elle foy a terra 5 I!' do EJlaâo dó Maranhão , Liv. IV. 157 terra-, nem me maravilhey dijo , porque fou velho , e ha Anno 1614. muitos ânuos , (jue ando nejias coufas ; e por derradeiro fey , que fera o que Deos quizer. Dada no Forte de San- ta Maria no rio do Maranhão a n de Novembro de i 614. Z: Jcronymo de •Albuquerque. ~ ^Andava fora a caça,, por tanto nao mandey a repojia mais cedo : as Cartas dos meus vifallao verdade ; mas pôde alguém enganarfe com ellasj torno-as a mandar , para que fevejaõ mais de ef- paço. 319 Os navios , que furprendeo Monf. de Pizieu , na enfeada de Guaxenduba , eíhvaõ já promptos para paíTar a Portugal com novos avifos do perigo fo eftado da fubílftencia daquellas Tropas, nao fe fiando fó o feu Commandante General , dos que havia feito a Parnam- buco ; e como os Francezes acharão nelles algumas Cartas dos Soldados , que encareciaõ aos feus amigos , e parentes o mefmo perigo com as mais vivas expref- sôes ; entendendo Ravardiere , que fazendo-nos pu- blicas asformaes noticias, que tinha delias, ajudaria muito a noíTa ultima confternaçaô , as mandou ajero- nymo de Albuquerque , com a que efcreveo , quando ja marchava para entrar no combate ; porém elle , que com o fuceeíío daquelle grande dia lhe convenceo en- tão todos os argumentos , para metello em mayor con- fufaÕ, quando de todo o naÕ defenganaíTe, tornou ago- ra a reftituirlhe eíTas mefmas Cartas , refpondendo à fua com os termos anfibologicos , de que fe ferve com tan* ta politica ; e com os feus authores praticou também huma taÓ louvável , que nem alcançarão por caminho algum , que as tiveífe lido ; prudente acordo entre os applaufos de huma vitoria , para que concorreo o valor de todos , mayormente naô defconhecendo , que na- quella culpa entrara fó a fua fmgeleza. 3 20 Com efta Carta formou já o Senhor de la Ra- vardiere diferente conceito ; aífim da juíliça das armas S Por- ou a quem lá for fobre a voffa pala- vra ; na qual fio tanto, como vós podeis fiar da minha ; pois a dou comoChrifiao verdadeiro , efervidorfiel de meu Rey , e voffo amigo. Mandai me dizer fe me dais a pala- vra , para ir lá o Capitão* Malhart , que vós já vijles em Parnambuco ; e vos rogo , que me façais eferever em Francez , ou em Hefpanhol pelos vojfos que lá tendes , que fabem de tudo. Dada em 22 de Novembro de 1614- ^ Ravardiere. ZZ 322 Mi Seííor de la Ravardiere. Mas obliga a lo? Cavai ler os Portuguezes un termino cor tez , que lafherça de las armas ; y ajfi doy mi palabra , que de nuejira que- relia en fuera , que a todo lo quefuere de gufio , y fervi- cio de Monf. de la Ravardiere , de lo hazer muy a punto. Luego , que recebi ejlefegundo menfage , embie dos Capi* tanes '•'! do E/lado do Maranha^, Liv. IV. 139 tanes con dos Francezes ,y el Trompeta a bufcar el Cuer- Anno 1614. po de Monj. de Pizieu , y mal aya la fortuna , y defcon- jfiança , que de mije tuvo \ queji e/los no pelearon tan va- ler o famente , y darfe quizieron a mi perjona , que fe lo ro- gava , t emendo el ímpeto de los mios fobre mis armas, to* dos oyfueran vivos , ò alo menos fi el mifmo dia de la ha* talla , yo tuviera avifo , como je acojlumbra- en las oca- Jiones , para enterrar los muertos , pudiera ejlar hecho lo que a la amifiad , y lealtad de los tales hombres je debe • ; ypor vida de mis hijos , que yo losjepidtara muy de otrk manera , pêro como cojafm noticia los hize enterrar, co- mo a los mios , a quien todo el bofque es muy honrada , y dichofa Jepultura ; y ajfi en lo de los muertos tengo hecho la debida diligencia. El Trompeta dirá, como quedamos} yo dirè , que mejor lo tratáramos ,fi ejluvier amos ennuef- tr a pátria; pêro como fomos hombres , que unpunodà harina , y un pedaço de culebra , quando la ay , nosjujlen- ta , quien a ejlo noje acomoda ■ , Jiempre rehufarhnueftfa compania : con los demas prifioneros hago cierta diligem cia , conveniente a quien ha de dar cuenta afuRey : he« cha quefea ,fe tratara de dar gujio a todos ; entre tanto ,Ji pareciere conveniente , puede venir a tierraiin Perfonage Francez de los mas principal es , para que vaya un Cava* Uero Portuguez de los mios a tratar de los mas puntos en voz viva., como fe promete-, adverti endo , que ■ ejialafède Monf. de la Kavardiere ,- y de Jerónimo de Albuquerque de permedio , y que no havra, quien haga macula- en ellaJ Hecha en el Fuerte de S. Maria en el rioMaranon a 22 deNoviembrede 16 14. ~ Jerónimo de Albuquerque. ~ 525 Foy tal o defcuido do.Capitaõ mór ? que fe nao affinou nefta fua Carta ; mas como tinha dado a en- tender ao mefmo Trombeta -do inimigo , que remetteo comella, que admittiria a pratica da fuípenfaõ de ar- mas , e o Senhor de la Ravardiere a defejava muito, lhe efcreveo efte a que fe fegue, v • , • S ii Se* á * li 140 Annoes Hijloricos A Anno 1614. 3 24 Senhor de Albuquerque. *A clemência daquelle grande CapitaÕ de ^Albuquerque , Governador de EIRey D. Manoel nas índias Orientaes ,fe vos ajjemelha na cor- tezia, que Jazeis aos Soldados Francezes, e afepultura, que haveis dado aos mortos 5 entre os quaes tenho hum , queamey em vida , como a irmão j forque era bravo , e d&'boa cafa. Eu louvo a Deos com tudo , efperando , que fe tomarmos as mãos , tomara minha jufla caufanasjuas. Para refponder a voja Carta , como vier ajfxnada , a man- darey communicar ao rejlo dos meus Capitães , c lida (e vos dará repojla , Jiando-me inteiramente na voja fé > e palavra , tanto que vier pojlo o vofojinal , afim como vos vedes na minha : eu vo la mando , e nào digo por ora ou- tra çoufa yfenao 1 que honraríeis a cafa,, e nome 'dos Albu- quer quês. Feita ante o Forte de Santa Maria no Mara- nhão ^a 23 de Novetnbro de 16 14. jz: Ravardiere. ~, . 325 Reftituío Jeronymo de Albuquerque ao Se-< nhor de la Ravardiere o mefmo papel já com a fua fir- ma , difculpando fó tamanho defcuido com as differen- t. âté o dia 25 5 e voltando neíle ao primei- ro lugar , em que elleve furto , efcreveo a feguinte Car- ta, de que he repofta a que fe continua. 3 26 Senhor de Albuquerque. Tenho confiderado os pontos principaes da voja Carta , e conforme aos difcur- fos , que vós tendes feito ao meu Trombeta , parece que tudo nao attende a mais que a paz por ejla banda de cá , como os nojos Reys tem pela parte de lá com muito efirei- taalliança 5 e como me- f aliar tío em Suas Magejlades ■, lo- go qjjentey com os meus Capitães , quena!o hepojfivel te- res - do EJlaão do Maranhão , Liv.IV. 141 resfoccorro por mar ; todavia vos quero ouvir J obre o que Anno 1614, me a itereis propor acerca da paz , tanto de palavra , como por efcrito , por aquellas pejbas aue mandardes fej 'ao quem forem, e eu vos dou minha fé , e minha honra em penhor, que podem vir feguramente , e voltar quando quizerem ; e fe Jor jervido o Senhor Diogo de Campos vir , euferey contentijfimo ; porque falia Francez , e nós havemos fei- to a guerra hum contra o outro , Jèrvindo os nojos Reys , quando elle andava com o Principe de Parma ,fegundo me dijeraõ : eu lhe beijo as mãos com vqffa licença , eo mef mo faço a vós ambos. V0J0 fervidor g* Ravardiere. ££ Peço-vos , quefempre me ejerevais em Francez , ou bom Hejpanhol 5 porque nao podemos as vezes achar deprefa o fentido das vojas Cartas. Feita diante do Forte de San- ta Maria a 25 de Novembro de 1 6 14. 3 27 Monf. de la Ravardiere.- Yofoy contento de os embiar ai Sargento mayor Diego de Campos , y otro Ca- pitan de Infantaria , para tratar los puntos , a que por aorano rejpondo , confiando, que feles hara la córtefia en tales cajos acojiumbrada-, mas para que guardemos el ejlilo de la guerra , jupuejlo que de vuejirafè , y palabra mucho me fio , conviene que vengan a tierra de vuejlra parte un Cavallero de Sanjuan , que teneis ■'; y elCapi- tan Malhar t , que deve conocerme , y con ejlofe tratara lo que conviene : el de Campos , yyo os befamos las manos muchas vezes , y quanto alafeguridad de mi parte fiem* pre la dare , y doi con los términos delidos. Dada en el Fuerte de Santa Maria en 25 de Noviembre de 16 14. U Jerónimo de Albuquerque. £3 328 Quando as linhas dos intereíFados em qualquer dependência caminhão todas para o mefmo ponto , fa- cilmente fe unem 5 o que melhor fe verifica nás maté- rias da guerra , fe os feus primeiros Gommandantes de- fejaõ ío a paz, como fuecedia no prefente cafo ; e af* fim Ravardiere, por naõ querer dilatar mais tempo as prati- ■ ! hJr''i'; 142 Annaes Hifioricos Ânno 1614. praticas delia \ mandou logo no dia 26 ao Cavaíleiro de Racily , com o Capitão Mattheus Malhart , aíMidos de todos os feus Officiaes até o defembarque de Gua- xenduba , donde os dous conduzidos com os mefmos cortejos à prefença de Jeronymo de Albuquerque ( que os efperava em huma tenda de campanha , junto da praya , para que naÕ viíTem a Fortaleza) defpedio elle em feu lugar ao Sargento mór Diogo de Campos com o Capitão Gregório Fragofo de Albuquerque , que che- gando abordo daAlmiranta, acharão também todas ás attençÕes nas do feu General. 3 29 Bem parecia já , que com a chegada dos Com- BiiíTarios de hum , e outro partido , fe entraria logo na negociação , de que todos niaõ encarregados j mas af- fim no alojamento de Guaxenduba , como na Almiran- ta , fó fe gaftava o tempo em difcurfos familiares , por nenhum delles querer fer o primeiro na propofta da tre- goa 5 até que o Senhor de la Ravardiere deu repetidas fatisfaçÕes a Diogo de Campos , fobre o engano da ban- deira branca, quevos Francezes puzerao na coroa de área r como final áe paz , de que Jeronymo de Albu- querque lhe tinha, feito cargo , fem f aliar nos outros ; de que igualmente o arguia j e continuando nàs expref- soes , lbè aflèverou com as mais vivas > que tanto fe obrara aquelle vil infulto , fem noticia fua, que feos feus authores oriao tiveflem já pagado nas mãos dos queixofos > com a recompenía das próprias vidas , en- contrafiaõ a mefma pena na fua jufta feveridade. 3 5 o Refpondeo entaõ Diogo de Campos , que na retenção 'do feu Trombeta , no dia da batalha , tam- bém o Gommandante General naÕ tivera culpa ; e que fe naô devia reparar I no acelerado movimento das Tro- pas Portuguezas naquelle mefmo dia , quando eílando élle muito claro , fe achavaô as Francezas em acçaô ; e muy bem defendidas de tantas trincheiras ■;■ a que aco* dio do Eílaâo do Maranhão , Liv. IV. -14? dio o Senhor de Pratz , dizendo , que fe naõ trouxeiTem Armo 1614. já à memoria os fucceílbs paíTados j mas fó fe trataíTe das boas providencias para os futuros 5 porque fe viaô todos os Francezes taõ defejofos de fervillo , que fariaô para o mefmo fim tudo aquillo , que lhes permittilTe a fua honra j e que fabendo elle , que os Portuguezes neceffi- tavaÕ muito da paz , Jhe advertia , que podia pedilla na- quella forma que lhe parecelTe , que o Senhor de la Ra- vardiere fe inclinava todo a feu favor. 3 3 1 Tinha bufcado Diogo de Campos a efte Gene- ral para a conferencia de huma tregoa , como fe moftra bem de huns , e outros avifos ; mas obfervando logo nos Francezes hum defejo nimio de erTeitualla , fe apro- veitou taõ politicamente do beneficio da conjuntura, / para melhorar o feu partido , que refpondeo ao Senhor de Pratz : Que agradecia muito aquellas attençoes too eheyas degenero/idade, cjue o Senhor de laRavardiere exercitava com a fua NaçaÓ, e naÚ menos com afuapef- foa j porém (jue elle nas matérias da paz , ou da guerra ; naò podia tomar refoluqai alguma , por lhe faltar em par a ijjo os plenos poderes do Commandante General -, mas que fe aos Francezes ( a quem profejfava particular agrado pela continuada commwicaqao' dos Elíados de F landes ) accommodava a fufpenfao de armas , a podiab 1 propor , ten~ do já entendido , que a terra que occupavaâ as Tropas ven- cedoras , como domínio próprio da Coroa de Portugal , nao fendo com ordens pofitivas do feu legitimo Soberano \ fò a hrgariao com as vidas ; porque todos fabiào muito bem ,- que as ventagens da pazfó as coftumavaòfegurar com hon- ra os esforços da guerra. 3 3 2 Celebrou muito Ravardiere eílas bizarrias de Soldado , naturaes fem duvida no deftemido animo de Diogo de Campos ;' e paliando logo a dirTerente difcur- fo , o conduzio para humâ mefa , que ainda fora dos grandes apertos do lugar , merecia bem o nome de po- lida , Annaes Hiftoricos Anno 1614. lida , aflim nas iguarias de que fe compunha , como no aceyo com que era fervida \ occupaçaõ goílofa , em que fe divertio muita parte da tarde j mas quando já fe def- pedia o Sargento mor, lhe perguntou o Senhor de Pratzt O como ficavao na matéria das armas ? A que refpon- deo , que como quizeíTe o Senhor de la Ravardiere ; porque fendo contente , podia mandar no feguinte dia o Capitão Malhart com a propofta , que elle lhe havia infmuado , que fe fe achaífe racionavel , feria attendida* . 355 Com efta ultima refoluçao , e reciprocas ur- banidades , defceo o portaló Diogo de Campos j e fepa* rando-fe da Almiranta , foy falvado de toda a artilharia, feguida de muitos clarins , e mais navaes cortejos j e o Cavalleiro de Racily com o feu Companheiro , que ti- nhaô também gaílado o tempo nosagazalhos dejeror nymo de Albuquerque , embarcando-fe à mefma hora , foraõ defpedidos com iguaes attençoes , no que permita tia a poífibilidade j porém o Senhor de la Ravardiere ^ Repondo já todas as foberanias do feu caraâer ? fe refoi- veo a fer o primeiro na propofta da tregoa ; mandando no dia feguinte, que era o de 27 , o Capitão Mattheus Malhart com os Artigos , que íe continuaõ , copiados também no mefmo idioma da fua tradução. . 334 ,, Artigos acordados entre los Scnores Daniel „ de la Touche , Senor de la Ravardiere , Lugar-Te- „ niente General en el Brafil por el ChriftianiíTimo Rey „ de Francia , y Navarra , Agente de Monf. Nicolao „ Arle , Senor de Sanei , dei Confejo de Eftado dei di- „ cho Seííor Rey , y dei Confejo Privado ; y por Monf. „ Francifco de Racily , entre ambos Lugar-Tenientes. „ Generales por EIRey Chriftianiííimo , en las tierras „ dei Brafil , con cien legoas de Cofta , con todos los „ meridianos en Islãs inclufas j y Jeronymo de Albu- „ querque , Capitan mayor por la Mageftad Catholica f9 de EIRey Filippe deEfpana de la jornada dçl-Mara- v fion ri non -?> do E/lado de > Maranhão y Liv. IV. 14? y anfi el Sargento mayor de todo el Eftado dei „ Brafil Diego de Campos Moreno , Colega , y Cola- „ teral dei dicho Capitan mayor en efta tierra , por la „ Mageftad dei dicho Seíior. 5 5 5 » Prim-ramente la paz fe acordo entre ellos „ dichos Senores , defde el dia de oy haíla el Mn de De- „ ziembre de 161 f j durante el qual tiempo ceíTaràn en- „ tre ellos todos los actos de enemiítades, que fueron , y „ han durado defde 26 de Oftobre haíla el dia de oy , „ por falta de faberfe las intenciones los unos de los „ otros j y de no entenderfe , donde fe íiguiò gran per- „ dida de la fangre Chriftiana de ambas partes > y gran- „ de difgufto entre los dichos Senores. 556 „ Se acuerda entre los dichos Senores , que „ embiaràn a Sus Mageftades Chriílianiííima , y Catho- >, liça , dos Hidalgos cada uno , para fe faber fus volun? „ tades , tocante a quien debe quedar en eftas tierras „ dei Maranon , a faber : dos Cavalleros , un Francez , „ otro Portuguez, hiràn aFrancia; y otros dosCayalle- „ ros de la mifma fuerte , hiràn a Efpaíia. 5 57 » Durante el tiempo , que los dichos Cavalle- ,, ros tardaren en boi ver de Europa , y traer de Sus Ma- „geftades elacuerdo, y orden de lo que fe deve fe- „ guir , fe advierte , que ningun Francez , ni Portuguez, „ paíTarà a la Islã deMaranon, ni Salvajes de los índios, >, ni a la tierra firme de Lefte , ni de una parte a otra , „ fin paíTaporte de los Senores nombrados arriba. 558 „ Los Senores de Albuquerque , y de Campos „ prometen ai Seíior de la Ravardiere no losconfenti- „ ràn poner los pies en tierra a menos de diez legoas de „ fus Fortalezas , ni de fus puertos , fin la permiííion „ dei dicho Seíior. 3 59 y> Que tanto , que las nuevas venieren de Sus >, Mageftades para aquellos , que deven quedarfe en la tiena , la Nacion deílinada a fe partir fe apreílarà den- T „ tro, m 146 Annaes Hiftoricos Annoi6i4. „tro de três mezes , para dexar alaotra la tierra , y „ los Salvajes , que queiran quedarfe dentro de la tierra, „ y haziendo-íe todo con buena orden , amiftad , y dili- „ gencia , figuiendo la intencion de las alianças de Sus „ Mageftades , a las quales los fufodichos fe remiten „ interamente por todo aquello , que pertenece a efta „ Colónia dei Maraíion. 540 „ Se acuerda , que los prifioneros tomados tan- r „ to de una parte , como de otra , queden libres , aííi I, los Chriftianos , como Salvajes , los quales fe bolve- „ ràn fm ninguna duda 5 y fi algunos dellos por algun „ tiempo quieran quedarfe en la parte , que fe hallaren , „ fera permitido con licencia de los fufodichos. 3 41 „ Todos los actos de enemiftades paíTados haíla „ ai dia de oy , quedaràn olvidados , y extintos , fin que „ los unos , y los otros puedan fer bufcados por ningu-» „ na via que fea , quedando cada uno de ellos libre en ,, el eftado en que fon. 342 „De aqui en adelante los dichos Seíiores, y JÍ fus gentes , viviràn en paz , y buena amiftad , y con* , 7 cordia los unos con los otros , dando-fe poder por fus „ perfonas , y de fus criados folamente , para poder hir, , ; y venir a los Fuertes de la Islã , y tierra firme, todas „ las vezes , y quando bien les pareciere. 343 „ Ningun accidente , en controverfia de lo que "„ arriba eílà aííentado por eftes Senores , fera capaz de „ hazer romper efte dicho Tratado de Paz , a caufa de „ los grandes danos , que pueden venir a Sus Magefta- „ des , alterando-fe tales amiftades , y concórdia ; y íl „ fucediere algun cafo entre los Chriftianos , y Salvajes „ de una , y otra parte , la otra Nacion ofendida harà fu „ quexa a fu General , para fe le dar remédio , el qual . „ promete fobre fu fé , y honra de le dar fatisfacion co- „ mo el cafo pidiere. 3 44 En confideracion de Io que queda dicho , y por tefti- )> ■ do EJlado do Maranhão , Liv. IV. H7 „ teítimonio de la buena inteligência, que dende eíta Armo i „ hora havemos como Chriítianos , y Cavalleros de „ honra , el Senor de la Ravardiere promete debaxo „ de fu fé de dexar la mar libre a los Seíiores de Albu- „ querque , y de Campos , y Uevar fus navios para la „ Islã , tanto eitos , como aquellos , que eítàn en la en- „ trada deita bahia , a fín de que los dichos Seíiores de „ Albuquerque , y de Campos puedan hazer venir to- „ das fuertes de vituallas para ellos, y fus gentes , tan- „ tos quantos les pareciere coutoda Ia feguridad ; y fi „ fucediere , que le vengan focorros de gente de guerra, „ ò que nos vengan a nòs otros , durante el tiempo de „ nueítra paz, los dichos Seíiores nombrados fe obligan „ fobre fus honras , y fé ., de que cada uno tendrà fu gen- „ te en paz , affi como eítà acordado , fin alteracion ah „ guna , durante el dicho tiempo dela paz, que para „ eito fe obligan de hazer guardar en todo , y por todo; >, y delante todo el Mundo. Y quanto a otras cofas de „ menos fubftancia , los dichos Seíiores no las efpecifí- „ can j porque fe confian en fus palabras verbales , en „ las quales no faltaràn jà mas , como gente de honra: „ Y para feguridad de todo lo arriba declarado , manda- ,,-ran hazer efta , que todos três los fufodichos Seíiores „ de la Ravardiere , y de Albuquerque , de Campos , „ íirmaron , y fellaron con el fello de fus armas. Fecha „ en la Armada de los Portuguezes en el rio Maranon „en27de Noviembrede 1614. ^ Ravardiere. 7S, 34? Confultou logo o Capitão mor os feus Offi- ciaes fobre eíta propoíta ; e ponderando todos o peri* gofoeítado a que fe achava reduzida a fua fubfiítencia no prefente fyítema , fe aífentou uniformemente , que fe admittiíTe na difpofiçaõ dos feus mefmos Artigos ; no cafo porém , que Ravardiere prefentaífe ordens do feu Soberano para aquella mefma expedição , comopromet- íia-j pois de outra forte devendo fer tratada fó como pi- Tii rata ? r 148 Annaes Hifioricos |,iH Anno 16x4. rata r banido da França , gente incapaz de todo o género de correfpondencia entre Catholicos Romanos , de ne» nhum modo podiaõ confentilla 5 porque ainda que nos esforços últimos, para a oppoíiçaÔ das fuás armas, foífe aquelle campo a fua fepultura , do mefmo facrificio das vidas ficariaõ tirando os mais honrofos intereíTes na im- mortalidade da memoria j e tomada efta generofa refolu- çaõ , defpedio Jeronymo de Albuquerque com a fubft an- ciã delia ao Capitão Mattheus Malhartj mas como todos os Francezes defejavao com anciã a fufpenfaõ de armas, a celebrarão já aquella noite com dirTerentes feftejos. 346 No feguinte dia bufcou o mefmo alojamento de Guaxenduba o Senhor de la Ravardiere , moftrando bem nos apparatos da comitiva a reprefentaçaõ da fua authoridade j e com aquelW, que entaõ fe fez pofíivel a Jeronymo de Albuquerque , o conduzio elle até a For- taleza, onde também foy recebido com todas as hon- ras militares , naõ reparando já em que fe obfervaíTe de taõ perto a fua pouca força. Levava Ravardiere na fua companhia o Padre Arcangelo de Pembroch , Commif- fario dos Religiofos Capuchinhos , com outros dous mais da mefma ordem 5 e inculcavaõ todos de tal forte, ainda nos exteriores accidentes das acções politicas , as muitas virtudes , de que fe adornavaõ os feus" efpiritos Apoftolicos , que os dous Capuchos de Santo António os tratarão logo com hum fummo refpeito. 547 Admiravaõ-íe todos os Francezes do adianta- mento das noíTas obras , parecendolhes com prudente difcurfo , que o trabalho delias naõ cabia no tempo ; e depois já de defpenderfe muito em bem correfpondidas urbanidades , para tirar todos os efcrupulos , prefentou logo Ravardiere nas mãos de Jeronymo de Albuquer- que a fua Patente , que traduzida por Diogo de Cam* pos , he a que fe fegue. 548 „ Luiz , pela graça de Deos Rey de França > V ede ■ do Fflado do Maranhão, Liv. IV- 149 „ e de Navarra , &c. A todos aquelles ,, que as pre- Aíin© ^14. >, fentes letras virem, faude. Fazemos faber, que pelo „ avifo que nos deu o noífo cariííimo , e bem amado „ primo o Senhor Dampulha , Almirante de França , e „ de Bretanha , das muitas coftas , e partes fituadas além „ da Linha Equinocial, que ainda naõ fao habitadas de >, Chriftãos alguns , nem de povos civilifados , ou dou- >,. trinados; e que todavia Ía5 bem temperadas > e de p, muita fertilidade , as quaes fe poderáo prover em pou- „ co tempo , e trazer os nnturaes delias a receber o >, Chriílianifmo , e bons coílumes , ufando com elles „ toda a brandura ordinária em noíTo tratamento , aííim „ como ufamos com noíTos fubditos ; e havendo tam- >, bem ouvido a advertência íbbre iílo a nós feita por y , noíío cariííimo , e muy amado Daniel de la.Tuche, „ Senhor de la Ravardiere , o qual tendo por pratica „ expreíTa , e navegação alcançado conhecimento das „ ditas carreiras , navegadas por elle , e pela digna rela? „ çaõ a nós feita por noíTo dito primo , de feus mereci- „ mentos, ecorage, virtude, efufficienciay experaen* ,, cia, inteireza, e predominaçaÓ em o feito das armas „ do mar , e boa diligencia , além das provas íingulares „ já por dlc feitas da fua fidelidade , e devoção ; e além „ difto viíla a commiíTaô de noíTo dito prímo^ fegundo „ o poder que tem no dito cargo , e depois de ter fabi- ,, do noífa intenção , e vontade fobre eíle cafo , e que ,, o tinha feito feu Vice-Almirante nas coftas , e terras, „ que pudeífe habitar : confirmando nós a dita nomear „ çaõ , havemos dá noíTo abundante , e pleno poder f „ força , e authoridade Real, dado ao dito Senhor de „ la Ravardiere todo o poder, e permiíTaõ de poder ar- >, mar , e prover tal numero de navios , de tal grandor , ,,e em taes de noíTos portos , e tantas vezes quantas „ bem lhe parecer , de baixo da licença particular de nof- ,, fo dito primo , e os poder fornecer de toidas 5 as fortes ■ f> Annaes Hiftoricos „ de peíToas de guerra , e mar , e outras coufas necef- „ farias ao dito defcobrimento , e eftabelecimento de „ Colónia ; como também de artilharia , pólvora , ar- e munições j de comida , provifaõ , e coufas ty neceífarias , fazendo o feu caminho além da dita Li- „ nha em taes partes , quaes achará a feu commodo , e „ que julgará expedientes para o accrefcimo da Chrif- ,, tandade , e bem do noíTo ferviço ; e aííim fará naquel- „ las, que naõ faõ ainda deícobertas, huma diligente „ reconhecença de todas fuás venidas, ou barras , e pi a- „ ticará todos os lugares , e entradas onde houver ai* ,, guns habitantes , procurando por todos os modos de ■,. brandura , e bom tratamento de os reduzir , e chegar ., ao conhecimenro de Deos de baixo da noífa authori- -, da de j e naõ querendo , lhes poderá fazer toda a inf- ? , tancia por todas as vias de armas , e hofpedagem , ? , para tudo reger , e governar conforme as Ordenanças >, de noífos Reinos , ou outras menos xlirTeren te s , que „ fervir poífaõ para o commodo das peífoas , e das cou- » fas s e lugares ,.. e eílas poderáõ fazer , e publicar em ,>.noffo nome , e de noíTo dito primo , e guardar, e ob- „fervar, efuílentar diligentemente j e aííim punir, e >, caftigar aos contraveriientes , ou lhes fazer perdaõ , como melhor lhes parecer bom , e neceífario ; e para recompenfar aquelles, que lhe houverem dado aju- >, da , ou que fe haveráõ ajuntado com elle para eífeito defta empreza >< aecrefcentando-lhes a vontade de „ perfeveriár , e dar exemplo aos outros de o feguir , e de fegundarem : pelo que damos , e havemos defde „ o prefente dado ao dito Senhor de Ravardiere todo o „ poder para lhes dar, e repartir todas as coufas , que 9 i poderá conquiftar cincoenta léguas de huma , e de ou« ,, tra parte de feu primeiro Forte , e morada , e tanto n avante nas ditas terras , quanto puder reduzir de bai* „ xo da noíTa obediência , em que fará as repartições , doa- ;; do EJlado do Maranhão, Liv. IV. l ? I „ doações , e bemfeitorias , que poderáõ gozar , ego- Anno 1614. „ zaráõ elles , e feus defcentedentes para fempre em to^ „ dos os direitos , e propriedades , a faber : aos Fidal- » gos , e gente de merecimento as dará em fenhorio , e „ feudo , e em todos os titulos , e dignidades , a condi- „ çaÕ , e eargo conveniente à noíTa honra , e ferviço , „ conforme fuás obrigações para a defenfa das ditas ter- „ ras de baixo da noíla authoridade ; e aos trabalhado- „ res em tal obrigação , que elle os avifará, como toi> „ nando affim das ditas viagens , por elles ferao partidos „ todos os ganhos , e proveitos por aquelles, que hou- „ verem aíliílido a cada hum , fegundo feu dever , qua- „ lidade ,- e merecimento ., e nas avenças já ditas fe re- ,, fervaráõ primeiramente noíTos direitos , e os de noflo „ dito primo , e os outros devidos , e coílumados j e „ reconhecendo além difto , que noefFeito diílo pode- „ ráõ occorrer diverfas occafiões de paíTar cartas, con- „ venções, artigos, acórdãos , títulos, e provisões , nós „ havemos validas , e confirmadas , validamos , e con- ,, firmamos todas as que ferao feitas , e pafiadas de bai- „ xo do final , e fello do dito Senhor dela Ravardiere ; „ e defde agora confiderando , e prevendo os diverfos , „ e naõ efperados acontecimentos , que podem aconte- „ cer em mar, e terra , na expedição do tal deflenho , „ nós lhe damos todo o poder de ajuntar, ou meter com >, outros , feja por companhia , commhTaõ , ou por te- ,,nencia, com igual poder que aquelle por nós a elle „ outorgado , ou da parte delle , que quererá igualmen- „ te dar, ordenar , e difpor todas as coufas fuccedidas , ,, e fuás circunftancias , e dependências , fazendo tudo „ aquillo , que nós fanamos , ou fazer poderíamos , fe „ prefente em peíToa nós eftiveíTemos 5 e como noíTo >> -Lugar-Tenente General em aufencia de noíTo primo „ em todas as ditas Coftas da diflancia de cincoenta le- „ guas de huma , e outra parte do feu primeiro aíTentOx „ e tan- IJ2 Annaes Hiftoricos V i) )t » Anno 1614. „ e tanto avante nas terras , quanto habitar poíTaõ , co- „ mo o havemos neíla hora feito, ordenado , e eftabe- „ lecido , fazemos , ordenamos , e eftabelecemos por ef- „ ta prefente, ainda que o cafo requeira mandamento „ mais efpecial , e particular , ratificando , e approvan- do defde a prefente tudo o que pelo noíTò Lugar-Te- nente fobredito , ou feus ditos Lugar-Tenentes , ou acompanhados , fera feito , tratado , e negociado pa- ra efta boa , e fanta execução , com a obrigação de bem , e devidamente obfervar por elle , ou fazer ob- fervar pelos feus , noflbs edi&os , e ordenanças , e fe alguns lhe quizerem pôr impedimentos , atraveíTando- „ fe no effeito deíla prefente , nós retemos , e referva- „ mos , e havemos por retida , e refervada toda eíla ju- „ rifdicçaõ , e o conhecimento delia para o noífo Con* „ felho de Eílado privativamente j e a todos os outros , f noífos Juizes , e Officiaes , fazemos toda a introduc- „ çaõ , e defenfa , como da mefma maneira a todos os „ noífos fubditos defta hora em diante , mandamos , que n fem a viíla , íabedoria , e vontade do dito Senhor de „ Ia Ravardiere , e dós íeus , naõ poíTaõ fazer alguma „ viagem , trafego , ou comercio , e negociação na „ quantidade das terras , que por elles feraõ efcolhidas , „ e povoadas , íbb pena de confiscação de navios 7 e „ mercadorias , dos que contravierem depois da publi- 7 y cação da noíía dita defenfa feita , e aflim damos 7 e „ mandamos a todos os noífos Lugar-Tenentes , Me£ „ três , Guardas dos portos , e obras, e todas outras nof- „ fas Juftiças , Officiaes, e fubditos , a que pertencer , „ que o dito Senhor de la Ravardiere , do qual temos „ tomado o juramento para iíTo devido , e coílumado , „ o façaõ , íònraõ , e deixem na dita qualidade de noíTo „ dito Lugar-Tenente General , em aufencia do noíTo „ dito primo Senhor Dampulha , deixando-o gozar, e „ ufar plenária , e apraílvelmente do pleno , e inteiro ef- - : „ feito do E/lado do Maranhão, Liv. IV. i J 5 „ feito das ditas preíentes , dando-lhe niílo todo o fa- Anno 1614, v vor , e ajuda ; ceifando , e fazendo ceifar todos os ru- mores ; e impedimentos em contrario , porque tal he j; y> „ o noflb gofto. E porque das prefentes poderá ter ne- „ ceílidade em muitos , e diverfos lugares , queremos , „ que aos traslados defta , feitos por hum dos noífos ,, amados Officiaes , Confelheiros , e Secretários, ou Ç, por Notário publico , lhes feja dada toda a fé como ao „ prefente original. Dada em Pariz ao primeiro dia de Outubro , anno da Graça de mil feifcentos e onze , e , do noífo reinado o primeiro. ZZ Luiz. ~ Por El- Rey a Rainha Regente fua mãy. 349 Naõ ignorava França , que todas as Conquif- tas da America fe achavaõ repartidas por repetidos Bre- ves Pontifícios entre as duas Coroas de Portugal , e de Joaõ Bòtero , Caílella , na jufta attençaõ dos feus primeiros defcobri- ? a ? ' pa J t# das , J, . - . r _, fuás Annota- mentos ; mas também fabia que faltavaõ muitos por fa- fies, pag. 4 y. zer , como fuccede ainda hoje naquella vaíliffima Re- giaõ do Mundo j e quando a eíla parte fe encaminhaífe fó o prefente projeclo , fe naõ podia verificar no Mara- nhão , fendo já antigo património da Monarquia Luíi- tana , como fe prova claramente pelas Doações , que fez das mefmas terras EIRey D. Joaõ III. a Joaõ de Barros , e a Luiz de Mello da Silva , a que fe feguiraõ as expedições, que fícaÕ referidas , que precederão mais de fetenta annos à de Ravardiere ; porém Jeronymo de Albuquerque , que neceffitava de fe aproveitar do mef- mo beneficio do tempo , de que eíle General queria fer- virfe nas efperanças dos foccorros da Europa , fem al- tercar novas difputas , aííinou os Artigos da Tregoa com o Sargento mor feu Adjunto, moftrando também ambos as ordens do feu Príncipe para a formalidade daquelle a&o. 350 Das Patentes de Jeronymo de Albuquerque,' e Diogo de Campos com os mais papeis, que moítrou o U pri- I?4 Annaes Hijioricos Annoi6i4. primeiro, conheceo bem Ravardiere o grande empe- nho das Armas Portuguezas naquella Conquiíla , prin- cipalmente quando via nos últimos as feguras • confi- gnaçõespara as defpezas delia j e difcorrendo já nefta matéria com differente refpeito , ( ainda que cheyo de politica para íuftentar a chamada juíliça da fua expedi- ção ) fe defpedio do Capitão mor , que o acompanhou até a praya com todas aquellas attenções , que podiaô caber na urbanidade militar. 351 Na fiel obfervancia do ultimo Artigo do Tra- tado da Tregoa , fe fez à vela Ravardiere em o feguin- te dia 29 domez de Novembro, moftrando bem nos univerfaes feílejos da Armada o grande empenho, com que entrarão todos os Francezes na fufpenfaõ de armas, fendo tao ventajofa para as Portuguezas , como clara- mente fe conhecia 5 e recolhendo-fe à bahia da Fortale- za de S. Luiz , fe dividio logo toda a fua equipagem nas coílumadas guarnições. 352 No mefmo dia fízeraõ os Portuguezes huma folemne ProciíTaõ em acçaõ de graças ; e para mais pu- blica demonftraçao do feu catholico agradecimento por .tantos benefícios recebidos , pelas poderofiffimas aííif- tencias da fua Divina Proteaora , lhe dedicarão huma Igreja com o foberano titulo de Senhora da Ajuda , a que deraõ principio , e reduzirão a forma decente para • o feu fanto miniílerio com o trabalho de tao pouco tem« ; po , que pareceo milagre da mefma Senhora. 353 Adornou- fe o Altar com hum Frontal rico , bordado de dirferentes matizes 7 que com huma Cafula da mefma qualidade , foy generofa offerta do Padre Ar-- cangelo de Pembroch , que aífeverou tinha fido obra , aflim da devoção , como também da arte , da Duqueza de Guiza ; Cafa que refpeitando-fe tao efclarecida na fua afcendencia , como na fucceífaõ , a faz ainda muito mais illuílre a pureza da Fé , que fempre profeílou , e conf- do EJiado do Maranhão , Liv. IV . 15 J confiantemente defendeo ; fegurando bem a immor- Annoi6i4» talidade da memoria nas mais heróicas acclamações de toda a Chriílandade ; e fenaõ fallem na perfeguiçaõ , que ella padeceo nas fanguinolentas guerras civis da França , as nobres acções dos Duques Franciico \ e Henrique de Lorena, com as ultimas , como coroa glo* riofa de todas ellas ; do famofo Carlos Duque de Ume- 11a , filho , e irmaõ terceiro dos dous primeiros referi- dos ; Heroe fem duvida tanto mayor que a fua mefma fama , que no fupremo Generalato da famofa liga , chamada Catholica , até chegou a merecer o mais alto lugar na forte oppofiçaõ do taõ grande Rey , como. Capitão o grande Henrique IV. 354 Tratou também ao mefmo tempo o Capitão mor da commodidade das fuás Tropas , alargando-lhes o alojamento na feparaçaõ de todos os índios , que íl- tuou em alguma diftancia da Fortaleza; e vendo-fe el- les com liberdade para a diligencia dos mantimentos % lhos fornecerão logo com grande abundância. 355 PaíTados dous dias, mandou o .Senhor de Ia Ravardiere a Jeronymo de Albuquerque o Capitão Mattheus Malhart com Monf. de Laílre feu Cirurgião mor, que levava todos os medicamentos neceíTarios pa- ra a aííiílencia dos feridos , que pereciaõ laílimofamen- te por falta delles ; e o avifou também , que podia logo defpachar a peflba , que nomeaílè para ir a Fariz na for- ma dos Artigos; porque o Senhor de Pratz, a quem ha- via encarregado a meíma commiíTaô , o eílava efperan- do para partir com elle na fua nao Regente , que já tinha voltado ao Maranhão depois da viagem , que fez a Fran- ça com o Senhor de Racily , e era a mefma , que com- mandava o Senhor de Pratz , quando intentou com a mayor parte da fua equipagem a interpreza do Forte de NoíTa Senhora do Rofario com o fucceííb , que fica re- ferido. Uii Ao m Annaes Hifloricos Ánnò 1614. 35 6 Ao mefmo tempo lhe lembrava também a jor- nada de Hefpanha , já com a noticia de haver efcolhido para ella o Capitão Malhart , e lhe pedia muito , que o Sargento mor Diogo de Campos quizeíTe chegar àquel- la Ilha com o Padre Frey Manoel da Piedade , para íb- cegarem com as fuás praticas os Topinambazes , que andavaô todos inquietos com os melancólicos difcurfos, de que o Tratado das duas Nações fe concluirá fó com o proje&o de os repartirem entre ambas , para os vende- rem como efcravos , com o exemplo do Capitão mor Pedro Coelho depois da guerra de Ybiapaba , que aquel- les bárbaros gentios traziaõ fempre na memoria. 357 Tinha trabalhado com grande efficacia o Ca- pitão mòr no aprefto de hum caravelaõ , para os avifos de Parnambuco , que defpachou em 5 de Dezembro y com o Capitão Manoel de Soufa de Eça , acompanha- do do Engenheiro mor Francifco de Frias , fiando jufta- mente do talento de ambos as melhores informações na prefença do Governador Gafpar de Soufa , aífim da vi- toria das fuás armas , como também da fufpenfaõ delias com asinftancias mais activas para a expedição dos promptos foccorros , de que neceffitava para o glorio- fo complemento de tamanha obra ; e defembaraçado já defte cuidado , attendeo à infmuaçaõ de Ravardiere , paíTando logo Diogo de Campos com o Padre Frey Ma- noel da Piedade à chamada Ilha do Maranhão pela par- te do Forte de S. Jofeph 5 que , como tenho dito 7 fica- va defronte do alojamanto de Guaxenduba. 358 Bem hofpedados dos Francezes , fe detiveraõ «lies no mefmo fitio todo aquelle dia com parte do fe- guinte na reducçaõ dos índios , fobre a defconfiança da prefente Tregoa ; e confeguida com felicidade , conti- nuarão ambos a fua jornada pelo continente da mefma Ilha até a Fortaleza de S. Luiz, onde recebeo a Diogo de Campos o Senhor de la Ravardiere com as mayores 6 • atten- . do Eftaâo do Maranhão , Liv. W< í í f attenções , affim politicas , como militares; fazendo AntiQi6i%. também elle General oílentacaò da fua grandeza no adorno da cafa. 359 Na manha feguinte foy Diogo de Campos ao Convento dos Capuchinhos , que ainda que eftava mui- to nos feus principios , o achou já com íufficiente capa^ cidade , aííim nas cellas , como nas officinas , para ac- commodaçaõ de vinte Miffionarios , que affiíliaõ nelle, de cue era digniffimo Prelado o Padre Arcangelo de Pembroch , que havia poucos mezes, que tinha chega- do ao Maranhão com dezafete dos taes Religioíbs ; o qual lhe moílrou logo hum Seminário de moços Fran- cezes , e índios da Ilha , onde aprendiaõ a lingua huns dos outros , fendo elle o que inftruía todos nas fuás vir- tuofas doutrinas por voz dos Interpretes. 360 Difcorrendo depois fobre varias matérias, o mefmo Prelado eílranhou muito a Ravardiere o empe-» nho da guerra de Guaxenduba ; também aíTeverando ') que naõ podendo embaraçalla , por mais que esforçara os feus bons officios , lhe prognofticara a infelicidade , que fentirao todos , mayormente no fatal deílroço da principal nobreza , em que entrara com a primeira par- te para a mais juíla magoa a laftimofa perda de Monf. de Pizieu , que além da fua grande qualidade , era o def- tinado para Commandante daquella Colónia na aufen- cia do Senhor de Racily , e depofiçao de Ravardiere , que mandava recolher a França a Rainha Regente ; por naõ forTrerjá a fua condu&a na povoação dehuma Conquiíla de Catholicos entre gente barbara ; porque ainda que o mefmo General fe adornava de muitas vir- tudes , lhas deftruía todas o abominável erro da herefia; e que como fe naõ podia já reduzir a pratica hum taÕ fanto proje&o , fem que fe tomaíTem novas medidas, determinava elle paííar a Pariz na companhia do Senhor de Pratz , para fatisfazer às efpeciaes recommendaçoes da 1:1 1 1 rr* 158 Ânnaes Hifloricos 1 ' *K'. Annol6i4. da mefma, fobre noticias muito importantes , que fó fiava do feu zelo. 3 6 1 Nefte tempo entrou o Senhor de la Ravardie- re j e diííimulando-fe o difcuríb com outros differen- tes , conduzio elle logo a Diogo de Campos para a For- taleza , onde lhe deu hum jantar magnifico. 362 No feguinte dia o levou abordo da fua nao Regente, na qual tinha diípofto o feu recebimento com as mayores honras militares : depois lhe foy moftrar a entrada da barra até a enfeada de AraíTagy , que defco- bre bem a terra firme de Tapuy tapera , e do Cumá com algumas Ilhas da viíinhança da do Maranhão 5 e ven- do que Diogo de Campos apontava tudo , lhe difle , que para melhor defempenhar a fua louvável curiofidade lhe promettia huma relação de todos os feus defcobrimen- tos até o Pará , em que peíToalmente havia trabalhado ; e que feria ainda muito mayor o fruto deftas fadigas , fe feu fobrinho Martim Soares Moreno o naõ inquietara no mez de Agofto do armo antecedente , fazendo-o acodir à principal defenfa daquella Fortaleza , que fup- punha logo atacada das Armas Portuguezas 5 masque efperava , que Monf. de Longueterre , que fubílituira no feu lugar com a força de quatrocentos homens , lhe traria largas informações daquelle vaíliííimo Paiz , que também lhe communicaria com a mefma finceridade. 363 Agrad*eceo muito Diogo de Campos eftas at- tenções de Ravardiere 5 e dando fim goftoío aos diver- timentos daquelle dia , fe recolheo logo no feguinte a Guaxenduba com o Padre Frey Manoel da Piedade , que aííiftio a tudo , taõ fatisfeitos ambos da hofpeda- gem , como obrigados delia. 3 64 Para a jornada de Pariz tinha já nomeado Jero- nymo de Albuquerque a feu fobrinho o Capitão Gregó- rio Fragofo ; e como pedia prompta execução pelas di- ligencias de Ravardiere , o defpachou em 1 3 de Dezem- bro do Eflado do Maranhão , Liv. IV . 159 bro cem huma larga Carta para o Miniftro de Hefpa- Anno 1614. nha , que nao traslado nefte lugar, porque a fubftan- cia delia fe comprehende toda nasinftrucções feguintes. I Coufas , que por ferviço de S. Magejlade ha de advertir o Capitão Gregório Fragofo de Albuquerque em o Reino de França ao Senhor Embaixador de Hefpanha. 3^5 n D Rimeiramente continuará a cafa do di- „ JL to Senhor , fervindo fempre , e acom- „ panhando a Sua Senhoria , até com effeito fer re£ „ pondido y e fará todas as diligencias , que pelo dito „ Senhor lhe forem mandadas , fobre os negócios defta „ Conquifta. 366 „ Advirta a Sua Senhoria , que o Maranhão ; „ e fuás terras , e aííim as de Tapuytapera , Cumá , e ,, Pará , e todas as mais deílas Coílas , faô à parte do „ Norte do Peru , e do Brafil 5 as quaes Provindas ho- „ je nao faõ defertas , mas defoceupadas dos Portugue* „ zes por infortúnios notáveis , e perdas de navios , e „ gentes . como as Chronicas eftao cheyas 5 porque „ nefte Maranhão eftao os fundamentos dos primeiros „ Portuguezes , que aqui povoarão , a faber : os filhos „ de João de Barros , e os Mellos , e outros , a que pe- „ los trabalhos de Portugal fe nao pode dar foccorro 5 „ e que nao fao defpovoadas, pois o Brafil tem mais de „ três mil Portuguezes , e tantas Cidades , e Villas co- „ mo fe fabe j e o Peru , o que he notório , fendo o Em- „ porio do novo Mundo de Sua Mageftade 5 de modo ? „ que fe por naô ter moradores huma terra fe ha de to- „ mar a feu dono , Silves no Algarve , e Algecira junto „ a Gibraltar, eftaõ fem moradores no coração de Hefc „ panha j e aqui nefta parte , que o he do Peru, fe fór- „ ma 'IT* lóo Annaes Hiftoricos ?? ;> Anno 1614, „ ma nova França , ou eílá já formada com vinte Ca- „ puchos , de que lie CommiíTario o Padre Arcangelo „ de Pembroch , da dita Ordem j do qual Sua Senho- ?; ria pode faber muitas coufas , e que eftavao oitocen- „ tos Francezes metidos nefta Colónia com mulheres , „ e cuílo incrivel , e com pouco proveito até agora , „ fegundo dizem : que o Senhor de la Ravardiere tem dado terras , e índios a Fidalgos , e Soldados feus , os quaes vivem fazendo fazendas , e as poíTuem co- „ mo fuás nas terras de EIRey de Hefpanha j coufas , „ que denotaõ mais fundamento , do que fe pode dizer „ neíle negocio. 367 „ Que temos entendido , que fe naõ foraõ as „ allianças de Hefpanha , e França , eftiveraõ já nefta „ Colónia mais de dous mil homens Francezes : que na ? , Cidade de Pariz foraõ levados em carros triunfaes os „ índios Topinambazes , e os apadrinhou o Senhor de „ Guiza , e Sua Mageílade Chriftianiííima lhes deu mu- „ lheres Francezas , e muitos veftidos , e dadivas com „ que os tornou a mandar ao Maranhão por feus vaíTal- „ los , fendo-o de EIRey nofíb Senhor 5 e além deftes „ „ e outros muitos alliados que tem , trazem linguas „ Francezas em todas eftas Provindas , com que nos „ tem feito , e fazem muito damno. 368 „ Que o Cardeal dejoyofa tinha ofFerecido „ para eíla Colónia a defpeza de hum Seminário , como dirá o Padre Arcangelo j e aíiim a Rainha Chriftia- niíTima Regente huma grande ajuda , que tudo com ,, capa de Religião Chriftã , vem a fer em damno do fer* „ viço de Deos , e deitas Províncias^ nas quaes dizem , ,, que tem defcoberto minas de lápis lazuli , e nova pef- „ caria de pérolas ? e tem achado pedraria de valor , fo- „ bre que ha pleitos entre elles ; e que cada dia de no- „ vas madeiras , e tintas de índios trataõ de tirar a fubf- „ tancia ; com que levar avante efles novos princípios j aco- 77 ?> :> do EJiado do Maranhão , Liv. IV» % êi „ acolhendo aqui da mefma maneira aos Corfarios 7 que Anno 1614. „ de roubar as terras do Braííl , e da Mina vem aqui „ defgarrados a bufcar mantimentos, e remédios às fuás }) viagens. 369 ,, Que refgataõ por machados , e fouces , e ), outras coufas de pouca fubílancia , muitos efcravos „ dos mefmos índios : que huns a outros fe comem , e „ fe cativaõ , e com elles fe vaÕ engroífando em modo „ de fazer fazendas -, e que trataõ de mandar ao mar de „ Angola a tomar os navios , que vem com efcravos „ ao Brafil , e às índias , para meterem nefta Colónia , „ e fazerem fem defpeza , mais que a agencia dos Corfa- „ rios , hum riquiífimo Reino : e que achámos aqui feus „ cativos com ferros nos pés , muitos Portuguezes no£ „ fos de três annos de efcravos , que como taes lhe ro- ,, çavaõ , e plantavaõ , e ferviaÕ no campo $ os quaes „ fempre eftavao condemnados a eíla vida , coufa que „ nem em Barbaria fe ufa , e iílo porque naõ deíTem „ noticia do que havíaõ viílo nefta Colónia ; na qual , f tem metido tanto cabedal , que feguramente entende- „ mos , e fabemos , que pedem favor a Inglaterra 7 of- „ ferecendolhe o feudo , e homenagem , em cafo , que „ de França lhes falte aífiílencia 5 porque o Senhor de „ la Ravardiere , além de fer de Religião Proteílante , j, he cunhado do Conde Mongumeri , que tem em In- „ glaterra mil parentes , e cunhados , homens de fubf- ,, tancia , poderofos , e ricos : também pela fua natural „ inclinação de conquiftar , e povoar coufas eftranhas , ,, e novos defcobrimentos , he de recear , que naÔ vivi- ,, rá quieto , fe a força o naõ obriga , ou benefícios. Pe- „ lo que parecendo a S. Senhoria , que os pobres Fran- „ cezes Catholicos , e mecânicos , que aqui eftao cafa- „ dos com mulheres , e filhos , que de França trouxe- „raô , e alguns folteiros , e nobres accommodados na ,, terra, que fiquem os que quizerem , poífuindo o que X tem, fifi» .« 162 Annaes Hifloricos mi \iiAl\ r9 ,.T Anno 1614. „ tem , como vaífallos de EIRey Catholico noíTo Se- „ nhor j e os que naõ tiverem terras r que poífaõ darfe- „ lhes , fem embargo da prohibiçaõ feita , que trata dos „ eftrangeiros ; eftes taes fempre feraõ de grandiíiimo „ effeito j porque como taô práticos em todas as cou- „ fas daquella Conquifta , e nas execuções dos deíTe- „ nhos dos feus mayores , e juntamente alliados , e ha- 37 vindos com os índios , de que naõ temos ainda hoje „ noticia alguma , ficaráÕ entre nós outros fazendo hum „ eíFeito maravilhofo j e os índios , que dependem da ,, fua linguagem , e promeíTas , naõ terão alteração al- „ guma 5 e com efte meyo mais breve ,■ e mais quieta- „ mente , e com menos defpeza, feremos fenhores , do „ que a Sua Mageílade tanto importa ; e lançaremos os „ Hollandezes do Cabo do Norte nefta Cofta , onde fe „ fortifícaõ na boca do rio das Amazonas , fem que de „ Hefpanha feja neceíTario bufcarfe , e mandarfe ho- ?? mens a grande cufto , ignorantes do que eftes fabem, „ e nifto naõ ha duvida fer muito conveniente tomarfe „ hum bom aíTento. 370 „ Ha fe de notar , e entender além deftas cou- ,1 fas com grande diligencia , e todo o fegredo , o que „ trataõ , e maquinaÕ os Senhores de Sancy , e de Ra- „ cily , e fe ajuntaõ gente ? e fe tornaõ a mandar a fua „ nao Regente , que he de quatrocentas toneladas , e i7 leva trezentos , e quatrocentos homens , e he fua , e „ dedicada a efta Colónia; porque fe affim for, convém „ qualquer coufa , por pequena feja , que fouber difto , , y avifar a Hefpanha , para prevenir Sua Mageílade o ? , que convém ; e que nos naõ tomem defapercebidos *' „ donde com Altares , e Mofteiros de Capuchos , e „ Clérigos , Curas de almas , fe vay continuando com a . „ obrigação do Santo Evangelho , prégando-fe em to- ,, do efte barbarifmo. 371 „ ífto cpe aqui fe adverte ao Senhor Embaixa* „dor. do EJíado do Maranhão % Liv. IV. 165 yy dor , he o mefmo que em Hefpanha fe ha de tratar Anno 1614» „ pelo Sargento mor deíle Eftado com Sua Mageftade, „ que Dcos guarde muitos annos y e fempre em grande- , y za. A 15 de Dezembro de 16 14. m Jeronymo de „ Albuquerque. T$ 372 Das exa&as noticias de Jeronymo de Albu- querque , principalmente na tyrannia com que havia tratado o Senhor de la Ravardiere a muitos Portugue- zes ( aprezados de diííèrentes piratas , que recolhia na- quella Ilha , onde lhos deixavaõ ) fervindo-fe delles, naô íó como cativos , mas ainda carregados de ferros ? fe moítra também com toda a clareza o intrufo titulo do feu dominio j porque fe elle naõ entendeíTe , que per- tencia de juftiça à Coroa de Portugal , naô procederia com tanta crueldade (naõ tendo nafcido em Maquinez, ou Conftantinopla ) na retenção dos feus vaflallos , quando profeíTava huma alliança a mais eftreita com o feu mefmo Príncipe ; mas antes he fem duvida , que te- merofo já de que fe lhe pediíTe a merecida fatisfaçaõ , tratava fó de dilatalla \ embaraçando por todos os ca- minhos as informações daquelle roubo. 373 Defpachado com eftas inftrucçoes , chegou à Fortafeza de S. Luiz em 14 do mefmo Dezembro o Ca - pitão Gregório Fragofo >j acompanhado de Mathias de Albuquerque , que o Commandante General feu pay mandava ao Senhor de la Ravardiere em reféns do feu Cirurgião mor Monf. de Laftre , que ainda fe detinha no alojamento de Guaxenduba com a aífiftencia dos fe- ridos , onde moílrou bem eíle Francez , tanto a fua fci« encia , como a largueza de animo no acerto , e definte* reíTe de todas as curas ; e dentro de dous dias fe fez à vela a nao Regente , levando a feu bordo os dous Com- ■miflarios ; porém logo com infeliz agouro para os Fi an« cezes ; porque íalvando a Fortaleza , no recebimento , que ella lhe fez , rebentou hum canhão de artilharia X ii grof- ■pB $ I64 Annaes Hifioricos ím\\M A'ffiio 1614. groíTa , que defpedaçando cinco peíToas , além do Con- deílavel , eftropeou mais duas , da obrigação todas do Senhor de la Ravardiere, . 3 74 Com a expedição de Gregório Fragofb de Al- buquerque , e Monf. de Pratz , fe tratou a toda a dili- gencia da viagem de Hefpanha, para a qual fe havia of- ferecido o Sargento mor Diogo de Campos com tanto goílo de Jeronymo de Albuquerque, que a malicia dos apaixonados o murmurou particular fatisfaçaõ defever livre da fua companhia j mas os re&os juizos ponderando melhor a fincér-a amifade , que profeífavaõ ambos , lhe deraÕ taÔ fomente o nome de zelo , empenhado todo nos prudentes difcurfos j de que ajudada aquella commiíTaõ da fua boa intelligencia , fegurava mais a felicidade , que pretendia nos foccorros da Europa j no que fem duvida fe naõ enganarão as fuás efperanças , como veremos no anno feguinte j e apreftada já a caravela , que na mefma enfeada de Guaxenduba tinha fido preza dos Francezes, (aos quaes fe comprou por duzentos mil reis) paílou logo Diogo de Campos com todos os defpachos neceífarios à Fortaleza de S. Luiz, onde entrou em 50 de Dezembro. . 375 Sem outra novidade fuccedeo o anno de 161 55 eafliftido Diogo de Campos da grande actividade de Ra- vardiere , entre a magnificência da hofpedagem , da mef- ma bahia do Maranhão tomou a derrota de Lisboa em 4 de Janeiro, acompanhado do CapitaÕ Mattheus Ma-, Ihart, ultima memoria do noífo Diário, que teve princi- pio em 2 3 de Agoílo do anno parlado ; e fó naõ fallo na relação dos defcobrimentos de Ravardiere, que com ef- feito communicou a Diogo de Campos 5 porque algumas das fuás noticias efcreverey no lugar a que tocaõ ; e a mayor parte delias differem muito das modernas , que preferem fempre para o credito na exacçao daHiftoria, principalmente depois de confirmadas pelas minhas pró- prias indagações f tanto na vifmhança da verdade de to- das. AN- Anno i6i£. i6j ANNAES ISTORICOS DO ESTADO DO MARANHÃO. LIVRO V. SUMMARIO. ELAXAÇAO da difcipíina militar no Tra- tado da Tregoa , que celebrou Jeronymo de AU buquerque com o Senhor de la Ravardiere. C/ie- gao vários fcccorr os ao Campo de Guaxenduba? e com elles intenta Jeronymo de ^Albuquerque romper o Tratado. Conclue outro novo com as grandes ventagens de occupar na Ilha do Maranhão o Forte de S. Jofeph de Jtapery , guarnecido pelos Francezes , aonde pajja logo evacuada afua guarnição'. Alexandre de Moura fahe de Parnambuco com huma Armada para a Conquijla do Ma- ranhao , aonde chegando fe refolve Ravardiere a evacua- ção daauella Colónia. Toma pojfe delia Alexandre de Mou- 166 Annaes HifloricoS V'\ Annoiói^. Moura, e notneya por Jeu Capitão mor ajeronymo de Albuquerque , e a Francifco Caldeira de Cafiello-Bran- co do descobrimento do Grão Vara , de que havia já mui' tas noticias. OJucceJJb dejia expedição. Recolhe-je pa- ra Parnambuco Alexandre de Moura com o Senhor de la Ravardiere. Dá principio Jeronymo de Albuquerque a Fundação da Cidade de S. Luiz. A razaÓ porque lhe poz ejle nome ', fendo o próprio dafua Fortaleza , que fe lhe transfere no deS. Filippe. Principiai? hum Convento na mefma Cidade os Religiofos Carmelitas , quefoy o primei- ro naquella Conqwjla da Fundação de Portuguezes. Re- duzemfe os Tapuyas da Ilha a obediência de Jeronymo de Albuquerque. Ãfua primeira expedição* y e o fuccejfo delia. Francifco Caldeira funda no Pará a Cidade de NqJJa Senhora de Belém. Communica por terra ao Go- vernador do Efado do Brafil, e ajeronymo de Albuquer- que a felicidade da fia empreza. A fua primeira acçaò militar, e o feu feliz êxito. AleivofafublevaçaÕ dos To* pinambazes do Maranhão ; principio que teve , e o cajli- go delia. Avifad aos Parentes do Pará , que também a feguem , mas com igual fortuna. Novos esforços dafua fereza , e novas vitorias das armas Lufitanas. Primeira Fundação de Religiofos na Capitania do Gral) Pará ; e primeiro Vigário da Igreja Matriz da Cidade de Belém* M< |: r 37 6 fl&S UB 4331 BSERVAVAO o Tratado dá Tregoa ambos os partidos ; po- rém como naÕ era com a Reli-: giaõ , que determinavaõ as con* diçoes eftipuladas nelle , fe fa- ziaõ de huma , e de outra parte differentes entradas , cjue diícuJ- pavaõos Command antes como relaxação da difciplina; e ainda que íbbre efta matéria , e outras de importância* paíTou do Efiado do Maranhão , Liv. V. 167 paiTbu Jeronymo de Albuquerque altapary, onde as Annoi6i$, communicoú com Ravardiere , e eíle depois a Gua- xenduba, também com o pretexto de pagarlhe a viíi* ta, recolhendo-fe aos feus Quartéis , fe continuarão as mefmas defordens , fe nao formalmente permittidas, de alguma forte toleradas. 377 Nefte mefmo tempo chegarão a Jeronymo de Albuquerque vários reforços \ affim de Portugal , que commandava o Capitão Miguel de Siqueira Sanhudo , como da Bahia de Todos os Santos , e Parnambuco , à ordem do Capitão mor Francifco Caldeira de Caítelio- Branco ; e mais cheyo de efpirito , que de forças , para romper o Armiílicio , ( mas antes opprimido de huma quaíi geral enfermidade de farampo , que padecia o feu alojamento , onde já fe temia como contagiofa ) man- dou notificar a Ravardiere, que tinha recebido naquel- les navios avifos do feu Príncipe, com a declaração de que aquellas terras eraõ legitimo património da Coroa de Portugal, termos em que fe achava na obrigação de dar por rota a Tregoa ; porém de nenhum modo a fua amifade , fe fe quizeífe fervir delia , entregandolhe a Ilha j porque nefte cafo lhe feguraria para as fuás Tro- pas toda a boa paífagem. 378 O Senhor de la Ravardiere por mais que apu- rou todos os esforços da fua conftancia , em accidente taÕ arrebatado , fe vio furprendido dos feus mefmos dif- curfos , fuppondo-o producçaô de certas efperanças de mayores foccorros , que os que tinhao chegado ao alo- jamento de Guaxenduba j mas ainda affim naõ fe dei- xando fuffbcar fó dos ameaços , fe aproveitou tanto de defafogo do feu animo , que fem moftrar nelle alteração alguma , refpondeo a Jeronymo de Albuquerque , que a importância daquelle negocio neceííitava de conferen- te , com plenos poderes para o ajufte ; e o Capitão mor, com razaõ fatisfeito da boa fortuna deites primeiros paf- fos, 168 Annaes Hifloricos h Annoi6i5. fos, defpedio logo para Itapary a Francifco Caldeira , fiando juftamente a felicidade do fucceflb da fua muita capacidade. i 379 A chava-fe Ravardiere com poucas efperanças dos promptos foccorros de que necefíitava , quando te- mia os Portuguezes já como vifmhos ; e fabendo fervir- fe das militares máximas , que tinha aprendido nas for- midáveis guerras civis da França, com o exercício de grandes empregos ; depois de rebaterlhe Francifco Cal- deira todos os arbitrios , de que fe valeo para dilatar a conclufaõ daquelle mefmo ajuíle , que dava a entender, que folicitava , recorreo então ao ordinário benefício do tempo , aíTentando , que no de cinco mezes evacuaria toda a Colónia do Maranhão , e Fortes , que nella guar- necia , com a condição de fe lhe pagar a artilharia del- les , e fe lhe darem as embarcações , que foíTem necef- farias para o tranfporte de todos os Francezes j mas Je- ronymo de Albuquerque , que naõ defconheceo a fua induftria , fe aproveitou da mefma para firmar o pé den- tro da Ilha ; porque fendo o primeiro Artigo Preliminar da negociação de Francifco Caldeira a entrega do For- te de Itapary , aflinou o Tratado fem a menor duvida , e paíTou logo ao mefmo fitio com toda a fua gente. 3S0 Naquelle Forte tinha o Senhor dela Ravar- diere concluido o Tratado ; e evacuada a fua guarni- ção , em virtude delle , o entregou a Jeronymo de Al- buquerque em 31 de Julho com geral fentimento dos Francezes ; mas quando para confolallo , no modo pof- fivel , íiavaõ ainda o melhoramento da fua fortuna dos foccorros da Europa , as mefmas efperanças esforçava5 também o noflo Commandante , no arrojamento com que procedia j e fervindo-fe todos dos mefmos difcur- fos , defafogavao as afrlicçoes do animo fem alteração na boa harmonia da correfpondencia. 381 No mefmo tempo fe achava já o Sargento mor Dio- do ditado do Maranhão , Liv. V. i 69 Diogo de Campos na Cidade de Lisboa com o Capitão Anno i6i£. Mattheus Malhart ) Màt o dia 5 de Março j e logo prefentando-fe ao Arcebifpo Vice-Rey D. Aleixo de Menezes, por mais que efte Miniftro, reputando fó co- mo piratas todos os Francezes do Maranhão , eílranhou muito o Tratado da Tregoa , foraõ tao a&ivas as fuás inílancias, para os íbccorros que pretendia, que defem- penhou bem as expectações de Jeronymo de Albuquer- que com grande confufaõ da malevolencia dos Teus emu- los } porque conhecendo o Miniíterio de Madrid a im- portância defta dependência , defattendidas as apaixo- nadas reprefentações do Capitão Malhart pela parte de França , tratou tao vivamente da expedição de Diogo de Campos , que afMido das forças neceflarias , voltou logo para Parnambuco , onde achou também o Gover- nador Gafpar de Souía occupado todo no mefmo proje- ão, pelos avifos que tinha recebido de Guaxenduba. 3^2 Era muy natural a actividade defte Fidalgo j e competindo fempre com o feu zelo, dentro de pouco tempo armou em guerra, no rio Olinda , {ete navios , hum caravelao , e huma caravela , com a equipagem de novecentos homens de huma tal qualidade, que confia- damente promettia a felicidade da empreza 5 mas para melhor feguralla , a encarregou a Alexandre de Moura , Fidalgo da Cafa Real , e Cavalleiro do habito de S. Bento de Aviz , que além do feu grande merecimento ,, acabava de exercitar o emprego de Capitáõ mor daquela la me fma Capitania. 385 No cargo de Almirante nomeou também ao. Sargento mor do Eílado Diogo de Campos Moreno ; no de Capitão de Mar, e Guerra da Capitania a Henri- que AfFonfo, que o era da Infantaria da ília Guarnição: daAlmiranta a Payo Coelho de Carvalho, (que ^af- iando depois a mais perfeita vida , a acabou com vfr> tuofo exemplo na Província Capucha da Arrábida ) e Y dos A I70 Annaes Hiíloricos I . *> *R AnnoióifT. Li I; dos mais navios a Maríoel de Soufa de Eça , Jeronymo Fragoíb de Albuquerque , Ambrofio Soares de Angu- lo , Bento Maciel Parente , e Martim Soares Moreno, que fe tinha reítituido a eíla Conquiíla na companhia de feu tio Diogo de Campos : do caravelaõ a hum Fu- lano de Carvalho , e da caravela a Manoel Pires. 384 Com efta Armada fe fez à veia para o Mara- nhão Alexandre de Moura em 5 de Outubro ; e já com poucos dias defte mez , entrou pela barra do Periá , que tinha também fido no anno de 161 2 o embocadouro dos Francezes j parece que difpondo a alta Providencia, que a mefma porta , que facilitou o feu infulto , fe achaíTe fempre aberta para o caftigo delle ; e para mayor confu- faõ fua , na juftificaçaõ da noíTa caufa > ainda que toca- rão varias vezes aquelles navios nos feus muitos baixos, na mefma evidencia do perigo fe falvaraõ de todos j) continuando a fua derrota até a bahia de S. Jofeph , on- de deraõ fundo. 385 Tinha Jeronymo de Albuquerque antecipado avifo de Alexandre de Moura , que lhe defpedio do Pe- riá j e vendo furgir as embarcações do mefmo aloja- mento de Itapary , paífou a bordo da Capitania 7 onde recebendo pofitivas ordens , para que rotos os Tratados marchaíTe logo fobre os Francezes 9 voltou prompta- mente a executallas, 386 Foy grande o goílo dos noíTos Portuguezes com a chegada de tamanho foccorro j porém no mef- mo tempo , em que a feílejavaõ , fe virão atacados do mais forte accidente , que tinhaõ padecido naquella Conquiíla ; porque pegando fogo no alojamento fabri- cado todo de madeira , e palmeira brava , matéria bem difpoíla para a voracidade dos incêndios , os defpojou efte em poucos inílantes , naõ fó dos. bens que poíTuíaÔ, mas da mayor parte das munições de guerra , e ainda das armas , que difparadas pelas mefmas chammas , tam- bém iilf do EJlado do Maranhão > Liv. V- 171 bem accrefcentarao a fatalidade do fucceíTo com o mui- Anuo 1Ó15. to fungue , que fizerao derramar as fuás balas. 387 Com o poílo de Capitão mor daquella Arma- da levava também Alexandre de Moura os fupremos poderes de General da Guerra 5 no que procedeo o Go- vernador Gafpar de Soufa com huma politica tao erra- da , que arrifcou por diíFerentes princípios o bom fuccef- iò delia ; porque fendo Jerony mo de Albuquerque o íèu primeiro Commandante nomeado pelo Principe , além de fe achar tao adiantado nos feus progreífos , como no conhecimento do terreno j e ficando fempre os que foc* correm à obediência dos íbccorridos , conforme as re- gras militares , naÕ os preferindo pela graduação das fuás Patentes , naÕ devia com tanta injuftiça accrefcentar a "fcircunftancia dos feus poderes, na que paífou a Alexan- dre de Moura. 388 Mas Jeronymo de Albuquerque , querendo mo£ trarfe fuperior às naturaes paixões do animo , foube ufaf taõ virtuofamente da grandeza delle , neíla tao feníivel defattençao , com que fe tratava o feu merecimento , o feu carader , e a fua peíToa , que obedecida a ordem de Alexandre de Moura , fem a menor contenda , mo* veo as fuás Tropas fobre a Fortaleza de S. Luiz ( que occupavaô já todos os Francezes , para fazerem a fua defenfa mais vigorofa ) com tanta a&ividade , valor , e difciplina , que no dia ultimo do mez de Outubro as podou junto à fonte das Pedras , viíinha da mefma For-* taleza , fem que fe atreveífem os inimigos a difputarlhe aquelle Quartel , ficando nelle fitiados pela parte da ter* ra. 3 89 Na manhã feguinte , primeira de Novembro > entrou então Alexandre de Moura na bahia de S. Luiz do Maranhão , a que poz o nome de Todos os Santos^ por fer eíle o feu dia ; e fazendo hum prompto defem- barque na pequena Ilha de S. Fiancifco , diítante pou- Yii co WfT— 172 Annaes Hiftoricos • Anuo 1615. co mais de tiro de canhão da Fortaleza dos Francezes , levantou nella outra defenfa de pao a pique , da invoca* çaõ da mefma Ilha , ( que fe chamou também o Forte do Sardinha ) obra que crefcendo fem tempo ? a mila- gres da fua actividade , foy dos nomeados para guarne- cella com a equipagem do feu navio , Bento Maciel Pa- rente, que hia fer vindo à fua cuíla de Capitão de Mar> e Guerra. 1 390 Vio-fe logo o cuidado de Ravardiere por toda aparte combatido j porque nos Tratados, que tinha ce- lebrado com Jeronymo de Albuquerque , nunca entrou com mais refoluçaõ , que a de dilatar o tempo , para fe aproveitar do beneficio delle ; porém era tao grande o feu efpirito , que no meyo das mefmas afrlicçoes , fe lifongeava ainda com as efperanças dos foccorros daEu-f ropa , até fazendo circunftancia para a fua vitoria da uniaõ das Armas Portuguèzas ; mas quando procurou com mayores esforços introduzir os mefmos nos def? mayados ânimos dos feus Soldados , como elles viaõ as fuás promeíTas taõ diítantes , e tao vifinhos os gol* pes inimigos , de que tinhaõ já baftantes experiências ; defenganaraõ a fua conftancia , também intereífada nos groíTos cabedaes , que havia metido naquella Co- lónia. . 5-91.. Bem defejou elle orTerecer então o facrifício ultimo no altar da honra , para falvar os perigos delia no defprezo da vida ; mas ponderando com prudente con- felho, que tratando-fe fempre, no melhor fentido da ra- cionalidade, como defacordo do coração , eíle argu- mento do valor , deixava o feu nome mais injuriado , do que gloriofo , neceífariamente convencido por todos os princípios das difpofiçoes da fua forte, (corno decre- . tos irrevogáveis da alta Providencia ) fe vio obrigado a bater a chamada com o aviíb a Alexandre de Moura , de que ainda que o prazo das fuás ultimas Capitulações t .; nao .' m do EJlado do Maranhão % Liv. V. 17$ naõ eftava cheyo , fe achava prompto para cumprillas Anno 1Ó15C fem a menor duvida. 392 Juftiííímamente ' fatisfeito o nofíb General da felicidade da propoíta , a aceitou com as eftimações ,; que ella merecia ; e paífando o Senhor de la Ravardie- re ao Quartel da Ilha de S. Francifco em 2 de Novem- bro, no mefmo dia aílinou o termo ; que fe fegue , de que tenho huma copia authentica. 393 Aos 2 dias do mez de Novembro de 1 6 1 5 a mios , na Ilha de S. Luiz , aonde habitao os Francezes , e no lu-, gar do Quartel de S. Francifco , que chamaÒ o Forte da< Sardinha , appareceo perante mim Daniel de la Touche , Senhor de la Ravardiere , e por eílefoy dito em prefença- dos Religiofos Padres de S. Francifco , que cá e/lavaÕ, e- cios que em minha companhia vier ai de NqJJa Senhora do: Carmo , e dos da Companhia dejefus , ejlando também prefente o Almirante da ^Armada , e muitas pejfoas no-, br es, que elle ejiava prejles para entregar o Forte , que pqffuía , em nome de Sua Magejlade Catholicã ao General da Armada , eConqiàfla Alexandre de Moura; e de co* mo ajfun o houver ao por bem , fizer ai efite auto , em qae afinarão os ditos Senhores. E eu Francifco de Frias de? Me f quita ojiz por mandado do dito Senhor General. ç$t Alexandre de Moura, n Daniel de la Touche. 23 394 Na manha feguinte voltou Ravardiere ao. Quartel de S. Francifco ; e Alexandre de Moura man- dando ler na fua prefença o referido termo , fez efta no-* va declaração. 395 Que me ha de entregar o Senhor de la Ravar- diere a Fortaleza em nome de SuaMageflade , com to- da a artilharia, munições, e petrechos de guerra , que nella habitao , fem por ijjb Sua Magejlade Jic ar obriga* do a lhe pagar nada de fua Real Fazenda y e nao defe- . rindo a i/lo, torno a quebrar a minha palavra , ficando elle na Fortificação , e eu fazer o que for fervido •■$ e iflo fera f 7 r ^ Y*< 174 Annaes Hiftoricos •Mi Anno 1615. fera hoje quarta feira. ^ ^Alexandre de Moura. ~ 396 É/ioy por el acima declarado por elSeíior Ge- neral ^ilexandro de Moura. En el Fuerte de el Sardi- fia, 5 de Noviembre de l6i$. ZZ Ravardiere. ZZ j>97 No ultimo Tratado , que tinha concluído com Ravardiere o Capitão mor Jeronymo de Albuquerque, fe obrigava eíle a lhe pagar toda a artilharia , que dei- xaíTe nos Fortes $ mas o General Alexandre de Moura y para revogar tal condição , fabendo aproveitarfe daquel- las ventagens , que corluma tirar em femelhantes cafos o poder dominante , o confeguio com felicidade. 398 Na meíma tarde deíle dia ordenou ao Capitão Henrique A ífonfo , que com a fua Companhia , que fe compunha de cento e fetenta homens , defembarcando no mais viílnho porto da Fortaleza, a occupaíTe logo j mas obfervando bem a rigorofa difciplina j que era ne* ceíTaria $ que elle feguia a fua popa , o que fez promp- tamente , aífiftido do Almirante da Armada Diogo de Campos , do Provedor da Fazenda Real , e do Gene- ral Ravardiere , com outras peíToas dediftinçaõj po- rém mal informado , de que na mefma Fortificação fe occultavaõ cavilofamente algumas minas atacadas , foy navegando para ella muito a remo froxo 5 até que avi- fado da falfidade deíla noticia , a achou guarnecida pe- lo Capitão Henrique Affbnfo 5 e o Senhor de la Ravar- diere dandolhe logo a poíTe na forma do Tratado , a re- cebeo elle das fuás mãos , acompanhado já de Jerony- mo de Albuquerque. " 399 O feu governo interino encarregou aò Almi- rante Diogo de Campos com a guarnição da mefma Companhia de Henrique AíFonfo j e recolhendo-fe à Armada, ponderou bem , como prudente Capitão , os perigofos accidentes da guerra , que taõ bem foube pre- venir Jeronymo de Albuquerque , confervando o feu corpo em toda a boa ordem da difciplina. ••--.. Era . m do Eftaâo do Maranhão, JLiv. V. 17.Í 400 Era hum dos princípaes Artigos das Capitula- Anno 1615. ções eftipuladas entre os Gcneraes Jeronymo de Albu- querque , e o Senhor de la Ravardiere , que ficaria li- vre a retirada a todos os Francezes , para o que fe lhes forneceriaõ das fuás mefmas embarcações as que pare- ceííem neceíTarias para o tranfporte ;\e em obfervancia defte rneímo acordo , paíTaraÕ logo em três navios para a fua pátria mais de quatrocentos , ficando alguns no Maranhão , que fe achavaÕ cafados com índias da ter- ra. 401 Os Religiofos de Santo António Frey Cofme de S. DamiaÔ, e Frey Manoel da Piedade, que acom- panharão a Jeronymo de Albuquerque na fua expedi- ção , vendo que na cultura de numa taÕ vafta vinha po- diaÕ empregar todas as fadigas dos feus efpiritos Apos- tólicos, com grande fruto delias, na reducçaõ de tan- tas almas , entrarão logo neíle catholico exercicio com novos créditos das fuás virtudes 5 e foraõ os primeiros Portuguezes , que em fórma Regular fe eílabelecerap naquella Conquifta , recolhendo-fe no Conventinho _ t que largarão os Padres Capuchinhos Francezes , que ainda que eílava muito nos feus principios , ( como já deixo referido ) mereceo com tudo o nome de primeiro. 402 Parlados poucos dias nomeou Alexandre de Moura a Jeronymo de Albuquerque por Capitão mor da Conquifta do Maranhão , que lhe tocava como pró- pria ; e ao mefmo tempo a Francifco Caldeira de Caí- tello-Branco com igual Patente para o defcobrimento ■do Graõ Pará , famofo rio das Amazonas , de que tinha já baftantes noticias pelas informações de Ravardiere. 405 Para.efta nova expedição , e progreífos delia , deu logo todas as providencias , que lhe parecerão ne- ceíTarias j e ajudadas muito da adividade do feu Com» mandante , fe fez eíle à vela da mefma bahia do Mara- nhão , avançado já o mez de Novembro com a força de 176 Annaes Hifioricos !í; i«"«, ri • Rii ll,i .. ii Anno iói^ de duzentos Soldados , e mais petrechos , que corref- pondiaó a huma tal empreza , a bordo tudo de hum pa- taxo , hum caravelaÔ , e huma lancha grande , de que eraõ Capitães Pedro de Freitas , Álvaro Neto , e Antó- nio da Fonfeca. 404 Encaminhando as fuás proas no mefmo rumo do proje&o , entrou a arrifcada barra de Seperará , que he hoje a da Cidade de Belém , fem o menor perigo $ e cofteando aterra com igual fortuna-, a tomou também varias vezes , tanto a pezar da oppofiçaõ de muitos Ta- puyas feus habitadores , que fahio fempre de todos os encontros com grandes ventagens. ■ 405 O primeiro homem , que pizou a praya neíle defcobrimento ? foy António de Deos , que fubio de- pois a differentes empregos j e continuando Francifco Caldeira a mefma derrota por hum largo rio com pou- cos dias de viagem, efcolheo o íitio , que lhe pareceo mais conveniente para Praça de Armas da fua Conquis- ta , a que chamou logo Graô Pará , nome também das Amazonas, por fe perfuadir com diículpavel erro, a que era já a terra firme deíle competidor do Oceano \ quando a grande bahia , com que fe enganava , fe for- ma fó verdadeiramente das bocas do Mojú , Acará , e Guamá, rios caudaloíbs , como já fica referido. 406 Sem a menor oppoíiçaõ defembarcou as fuás Tropas em 3 de Dezembro , dia dedicado à feftividade de S. Francifco Xavier , Apoftolo da Índia Oriental 5 e vendo-fe em outras índias eíle Commandante , aííiílidas também de Portuguezes , e conquiftadas com o feu fan- gue , tratando já o accidente como myfteriofo vaticínio, collocou logo a fua Imagem naquelle lugar , que ava- liou a devoção por menos indecente em tao eílreita con- . jun&ura. 407 Era efle fitio ( que cbamarey já o Graõ Pará ) antigo domicilio de índios bellicofos ,, com a povoação de 1 . 'a » do Eflado do Mararihafi., Liv. V* i?7 de muitas Aldeãs ; porem a fortuna de Francifco Cal- Anno 1615. deira fe declarava tanto a feu favor , que naô fó lhe of- fereceraõ a paz , que nao poderia confeguir fem a força das armas ; mas também pelos bons officios deites mea- mos bárbaros reduzio logo à fua amifade todos os mais daquellas vifinhanças. 408 Na diit anciã de fete , ou oito léguas tinha ellet deixado huma apraíiveí Ilha, chamada do Sol, que era o íitio por todos os princípios mais accommodado para a fua conquiíta , e povoação j mas namorado deite ; que occupava com taõ errada efcolha , fe aproveitou bem da reputação em que fe via , para fegurar nelle á fua fubíiítencia ; porque ajudado de hum copiofo nu- mero de índios levantou logo terra para fortificarfe i£ fendo taõ poderofa a fua a&ividade no trabalho da obra,' que dentro era poucos dias já fe lhe dava o nome de For- taleza , ultima memoria deita expediçao^na-rigoroía or- dem da chronologia. / 4 9 Defejava Alexandre de Moura com fervorofo' zelo a confervaçaÕ do Maranhão y e para melhor fegu-! ralla , logo que defpedio o Capitão mor Francifco Cal- deira para o defcobrimento do Graõ Pará , regulou bem todas as mais medidas 5 porque encarregou a Fortaleza de S. Luiz a Ambroílo Soares com a guarnição de cem Soldados : o Forte da Ilha de S. Francifco com cinco- cnta a Álvaro da Camera 5 e com o mefmo numero o de S. Jofeph de Itapary a António de Albuquerque ; todos com as Patentes de Capitães , e o primeiro afíiiti* do do Alferes Domingos da Corta Machado s a Baltha- far Alvares Peítana nomeou também Sargento mor : a Salvador de Mello Capitão do mar : do deítri&o do Cu- má a Martim Soares Moreno com vinte e cinco Sol- dados : das entradas a Bento Maciel Parente : e Ou- vidor , e Auditor Geral a Luiz de Madureira ; acer- tadas acções com que deu fim às do prefente anno. 1 Na <í, *■*» .■li ! 178 ; Annaes Hifioricos Anno 1616. 410 Na nova fucceíTaõ de 16 16 fe achava já prom- pto eíle Commandante para fe retirar com a fua Arma- da ; e defpachando logo para Portugal a Jeronymo Fra- goíb de Albuquerque com as individuaes noticias do que tinha obrado na Conquiíla do Maranhão , em 9 de Ja- neiro fe fez à vela para Parnambuco , tao mimofo ainda da fortuna , -.que fem fentir nella a menor mudança , def- embarcou em 5 de Março na Povoação de Olinda , af- fiílido do Senhor de la Ravardiere , que nao fó achou naquella Capital todas as attenções., que correfpondiaõ ao feu merecimento , mas também por empreftimo o dinheiro , que lhe foy neceífario 5 e paífando a Lisboa com dependências , que alli o detiveraõ perto de dous annos , lhe confignou a grandeza de EIRey dous mil reis cada dia por ajuda de cufto , que na economia da- quelle tempo inculcava bem a qualidade da peífoa. \ 411 Logo que o General Alexandre de Moura fa- hio da bahia do Maranhão , applicou Jeronymo de Al- buquerque o principal cuidado à útil fundação de huma Cidade naquelle mefmo íltio , obra de que também fe achava encarregado por difpofiçôes da Corte de Madrid com repetidas honras juftrffimamente merecidas : e co- mo o feu zelo ? e a fua a&ividade nao foffriaÕ demoras na execução de qualquer proje&o , depois de bem preme- ditados os intereífes delle , dentro de pouco tempo adi- antou tanto a Povoação , que reduzida a regular for- ma de Republica , de baixo da protecção foberana de Maria SantiíTima com o auguílo titulo da Vi&oria , que já lhe tinha decretado no feliz lugar de Guaxenduba , lhe declarou a invocação de S. Luiz 5 ou foíFe porque eílando taõ conhecida já aquella Ilha pela natural parti- cipação da fua Fortaleza , fe naô atreveo a confundir- • lhe o nome com a mudança delle ; ou porque quiz na confervaçaò deíla mefma memoria fegurar melhor a fua nas recommendações da pofteridade j e como defles dias ta do Eflado do Maranhão , Liv. V> 1 79 dias por diante acho fempre a invocação de S. Filippe Anno 1616, na tal Fortaleza , me perfuado fundamentalmente , a que lhe foy pofta em lugar da primeira , dando-fe defde logo por transferida , por lifonja fem duvida à Magefta- de de Filippe III. de Caftella , a quem entaõ obedecia a Monarquia de Portugal. 412 Aos Padres Frey Cofme da AnnunciaçaÕ , e Frey André da Natividade , Religiofos ambos de Nof- fa Senhora do monte do Carmo , da Vigairaria do Eíla- do do Braííl , que acompanharão a Alexandre de Mou* ra por Capellães da Armada , concedeo elle para a Fun- dação de hum Convento a pequena Ilha do Medo ( cha- v mada vulgarmente do Boqueirão ) muito vifmha da de S. Luiz j e neíla duas léguas de terra , com fitio tam- bém para a mefma obra no mais eminente da já deíTe- nhada Povoação y tudo por portaria de 12 de Dezem- bro do anno paíTado ; mas como na preíTa com que fe recolheo a Parnambuco /parece que nao coube a expe- dição da Carta de data , lha paíTou Jeronymo de Albu- querque no dia 20 de Fevereiro deite prefente anno $ 6 com eífeito os taes Religiofos deraõ logo principio à fua Fundação , que de Portuguezes foy a primeira na- quella Conquiíla j onde continuando com virtuofo ex- emplo , fizeraõ muito fruto entre tantos bárbaros. 413 Também affiíliraõ a Alexandre de Moura na fua expedição os Padres Benedido Amadeo , Lopo de Couto , com outro que nao era Sacerdote , e Superior de todos Luiz Figueira , Religiofos da Companhia de Jefus, que ainda naõ tratando da fua fubííílencia na- quella Ilha 7 paífaraõ brevemente a huma grande Aldeã de Tapuyas , íituada nas margens do rio Mony , onde empregarão bem a fua vocação na doutrina Apoíloíica. 414 Com eftes bons Soldados da milicia Celeíle ) e outros da terrena,, nao menos valerofos para empre- gos delia , cada dia adiantava mais os feus progreííòs , Zii af- m íSa ■ Annaes Wftoricos w*. Amoiáiú, affimefpirituacs., como temporaes o Capitão mor Jero- nymo de Albuquerque ; porém como a gentilidade era copiofa, naÕ queria ainda focegarfe a mayor parte dos Topinambazes ', até que vendo elles , que da fua barba- ra obftinaçaõ tiravaô fempre fó a própria ruina , atalha- rão a ultima a que caminhavaõ , ofFerecendo a Jerony- rno de Albuquerque a fua fugeiçaÕ , com apparentes demonílrações da mais voluntária ; e como eflastaõ do- meílicas perturbações neceíFariamenne dividiaõ o feu grande cuidado , vendo-o todo unido , o occupou bem em eftabelecer na nova Republica a mais virtuofa regu- laridade 5 bufcandolhc também ao mefmo tempo , para deixalla mais ennobrecida , as riquezas do Mundo. 41 £ Era grande a fama das preciofidades do Mara- nhão 5 e entendendo elle , que no feu fufpirado defco- brimento fe intereíTava muito a utilidade .publica, e fer-* viço do Príncipe , mandou a eíle fim o Capitão Bento Maciel Parente ao rio Pindaré , onde fe fuppunhaõ os .principaes thefouros , com a força de quarenta e cinco Soldados , e noventa índios ; porém tendo fahido da Cidade de S. Luiz no dia n de Fevereiro, fereeolheo depois de alguns mezes , fem tirar outro fruto do feu muito trabalho, que o de fazer guerra aos bárbaros Ta- puyas Guajajaras com fatal eílrago da fua Naçaõ , que na mayor parte reduzida ao grémio da Igreja no gover- no de Francifco Coelho de Carvalho , fe conferva hoje emhuma boa Aldeã, da adminiítraçaõ particular dos Religiofos da Companhia de Jefus. 416 Nefte mefmo tempo fentia já o Capitão mor. huma total falta de munições de guerra 5 e tomando a refoluçaÕ de as mandar pedir ao Governador do Eirado doBrafil, encarregou a diligencia com acertada efco- lha ao Sargento mor Balthafar Alvares Peftaná , çom a efcolta de vinte Soldados , e perto de cem índios -5 mas como foraõ eíles Portuguezes os primeiros homens bran* COS; do EJlado do Maranhão , Liv. V. 1 8 1 cos , que penetrarão aquelles vaftiííimos Certoes , quan- Anno 1616Í do chegarão a Parnambuco , tinhao confumido cinco mezes de contínuos trabalhos, que pela dilação fe fariao' ainda mais penofos ao cuidado de Jeronymo de Albu- querque , fèjá fenaÕ achaflè foccorrido das providen*' cias de Gafpar de Soufa , fem outra alguma íupplica , que a do feu grande zelo , ultima memoria da Capita- nia do Maranhão nas do prefente anno. 417 Com os últimos dias do paíTado, deixey no- Graõ Pará ao feu Capitão mor Francifco Caldeira já fortificado para a oppofiçaô de innumeravel gentilifmo de taõ vaftos Certoes , aonde então fó fe encaminha- vaô os principaes receyos j mas como vivia, em huma continua operação o feu grande efpirito , bufcando fem^ pre por alivio de qualquer trabalho as fadigas de outro ■+ ' entrou logo nas da Fundação de huma Cidade , a que promptamente deu principio , e reduzio a forma de Re« publica , com a celeílial invocação de Nóífa Senhora de Belém , e gloriofo titulo de Cabeça da feliz Luíi-; tania. ' : . . 418 Communicou entaô por terra a Jeronymo de Albuquerque o ditofo fucceffo da fua' expedição .:,'■ de que também deu conta ao Governador Gafpar de Sou- fa ; e encarregando a diligencia de conduzir as Cartas ao Maranhão com huma.eícõlta de poucos Soldados ao conhecido preftimo do Alferes Pedro/Teixeira , defem-r penhou bem eíte Official a confiança , que fe fazia deli e 5 porque fabendo no íitio do Cayté , que Os muitos Ta- puyas feus habitadores d aleivofamente lhe difpunhaÒ a morte , depois de o falvar.de taõ fatal perigo a conftan-» cia do animo , os reduzio todos à obediência da Coroa de Portugal ; e em nome delia tomando logo poffe da- quelle deftrido , que fica com pouca diifferençaiiomeyo da jornada , como já deixo referido ,. a continuou até a Cidade de S. Luiz com geral aífombro dos feus mora- dores . 182 Annaes Hiftoricos rtí -j ., i ii nRin vk ãmoi6i6. dores , por fer elle o primeiro homem ? quecomnoti- cia fua tinha pizado aquellas terras ; e defpachado cui- dadofamente pelo Capitão mor com o foccorro de algu- ma artilharia , munições de guerra , e pagamento para ©s Soldados , ( a bordo tudo de huma lancha grande ) fe reftituío à Cidade de Belém do Pará com profpera viagem. 419 Com o meímo titulo - com que occupavao os piratas Francezes pela parte do Sul a chamada Ilha do Maranhão , e toda a fua Coita , fe introduzirão pela do Norte algumas Nações delle no verdadeiro rio defte nome , ( conhecido mais pelo de Amazonas ) aíTentan- do em varias Ilhas da fua grande boca muitas Feitorias de diferentes géneros , que fe amparavaÕ de algumas cafas fortes com baftante defenfa . afTim pela força da fua guarnição , como pela da fabrica 3 e como flcavaÕ eftes inimigos tanto na vifinhança da nova Cidade de Belém, o Capitão mór Francifco Caldeira principiava a viver cuídadofo na fua oppofiçaõ , e confervaçaÕ pró- pria j mas era tamanho o defafogo do feu animo . que naõ embaraçavaõ huns taes accidentes o adiantamento da fua obra ; porque fe via cada dia com muitas venta- gens na commodidade dos edifícios , e governo politi- co. 420 Nefte eílado fe achava aquelle Commandante . quando no dia 7 do mez de Agofto lhe chegou à noti- cia , de que quarenta léguas à cofta do mar eftava furto hum navio de Hollanda com a lancha fora . que diligen- temente procurava a communicaçaõ dos índios aldea- dos j e ao mefmo tempo teve também vários avifos . que confirmava a repetição delles . de que no rio Curu- pá ( que he hum dos que defagoaõ na grande boca do das Amazonas ) bordejavaÕ outras embarcações de ma* yor força da mefma Nação > efpalhando vozes , de que naquelle íltio efperavaõ huma groíía Armada , expedida dos 11 111, do EJiado do Maranhão , Liv. V. 1 8 j dos Eftados Geraes , com o projecto de eftabelecer nelle Anno 1616. huma nova Colónia. 421 Com a publicidade de ílas noticias cuidarão lo- go muitos , que aquelle navio era já hum dos da fua conferva ; e inítigado Francifco Caldeira dos ardentes eftimulos do feu eípirito , defejou dar delle as mais fe- guras provas na peíToal difputa de taõ defiguaes forças ; mas ponderando com maduro confelho, que defattendia culpavelmente os mais eílreitos vínculos da fua obriga- ção , fe defamparava a Fortaleza ; fugeitando-fe , como Varão prudente, aos documentos daboa difciplina, or- denou logo aos Alferes Pedro Teixeira , e Gafpar de Frei- tas de Macedo, que em duas canoas armadas em guer- ra , com a guarnição de vinte Soldados , reconheceíTem atai embarcação, e de baixo de qualquer perigo a abor- da/Tem. 422 Eraõ vaíerofos ambos os Commandantes ; é tratando já como deíèmpenho da fua honra a occaíiao a que ella mefma os conduzia , foy tanta a força , que pozeraõ nos remos , e rlzeraõ de vela , que na noite lo* go do dia 9 fe meterão de baixo das baterias inimigas , com hum tal defprezo de chuveiros de balas , que quan- do os Hollandezes fe coníideravaõ fó acomettidos , fe viraô entrados 5 mas recobrando-fe do primeiro fufto , empenharão de forte toda a fua conílancia na oppoíi- çaÕ da fúria dos golpes , que já corria o fangue pelos embornaes de hum , e outro bordos Alguns dos Portu- guezes tinhaÔ também feito o facriflcio ultimo no altar da fama , eternizando a vida na fua mefma perda : qua- íi todos os mais fe viaõ cheyos de feridas , em que en« trava o Alferes Pedro Teixeira com três perigofas 5 po- rém como o fangue , que derramavaõ fe lhes convertia em novos alentos , com igual ardor durava o combate , que nós já fuftentava-mos fó pela gloria do triunfo , quando os inimigos pelos intereíTes da defenfa própria, Nef- 1 xU , Ãnnaes Hifloricos m Ániio 1616. 42 j Neíle mefmo eftado fe tinha confumido muita parte da noite 5 e confiderando já os deftemidos Portu- guezes , que os inimigos nao poderiaõ fer vencidos no mar fó aos golpes do ferro , (parece que fup pondo -os metaforicamente filhos de Neptuno ) fe valerão tam- bem dos inílrumentos de Vulcano ., applicando o fogo por muitas partes do navio ; porém atalhado varias ve- zes com tanto arroj amento , como fortuna , crefcen- do o furor com a porfia da difputa , fe fez ainda mais> fanguinolenta , até que cedendo hum elemento a outro mais a£Hvo,fe via já arder a embarcação nas mais vi- vas chammas > quando fe retirarão os vkoriofos às fuás canoas j mas confervando fempre aífim o valor , como adifciplina na oppofiçaò dos últimos esforços da defef- peraçaÔ dos Hollandezes. 424 Alguns deites , vendofe acomettidos da vorací-i dade do incêndio , bufcavaõ ainda a falvaçaõ das vidas no refrigério da agua 5 porém fendo amefma que ha- via poucas horas os fuítentava, os recebia como tumu- lo, que naõcoílumao contar diftancias (fallando no fentido catholico ) os accidentes do deftino : os mais fe- gurando bera na fua conílancia a mais honrofa pyra , me- lhorarão muito de fepultura. ,425 Confumio o fogo toda aquella porção , que lhe eftava fugeita , obfervando fempre os vencedores as la- varedas , que fahiaõ delle f como luminárias da fua vi- toria j e chegando ao domínio da agua , tragou em hum inílante a que lhe pertencia. 426 SinalaraÕ-fe na peleja os dous Commandantes, o Ajudante Pedro do Couto Cardofo , o Alferes Joaõ Félix , o Sargento Mathias de Almeida , que fahio maí ferido ; da mefma forte Manoel Martins Maciel , que ganhou também huma roqueira no tempo do ataque 5 e António Soares Saraiva , que fe chegava tanto ao fogo, que ficou com o braço efquerdo todo queimado. Só. do E/lado do Maranhão , Liv. V. 1 8 J 427 Só com o defpojo de hum rapaz Trombeta , ãnno 1616» que bufcando no mar a Tua fepultura , achou nelle a vi- da , fe recolherão os dous Commandantes à Cidade de Eelem do Pará \ onde celebrou o Capitão mor Francif- co Caldeira a felicidade do fucceílb com as demonftra- ções , que elle merecia por tantas circunílancias ; mas foy fem duvida das mais efpeciaes para a ília gloria a da efcolha dos Cabos ; e como o Alferes Pedro Tei- xeira fez a obfervaçaõ , de que o lugar , em que o navio fe meteo a pique , tinha pouco fundo , logo que melho- rou das fuás feridas , fe lhe tirou pela fua induílria toda a artilharia , para que também lhe fícaíTe devendo hum taõ útil reforço a defenfa da Capitania. ) 428 Sem outra memoria, que merecidamente fe nos recommende , entrou o novo anno de 1617 , e nos ^ bimo l ^7' princípios delle vivia ainda o Capitão mor Jeronymo de Albuquerque na Cidade de S. Luiz do Maranhão com grande focego ; mas como eíle fe fegurava fó no da-, quelles Tapuyas , principalmente Topinambazes , ake- rando-o hum forte accidente , fe perturbou tudo de tal modo , que para haver de reíiítirlhe , neceífitou bem de todo o defafogo do feu animo. 429 Eraõ eíles índios , pela tradição das fuás memo- rias , oriundos do Eítado do Brafil, e muita parte delles fe achava fituada em o deferido doCumá, pouco diftan- te do Maranhão , com Aldeãs muito populofas , gover- nadas por Mathias de Albuquerque com a Patente já de Capitão de Infantaria , na íucceíTao de Martim Soares Moreno, promovido para a fua antiga Capitania do Sea* ia j mas exercitando-fe naquelle emprego havia mais de hum anno , com grandes intereíles dos mefmos índios ? ainda vacilavaõ na amifade dos Portuguezes , por fe lembrarem das fmiílras praticas dos feus primeiros hof- pedes. 43° .Procurou elle.reduzillos com fuavidade à me^ A a recida vTT 31 T! >H Xf* i?!il |í «I nif 18Ó Annaes Hifioricòs Ánno 1617. recida confiança , e o confeguio com grande fortuna , aíTiftido fem duvida de fuperiores influencias ; porque mandando levantar algumas Igrejas com a decência , que lhe foy poííivel , parece que logo penetrados da verdade catholica , naõ fó publicamente reconheciaõ as conveniências , que tinhaõ grangeado na mudança dafua fugeiçaõ, mas também fe inciinavao com taes demonílraçÕes ao culto divino , que cada dia davaõ mayores efperanças da fua chriílandade , até vivendo taõ conformes , que fe empregava© todos na cultura do campo com huma geral utilidade , por fer eíla recipro- ca aos moradores de S. Luiz, por meyo dos refgates com que concorriaõ com muita frequência. 451 A eíle eftado tinha o Capitão Mathias de Al- buquerque reduzido os feus fubditos j e parecendolhe , por huns fundamentos tao regulares , que já os naõ ha- via para recear a fua inconítancia , principalmente quan- do a fubjugava com hum prefidio de trinta Soldados to- dos de bom nome, paíTou à Cidade de S. Luiz, chama- do de feu pay para negócios importantes ; mas appare- cendo naquelle mefmo fitio , logo depois da fua aufen- cia , huns índios do Pará , também Topinambazes , átf- pachados por Francifco Caldeira com Cartas para Jero- nymo de Albuquerque ; hum muy induftriofo das mef- mas Aldeãs do Cumá , que fe chamava Amaro , ( criado com os Padres da Companhia de Jefus nas partes do Brafil , e muito apaixonado pelos Francezes ) tomou , e abrio as Cartas , e fingindo que as fabia ler, aífeverou diante dos Principaes ; Que o ajfumpto delias fe reduzia, a que todos os Topinambazes Jcaffem e [cravos j execução, que tardaria jó em quanto fe naã entregajfem ao Capitão mor. O quefuppojlo , vjjfem elles o que determinava^ , fe nao queriaô concorrer para a defgraça ultima dafua Na- çaõ , quando parafugirlhe tinhao def amparado nas terras do Brafil os domicílios de que erao fenhores , com afuc- , ceflati do EJiaâo do Maranhão , Liv. V. 187 ceffao de tantas idades , híjujiiffimamente perfeguidos da Annoi6i7. mefma tyrannia Portugueza. 432 Foy taõ diabólica eíla fuggeílaõ, que pene- trando logo a brutalidade de tantos bárbaros , aífenta- raõ uniformemente , em que fe mataíTem todos os bran- cos, que lhes aííiftiaõ de prefidio ; e com o mefmo im- pulfo da reíòluçaõ a executarão naquella noite, deixan* do fepultadas para fempre no feu fatal letargo as inno- centes vidas , que na fé íbcegada de huma confiança taõ* mal merecida , defcançavaõ íèm o menor receyo 5 mas naõ parou aqui taõ horrorofa maquina , porque correo tanto mais adiante , que formarão também o novo pro* jecto de paíTar a Tapuytapera , para que interefíadas na íublevaçaõ as fuás Aldeãs , entaõ fe tranfportarem à mefma Ilha do Maranhão j donde já unidos a todos os Parentes Topinambazes feus habitadores , feguramente furprenderiao a Cidade de S. Luiz , que reduzida a cin* zas ficaria extin&o por aquella parte o nome Portui guez. 45 } Parecerão fem duvida fobrenaturaes todas eftas medidas na barbara rudeza daquelles Tapuyas ; porém permittio a alta Providencia , que ficaíTem elles caftiga* dos ; porque bufcando logo muito bem armados o íeu Capitão Mathias de Albuquerque , que efperavaÕ to- dos os inftantes , por mais que o encontrarão no mefmo lugar de Tapuytapera com poucos Soldados já de via- gem para a outra banda do Cumá , totalmente alheyo de huma traição taõ abominável , revelandolha hum dos mefmos índios comprehendidos nella , taõ pouco fe dei-; xou fuíFocar de hum tal accidente o valerofo animo de que fe compunha, que atacado de tantos inimigos, naõ fó os obrigou a retroceder com vergonhofa fuga , mas também foccorrido promptamente do pay com as noti- cias da vitoria : como fe achou com cincoenta Solda- dos , que governava o Capitão Manoel Pires , Official Aaii dó '!' ii 188 , Annaes Hijloricos A1H101617. de muita diílinçaõ, e duzentos índios dos de melhor nome , feguio o alcance dos mefmos Tapuyas pela dif- tancia de cincoenta léguas , com hum nobre defprezo das afperezas dos caminhos. 454 Porém aquelles bárbaros , que conhecia õ bem a qualidade do terreno , a que o tinhaõ levado , fabendo então aproveitarfe delia , fe via já acomettido das fuás embofcadas com deíacoflumada difciplina , aprendida toda nas experiências próprias do feu fatal eítrago $ quan* do querendo dar algum breve defcanço às fatigadas Tro- pas , para melhor fegurar na reftituiçaõ das forças natu- raes a felicidade da empreza , a que os conduzia o íeu grande valor, fe fortificou fobre a mefma marcha , le- vantando a toda a diligencia huma trincheira de fachina; mas como os inimigos , por efta acção taÕ militar erra- damente difcorrendo que já osrefpeitava, o atacarão com muito mayor arrojamento ; para caftigallo Mathias de Albuquerque , como novo delido , tomou a genero- fa refoluçaõ de fe pôr na Campanha j e naõ neceffitando de provocar os feus Soldados para os esforços do com- bate, (a que também fe convidavaõ , como juíla vingan- ça das aleivofas mortes dos feus amigos , e parentes) en- trou logo nelle com taÕ valentes golpes , que a pezar da mais defeíperada oppoíiçao, fe acharão fem emprego dentro de poucas horas , íèndo a mayor parte de tantas vi- das defpojo da vitoria , que celebrou em 5 de Fevereiro. 43 5 O Capitão Manoel Pires fe íinalou bem nefta occafiaõ ; mas o feu Commandante com muitas venta- gens , porque tirou delia taÕ honrofos créditos de vale- rofo , como de Soldado , no militar acordo com que me- teo os feus nos mayores perigos ; e he laftima fem duvi- da , que merecendo todos as recommendações da poíle* ridade , me falta para ellas a memoria dos nomes. 456 Bem quizera Mathias de Albuquerque exerci^ tar mais o feu guerreiro efpirito y naõ fó eítimulado dos natu- f T! ,1 do Eílado do Maranhão , Liv. K 189 naturaes impulfos , mas também da vingança , por lhe Anno 1Ó17; parecer leve , a que tinha tomado naquelles bárbaros ^ quando a regulava pelas juílas medidas de taÕ enorme culpa j porém embaraçado das difpoííções do feu regi- mento , fe recolheo por mar ao Maranhão nas muitas canoas , que accrefcentaraõ o defpojo , fervindo agora para a commodidade do tranfporte , depois para o ap- parato do triunfo. 457 Gozou bem da felicidade do fucceíTò a Capi- tania do Maranhão j porém como os vencidos logo que executarão o bárbaro proje&o da fua aleivofia , ufanos da acçaõ , a participarão por ligeiros avifos aos Paren- tes , fentiria hum fatal contratempo o coração de Fran- cifco Caldeira , fe naÕ foífe mayor o feu valor , que os accidentes da fortuna ; porque os Topinamhazes deita Capitania também communicando com igual diligencia tamanha novidade a todas as Aldeãs da fua Naçaõ , fe foblevaraô em hum mefmo dia as que ficavaÔ mais na vifinhança da Cidade ; mas informado logo de tudo o Capitão mór , foube ufar de forte da fua adividade ? e defafogo , que ordenou promptamente ao Sargento mói.' daquella Conquifta Diogo Botelho da Vide , ( natural da Villa de Figueiró dos Vinhos , na Província da Bei- ra ) que com os Capitães de Infantaria Álvaro Neto , e Gafpar de Freitas de Macedo (já promovido a eíle pof- to depois do combate naval do anno paíTado ) bufcaífe aquelles bárbaros , para que , primeiro que o contagio mortal das fuás praticas , contaminaíTe os ânimos de to* dos os mais da noífa obediência , lhes ferviíTem de effL* caz remédio prefervativo as informações do feu eítrago, como merecida demonftraçaÓ da re&a juíliça. 43 8 Executou Diogo Botelho eíta militar ordem , e taõ inteiramente , que defcarregando os primeiros gol* pes na Aldeã do Cujú ( que além de fer huma áds mais populofas dos mefmos índios , eílava fornecida de to- das y+T+e** iV •• .■"'■ Ti\ , 4? 7, Ipo Annaes Hijloricos ) Afino 1617. das as outras , como efcolhida Praça de Armas para a oppofiçaò dos noíTos progreíTos ) a efcalou com huma tal braveza , que dentro em poucas horas fe naÕ viaõ já nella mais que ruinas , e cadáveres ; a que fô deixavaõ de fazer companhia os que fe fouberaô aproveitar do re- médio da fuga 5 mas como depois de reduzir tudo a hor- rorofas cinzas , paflando à Aldeã de Mortigura , achou nella a certeza , de que o terror em que tinha poílo os inimigos , os iuranhara na aípereza dos matos , por onde já naõ podia feguillos , deílacou para o Certaõ do Igua- pé ao Capitão Gafpar de Freitas com huma partida de dezafete Soldados , e muito mayor numero de índios de guerra , e fe recolheo à Praça do Pará com todas as mais torças da fua expedição. ; 439 Chegou Gafpar de Freitas às vifmhanças do Iguapé 5 e fabendo logo que tinhaõ padecido aleivofa-* mente todos os Soldados do Pará, que lá andavaÕ ref* gatando farinhas para a guarnição da Fortaleza , man* dou também arcabuziar na primeira Aldeã dous Topi- nambazes , menfageiros da nova do levantamento da fua NaçaÕ 5 mas continuando a mefma marcha , achou já com as armas nas mãos todos aquelles índios. 440 Intentou elle retirarfe por falta de forças ; po- rém já a tempo que fe via cercado da multidão dos bár- baros , quando para bufcar alguma fahida pela parte do mar , que lhe ficava fendo menos perigofa , lhe faltava também embarcação; mas a fidelidade de hum deftemi- do índio, dos que o acompanhavaÕ, que fabia bem on- de fe achava furta huma lancha grande, em que tinhaõ Jiido aquelles Soldados , que traidoramente padecerão , lha conduzio depois de três dias até a vifinhança do meA mo fitio , que fuílentava ainda a fua conftancia na oppo- íiçaõ de tantos inimigos ; e rompendo entaô por todos elles , fe meteo a feu bordo com refoluçaÕ taõ valerofa , que atacado logo pelos esforços últimos da fua fereza , n - * pa- 11 W do EJlado do Maranhão , Liv. V. 1 9 1 pagarão muitos o feu arrojamento com a perda das vidas. Anuo 1617. 441 Com tudo , paíTados poucos dias , mal convale- eidos os Topinambazes do primeiro terror com a retira- da do Capitão Gafpar de Freitas > fe atreverão de novo a formar corpo das mayores forças da fua Naçaô, emais alliadas no rio Guamá , em hum fitio muito accommo- do para a fua defenfa 7 pouco diftante da mefma Cidade de Belém , que para a natural confervaçaÕ raras vezes faltou a difeiplina ainda às mefmas feras : mas Francif- co Caldeira , que conhecia bem o grande damno , que fe feguia à Capitania da vifmhança daquelles bárbaros , para embaraçar a fua união , ordenou logo ao Alferes Francifco de Medina , que com vinte Soldados efeolhi- dos os atacaíTe no mefmo Quartel. 442 EraÕ pequenas forças para tamanha acçaõ 5 mas efte Official, que fe agradava fempre das mayores, aii> tentava já com deílemido animo ; quando acomettido de duas canoas dos mefmos inimigos , bem guarnecidas de gente de guerra , as abordou taõ valerofamente , que entradas à efpada , foraõ poucos os que fe falvarao dos feus pezados golpes , valendo-fe da terra , que tomarão a nado 5 e como a eíles , fazendo o caminho para o feu Quartel por dentro dos matos , lhes ficava taõ breve , como feguro , pelo cabal conhecimento que tinhaÕ dei- le , ao mefmo tempo que pelo rio naõ podia vencerfe em muitas horas 5 ponderando Francifco de Medina , que retirados , como fuecedeo , aquelles Tapuyas com o primeiro avifo , lhe deixavaõ innuteis todos os feus ef forços , fe recolheo para a Cidade do Pará com mais ef- ta vitoria , ultima memoria militar nas do prefente anno» 443 Edificados os Conquiftadores do Maranhão da virtuofa vida dos Padres Fr. Cofme de S. Damião , e Fr. Manoel da Piedade , Religiofos Capuchos da Provín- cia de Santo António , que acompanharão de Parnambu- co a Jeronymo de Albuquerque , como já fica referido , P e ** ynr * * > + 192 Annaes Hiíloricos Ànno 1617. pedirão à Corte de Madrid , que mandaíTe affiftir aquel- las Conquiftas de mais operários de taõ exemplar Or- dem: e attendendo o Rey a juíliflcaçaõ das fuás inftan- cias ? por feu Real Decreto chegarão à Cidade de Be- lém do Pará em 22 de Julho os Padres Fr. Chriftovaõ de S. Jofeph, Fr. Sebaíliaõ do Rofario , Fr. Filippe de S. Boaventura , e por feu CommiíTario ( ainda que os Ar- chivos do Senado da Camera erradamente lhe chamaõ Cuílodio) Fr. António da Marciana , na companhia de Manoel de Soufa de Eça 7 provido no emprego de Pro- vedor da Fazenda Real da Capitania , que a bordo de duas embarcações levava foccorros para ella ; e paga- mentos para os Soldados. 444 Eraõ poucos os Religiofos trabalhadores para taÔ grande vinha 5 porém de forças taõ agigantadas no zelo do efpirito , que principiarão logo a obrar com a virtude dos fagrados Apoílolos na converfaÕ daquelle gentilifmo j e para o feu decente recolhimento ? levan- tarão hum pequeno Hofpicio no fitio de Una , diílante meya légua da mefma Cidade- ^que na Capitania do Pa- rá foy a primeira Cafa Reiigiofa. ' 445 Neíle tempo tinha já fuccedido no governo ge- ral do Eílado do Brafil D. Luiz de Soufa , Fidalgo mui- to digno demayores lugares 5 epor nomeação fua foy provido em primeiro Vigário da Matriz de NoíTa Senho- ra da Graça da Cidade de Belém ( que eftava ainda den- tro da Fortaleza ) o Padre Manoel Figueira de Mendo- ça , que por recommendações do Governador Gafpar de Soufa fervia já o mefmo cargo com huma cabal fatif- façaõ de todos aquelles moradores na juíla attençaõ do feu virtuofo procedimento , e conhecida capacidade. 4? " ANNAES ?2* A N N A E S HISTÓRICOS DO ESTADO DO MARANHÃO. LIVRO VI SUMMARIO. ALE CE no Maranhão o feu primeiro Com (jujjiador , efuccedelhe na Capitania feu Jilha António de Albuquerque. Bento Maciel Pa+ rente pajfa a reedificar o Forte de S. Jofeph da Itapary , e fe encarrega do feu Governo. Pretende fo- ciedade no da Capitania com atrevido modo , e vay prezo para Parnambuco. Defiruiçao dos Topinambazes. A Infantaria do Pará feguida do povo depõem , e prende o feu primeiro Capitão mor Francifco Caldeira de Caf> tello-Branco , fubjlituindo no feu lugar a Balthafar Ro- drigues de Mello. Soe corridos os Topinambazes , intentai efcalar a Fortaleza do Pará. Succejfo (jue tiver ai. Sue* BU cede •r* |* M 194 Annaes Uiftoricos cede no Governo da Capitania do Maranhão Domingos da Cofia Machado j e na do Pará Jeronymo Fragojo de ^Albuquerque , que difpoem logo o novo cqjligo dos Topi- nambazes. Na mejma expedição morre de enfermidade. Succedelhe Mathias de ^Albuquerque , que he depojlo den- tro de vinte dias 5 efubjlituem o mefmo emprego os Capi- tÚesCufiodio Valente 7 e Pedro Teixeira com o Padre Fr. Antotiio da Merciana. Fica independente no Governo o Capitai Pedro Teixeira. Intenta occupallo Bento Ma- ciel; mas malogradas as fuás efper ancas , pajfa ao Mara- nhão , onde funda o Forte do Itapecurú. ^Aleivofia dos In* âtos Guayanazes da Capitania. No Governo da do Grão Pará fuccede Bento Maciel; e na do Maranhad António Moniz Barreiros. Chega de Lisboa Luiz Aranha de Vaf- concellos com a commijao de fondar o rio das Amazonas. Ojuccejfo delia. Sepàrafe o Governo das Capitanias dó Maranhão^ e Grão Pará do Geral do Brqfil com titulo de Fjlado. Os feus primeiros Governadores nomeados. Francijco Coelho de Carvalho pajfa ao Maranhão pela e/cala deParhainbuco , onde fica detido. O Padre Fr. ChriJloVao 1 de Lisboa , que o acompanhou de Portugal com o cargo de primeiro Cujlodio do Maranhão 1 , continua a fia viagem ate a Cidade de S. Luiz. Ofeu elogio. As equipagens de dous navios Hollandezes intentaô render o Prefidio do Seara. Perda que experimentarão 1 . Novos esforços da mefma Nação* com a mef ma fortuna. O Pa- dre Fr. Chriftovab' de Lisboa funda na Cidade de S. Luiz o Convento de Santa Margarida. Pajfa ao Pará , onde depois defe lhe impugnar huma Provifaâ , principia a Vi* fita Ecclefiajlica , de que também hia encarregado. Ex* pediçab 1 de Pedro Teixeira , eofuccejjb delia. ■■ v, ■ 5 . ■ ■■' . _.• 1 L sue 'Mm do Eflado. do Maranhão ,. Liv. VI. tf# ^ ^a i UCCEDEO oanno de ióiS , Anuo 1618. | e no fim de Janeiro entrou na; ! bahia da Cidade de S.Luizhu- rna embarcação de Parnambucos j com poucos foccorros para a I guarnição da Capitania , quan- ! do fe achava já com tanta falta delles , que até chegava a penetrar o confiante animo do feu Capitão mor , fem que baftaífe para confolar as luas afflicçóes o repetido gofto das vitorias no mereci- do açoute dos Topinambazes j mas antes eílas mefmas ; lhe ajudavaô mais o diílàborj porque reconhecendo a- muita honra, com que fahiaò delias todos os feus Solda* dos , fentia mortalmente vellos defattendidos. 447 Contava Jeronymo de Albuquerque a avança* > da idade de fetenta annos , dos quaes tinha empregado a principal parte em utilidade publica , e ferviço do Prín- cipe com tal fortuna , efpecialmente nas acções milita- res , que fendo muitas as em que o poz o feu grande va* lor, forao poucas as em que naÕ fahio vitoriofo ; mas confumido já de tantas fadigas , poderão tanto para a; fua ultima oppreffaÔ os prefentes cuidados , que em 11 de Fevereiro lhes rendeo a vida , depois de bem recom- mendada à immortalidade da memoria , pelo notório me- recimento das fuás virtudes ; e refplandecendo entre to- das ellas a da devoção à Virgem puriíFima , parece que difpoz a mefma May de Deos , que faleceífe no dia de Sabbado , de que he protectora , para deixar à piedade catholicahum claro teílemunho da fua eterna felicida- de. ,■•■"■■■!. 44S Experimentou a Capitania de S. Luiz o mais. pezado golpe na lamentável perda defte.feu primeiro Conquiftador , que muito tempo antes tinha accref- centado nos íinaes públicos, o Appellido de -Maranhão* Bb ii ao . 196 Annaes Hifioricos «Hjí Annoi6i8. aodafuaCafa; oufoíTe para credito da fua fineza na duração da vida , ou para melhor eterpizalla na lenv branca dos homens , a pezar dos fataes decretos da mefma natureza j e he fem duvida , que por todos os títulos fe fez tao fenfivel huma tamanha falta , que anaÕ fubílituilla a fua própria imagem na peflba de António de Albuquerque , feu filho primogénito , a quem deixa- va encarregado aquelle Governo , feria inconfolavel a jufta magoa. 449 Porém naõ duvidando da aceitação do novo Commandante no geral agrado daquelles moradores , para moftrar ainda o quanto fe achava fuperior às natu- raes paixões do animo , neíla ultima hora nomeou tam- bém para a fua affiftencia , no mefmo miniílerio em que lhe ficava fuccedendo , a Bento Maciel Parente , Capi- tão das Entradas , e Domingos da Goíla Machado , Ca- pitão Commandante da Fortaleza de S. Filippe , Offi- ciaes ambos , que fe tinhaõ feito merecedores de huma tal confiança j mas Bento Maciel , que entaõ conheceo bem , que a capacidade de António de Albuquerque naõ neceffitava da fua companhia , quando podia elle fazer mayor ferviço na reedificaçao do Forte de S. Jofeph de Itapary , íè encarregou logo defta obra ; e o Capitão Domingos da Colla iicou também fem exercício no em- prego de Adjunto. 4^0 Tomou António de Albuquerque as rédeas do Governo da Capitania , e fem mais affiftencia, que a do feu bom juizo , que principiando logo a defempenhar no exercício delle, fazia confeífar todos os inftantes até aos mefmos emulos , que o naõ preferirão para o empre- go os fobornos do fangue ; mas ainda que o Capitão Domingos daCofta fe accommodou bem a efta indepen- dência, Bento Maciel , que havia dias tinha fido o pri- meiro na fua approvaçaõ , já fe defagradava com impa- ciência, de que lhe naõ coubeíle alguma parte nosap- plaufos 1 , h iitPi do Eftado âo Maranhão , Liv. VI. 1 97 plaufos do povo $ queixas , que naõ ouvia , ou diffimu- Armo 1618. lava politicamente o novo Commandante ; até que en- tendendo o mefmo author delias , que dos últimos vómi- tos da ília cólera tiraria fem duvida a fociedade , que pretendia , chegou a declararlhe, que tudo o que obra- va fem o feu parecer , e o do Capitão Domingos da Coita , o reputava como nullo j e que continuando na mefma ifençaõ , lhe negaria a obediência ; porém elle , que nos floridos annos da ília idade era taÕ prudente , como valerofo , fabendo caftigar como fuperior tama- nha oufadia , o mandou prezo para a Fortaleza de S. Filippe , da qual depois de quatro mezes o remetteo para Parnambuco na companhia de Domingos da Coi- ta , que fe embarcava para aquella Conquifta , para paf- íàr delia a Portugal no requerimento do deípacho dos feus muitos ferviços. 45 1 Socegada eíla perturbação , attendia fó Antó- nio de Albuquerque às obrigações do feu minifterio ? quando recebeo apreíTados avifos , de que pelo rio Go- rupy caminhavaõ os índios Topinambazes do levanta- mento do Maranhão a unirfe com os feus nacionaes da Capitania do Pará ; e ainda que a marcha lhe ficava dif- tante , como regulando-a pelo coílume de todo o gen- tio , fabia bem que havia de fer muito vagarofa , tomou logo a refoluçao de os atacar nella , já com as efperan- ças , de que venceria toda a dificuldade a boa diligen- cia ; mayormente quando por acclamaçaõ univerfal a encarregou a feu irmaõ Mathias de Albuquerque , inte- reíTado por todos os principios na felicidade do fucceííb. 452 Deu logo António de Albuquerque todas as providencias , que julgou necefíarias a eíla expedição $ e no dia 24 de Agofto paíTou o Cammandante delia à terra firme de Tapuytapera com cincoenta Soldados , e feifcentos Tapuyas , oppoílos todos aos Topinamba- zes , e alliados da Capitania , pouco avultadas forças para I Annaes ttifioricos Anno 1618. para as formidáveis dos inimigos , porém muito robuf- tas pela qualidade ; porque os primeiros hiaõ empenha- dos nos adiantamentos da ília honra , e todos na vingan- ça j huns como merecida fatisfaçaÕ do bárbaro infulto do Cumá 1, ( que além da oiFenfa publica , a avaliava a fua juíla dor também como própria ) e os outros fó por ódio > que fundando-fe as mais das vezes em matérias taÕ leves, que fe devem tratar como ridículas , traz. quaíi fempre feparadas todas as Nações daquelle gentia lifmo , o que podemos attribuir às difpofiçoes da alta Providencia ; porque unidas ellas por aquella parte par ra a ruina da Chriílandade, .até ficaria, a confervacaõ moralmente impoífivel. 45 5 Fez a reviíla Mathias de Albuquerque de to- da a fua gente 5 e como a reputava pela eílimaçaô , e naõ pelo corpo , lhe parecia já pouco crefcido o agigau- tado dos Tòpinambâzes para o defpojo da vitoria , fen- do taes os feguros , com que marchava para ella , que venceo mais de cento e cincoenta léguas pelas afperezas do Certaõ em taõ pouco tempo , que até pareceo que naõ cabia nelle a mefma brevidade, quando fe regulava pela conta dos dias. 454 Já nas viíinhanças do Pará fe chegou a pôr fo> bre os inimigos 5 e lembrando fó aos feus Soldados, que eraõ, aquelles os mefmos que bufcavaô , aííim as virtuo- fas ambições da fama , como os eftimulos da fua jufta , a.primeira voz , para que entraíTem no combate , foy o feu exemplo 5 o qual obrou em todos com tal ef- fícacia , que naõ havia golpe , que naõ cuftaíTe vida j e já defefperados aquelles bárbaros da reílftencia delles , os que reftavaõ , que naõ eraõ muitos , encommenda- raõ a fua falvaçaÕ ao amparo dos matos 5 mas naõ fe pode aproveitar da mefma fortuna ( opprimido fem du- vida do grande pezo da fua culpa ) o celebre Amaro , Interprete das Cartas do ÇapitaÕ mor Francifco Cal dei : ?a> do E/lado do Maranhão , Liv. VI* % 9 9 ra , principal incentivo da fublevaçaÕ dos Topínamba- Arma 161& zes ; porque cahindo nas mãos dos vitoriofos , achou o caftigo da fua aleivoíia na horrorofa boca de huma bom> barda. 45 í Ainda feguio o valerofo Commandante por re* petidas marchas as confequencias da vitoria ; mas ven- do, que o terror, em que tinha poílo todos aquelles bárbaros , fazia já inúteis as fuás fadigas , a foy celebrar depois de quatro mezes na companhia dos feus amigos , e parentes , onde confeguio por merecido premio das fuás acções o mais honrofo fruto nas acclamaçõés del- ias. • ; ( 45 ó Na Capitania do GraÕ Pará nao vivia também ocioío o feu Capitão mor Francifco Caldeira ; e orde* nando a Pedro Teixeira, (já promovido ao poílo de Ca* pitaõ de Infantaria por Patente Real ) que a bordo de huma lancha, guarnecida de trinta Soldados, foífe refga* tar hum homem , que eílava cativo de huma Nação Ta? puya , por compra que havia feito delle aos Topinamba* zes , quando fe levantarão, e ajuílaífe pazes com todo o gentilifmo , que quizeífe admittillas , nao fendo do com* prehendido na tal fublevaçaõ , defempenhou bem ambos os encargos ; mas fahindo já dos Carabobocas para aCi- dade de Belém, fe pozeraõ na fua. proa os mefmos rebel- des , auxiliados de muito mais gentio da fua devoção / com grande numero de canoas , armadas em guerra. 457 Bem entendeo Pedro Teixeira , que na oppo- fiçao de tantos bárbaros faria fermofo aquelle dia f po* rem elles , que na affiílencia das fuás luzes fe naõ atre- verão a entrar na peleja com humas taes ventagens, dis- correndo também ( como todos os índios Mexicanos na Conquiíta do famofo Cortez ) que os immortaes efpiri- tos , que fuppunhaõ nos Europeos , eraõ influídos' dos rayos do Sol , logo que efte Planeta levou o feu gyro a outro hemisfério , bufcando entaõ a Pedro Teixeira* que II iW Is I' MUI 2oo - Annaes Hifloricos Anna í6i8. que já fenda como malograda a concebida gloria da ac- ção , o atacarão com tanto arrojamento , que ainda an- tes de abordallo , foberbamente fe defvaneciaõ com as acclamações de vencedores j mas efte Commandante , 2 02. Annaes Hijloricos !! hum dos Religio- fos. Ardeo entaõ Francifco Caldeira na mais viva e apreíTadamente conduzido delia para a fua mandou ao Capitão Balthafar Rodrigues de Mello , que com a força de fetenta homens fizeíTe lo- go apprehenfao nos refugiados 5 porém elle , que zela- ya tanto a fua opinião , como a immunidade Religio- 465 cólera ruina , do Eflado do Maranhão , Liv. VI. í o J fa , confumindo o tempo em romper fó o muro da cer- Anno i6i2. ca ; que era de pao a pique , fe recolheo com o pretex- to , de que acabado o dia naquella operação , fe quize£ fe paíTar à da interior efcala do Convento , feria teme- rária na confufao das fombras. 466 Recebeo a defculpa o Capitão mor , efperan- do com impaciência pela manha íèguinte ; mas determi- nada naquella mefma noite a fua prizaõ , e conjurada para ella toda a Guarnição da Fortaleza , feguida do povo , ao meímo tempo que lhe chegarão aos ouvidos , com as luzes do dia ? as primeiras vozes da commoçaõ , achou junto de fi a Chriftovaõ Vaz Bitancourt , e An- tónio Pinto , com dous homens mais ; dos quaes hum levava hum grilhão bem pezado , que António Pinto com hum punhal na maÕ lhe fez meter nos pés > taõ de£ amparado Francifco Caldeira de todos os feus fubditos % que lhe naõ pode reííílir $ porém fugeitando-fe às difpo- íiçoes da advería fortuna, até moftrou bem noforrri* mento delia lhe era fuperior o feu coração. 467 Por univerfal acclamaçaõ fubílituío aquelle lu-J gar o Capitão Balthafar Rodrigues de Mello j e ainda que na aceitação parece que offendeo o feu merecimen- to , também pode entenderfe , que foy conftrangido para ella , ou pela violência da mefma commoçaõ , ou pelo zelo , de que faltando nefta huma cabeça como a fua , paífaíTe a mayores defordens com evidente rifco da Capitania , cujos accidentes eftavaõ obfervando tan- to nas fuás vifinhanças os piratas do Norte , taõ cheyos de ambição ; como de fortuna , que fazia muito mais formidáveis a rebeldia dos noífos índios j porque os In- guahibas a cara defcoberta feguiaõ já as fuás bandeiras , quando os Topinambazes de todo feparados da fugeiçaõ da mefma Conquiíla , nos obrigavaõ a reduziilos outra vez a ella com o rigor das armas , divifaõ que neceífa- riamente a enfraquecia je por efte caminho 7 por mais Ce ii que I, 2 04 Ânnàes Hiftoricos ■ 7 - . - . Anno • que irregular , reílituindo-a Balthafar Rodrigues ao pri- meiro focego , deu conta de tudo ao Governador do Eftado do Brafil D. Luiz de Soufa , e à Corte de Ma* drid. 468 Neíle mefmo eílado fe confervava a Capitania 1619. do Par á na fucceífáõ do anno de 1 6 1 9 ; mas alterou-o muito logo no feu principio hum forte accidente j por- que chegou a tanto a ouíadia barbara dos Topinamba- zes , que defprezando já as grandes ventagens , com que difputavaõ algumas vezes as forças Portuguezas nos íl- tios, que habitavao , intentarão a efcala da Fortaleza da Cidade 7 influidos do feu Principal Cabello de Velha , (chamado affim por anthonomaíia ) que era entre elles o de mayor nome $ e com eífeito arrimando-fe a ella em 7 de Janeiro, lhe derao hum aíTalto geral com arrojamen- to tao deftemido , que neceffitaraõ aquelles Soldados de iodos os esforços da fua valentia para rebatello ? ainda com a perda de hum dos feus Companheiros , além de cinco , que ficarão feridos : entrou neftes últimos Gafpar Gàrdòfo , e provocado mais dos novos eftimulos da fua dor , fez apreíTado tiro ao mefmo Principal com tao fe- liz acerto , que vingando logo todo aquelle fangue der- ramado, fegurou bem a noíTa vitoria no importante àef- pojo da vida defte bárbaro ; porque fervindo de horro- rofo efpe&aculo a todas as outras , que fe animavaõ fó da ferocidade dos feus efpiritos, nao tratarão mais que da falvaçaÕ delias com arrebatamento tao precipitado 1 que nem deixou lugar para fegundo golpe, 469 Nefte tempo tinha já chegado a Parnambuco o Capitão Domingos da Corta Machado com o prezo Bento Maciel , que remettia o Capitão mor do Mara- nhão ao Governador D. Luiz de Soufa 5 mas ouvidas as queixas pelas mefmas bocas dos apaixonados , por mais que efte Fidalgo nao attendeo a ellas , parece que mof- trou, que naõ apprQYara o procedimento de António . j ■. . ... . de do EJlado do. Maranhão, Liv. VI. 2o J de Albuquerque $ porque confirmando por Patente fua Anno 1619, a nomeação , que nelle fez o pay . , lhe deu por adjun- to ao meimo Capitão da Fortaleza de S. Filippe Do- mingos da Coita , com a declaração de que naõ concorr ciando com o feu voto nas matérias mais graves , feria decifivo o de Luiz de Madureira, Ouvidor, e Auditor Geral da Capitania j e ao Capitão Bento Maciel , ab- folvendo-o da culpa , que o levou à fua prefença , en- carregou da guerra dos Topinambazes. 470 He fera duvida , que procedeo Dom Luiz de Soufa com informações menos verdadeiras da capa^ cidade de António de Albuquerque 5 mas naÕ defco- nheceo a diftinçaÕ da fua peífoa j porque defconfíou lo- go da aceitação daquella Patente j e maduramente pre- venindo efte mefmo fucceíTo , paífou outra de Capitão mor, no cafo da fua demiíTaô , a Domingos da Coita > que partindo de Olinda em 16 de Março na companhia de Jeronymo Fragofo de Albuquerque , defpachado com a Capitania do Gruo Pará , chegarão ambos à Ci- dade de S. Luiz no dia 6 de Abril. . 47 1 Recebeo a Patente António de Albuquerque $ mas por mais que tomou a refoluçao de a naõ aceitar , como bem entendeo D. Luiz de Soufa, prudentemente fe valeo do pretexto de ter já dado conta no Miniflerio de Madrid da morte do pay , com as juftiííimas repre* fentações do muito que neceíTitavao da fua aíTiftencia as dependências da fua cafa 5 e declarando logo a Domin^ gos da Coíla , que fe trazia outra Provifaõ do General do Eílado , podia moítralla : prefentandolha elle , lhe entregou o Governo. 472 Quatorze mezes governou António de Albu^ querque a Capitania do Maranhão , de que já tinha fi- do hum dos primeiros Conquiftadores , de baixo das or- dens de feu pay 5 e natural herdeiro das fuás virtudes > regulou de forte todas as acções pela doutrina delias > que 2o6 Annaes Hiftoricos MW A1H101619. que muito ã pezar das faudades daquelíes moradores, paflbu a Portugal , onde fe attendeo bem o feu mereci- mento no prompto defpacho da Capitania mor da Paraí- ba com a mercê de huma Commenda. 475 Jeronymo Fragofo de Albuquerque , Fidalgo da Cafa Real , que nas occaíioes de mayor honra fe ha- via feito merecedor de grandes empregos , tinha chega- do ao Maranhão com o de Capitão mor do GraÔ Pará $ como já fica referido ; e continuando a fua viagem até a Cidade de Belém , tomou poíTe delle nos últimos de Abril com huma geral fatisfaçaõ daquelíes moradores. 474 Levava ordem do Governador Dom Luiz de Soufa para remetter prezos para Portugal ao Capitão mor Francifco Caldeira , a feu fobrinho António Cabral, a Balthafar Rodrigues de Mello , a António Pinto , e a Ghriftovaõ Vaz Bitancourt 5 e com poucos dias de go- verno , a obedeceo , como era obrigado 5 porém elle , que na feveridade deita execução exercitava ío a fua in- teireza , vendo-a ociofa , voltou todo o feu animo bel- licofo para o caíligo dos Topinambazes , de que tam- bém hia encarregado ; e pondo logo prompta huma lu- zida Armada, que fe compunha de quatro embarcações de quilha, e muitas canoas , com a equipagem de cem Soldados , além de grande numero de índios , depois de declararfe Commandante delia , nomeou por feu Almi- rante ao Capitão Pedro Teixeira , e por Capitão mor de todas as canoas a Jeronymo de Albuquerque o mo- ço , que ainda do tempo em que vivia o Conquiílador do Maranhão , confervava a difíèrença. 475 O Governo da Capitania encarregou ao Capi- tão de Infantaria Aires de Soufa Chichorro , acompa- nhado do Vigário Manoel Felgueira de Mendoça j e em 4 de Junho , encaminhando as fuás proas ao fitio do Iguapé , que guarneciaõ os inimigos com as principaes forças , foraõ tao vigorofas as do feu ataque ? que efca- lada do Eãaâo do Maranhão , Liv. VI. 2 c? lada já a defenfa de huma boa trincheira i os deixou por Anno 1619. aquella parte inteiramente deftruidos. 476 Foy fatal o eílrago , que padecerão todos aquelles bárbaros nefte primeiro golpe $ mas o Capitão mor Jeronymo Fragofo , que ainda o naô tratava como cabal fatisfaçao da fua aleivofia, paflbu aos Guanapús, e Carapy , donde voltando ao Iguapé , e a outras para- gens, no alcance fempre dos meímos inimigos, os der- rotou de todo ; e as fuás Aldeãs reduzidas a cinzas fer- virão também para os apparatos da vitoria. 477 Nefte tempo , que caminhava já ao fim do mez de Junho , entrou na Cidade de Belém do Pará o Capitão Bento Maciel Parente com o corpo de oitenta Soldados, e quatrocentos índios , todos frecheiros , que conduzia deParnambuco , onde também tinha levanta- do toda efta gente , com o feu próprio cabedal , para a guerra dos Topinambazes , a que deu principio em Ta- puy tapera , vifinho fitio de S. Luiz do Maranhão , co- mo já deixo referido ; e continuando até o Pará nos ef- tragos delia , extinguío por aquella parte as ultimas re* liquias deftes bárbaros. 478 Levava também a commhTaõ de conhecer ju^ ridicamente da depoziçaõ do Capitão mor Francifco Caldeira 5 mas ainda que defempenhou bem as obriga- ções deita diligencia, fó pode fazer aprehenfaõ dos que lhe nao fugirão por menos culpados , que com os mef- mos autos remetteo logo para Portugal , onde já fe achavaõ as principaes cabeças, pelo procedimento que teve com ellas o Capitão mor 5 e profeguindo no açou- te dos Topinambazes com tanto valor , como fortuna , accrefcentava fempre o feu eítrago 5 até que entenden- do Jeronymo Fragofo , que nefte caftigo , e com o da fua expedição , tinhaõ já purgado a aleivofa culpa da fua rebeldia, avifou por Carta a Bento Maciel, que devia ceifar nas hoftilidades ; prudente acordo , que òeC- attendeo 2o8 Annaes Hiftoricos ,7'» 11 'I " ' Annoióií?. attendeo fó com o fundamento, de que fendo elle x> Commandante daquella guerra , por efpeciaes ordens do General do Eftado , lhe tocava privativamente o co- nhecimento da fua juftiça. j * 479 Sentio com viva dor Jeronymo Fragofo efta defattençaõ ; mas como lhe faltava poder para a fatif- façaõ, que lhe competia , tratou prudentemente de di£ íimulalla; e járecolhendo-fe para a Cidade de Belém, cheyo de vitorias , o aíTaltou huma aguda doença , que lhe tirou ávida, quando a tinhaò feito merecedora de niayor duração as fuás virtudes. 480 Mathias de Albuquerque , filho do primeiro Conquiftador do Maranhão, como já deixo referido , c primo com irmaô do defunto Capitão mor , tinha Pro^ yifaõ fua para fubítituirlhe todas as faltas no governo ida Capitania ; e entrando nefta a fuccederlhe , em vir- tude delia , lhe deraõ poíTe fem a menor duvida nos prin- cípios do mez de Setembro 5 porém no breve termo de vinte dias também o depozeraõ , com o pretexto de que naô era valida a Provifaõ do primo depois da fua morte. 48 r Procedeo-íe logo à eleição ; e fuggerida de apaixonadas negociações , foy conferido o cargo ao Ca- pitão de Infantaria Cuftodio Valente , com o Padre Fr. António da Merciana por feu Adjunto 5 que he taõ po- derofa na natureza humana a ambição de mandar , que até faz imprefsões nas mayores virtudes j, como fe vio bem neíle Religiofo ; mas porque o Capitão Pedro Teixeira , que tinha hum grande fequito , eílranhou muito eftes procedimentos , o períliadiraõ à fociedade no Governo , que elle aceitou também com pouca re- pugnância. 482 Continuava a guerra dos Topinambazes o Ca- pitão Bento Maciel ; e fabendo da morte do Capitão mor Jeronymo Fragofo , e dos Governadores que lhe íucccderaõ r lhes requereo a demiíTaô do emprego na fua do Ejlado do Maranhão , Liv. VI- 09 ■ fua pefíoa, com o fundamento de que lhe pertencia pe- la jufifdieçao, com que já fe achava no mefmo Gover- no -, mas defattendida a fua propofta , tratou de profe- guir no eftrago dos índios , também intereíTados nas uti- lidades do feu cativeiro. 483 Sem outra memoria , que poífa merecella , en- trou o novo anno de 1620 ; e continuando do mefmo Anno 1620. modo até o mez de Mayo, nefte embarcou para Portu- gal o Capitão Cuftodio Valente, deixando independen- te no governo da Capitania do Graô Pará o Capitão Pedro Teixeira ; porque o Padre Frey António da Merf ciana , conhecendo já que a fua companhia era defagra- davel àquelles moradores , fe recolheo ao feu Hofpicio de Santo António de Una. 484 Chegou entaÕ à Cidade de Belém Bento Ma- ciel j e ardendo nos defejos de occupar o governo da Capitania , intentou lograr as fuás efperanças pelos meyos illicitos das alterações do focego publico $ mas Pedro Teixeira , que era ta6 valerofo , como acautela- do , defenganou de forte as fuás pretençoes , que fe re- colheo logo ao Maranhão , onde fundou hum Forte na boca do rio Itapycurú , que crefcendo fem tempo a mi- lagres da fua actividade , fe encarregou também da de- fenfa delle com a guarnição de quarenta Soldados 5 e à fua mefma fombra entrou a povoar de alguns moradores a terra firme , com a aííiftencia de duas Aldeãs de índios domeílicos , por antecipadas difpofições tudo do Go- vernador do Èftado do Brafil D. Luiz de Soufa. 485 Nefte mefmo tempo entrou na bahia da Cida- de de S. Luiz hum navio das Ilhas dos Açores , de que era Capitão Manoel Corrêa de Mello , que levava a feu bordo algumas famílias para a povoação daquella Co- lónia , conduzidas à cufta de Jorge de Lemos Bitan- court , que pelo ferviço de meter nella duzentos cafaes , fe lhe fez a promeíTa de huma Commenda de lote de Dd qua- ■m 2IO ■Ânnaes Hiíloricos \f - Anno 1620. quatrocentos mil reis : depois chegou também huma ca* ravela com a mefma carga , a que fe-feguio o Bitan- court ., Commandante das três embarcações , que ti- nhaÕ arribado a differentes portos , por hum temporal forte , que padecerão nos primeiros dias da ília viagem; e accommodada toda efta gente com as diligencias ., e liberalidades do Capitão mor Domingos da Cofta Man- chado , principiou logo a conhecer, que melhorara mui- to de fortuna na mudança dos pátrios domicílios , onde pagava a vida laboriofamente, pela total falta de meyos para a natural confervaçaõ. 486 Nefte louvável exercicio fe empregava o zelo de Domingos da Cofta , quando huma NaçaÔ de Ta- puyas decorfo, chamados Guayanazes , lhe oíFereceo a paz , que defejava muito } por entender que da com- muhicaçao de tantos bárbaros tirariaõ grandes interef- fes a Igreja , e a utilidade publica ; e por eíla con* ta cheyo de alvoroços , naõ fó os recebeo na fua ami* fade , mas também para eftreitalla mais , mandou tre- ze Soldados à ordem de feu filho Jorge da Cofia pa- ra huma Aldeã do rio Mony , que era a mais fronteira aos mefmos índios 5 porém elles , que fe haviaô valido das taes praticas com traidor animo , que he como na- tural em todo o gentilifmo daquelles Certões , logo que conhecerão , que tinhao confeguido a inteira confiança dos Portuguezes , que fó fe guarneciaÕ de huma defen- fa de pao a pique , os convidarão para o reígate de vá- rios eferavos ; e ao mefmo tempo que fe oceupavaõ na efeolha dos de melhor figura , com mais ambição, do que cautela , aleivofamente os matarão a todos : infeli- cidade, que naõ comprehendeo o feu Commandante, por fe naõ achar naquella occaíiaõ na fua companhia. Sentio efte golpe o Capitão mor ; mas he fem duvida , que a ponderação do feu engano o fez mais penetrante. í 487 Sem outra memoria , que fe recommende à .; . poíle- - do EJlado do Maranhão , Liv. VI. 211 poíleridade, fuccedeo o anno de 1621 ; e logo no prin« Anno 1621, cipio chegou à Cidade de S. Luiz huma embarcação de Parnambuco com dinheiro para pagamento dos Solda- dos ? e mais fornecimento , de que neceffitava a Capitai nia ; mas a efte foccorro fe feguio brevemente huma doença de bexigas de taõ má qualidade, que os tocados -delia , que pela mayor parte eraõ os índios ,• naõ paífa- va a fua duração do termo de três dias : affligio-fe o ani- mo do Capitão mor ; porém as meímas oppreísões flze- raõ luzir mais as fuás virtudes j porque aos enfermos pobres naõ íó aíTiília generofamente o íèu cabedal pró- prio, mas também a peflba com hum total defprezo dos perigos da vida. 488 Entrou nefte tempo outra embarcação das Ilhas dos Açores com quarenta cafaes , que o feu Pro- vedor mor António Ferreira Bitancourt também havia promettido meter no Maranhão , por contrato feito com a Coroa 5 e Domingos da Cofta depois de accom- modar todas eiras famílias com a coílumada liberalida-; de , para applacar a ira de Deos , que durava ainda na fua mayor força , lhe levantou à fua culta a Igreja Ma- triz , e ajudou a obra do Convento do Carmo , de que parece fe agradou tanto a Divina Bondade , que princi- piou logo a moderar a execução da fua juíliça. 489 Logo que o Capitão Bento Maciel fe recolhe© ao Maranhão da expedição dos Topinambazes , deu conta delia ao Governador D. Luiz de Soufa, que fa- tisfeito da fua condu&a , o promoveo do Forte do Ita- pycurú , de que ainda fe achava encarregado , ao Go- verno da Capitania do Grão Pará j informado já do fa- lecimento do feu Capitão mor Jeronymo Fragofo de Al- buquerque ; e Bento Maciel, que vio bem logradas as fuás efperanças , paífando fem demora para a Cidade de Belém , tomou poífe do cargo em 18 de Julho. 490 Principiou a imitar o feu anteceíTor Pedro Tei- Dd ii xeira i'i> 212 ."nii J:\'" Annaes Hifioricos Anno 1621, xeira no provimento de todos os empregos , affim políti- cos , como militares , buícando para elles íb o mereci- mento j e ainda que alguns daquelles moradores temiaÕ juftamente as já bem conhecidas afperezas áofeu natu- ral, as, moderou de forte, que foube grangear a geral aceitação da Capitania. ■ , ■ 491 No mez de Setembro fez huma grande expedi- rão de guerra, para o caftigo dos índios levantados , de «jue nomeou Gommandante a Pe^dro Teixeira , que naõ fó fahio delia com novos créditos para a fua fama , mas também com muitos interèíTes para a Capitania no fatal efcarmento daquelles. barbar os >; memoria ultima defte prefente anno. Anno 1 622. 492 Na TucceíTaõ do de 16 2 2 a teve também o Go- verno geral do Eftado. do Brafil na peíToa de Diogo de Mendoça Furtado, Fidalgo chéyo de todas as virtu- des : tinhaelle levado de Portugal na fua companhia a António Moniz Barreiros , nobre morador de Parnambu- co com o defpacho de Provedor mor da Fazenda Real , que recebeo com a obrigação de levantar à fua cufta na Conquifta do Maranhão dous engenhos de aífucar ; e como era poífuidor de groíTos cabedaes , procurando logo facilitar a fatisfaçaõ da fua promeíTa com novos interèíTes para a fua cafa , esforçou de forte as negocia- ções com o Governador, para o provimento da Capita- nia mor de S. Luiz em hum filho feu do mefmo nome , e appellido com mais o de Moniz , que muito a pezar das emulações , que fe lhe oppozeraÕ , confeguio o em- penho cpm grande fortuna. 493 Era António Moniz Barreiros moço na idade j e fendo efta huma das excluíívas , que difficultaraõ a fua eleição, tratou de defculpalla Diogo de Mendoça no modo poííivel , pondolhe a obrigação de fe aconfe- lhar nas matérias mais graves com o Padre Luiz Figuei- ra, da Companhia dejefus, que com outro Religiofo Ita- do EftaâQ do Maranhão , Liv. VI. ? i J Italiano da mefma proflíTaó , e de tantas letras , como Anno 1622, virtudes , procurou voltar ao Maranhão, onde já tinha eílado , como em feti lugar fica referido ■; porque ainda que a Corte de Madrid /agradecendo ao feu Provincial a ofFerta que lhe fez, para a Miílaõ daquelle Paganií* mo , fe naõ quiz fervir delia ; ardendo fempre eftes; verA dadeiros Miííionarios no Apoftolico zelo da falvâçaõ das almas , fe deixarão vencer da fua vocação. 494 Affiftido de tao bons Companheiros , fahio de Parnambuco António Moniz j e com poucos dias de viagem, chegou felizmente à Cidade de S. Luiz , onde tomou poíTe do feu emprego em 20 de Abril , deixando o fuave governo do Capitão mor Domingos da Cófta tao cheyos de faudades todos aquellés moradores , que nem as efperanças do novo fucceííbr poderão confolal- las, fendo quafi fempre os mais efficazes defafogos:ria lifongeira pratica do Mundo politico. ;? a 495 Entrou no Maranhão o virtuofo Padre Iah& Figueira com o feu Companheiro 5 masaíemrazao da-, quelles moradores, que temeo fempre a communiçaçat* dos Mifíionarios da Companhia de Jefus , como emba- raço dos particulares intereífes no ferviço dos índios , por conta dos efcrupulos das fuás liberdades , fé com- moveo de modo , que o Senado da Camera fe vio obri- gado a requerer ao Capitão mor, que fe lançãíTem fora da Capitania com as vivas inftancias , de que fe paíTaíTe, a execução em breviííimo prazo. 49 6 Affligio-fe o animo deíles Religiofos com nu* ma acçaõ taõ barbara j porém com tal eonftancia na fua vocação , que poftos no Juizo do mefmo Tribunal , xz- \ folutamente proferio o Padre Luiz Figueira , que fó fei^ to em pedaços fe apartaria dos exercicios delia 5 e An-, tonio Moniz , que conhecia bem a paixão do povo , o foube de forte reduzir à moderação devida , affiftido também da authoridade do feu antecefíbr Domingos da Cofia, V- \ 214 Annaes Hiftoricos Anno 1622. Cofia , que veyo a contentarfe , de que ambos os Padres fízeifem hum termo , que logo aífinaraõ , de que nunca fe intrometeriaõ com os índios domefticos 5 e que fal- tando a elle , incorreriaõ na pena de extermínio com a perda de todos os bens , de que fe achaíTem poíluidores \ refignaçaõ prudente , que deu fem duvida as mais fegu- rãs provas , de que fó bufcavaô como verdadeiros Mif- ílonarios os importantes intereíTes na converçaõ das al- mas daquelle gentilifmo. 497 Levava o encargo António Moniz de levantar dous engenhos de aíTucar 5 obras que quando eraõ da fua utilidade , foy obrigação > que fe poz ao pay , co- mo grande ferviço , para o defpacho de Provedor mor da Fazenda Real do Eftado do Braíií , como já fica dito no lugar a que to;ca ; e entrando logo em huma deílas fabricas nas margens do rio Itapicurú, a poz brevemen- te na fua perfeição , fendo ella a primeira de que fe vio ô ufo naqudlla Conquifta 5 mas occupando as terras das doações de António de Albuquerque , fem attençaõ al- guma aos proteftos dos feus Procuradores j paíTados muitos annos de trabalhofos pleitos , fe reftituiraõ de- pois da fua morte ao feu legitimo poíTuidor , por fenten- ça final do fupremo Senado da RelaçaÕ da Corte de Lif- boa. 49 & Eílas faõ as memorias da Capitania do Mara- nhão j e na do Grão Pará continuava Bento Maciel no exercicio do feu emprego , fem accidente que podeífe alterallo j quando lembrando-fe , de que no alcance dos Topinambazes penetrara por terra das vifinhanças da Cidade de S. Luiz até a de Belém , determinou logo fa- cilitar efte longo traníito , erradamente difcorrendo , que ferviria muito para a utilidade do comercio ; mas encarregando a execução nos principios de Junho ao Capitão Pedro Teixeira , com huma boa efcolta de Soldados, e índios, ainda que vencendo a fua activi- dade do Eflado do Maranhão , Liv. VT. 2 1 J : - ; Vi da de huma grande parte das afperezas do caminho ,0 deixou mais tratavel , defvaneceo com tudo as princi* pães medidas do projecto j porém ao mefmo tempo lo- grou bem o feu zelo Bento Maciel na reedificaçaõ da Fortaleza da Cidade ; porque accrefcentandolhe diffe- rentes obras naõ pouco proveitofas para a fua defenfa $ a poz em mayor força ; e fem outra noticia , que feja de importância , tiverao fim as do prefente anno em hu- ma , e outra Capitania. 499 Entrou a nova íucceíTaõ de 1623 ; . e continu- Anno j^, ando em todo o Eflado com o mefmo filencio até 20 de Mayo , chegou neíle dia de Lisboa à Cidade de Beleht do Pará pela efcala de Parnambuco huma caravela , que levava a feu bordo o Capitão Luiz Aranha de Vafcon- cellos com efpeciaes ordens do Miniílerio de Madrid , para fondar o rio das Amazonas , e reconhecer todos os íitios , que occupavaõ nelle os Hollandezes , e mais Nações da Europa com intruíò domínio. 500 Era hum dosCapitulos das fuás Inílrucções ■',' que as communicaria na mefma Cidade de Belém ao Ca- pitão mor Bento Maciel ; e que fegundo o tempo , em que alli aportaífe , e ventos , que correíTem , fe aíTenta- ria com o feu parecer , o do Meftre da caravela André Fernandes , e dos Pilotos delia António Vicente Ma- chado , e António Jorge , por qual das bandas devia ter principio a tal operação , fe pela do Sul , em que íe achava íltuada a Cidade , fe pela do Norte , onde íe fuppunhaõ os taes Eftrengeiros y e que o que fe julgaífe por mais conveniente , fe executaria com toda a effica- cia. 501 Obedecerão todos a taõ fuperiores ordens 5 e uniformemente refolvendo , que fe principiaíTe a expe- dição pela parte do Sul, para que depois fendo taõ ven- turofa , como fe efperava , fe continuaíTe pela -do Nor- te. Dadas para ella todas as necelfarias providencias , fe r 2í6 Annaes Uiftoricos M ■ M" \m . fm Anno 1625. fe fez à vela o Capitão Luiz Aranha no fim do meímo Mayo 5 mas feguindo a derrota fem accidente, que po- dèíTe alteralla até o rio Curupá , chegarão com tudo re- petidos avifos ao Capitão mor Bento Maciel , de que íe achava já taõ perigoíb naquelle rio , que o fuppu- nhaó cercado dos Eftrangeiros 5 e para foccorrello for- mou logo hum corpo de fetenta Soldados , e mil índios Frecheiros , com o qual guarneceo vinte e duas canoas, e hum caravelao. 502 Efperavaõ muitos a primeira honra da empre- za; mas Bento Maciel , que attendia bem à importân- cia das fuás confequencias 5 naõ querendo fialla de alheya condu&a , fe encarregou delia ; e nomeando por feu Lugar-Tenente no governo da Fortaleza ao Alferes Mathias de Almeida , fahio da Cidade de Belém em 1 8 de Junho , affiftido dos Capitães de Infantaria Pedro Tei- xeira , Aires de Soufa Chichorro , e Salvador de Mello* 505 Navegava a toda a diligencia em foccorro de Luiz Aranha , quando o encontrou depois de alguns dias de volta já da fua jornada ; mas ainda que logo fou- be delle , que tinhaõ fido mentirofas as primeiras noti- cias , de que eftava cercado , o informou também de que nao enchera a obrigação , de que fe encarregara por falta de forças , para contender com as dos Eftrangei- ros , que com effeito fe achavaõ fituados no mefmo rio Curupá , e em outros braços mais do das Amazonas ; e Bento Maciel , que fe via aífiftido do principal poder da Capitania , quando reconhecia 05 perigos na vifinhan- ça de tantos inimigos ; conferida a matéria com devi- das reflexões , acertadamente determinou , que Luiz Aranha repetiífe a fua expedição pela coita do mar , am- parado do Capitão Pedro Teixeira no caravelao daquel- la Armada , que elle com todas as canoas caminharia pela banda da terra, fondando os feus rios até o Curu- pá , onde fe faria a juncçaÕ de todos. Execu- do EJlaâo do Maranhão , Liv. VI. 217 504 Executou-fe eíle proje&o com igual fortuna , Anno 1623. e com a meíma fe unirão brevemente os dous Comman- dantes no íitio deftinado , aonde chegou depois de al- guns dias o caravelaõ de Pedro Teixeira , que apartan- do-fe de Luiz Aranha , tinha corrido grande perigo , af? íím pelas muitas embarcações de Eftrangeiros , que na* vegavaõ aquella Coita , como pelos feus baixos ., em que tocara varias vezes 5 além também das fortes cor- rentes , e medonhas borrafcas , a que confiantemente havia reíiftido com huma total falta de pilotagem. 505 Chegou ao mefmo tempo da Cidade de Belém do Pará o Alferes António de Amorim com hum foc- corro de Soldados , e índios , que o Capitão mor Ben- to Maciel logo no principio da fua viagem lhe tinha mandado conduzir com as primeiras informações das forças eftrangeiras , já com as idéas de adiantar os pro< greííòs na fua oppoziçaõ 5 e valerofamente confiado na qualidade das fuás Tropas , efperou o combate por mui- tos dias , até que apurado o feu ardente efpirito da in- fenfibilidade dos inimigos , os bufcou nd Quartel mais forte , que achou defendido de huma boa trincheira fo- bre o mefmo porto com numerofa guarnição , que fe compunha de Hollandezes , Inglezes ,. e Francezes > além de muitos índios feus auxiliares ; porém, favore- cidos de tantas ventagens , por mais que empenharão to- dos os feus esforços para lhe , impedir o defembarque ; nao fó o logrou elle por meyó de chuveiros de baías, mas também forçandolhes taõ feguros reparos , lhos fez abandonar precipitadamente. 506 NaÕ fe contentou o bellicofo Gommandante fó com eíla vitoria ; porque no mefmo ardor , fabendo bem aproveitarfe delia , confeguiò outras muitas no ren- dimento de algumas cafas fortes , que com grande eftra- go dos inimigos , aííim naturaes , como eftrangeiros , re- duzio a cinzas ; e vendo-fe já por aquella parte fem ex- Ee ercicio i' 1 2l8 Annaes Hifioricos Anno 1623. ercicio para o valor dos feus Soldados , os tranfportou à Ilha dos Tocujuz , que he huma das da boca das Ama- zonas , no alcance ainda dos fugitivos, que feretiravaõ a varias Feitorias bem fortificadas , que fuílentavao na mefma Ilha 5 mas já naõ fe fiando da fua defenfa, as achou também defamparadas ; que raras vezes ha ligei* reza., que chegue a igualar os paíTos do medo. 507 Com efta acção ultima moderou entaõ o pri- meiro ímpeto das fuás Tropas ; e para difpollas com o defcanço para novas fadigas , as meteo em hum fitio vi- linho ao do feu defemb arque, que além de o cobrir, era também muito accommodado para feguir a guerra no certao da Ilha -•, onde fecon ferva vao alguns dos inimi- gos amparados das fuás afperezas 5 mas quando já que- ria reduzir a pratica hum taÕ útil proje&o, recebeo o avifo de que em foccorro dos vencidos navegava huma nao de força com todo o pano largo ; e mandando-a re- conhecer a toda a diligencia pelo Alferes Francifco de Medina , voltou no mefmo dia com a noticia , de que ellava ancorada a poucas léguas de diílancia. - 50,8 Tomou logo Bento Maciel a género fa refolu- çaõ de buícar no mar novo combate , entendendo fem duvida , que fe.o efperava nas ventagens da terra , inju- riaria o feu valor nos meímos applaufos da vitoria , pa- ra o que guarnecendo com a melhor gente a caravela , o caravelaÕ , e dez canoas , .deixou as mais com baftantes índios , e alguns Soldados menos capazes naquelle fi- tio, de que fahia para confervallo ; e continuando nas difpofições da boa difciplina , mandou avançar cinco das canoas , com expreíía ordem para que atacaíTem os inimigos ao romper da Alva , que elle feguia as fuás po- pas com todo o refto da conferva. 509 O Alferes Francifco de Medina , que manda- va efte deftacamento como no defprezo dos perigos , li- fongeava íempre a valentia do feu animo , fez de forte apertar do EJlado do Maranhão , Liv.VI- 219 apertar os remos , que à mefma hora (inalada ; acomet- Anno 1623. teo a nao por meyo das Tuas furiofas baterias 5 e prolon- gando-fe pela popa delia com a ília canoa , que foy a primeira , que meteo no combate 7 lhe atacou o leme ; mas como era muito vantajofa a equipagem inimiga , naõ podendo já fupportarlhe o fogo as cinco embarca- ções , a pezar da conílancia do feu Commandante , fe retirarão deftroçadas ; porém ao mefmo tempo o Capi- tão mor Bento Maciel , que tinha largado a caravela , e o caravelaô , que o naõ acompanhavaõ por lhes acal- mar de todo o vento , entrou de novo na acção com hum arrojamento o mais deftemido 5 e o Alferes Fran- cifco de Medina , refazendo-fe logo na fua canoa , fou- be bem imitallo: com tudo, fem que os inimigos f o f- fem abordados , havia perto de quatro horas , que fe defendiaõ , quando faltandolhes de todo o valor , na imiaõ da noíTa retaguarda, que já fe introduzia na pele- ja, fizeraõ os últimos esforços da defefperaçaõ na fataí efcolha do feu eílrago, applicando-fe o fogo 5 e reduzin- do eíle brevemente a cinzas tudo o que ficava fora da agua , fe fubmergio o mais no fundo delia. . 5 1 o SinalaraÕ-fe nefta occafiaõ ( além do Comman- dante a quem tocou a mayor gloria ) o Capitão Salva- dor de Mello, Manoel Coelho de Figueiredo , e Mi- guel da Cofta , que ficarão muito mal feridos : o Alfe- res Francifco de Medina , e Pedro da Cofta Favella : os Sargentos Joaõ MouraÕ de Abreu , e António Fernan- des Ribeiro : o Cabo de Efquadra Pafcoal Rodrigues, Pedro Bayaõ de Abreu , e Balthafar do Valle -, mas com notória diftinçaÕ o Alferes António de Amorim , que era hum dos da guarnição da canoa de Bento Ma- ciel ; porque na proa delia fez hum taõ vivo fogo aos inimigos , que depois de ter huma grande parte na vito- ria , a rubricou também com o nobre fangue de duas fe- ridas perigofas .- os Capitães Pedro Teixeira , Luiz Ara- Ee ii nha 220 Annaes Hifioricos 4111101623. nhadeVafconcellos, e Aires de Soufa Chichorro , na5 fe acharão neíle forte combate , fenaõ já no fim delle , por ficarem no caravelaõ , e caravela, a que faltou o vento ; porém em todas as mais oceafiões defempenha- rao bem as obrigações da fua honra. 511 Os vencedores fentirao fó a perda de quatro Soldados , além dos feridos , que foraõ quafi todos j mas dos Vencidos fe naõ falvou mais que hum rapaz, que fe lançou ao mar por entre as mefmas chammas já meyo abrazado. 512 O Capitão mor Bento Maciel tornou a occu- par o feu Quartel dos Tocujuz j porém ■ abandonan- do^ , por mudar de proje&o, paíTou a Curupá , on- de levantou huma Fortaleza , em hum fitio chamado Mariocay, que ainda fe conferva com a invocação de Santo António j e deixando-a já capaz de defenfa com a guarnição de cincoenta Soldados , governados pelo Capitão de Infantaria Jerony mo de Albuquerque, fere- colheo à Cidade de Belém cheyo de gloria militar. ; 515 Deite mefmo tempo por diante fe intitulou Bento Maciel primeiro Deícobridor, e Conquiílador •dos rios Amazonas, e Curupá 5 mas com huma forte oppofiçaõ do Capitão Luiz Aranha de Vafconcellos , que ufava também dos mefmos titulos 5 e com razoes mais authorizadas , no que refpeita ao ultimo , por fe ter já achado nelle quando foy foccorrido do Capitão mor ; -que dofamofo das Amazonas nenhum fe podia cha- mar Defcobridor com juílificados fundamentos , falvo pela parte das novas Conquiftas Portuguezas , que pelas Caftelhanas o tinhaÕ fido fem difputa Vicente Yanes Pinçon , e Aires Pinçon , no anno de 1500 5 e depois delles Fulano Maranhão , que deu o nome próprio a efte grande rio j e da fua navegação o Ca- pitão Francifco de Orelhana , que lhe deixou também o do feu appellído na jornada de Gonçalo Piífarro , como do EJtado do Maranhão , %iv. VI. 221 como largamente fica referido no lugar a que toca. Anno 1623. . 514 O Capitão mor do Maranhão António Moniz tinha continuado no exercício do Teu minifterió com hu- ma geral aceitação daquelles moradores , que pelas ze-> Jofas diligencias do feu grande cuidado fe augmentavao muito todos os dias , aííim no bom commodo das fuás vivendas da Cidade, rriultiplicando-fe os edifícios delia, como também na cultura dos campos para o feu fuften? to , e grangearias , de que já abundayaõ j e como he ef- ■ta a ultima memoria do prefente anno , pafíb ao que fe fegue. ; r: 515 Succedeo o de 1624 com a novidade de efta- Anno 1624. rem feparadas do Governo geral do Braíll as Conquiftas do Maranhão , e Graõ Pará com titulo de Eftado ; è que o nomeado Governador delle fe preparava já para a viagem, vencendo fempre a fua actividade todos os embaraços , que fe lhe oppunhaõ. 516 No anno de 1621 foaraõ tanto na Corte de Madrid os brados da fama das Capitanias do Maranhão, que aquelle Minifterió fe refolveo a feparallas do Efta- do do Brafil , nomeando logo para feu primeiro Gover- nador a D. Diogo de Carcamo , Fidalgo Caftelhano , nafcido na Cidade de Córdova , e naturalizado na de Lisboa , onde tinha cafado com Dona Antónia de Vi- lhena , illuftre filha de Pedro de Tovar, e de D. Brites da Silva , filha de Heitor de Oliveira , Senhor do Mor- gado deite appellido 5 mas ainda que D. Diogo era taô cheyo de virtudes , que fe fazia digno de mayores em? pregos , como fe achava já muito avançado na idade para o trabalho defte , efcufando-fe delle , fe conferio a D. Francifco de Moura , que acabava de fe recolher do Governo das Ilhas deCabo-Verde com bem merecida opinião de huma grande capacidade j porém dotado de tanta fingeleza , que deixando-fe fuggerir de apaixona- das negociações, pedio taes aíTiftencias para a fua jor- nada. 222 Annaes Hiftoricos ' ■ : Anno 1624. nada y que entendendo os primeiros Miniftros > que queria fervirfe do corado titulo da negativa para pou- parfe a ella , fe encarregou de novo , por Patente de 25 de Setembro do anno paíTado , a Francifco Coelho de Carvalho , Fidalgo da Cafa Real , e benemérito de to- das as fortunas. 517 Paflou eíle logo para Lisboa a porfe prompto para a viagem ; mistos Governadores do Reino Dom Diogo de Gaílro , Conde Bailo , e Dom Diogo da Sil- va , Conde de Portalegre , occupados em mayores cui- dados , ainda a dilatarão até o dia 25 de Março do pre- fente anno / em que fahio do Tejo com dous navios, levando a feu bordo hum bom foccorro , affim de Solda* dos , e munições para a defenfa daquellas Conquiftas , como de moradores para povoallas ; e por expreflas or- dens tomou a derrota deParnambuco , pela occafiaõ do eftrondo , que fazia na Europa huma grande Armada , formada em vários portos dás Provincias Unidas , que com três mil e quatrocentos homens de mar , e guerra fe tinha feito à vela em 21 do mez de Dezembro do an- no paíTado à ordem do General Jacobo Vvillekhens , e do Medre de Campo Joaõ Dorth 7 nomeado também Commandante para o proje&o defta expedição ; porque ainda que fe efpalhavaõ vozes , de que fe encaminhava à invafao das índias Occidentaes , mais fe receava a do Brafil , como fe experimentou na interpreza da Cidade do Salvador da Bahia de Todos os Santos em 10 do mez de Mayo , féis dias depois de ter chegado ao rio de Olinda o Governador Francifco Coelho. 518 Governava a Capitania de Parnambuco , de que era Donatário Duarte Coelho , feu irmaõ Mathias de Albuquerque j ( que na gloriofa guerra da Acclama- çaõ de Portugal , depois de fubir aos primeiros empre- gos juítiííimamente merecidos , teve também o titulo ile Conde de Alegrete ) e recebendo comos promptos avi- do E/lado do Maranhão , Liv. VI. 22 5 aviíbs da infelicidade daquella Capital , o de que fícan- Anno 1624. do prizioneiro o Governador Diogo de Mendoça Fur- tado , abertas as vias de EIRey , era elle o que lhe fuo cedia no Governo do Eftado, tratou logo de fe prevenir para a oppoílçao dos Hollandezes , fuppondo-fe ataca- do do poder formidável da fua Armada. Conhecia bem efte General a capacidade de Francifco Coelho 5 e que- rendo aproveitarfe delia na prefente occafiaõ , o perfua- dio a que fe encarregaíTe do Recife, o que confeguindo do feu valor , e zelo , fem o menor reparo do feu gran- de carader , lhe accrefcentou dirTerentes obras de fum- ma importância para a fua defenfa j porque ainda que defattendia os cuidados próprios nafufpenfaõ da fua jor- nada , lhe pareceo entaõ , que devia preferir os alheyos como mais perigofos , principalmente quando as inílruc- ções , que o obrigarão a fazer a efcala ? também favore- ciaÕ efta generofa refoluçaõ , no exercicio da qual he força , que eu o deixe , até que elle me chame na rigo- rofa ordem da chronologia , para poder continuar a da Hiftoria. 5 1 9 Na companhia de Francifco Coelho tinhaõ fa- hido de Portugal Manoel de Soufa de Eça , provido no lugar de Capitão mor do Graõ Pará , Commandante também do íègundo navio ; Jacome Raimundo de No- ronha com o defpacho de Provedor mor da Fazenda Real do novo Eftado do Maranhão $ e o Padre Frey ChriftovaÕ de Lisboa , Religiofo Capucho de Santo António com o emprego de primeiro Cuftodio da fua fagrada Religião naquellas Conquiftas ; mas conhecen- do bem eíle fanto Varaõ o quanto ellas neceííitavaô do pafto efpiritual, que lhes levava nas fuás Apoílolicas doutrinas , quando a demora do Governador naõ podia fer breve , julgou a fua por taõ efcrupulofa, que toman* do a refoluçaõ de fe feparar de tantos Companheiros P partio do Recife em 12 de Julho , afliílido fó de dezafeis Mif- ;iV] : V $■. ..4 3?| 224 Annaes Hijloricos Anno 1624. Miffionarios da mefma Ordem , de dous da de Nofía Se- nhora do Monte do Carmo com o feu CommiíTario , e de poucas familias das que hiaõ do Reino , a bordo tu- do de hum barco de cuberta. 520 Com feliz viagem tomou o Seara no dia 17 do mefmo Julho 5 e a inftancias do CapitaÕ daquelle Prefi- dio Martim Soares Moreno ,. deixando alli dous dos feus Miffionarios , continuou em 3 o a fua derrota até a Ci-, dade de S. Luiz , onde entrou em 5 de Agofto. 521 Os Capuchos Fr. Cofme de S. Damião, e Fr. Manoel da Piedade, que acompanharão a Jeronymo de Albuquerque na Conquiíla do Maranhão , fe recolhe- rão ao Conventinho , que principiarão os Francezes , como já fica referido ; mas vendo affiftida aquella MiA faõ dos operários neceíTarios , fe reftituiraõ à fua Cuf» todia de Parnambuco , depois de accommodarem os da Companhia de Jefus na mefma vivenda de que fahiaõ , que também a deixarão fem muita refiílencia , parlando a huma Aldeã do rio Mony ; e como por eíla occafiaõ fe abandonou aquella Cafa às ruínas do tempo, quan- do Frey Chriílovaõ de Lisboa chegou à Cidade de S; Luiz , achando-a incapaz de habitação humana , fe aga- zalhou na do Feitor de Gafpar deSoufa , que generofa- mente lhaofFereceo 5 porém a milagres da fua diligen- cia , no breviííimo termo de cinco dias , fe levantou Igreja no mefmo íitio com varias officinas Religiofas , tecido tudo de palmeira brava r aonde trasladado com os feus Companheiros , fe celebrou a primeira MiíTa na feítividade de S. Lourenço ; e entrando logo na funda- ção de mais capacidade , lhe lançou a primeira pedra de baixo do nome de Santa Margarida. 522 Além do lugar deCuílodio , levava elle ode CommiíTario do Santo Officio com largos poderes , por efpecial graça do Inquiridor mor D. Fernando Martins Mafcarenhas , e o de Vifitador Ecclefiaílico j e entran- do do Eâaâo dv Maranhão \ Liv. VI* 22 j do brevemente no exercicio defte ultimo, fez aDeos Atino 1624* importantes ferviços com merecidos créditos das fuás virtudes, bem conhecidas já em toda a parte, a que fe eftendia o feu grande nome ; fendo taes os refpeitos , com que também o venerarão logo aquelles moradores > que moftrandolhes hum Alvará Real de 15 de Março do prefente anno , que removia todas as mercês das ad* miniftrações das Aldeãs dos índios , lhe deraõ inteiro cumprimento fem a menor duvida , quando era eíle o mais pezado golpe para os feus intereíTes 3 porém he certo , que para a felicidade do fucceíío , ajudarão mui- \ to os bons officios do Capitão mor António Moniz. 523 Nefte eílado fe achava a Cidade de S. Luiz do Maranhão , quando os Hollandezes , que haviaô expe- rimentado taÔ infauftos fucceíTos pela parte do Norte da Capitania do Graõ Pará , quizeraõ tentar a fua for- tuna por eíla do Sul 5 e fabendo bem , que na Fortaleza do Seara fe confervava fó huma pequena guarnição , in- tentarão rendella com as equipagens de duas nãos de for- ça , fegurando nellas os grandes intéreífes , que íe pro- mettiaõ da vitoria ; mas fazendo hum prompto defem- barque , que as vaílas medidas da fua ambição inculca- yao muito mais numerofo pela qualidade , foy rebatido íaõ vigoro famente por Martim Soares Moreno, Capitão do Preíldio, que depois de ter já fobre o campo a ma- yor parte dos inimigos , bufcou o refto delles a fua fal- vaçaõ na diligencia dos feus remos , valendo-fe das lan- chas , que eftavaõ furtas junto da praya j e as duas nãos, logo que receberão a feu bordo aquelles poucos fugiti- vos , que o terror de taõ pezados golpes naõ dava ain- da por feguros , levantando as ancoras , que tinhaõ a pique , largarão todo o pano. 524 Todos os que entrarão neíla occaílaõ , fe fí- halaraõ nella ; mas além do feu Commandante , fó o Soldado Manoel Alvares da Cunha confeguio a im- Ff mortalidade 226 Annaes Hiíloricos \w Anno 1624. mortalidade da memoria na diíliriçaò do nome. 525 Tocava então o Seara ao Governo da Capita- nia do Maranhão , e o feu Capitão mor António Mo- niz, depois de feílejar a felicidade deíle íuccefío com as demohftraçoes , que elle merecia , foy íbcegadamente continuando nos ordinários exercidos do feu minifterio , em que fó fe empregava 5 porque depois do ultimo ef- trago , que padecerão os Topinambazes , naõ havia ini? migos domefticos 7 que o inquietaíTem. 526 Em taÕ agradável fituaçaõ fe achava todo o Ef- Anno 1625. tado na nova fucceífaÕ de 1625 , quando ■ a obftinaçaS dos Hollandezes intentou ainda perturballa , fem que os efcarmentaíTe o fatal fuccefíb , que experimentarão as fuás duas nãos no Prefidio do Seara o anno paífado ; porque outras tantas repetirão neíle o mefmo pioje&o cia invafaô, com mayores esforços , para melhor fegural- la j mas o feu Commandante Martim Soares foube de forte regular pelas medidas do feu efpirito o jufto cafti- go defte atrevimento , que fendo muitos dos inimigos , os que quizeraÕ fuílentallo , já proftrados em terra , del- les forao poucos os que fe retirarão às embarcações 7 e taõ deípedaçados a feridas , que ferviraô bem para a confíernaçaÕ , com que aquelles piratas defoccuparaô os nofíbs mares. 527 Neíla occafiaõ fe diílinguio, como na paga- da , o Soldado Manoel Alvares da Cunha 5 e foy fó também , além do Commandante , o que nos deixou a fua memoria , para as recommendações da poíleridade. 528 Entre a trabalhofa applicaçao dos feus muitos cuidados , tinha aííiftido fempre o Padre Fr. Chriftovaõ, como mais fervorofo , à fundação de Santa Margarida , onde fe admirarão vários prodígios , que fe authentica- rao como milagròfos j e reduzida já a forma decente , para a obfervancia da regularidade Religiofa , paíTou a ella no primeiro dia de Fevereiro com huma folemne Pro- " do Eflado do Maranhão , Liv. VI- 227 ProciíTkõ, que fe compunha de todos aquelles morado- Armo 1625^ res , aílim Eccleíiaílicos , como Seculares. 529 Acertadamente nomeou para Prelado defta nova Cafa ao Padre Fr. António da Trindade , Religio- ío de muy exemplar vida j e tratando logo de paflar ao Pará , principiou a ília jornada em 7 de Março, aííífti- do ío em huma canoa de dous Companheiros , e do Ef- crivaõ da lua Viílta , que fe chamava JoaÔ da Silva j mas como do íitio do Cayté y que fica no meyo do ca- minho , o intentou por terra , padeceo nelle grandes tra- balhos , e perigos até chegar nos últimos de Abril à Al- deã de Una , habitação dos feus Religiofos. 530 No mefmo fitio o bufcou logo o Capitão mor Bento Maciel j e depois de exercitar com a fua peííba todas as attençoes, que ella merecia , lhe communicou o jufto cuidado , com que fe achava , pelas verdadei- ras informações , de que nas Amazonas , e Curupá íe haviao de novo introduzido duzentos Hollandezes , de que erao Capitães Nicolao Hofdan 7 e Filippe Porcel $ ( bem conhecidos já nos mefmos rios ) protegidos dos Eftados Geraes , com o projecto de os povoarem , e cultivarem nelles as fuás muitas drogas, fem que baftaf- fe para defenganar o feu ambiciofo procedimento a re- petição de tantos caíligos ; e que como além deílas no- vas forças fe mantinhaõ ainda algumas Inglezas , e Ir- landezas no afpero CertaÕ dos Tocujuz , receando fun- damentalmente , que no defprezo da fua uniaô fe foíTem fazendo formidáveis , tinha já prompto hum armamen- to para defalojallos. 5 3 1 Conheceo bem o Padre Fr. Chriftovaô a recta juftiça , com que procedia Bento Maciel neíla expedi- ção ; e como a teve por defenfiva , naõ fó a approvou , mas animou também os índios para que a feguiíTem com todas as forças das fuás Aldeãs , o que fe logrou com felicidade pelos bons officios do Padre Fr. António da Ffii Mer- 22 8 Annaes Hifloricos ' i . r 4? í 1 ! .!'i, Anno 162^. Merciana ; o qual tendo entre elles grande authorida- de , acompanhou a Pedro Teixeira , Commandante da guerra , que fahio da Cidade de Belém do Pará em 2 do mez de Mayo com cincoenta Soldados , de que eraõ Capitães Jerony mo de Albuquerque , e Pedro da Cofta Favella, e trezentos índios , a bordo tudo das canoas , que lhe parecerão neceíTarias. 532 Socegados os marciaes eftrondos com a fahida de Pedro Teixeira , no dia 14 de Mayo entrou o Cufto- dio na Cidade , onde foy recebido com repetidas de- monftraçôes de gofto j mas prefentando logo no Sena- do da Camera o Alvará Real , que abolia as mercês das adminiílrações das Aldeãs dos índios , como tirava óq{- tes todos os íntereíTes a utilidade publica da Capitania com as primeiras vozes , que percebeo o povo , ( então mais orgulhoíb , que o do Maranhão ) fe commoveo de forte , que para íbcegallo necefíitou bem o mefmo Tri- bunal de tomar a prompta refoluçaõ , de que o cumpri- mento , que fe requeria , fe difFeriíTe para tempo mais lar- go , aproveitando-fe do beneficio delle com o corado ti- tulo , de que fallando , como íb fallava , aquelle Alva- rá com a peíToa do General do Eílado , que fe achava já em Parnambuco , lhe tocava privativamente a fua execução ; e formando-fe eíle mefmo aífento , fe fugei^ tou a elle o Padre Fr. Ghriílovaõ /com razaõ temerofo das fataes coníèquencias da fua repugnância. 533 Livre já deite fuílo , principiou a fua Vifita na Cidade, onde por falta de Convento, fe recolheo em huma cafa particular 5 e continuando a corrupção dos vícios , cada dia dava mais evidentes provas das fuás virtudes na fuavidade , com que os removia ; até quê entendendo , que tinha feito importante fruto neíle fan- to exercicio , paflbu a dilatallo no defcobrimento do ce- lebrado rio dos Tocantins , para o qual partio da Aldeã de Una em 8 de Agofto , acompanhado dos Padres Fr. „-j - o e- do Eftado do Maranhão , Liv. VI- 229 Sebaíliaô de Coimbra , Fr. Domingos, e Fr. Chrifío- Anno 162.$. va5 de S. Jofeph j do Efcrivaõ da fua Vifira JoaÕ da Sil- va , e de Manoel de Pina , feculares ambos, de juílifi- cado procedimento ; e excellentes línguas para a intro- ducçaõ do fagrado Evangelho na barbaridade daquelle gentilifmo. 534 O Indo Thomagica , hum dos Principaes, e de mayor nome em taõ vaílos CertÕes , tinha já admittido na fua grande Aldeã ao Padre Fr. ChriftovaS deS.Jo^ feph } e bufcando-o agora no Hofpicio de Una , foube de forte perfuadir os intereííes deíla jornada , que o Pa- dre Cuílodio , depois de defpedillo para as neceííarias prevenções delia , o foy feguindo logo , aííiftido já de Pi- lotos do rio com firmes efperanças de defcobrir nelle as importantes efpiritnaes fortunas , a que o conduzia a fua vocação ; exercício em que o deixaremos para a relação do feliz fucceífo da expedição de Pedro Teixeira , que nos eftá chamando. ) 535 Logo que fahio eíle Commandante do rio da Cidade de Belém , encaminhou as fuás proas ao Curu* pá , aonde chegou em 22 de Mayo com mais nove ca» noas guarnecidas de duzentos índios , todos frechei- ros ; e achando a noticia de que os Hollandezes , com- mandados pelo Capitão Hofdan , fe fortificavaõ no viíí- nho fitio de Mandiutuba , dividindo o feu pequeno cor- po emduasiguaes partes, os atacou ao mefmo tempo por mar, epor terra na madrugada do feguinte dia, taõ aífiílido do natural ardor da valentia do feu animo , co- mo das acertadas difpofiçoes da difciplina militar. * 536 Primeiro chegou aos inimigos a penetrante dor defte pezado golpe , que os ameaços delle ; mas foy tal o valor, com que lhe refiíliraõ , que durando o combate todo aquelle dia , e parte da noite , fe duvidava ainda da vitoria , na igual conflancia com que fe difputava , quando a cederão a Pedro Teixeira 3 e amparados das hor- 2J0 Annaes Hiftoricos irtoi Ânno 1625, horrorofas íbmbras de huma trovoada , fe embarcarão com o feu Commandante em huma lancha grande , que confervarao advertidamente de baixo do feu fogo , dei* xando-nos fó as indignas defculpas dos defmayos do ani- mo no derramado fangue de quarenta cadáveres. 537 Pareceo pequeno efte nobre defpojo ao Capi- tão Pedro Teixeira , regulando-o pelo feu grande efpi- rito 5 e empenhando-o todo no importante alcance dos fugitivos , para fazello muito mais avultado > os mandou feguir pelo Capitão Pedro da Coíla 5 mas naõ poden- do com os curtos remos, das fuás canoas vencer a fúria da borrafca, chegou varias vezes a telio foçobrado, pe- rigo de que elles fe falvarao trabalhofamente à força das vogas. $}% Accommodando-fe o vitoriofo Commandante com a rigorofa difpoflçao do tempo , fe deteve no lugar do confli&ò o refto da noite , fem outro motivo 5 po- rém o feu ardor, como confervava a toda a hora a mef- ma adividade , logo que amanheceo , mandou bufcar os inimigos com muita parte das fuás Tropas ; e voltan- do efte deftacamento com as verdadeiras informações , de que unidos com os dos Tocujuz , os de huma cara- vela , e os de três lanchas grandes , que traziaÕ no mar , tinhao paíTado todos ao rio de Filippe , ( que he outro braço do das Amazonas ) onde também fe achavaÕ al- guns mais das mefmas Nações , embarcando-fe a toda a diligencia , poz as fuás proas no mefmo rio. 539 Na entrada delle encontrou logo o principal corpo dos Hollandezes , dividido nas guarnições de duas cafas fortes ; mas também repartindo a fua pouca gente com a mefma igualdade , à proporção do numero , que fe via já muito diminuído, as inveftio ao mefmo tempo com tanta difciplina , que pareceo fó hum o impulíb na feparaçao dos movimentos ; e os inimigos , que geme- rão bem no primeiro ataque , faltandolhes o animo para as do miado do Maranhão, . Liv. VI. 251 as experiências do fegundo , procurarão fazer eftas ac- Anno 1625U coes menos glorioías , abandonando ambas as defen- ias. 540 Mais irritado defta frouxidão , de que fe quei- xava o feu valor , do que ambiciofo de novas vitorias , os mandou feguir Pedro Teixeira pelo Capitão Pedro da Cofta , aííiíiido fó de vinte e oito Soldados , e alguns Índios j e reforçados de novos foccorros , bufcavaõ já a iâtisfaçaÕ publica da fua honra , quando os batedores de Pedro da Cofta lhes defcobriraÕ a vanguarda , : que fe compunha de oitenta homens j mas como cada hum dos deftemidos Portuguezes fe animava viftuofamente do mefmo efpirito do feu Commandante , avifado eíle da vifmhança dos inimigos , fe moveo logo fobre elles , e os atacou com taõ pezados golpes, que ainda que a conítancià da fua oppofiçaõ , por efpaço de muitas ho- ras, foy das mais alentadas , vendo que já paíTavaõ de feífenta os que nos ferviaô de defpojo ; ennobrecido com os dous Capitães Hofdan, e Porcel, defpedaçados a fendas , todos os mais largarão as armas como emba- raço da fua falvaçaÕ ; e precipitando- fe na fugida , fem outra eleição, nem regularidade , que a do próprio def- tino , até impoíTibilitarao o alcance. 541 Ficarão fobre o campo todas as armas , e mu- nições de guerra ', de que fe aproveitarão os vencedo- res , que também levarão três prizioneiros muito mal feridos ; e fabendo delles o Capitão Pedro Teixeira , que na diílancia de quinze léguas fe mantinha ainda hum pequeno Forte com a guarnição de vinte Soldados , e que as fuás embarcações lhe teriaõ já tomado o rio , bufeou logo eftas para abordallas ; e naõ as encontran- do , voltou fobre o Forte , que entregando-felhe com a mercê das vidas , o mandou arrazar até os fundamen- tes. 542 Em todas eílas occafiões fe diftinguiraõ os Ca- pitães M m m 232 Annaes tíifloricos : ã &M101625. pitãesjeronymo de Albuquerque, Pedro da Cofia Fa- vella , e o Sargento Pedro BayaÕ de Abreu , que feri- do perigofamente de huma baia no conrli&o de Man- diotuba , feguio os Hollandezes com hum total defpre- zo da vida $ porém todos os mais Officiaes , e ainda Soldados defempenharaõ bem as obrigações da fua hon- ra 5 e o Commandante com a de humas acções , em que fem duvida grangeou a primeira, fe recolheo ao Pará entre as geraes acclamações , que juíliffimamente merecia. »\!i ANNAES i I!' 1 m ! SS^s ANN AE S HISTÓRICOS «. •«-i r\ wm-. DO ESTADO DO LIVRO VII SUMMAKIO. ONTINUA o Ciiflodio Fr. Chrijlovao 1 de Lif- boa a fua viagem pelo rio dos Tocantins. Ofuc- cejfo , que teve ate ' fe recolher ao Fará. ^Altera- ções daquelles moradores por caufa dos índios 7 e ofuccejb delias. PaJJa a Cidade de S. Luiz , e dejlapor terra ao Seara. Trabalhos , e perigos da mefina jornada. Volta ao Maranhão na companhia do primeiro Governa* dor do afiado Francifco Coelho de Carvalho. Faz ejlea fua entrada publica na Cidade de S. Luiz. Accidentes ) que fe olfervarad' nella. Funda de novo a Fortaleza de S. Filippe. Procedimento menos jiijlificado do Capitão mòr do GraÚ Fará Bento Maciel. Succedelhe naCapi- Go- tania ,!'! 1 \ :,-/: . : Annaes llijloricos tanta Manoel de Souja de Eça. ^AJua primeira expedi- Encarrega Francifco Coelho o governo da Capita^ ríia do Maranhão a feujilho Feliciano Coelho de Carva- lho ' j e paffando ao Fará , funda no caminho a Povoação de Gurupy. Conferva as adminijlraçúes das Aldeãs dos Ín- dios , e vifita as do Camutá. Volta a Cidade de S. Luiz , e manda a de Belém com os feus poderes a feujilho Feli- ciano Coelho, Succejfo dajua primeira expedição 1 ; e de outra, que também tinha feito o Capitão 1 mor. *A prizao defie , e a fua remeffa para a Cidade de S. Luiz. Prohi- be o Governador as Tropas de refgates , e por novas re- prefentações toma a permittillas . Bloauea o Capitai Pe- dro da Cojla Favella o Forte do Torrego, guarnecido pe- los Hollandezes , e fe retira depois de alguns fuccejjbs gloriofos. Manda o Governador f obre o Forte ao Capitão Pedro Teixeira r, que o ataca , e rende com varias occa- Jtâes de grande honra. Sucçede, na Capitania do Para Luiz Aranha de Vafconcellos. RA ardente o zelo , e grande afortuna , com que o Padre Fr. Chriftovaõ de Lisboa conti- nuava na converfaõ dos barba* ros Tapuyas dos Tocantins , quando o inimigo do género 'humano, que fentia já a cruel guerra , que lhe fazia , intentou a fua oppofiçaõ 5 e em- penhando nella as formidáveis forças da fua malícia , como tinha fido o índio Thomagica , o que facilitou aquella entrada , fuggerio a outros de differentes Na- ções , que perfuadiíTem ao Cuftodio com toda a effica- cia fe naô fiaíTe delle ; porque traidoramente lhe difpu- nha a morte na fua rríefma Aldeã a que o conduzia ; mas eíle verdadeiro Miffionario , que bufcava fó os fantos -•"■.• - ; ) exerci- " do Ejiado do Maranhão , Liv, VIL 255; exercícios da fua vocação, defprezou de forte com a Anno 1625, conílancia do feu efpirito Apoílolico tao horrorofas ma- quinas , que arruinadas todas com hum total defprezo de tamanho perigo , tomou o porto da tal Povoação , onde as demonftrações , com que foy recebido daquelle Principal , abonarão bem a fidelidade do feu animo. 544 Tinha três praças efta grande Aldeã , nas quaes o Cultodio arvorou três Cruzes com tao feílivos alvo- roços daquelles bárbaros , que pareciaõ já veneração a taõ alto myfterio j e entrando logo na importante fabril ca de huma Igreja , como as madeiras , e palmeiras bra- vas , que eraõ os materiaes de que fe compunha , lhe e£ tavaõ a porta , quando ajudava muito o feu efficaz ze- lo hum copiofo numero de obreiros , empenhados to- dos na fua lifonja , com poucos dias de trabalho fe aca- bou a obra , onde fe celebrou a primeira MiíTa com tal acatamento de tantos gentios , que cada dia fe abraza* va mais eíle Religiofo nos ardentes defejos da fua con- verfaõ ; mas depois de lograr com fanta complacência a de alguns adultos ? e de adminiftrar o Sacramento do Bautifmo a muitos innocentes , para fegurar a conftan* cia de todos nas difpoíições , em que os deixava , a ca* da. hum dos Principaes pedio (como reféns) hum dos feus filhos , que lhe entregarão fem a mais leve repu- gnância 5 e como também fe queria fervir deftes inftru^ mentos para facilitar na communicaçaõ daquellas Al- deãs a geral reducçaõ dos feus habitadores ao grémio da Igreja , fe recolheo com elles ao Pará cheyo de alegres efperanças. 545 No dia 3 de Outubro chegou à Povoação do Camutá , donde continuou a fua viagem até a fua rehV dencia da Aldeã de Una -, e como em toda a parte ti* nhaõ corrido as melancólicas noticias , de que os barba* ro índios Tocantins aleivofamente o efperavaõ para lhe dar a morte , e a todos os mais da fua companhia ? Gg ii em 2]6 Armões- Hiíioricos ■ «i: ' i|j d .di 1 Anno i62$< em vingança de antigos aggravos de outros Portugue- zes j os empenhados alvoroços , com que foy recebido, authorizaraõ bem as eftimaçoes da fua peíToa no geral agrado da Capitania. 546 Com poucos dias de deícanço paíTou à Cida- de de Belém , ainda em dependências da fua Vifita j e continuando no exercicio delias , fazia crefcer fempre a veneração das fuás virtudes 5 mas como fe lembrava da muita repugnância , com que amuara o termo fobre a fufpenfaõ do devido eíFeito do Alvará Real , que revo- gava todas as mercês das adminiftrações das Aldeãs dos índios , recolhendo-fe em 2 1 do mez de Dezembro ao Hofpicio de Una , para caminhar logo para a Cidade de S. Luiz ; no mefmo dia , que era o de Domingo , mandou publicar huma Paftoral na Igreja Matriz com a comminaçaõ de exeommunhaÕ mayor a todos os que tendo as taes adminiftrações , fe confervaífem nel- las. • ^47 Foy- recebida efta novidade com taõ geral ef- candalo , que os Miniftros da Camera , para fegurarem o focego publico , quevirao perigofo, chamarão logo todos os homens bons , aííim politicos , como militares , ç lhes propozeraõ no mefmo Tribunal : Que em 14 de May o prefentara nelle o Padre Fr. Chri/lovai , como to- dos fali ai , huma Provifaó , que prohibindo absolutamen- te as adminijlraçúes da Capitania do Maranhão' , naÒ fat- iava nas daquella Conquijia do Pará , dijlribuidas pelo Ca- pitai mor Bento Maciel : que também avifando o MiniJ- terio de Madrid da tal repartição 1 , tido tinha recebido até aquelle tempo repojla alguma com a noticia delia r e De- creto em contrario j razad porque affentardo , que veneran- do todos a nova ley , fe diijFeriffe o feu cumprimento até a chegada doGovernador Geral do JLjlado , que fe efperava por inflantes , para que elle tomaffe a refoluçab 1 , que lhe pareceje mais conveniente , a que refigruwdo a fua obedi- , ; ) encia, :x ' m do EJiaâo do Maranhão 9 Liv. VIL 1 3 7 enciãy por mais que entendido , que nas adminijlraçoes da Anno 162$. *C apitam a deS. Luiz fendo podido comprehender as do Gr ao Pará $ ndõfe fazendo defias exprejfa mençdo , por ferem ainda inteiramente feparadas pela diverfidade , e independência dos Governos j e que conformandofe com tao jujlo acordo , o Padre Fr. Chriflovao , como bem fe mojirava pela continuada paciência defete mezes , pare* cia que na prefente alteração , além de def prezar ofocega publico , procedia de poder abfoluto com gravijjima ofeú- ja da authoridade Real. Também ndo attendendo , a que fem huma nova , e pofitiva declaração* da Corte , cabalmen- te informada , de nenhuma forte fe devia cumprir aquella Provi fao , quando encaminhando-fe , comofe via delia , a beneficio dos Tapuyas , fe reconhecia na fia execução ofeu mayor damno , ajjim efpiritual , que preferia a tudo , pe- lo imponderável , e quqfi infallivel a que fe condemnavdo as fuás almas nafeparaçao do grémio da igreja ; ( por* que po/los , como difpunha a Ley , nafua liberdade abfo- luta , de novo abraçaridó a barbaridade dos primeiros cof- tumes ) como temporal , que ndo era de menos importem* cia , involvendo o primeiro \ pois reflituindo-fe aos feus antigos domicílios , fe confumirido nas continuas guer- ras , de que fe alimentava a fita fereza , fazendo pajlo dos vencidos com Iqjlimofo efcandalo da racionalidade - y o que tudo confirmava bem ofuccejfo do Ejlado do Brafil , onde por falta de adminiflraçíes fe tinha reduzido a quqfi na* da o immenfo numero daquelle gentilifmo, fendo , como era , muito menos bárbaro.  vijla do que , e de outras razões da mefma qualidade , que ndo ignorava o Padre Fr. Chrifiovao , claramente fe via 7 que procedera elle na fulminação daquellas cenfuras com notória violência , op~ primindo com ellas huns tdo leaes vaffallos dofeu Prínci- pe , que havia três annos , que tdó combatidos de traba- lhos domefiwos , como de inimigos r affim naturaes , como ejlrangeiros , fefufientavaafá da mefma confiancia , de- fendendo 238 Annaes Hifloricos ',/' Anno 1625. fendendo as terras , de cjue tinhaofido descobridores , con- quijladores , e povoadores com grande gloria da Naçaã Portugueza , fem mais outros foccorros , que os da fua grande fidelidade ; e que em lugar delles , os punha najua ultima conjlernaçad o talReligiofo , impqffibilitandojelhes a fua fubfifiencia por todos os caminhos com afeparaçab' daquelles Tapuyas , que também erdã fempre a principal defenfa daConquiJla , pelas fuás forças , e conhecimen- to do terreno 5 naõ advertindo do mefmo modo , que as ad~ miniflracoes fe dijlribuirai com os mais prudentes parece' res , fendo entre elles muito efpeciaes o do Padre Frey António da Merciana feu antecejfor , e o do Padre Vigá- rio Manoel Figueira de Mendoça 5 e que a grande anciã com que procurava a fua extincqao , appropriandofe o temporal governo delias , ( que no efpiritual ninguém du- vidava ) fe reprefentava a mais efcandalofa. 548 Parecerão muito fundamentaes eftes difcurfbs a todas as peflbas , de que fe compunha aquella grande Junta 5 e penetradas delles , uniformente reíblveraõ , /tjue fe pedi/Te com a mais reverente fubmiíTaõ ao Padre Fr. Ghriílovaõ" , que removeífe o feu monitorio , dei- xando tudo no primeiro eílado até a poíitiva declaração da Corte , ou chegada do novo Governo ; mas que fe defprezando eílas attenções , continuaíTe à força , ag- gravando ascenfuras, fe appellaífe delias , proteftando os damnos , que podiaõ feguirfe ; porém elle , feita a diligencia , ou convencido já das nervofas razoes de taõ formal propoíla , ou juftiííimamente temerofo da fuften- taçaò da fua negativa no prefente fyílema , defiílio lo- go dos feus procedimentos j e redimido aquelle povo à fua antiga tranquillidade , mereceo também por eíla mo- tleraçao univerfaes applaufos. 549 O Padre Fr. Chriílovaõ de Lisboa era tio le- gitimo de Gafpar de Faria Severim , Secretario das Mer- cês p e Expediente do Senhor Rey D. Joaô IV. j e fen- do ¥ !'l. do E/lado dó Maranhão , %iv. VIL 2 39 do já no feculo taÕ conhecido pela nobreza do Teu nafci- Anftq §£gjjl mento , a mefma modeftia com que procurou a diífímu- laçaõ deíla memoria na mudança de eítado , a fez mui- to mais celebre , exaltando-a às mais verdadeiras eíli- mações dos homens as fuás letras , e virtudes j exercita- das humas , e outras , aííim na Europa , como na Ame- rica , tanto nas Cadeiras , como nos Púlpitos com uni- verfal aproveitamento do rebanho Catholico. , 550 Sendo Geral da Ordem Seráfica o Padre Frey Bernardino de Sena , ( filho da Província de Portugal ) no Capitulo Provincial , celebrado por elle no Conven- to de Santo António de Lisboa em 7 de Mayo de 1625 , foy eleito primeiro Cuílodio do Eftado do Maranhão o Padre Frey Chriílovaõ , por concorrerem na fua peíToa aquelles predicados , de que fe compõem hum Varão Apoílolico $ e procurando o fanto exercício deíle mu nifterio o anno paíTado , na companhia do Governador Francifco Coelho 7 depois de o deixar no Recife de Par- nambuco , continuou a fua derrota até a Cidade de S, Luiz , e delia à de Belém , como já fica referido. 551 Socegadas , pois, as alterações de Belém do Pará pela prudente refignaçao de taÕ fanto Prelado , entrou o novo anno de 16265 e partindo logo para a Anno 1626. Capitania do Maranhão , com quarenta e fete dias de viagem , chegou à Cidade de S. Luiz , onde foy feíle- jado daquelles moradores com demonftraçôes tao affe- cluofas y que bem lhe feguravao as verdadeiras fauda- àes , que lhes tinha devido. Repetio brevemente a fua Vifita , em que achou tao conhecida emenda , que nao ceifava de dar graças por ella à Divina Bondade ? e fa- bendo , que a Capitania do Seara também neceííitava díj fua prefença , difpoz eíla jornada com o mefmo Apof- tolico zelo , em que ardia fempre a fua caridade. 552 Quando chegou ao Maranhão , fe achava na bahia daquella Capital hum carayelaõ , que havia con- duzido 1 & 54° Annaes Hifiorlcos Itíl Kmi •iii> i m ,! :íibi Anno 1626. duzido de Parnambuco por ordem do Governador Fran- cifco Coelho algumas famílias , que lá tinhaó ficado r como já deixo referido j e intentando nelle a fua viagem do Seara , o pedio ao Capitão António Moniz, que lho negou com o pretexto , de que eíla embarcação ( com outra mais arribada a índias ) eftava deftinada para o ferviço dâquellas Conquiftas , onde faria falta ; porém as forças do feu ardente efpirito , que fabiaõ vencer ma- yores embaraços , pozeraÔ logo promptas duas canoas, éfe fez à vela em 18 de May o. 555 Defembocou a barra do Periá para fubir a Cof- ta ; mas achou-a taó brava , que as embarcações , já quafi foçobradas , arribarão a terra j e feguindo por el- la a fua jornada , defenganado de poder vencella pela navegação, entrou a lutar com mayores perigos ; por- que depois da trabalhofa marcha de mais de trinta dias , fe lhe oppoz no da vefpera de S. Joaõ Bautifta hum cor- po de Tapuyas de corfo , que fe compunha de noventa: era igual o numero dos que lhe obedeciaõ ; mas ama- yor parte ta ô inferiores na qualidade , que fó de quinze fazia confiança ; porém ajudados de oito Portuguezes , alguns delles Soldados , e todos do valor do mefmo Commandante , foy tal a refiítencia na fua retirada , até fe amparar de fitio mais coberto , que ainda que a baga- gem ficou pordefpojo aos inimigos , lhes cuílou tanto fangue , que foraõ elles os que rogarão com as pazes j que obfervando taõ mal , como coíluma fempre a fua barbara aleivofla , naõ fentiraõ também o caíligo delia com maõ menos pezada. 554 Neftas occafioes perdemos três índios dos de melhor nome j e o Padre Fr. Chriftovaõ com huma ef- pada , e huma rodella , fe moílrou em todas taõ bom Capitão, como Religiofo :. nellas também fe diílingui- raõ o Padre Fr. Joaô feu Companheiro , o Padre Bal- thafarJoaõConea, que ficarão feridos? ejoaõ Perei- ra ..'..■ i,,h " do EJladodo Maranhão, Liv. VIL 241 rã com algumas v entagens , o fegundo Vigário dà Ma.- Anno 1.626. triz do Pará , e o ultimo Soldado da fua guarnição , que paíTavaô ambos a Parnambuco ; mas o rigor da guerra , naõ fendo na jornada mais perigoíb , que o das afpere- zas dos caminhos , com huma total falta de mantimen? tos, a conílancia do virtuofo Commandante , influía •tanta nos ânimos de todos ,. que lutando fempre com a, morte , chegarão vitorioíbs no dia 25 dejunho ao Pre- fidio do Seara , onde os deixaremos bem agazalhados do feu Capitão Martim Soares , por nos eftar chamando o Governador Francifco Coelho. 555 Com a noticia da invafaõ da Bahia de Todos os Santos , deixámos no anno de 1624 ao Governador do Maranhão Francifco Coelho de Carvalho na deferc- fa da Capitania de Parnambuco , a inílancias do novo General do Eílado do Brafil Mathias de Albuquerque^ mas reftaurada gloriofamente aquella Capital pelas gran- des Armadas de Portugal , e de Caílella no (inalado dia primeiro de Mayo do anno paíTado , para que naõ fofle fó o feu zelo o que concorreíle neftas oceaíiões para o apparato da fua fama, deu também iguaes provas do feu valor , e difciplina militar, furgindo os Hollandezes na bahia da Traição (fete léguas da Povoação da Parahi- ba ) com trinta e quatro nãos , de que era General, e de lluftre nome, Vvalduino Henrique, deftinado para o foccorro da mefma bahia , que os Eílados Geraes fen- tiaõ já ameaçada da juftiffima fatisfaçaõ, a que fe difpu- nha a Monarquia Hefpanhola na formidável uniaõ das armas Lufitanas ; porque acodindo logo Francifco Coe- lho à oppofiçaõ do feu defembarque com hum corpo de Tropas de quinhentos Soldados , e feifcentos índios, por mais que já achou bem podados em terra feifcen- tos homens na vigilante guarda de muitos enfermos , fo* ra5 taõ pezados os feus golpes , que faltando forças aos inimigos para rebatellos , depois da conílancia dè algu- Hh mas 1 » " I ,:i.|. HftiJ '<>»< ri 242 Annaes Hiftôriccs 1Ú26. mas horas , fe retirarão à fua Armada com importante perda. , 556 Vitoriofo Francifco Coelho, fe recolheo ao Recife j e como já via defauombrado das armas HoL- landezas o Eílado do Brafil , fe difpoz logo para a via- gem do Mara-nhaõ , a que dando principio nos fins de Julho f a bordo de hum navio , que feguiaõ quatro ca- ravèlões , governados pelo Provedor mor da Fazenda Real Jacome Raimundo de Noronha., pelo Capitão mor do Graõ Pará Manoel de Soufa de Eça , pelo Ca- pitão Joaô de Torres , e pelo Capitão Francifco de Azevedo , guarnecidos todos de boa Infantaria , che- gou felizmente ao Seara, onde tomou folemne poífe do feu novo Governo , por fer então da jurifdicçao delle efta Capitania , que pertence hoje à de Parnambuco , como já fica referido. $}j Tratou logo da reedifícaçaõ daquella Fortale- za , acerefeentandolhe algumas defenfas com poucos dias de trabalho j e depois de vifitar também a populo- fa Aldeã do grande Principal Algodão , continuou a fua viagem em 1 5 deAgofto, aííiílido já do Padre Fr. Chriílovaô de Lisboa na embarcação do Provedor mor, ena do Capitão JoaÔ de Torres do Padre Lopo de Cou- to, e outro Religiofo , ambos da Companhia deje- fus ; mas navegando todas arrazadas em poppa , era o vento taõ rijo , e com mares taõ groflbs , que correrão perigo as do Provedor mor , e Manoel de Soufa , por tocarem em baixos , de que fahiraô como por milagre j ate que permittindo a Bondade Divina , que chegaífem todas a falvamento à Ilha do Maranhão , refoluto Fran- cifco Coelho a feguir por ella a fua jornada , tomou ò Forte de S. jofeph de Itapary , onde defembarcou com muita parte da fua gente em 22 do mefmo mez deAgof- to. 5| % Adiantou-fe logo o Padre Frey Chriftovaõ .; ^1 tal porque , ' âo Efiado âo Maranhão , "Llv. VII. 24 3 porque como o Governador havia de paíTar por huma Anno 1626. das Aldeãs das fuás Miftoes , lhe foy preparar a hofpe- dagem 3 na qual com eíFeiro fe admirou bem a profu- faõ , lendo o concurfo de noventa peíToas , ou foíTe mi- lagre do feu animo , ou da fatisfaçaõ das divinas pro- metias ao feu Seráfico Patriarca. Era breve o tranfito até à Cidade de S. Luiz 5 mas Francifco Coelho , que queria dar tempo para as difpoíiçÕes da fua entrada , detendo-fe alguns dias nos goíloíbs feílejos dos feus no- vos fubditos , a fez às três horas da tarde de 3 de Se- tembro , tendo paíTado na mefma manha do rio Cuty ao Forte de S. Francifco a bordo de huma canoa gran- de, que alli lhe poz prompta o mefmo Cuílodio. 55 9 NaÕ havia ainda a prevenção de Pallio para a formalidade do feu recebimento } e fervindo-fe de hum , que tinha mandado o Governador do Eftado do BrafiL para as Procifsões da fagrada Euchariília, ( fanto .minif* terio , em que le empregava ) fe lhe foltarao duas das varas até a entrada da Igreja Matriz j o que podendo fer fó ca fu alidade, fe tratou logo como myílerio com os fataes prognoílicos , de que o Governador Francifco Coelho acabaria a vida no Maranhão , que com erTeito fe verificarão 5 parece, que difpondo-o a Divina Juíli- ça , como caíligo daquella indecencia : no principio do aclo diííe a oração do Ceremonial , que pertencia a hum dos Senadores , o Padre Miguel Barreto , Clérigo do habito de S. Pedro , que para fer em tudo elegante , foy também breve j e o Governador, depois de tomar a fua poíTe no Tribunal da Camera com a aíliílencia do Capi- tão mor António Moniz Barreiros , fe recolheo com a mefma folemnidade , entre as acclamaçoes de todo o povo , ao apofento , que eftava preparado para a reíí- dencia da fua peífoa. 560 Nas bem ponderadas difpoílções do feu regi- mento , levava elle já como feguros os defempenhos da Hhii fua 1 i»'! vw 244 Annaes Hiíloricos Ânno 1626. íua occupaçaõ no ferviço do Principe , e utilidade pu- blica ; porque advertindo com maduro confelho os Mi- niftros da Corte , que em tanta diítancia de permeyo , com notória falta de oculares noticias , mal fe podiaõ premeditar para o acerto das refoluções , os taõ vários , como continues accidentes , de que naturalmente cof- tuma enfermar a fucceíTaõ das horas ., quanto mais dos annos, para atalhar o feu fatal perigo na prompta appli- caçaõ de efficazes remédios , fe lhe eftendeo toda a ju- rifdicçao , que pareceo precifa , de que foube ufar efte benemérito Governador com huma taõ prudente mode- ração , que poucas vezes neceffitou de fe valer delia. 561 Para a reforma de vários abufos , aiTim poliria cos , como militares , introduzidos pela ignorância , ou pela malícia daquelles primeiros habitadores , deu Fran- cifco Coelho todas as providencias , que julgou necef» farias, que refignadamente fe recebiao com huma geral aceitação dos povos 5 e vendo também , que a Fortale- za de S. Filippe era de fachina , obra de pouca duração, ainda que de boa defenfa para as baterias da artilharia , a principiou logo a fabricar de pedra , e cal ; e com tan- to calor , que crefcia fem tempo 5 mas porque já o he para a' relação das memorias , que tocaô na ordem com que efcrevo à Capitania do Graõ Pará, quando nao acho outras na do Maranhão , que poíTaõ merecella nas do prefente anno , a deixarey por ora occupada toda nos applaufos do feu Governador, ou fejao effeitos na- turaes dos alvoroços da novidade nas influencias da li- fonja, ou do verdadeiro conhecimento das fuás virtu- des. 562 Governava o Pará o feu Capitão mor Bento Maciel ; mas já com defagrado daquelles moradores ; porque ainda que tinha muitos dos predicados , que fe fazem dignos da eftimaçaõ dos homens , exercitava o poder do feu cargo com tanta afpereza , que a impaci- ência .1 . .. " do EJlado do Maranhão , "Liv. Vil. 24 5 encia com que fe tolerava , apreífadamente caminha- Anno 162.5, ria para os fataes delírios da defefperaçaõ, fe conhecen- do elle os ânimos de todos , nao foubeífe fempre mo- derallos na fua mayor fúria , fervindo-fe bem da natural indullria de que era dotado. 563 Era a ordinária , de que fe valia com fegura for- tuna , a das entradas aos Certões do grande rio das Ama- zonas ao reígate de efcravos ; e aproveitando-fe para huma de ftas do corado titulo de mandar atacar huns Ef- trangeiros , que depois da guerra de Pedro Teixeira ain- da alimentavaõ as efperanças de novidades nas viíí- nhanças do Curupá , favorecidos de muitos índios da obediência daquella Fortaleza , encarregou a expedi- ção a hum filho natural , do feu mefmo nome 7 e appel- lidos , que fahindo da Cidade de Belém no fim de Janei- ro , aífiftido do Capitão de Infantaria Pedro da Coíla Favella , com as forças de que neceííitava, defempe* nhou inteiramente o projecto do pay ; porque tratando fó de reígatar muitos Tapuyas, fez tapar aboca por algum tempo a huma grande parte dos clamores do po- vo. 564 Neíles mefrnos dias , que chegavao já ao pri- meiro de Abril ? fízeraõ os Religiofos da Companhia de Jefus hum requerimento no Senado daCamera, para permittirfelhes a fua fundação naquella Cidade j mas oppondo-le logo o Procurador em nome do povo , com mais paixão , que zelo , ficou efcufado ; fó com o fun- damento , de que achando-fe ainda a Povoação tanto nos feus princípios , nao cabia nella , principalmente > quando tendo já os dous Conventos de Noíta Senhora do Monte do Carmo , e Santo António , nao havia fi- tio para terceiro , por eílarem todos repartidos 5 porém o certo he , que por mais que esforçavaÒ com eíías ap- parencias a jurtincaçaõ da fua negativa , fe defcobriâ bem a verdade delia nos melancólicos penfamentos > com W 1 3. ■ [w. ''''■ I 246 Annaes Hijloricos Ânuo 16260 com que difcorriao aquelles moradores , fobre a iritro- ducçaõ dos novos Miílionarios , confiderando-a fempre como total ruina dos feus intereíTes na feparaçaõ do fer* viço dos índios. Sentirão os Padres a defattençaõ da fua fupplica j mas naõ defconhecendo a legitima caufa de taô dura exclufiva /prudentemente diííimularaõ a fua jufta magoa , recommendando fó ao ordinário benefi- cio do tempo o melhoramento da fortuna. 565 O Capitão mor Bento Maciel , na entrada do filho , fim logrou as medidas , que tinha tomado para en- treter as queixas dos moradores do Pará j porém como as conveniências nunca chegaò a todos , ainda fe ou- viaõ muitas delias, por mais que fufFocadas, quando as fez foar hum novo accidente ; porque celebrando huma grande feita os Topinambazes , como a mayor entre os índios da America he a do Deos Baccho , a que fe fegue a perda dojuizo 5 alguns dos Principaes na perturbação delle , querendo fazer orientações da fua valentia , pa- rece que differaõ, que com facilidade podiaõ deftruir os Portuguezes , apontando o modo j e Bento Maciel mandando logo devaçar defta beberronia , fe condem- naraõ vinte e quatro dos da primeira eftimaçaõ a morte natural , que por ordem fua fe executou em hum mef- mo dia às cutiladas , e eílocadas , pelas ferozes mãos de outros Tapuyas íeus inimigos j cruel procedimento , que recebeo o povo com taõ geral efcandalo , que até peri- garia o focego publico da Capitania, fe a certa muta- ção de theatro , 254 Annaes Hilloricos u-. M Anno 1629. Eílrangeiros dos Tucujús , que desfrutavao aquella Ilha com grande damno dos intereíTes Portuguezes. 582 Para tamanha empreza fahio do rio de Belém do Pará efte Commandante em 21 de Junho com as canoas neceíTarias para o tranfporte de fetenta Solda- dos , e grande numero de índios ; e pondo as fuás proas na mefma Ilha dos Tucujús > naõ fó venceo a valero- fa oppoíiçao dos inimigos no defembarque das fuás Tro- pas , mas também as poílou junto do Forte chamado do Torrego, que aflirn na fabrica para a defenfa, co- mo na qualidade da guarnição ; excedia muito a todos os outros , que ainda confervavaõ. 585 Naõ levava forças para efcalar aquellas mura- lhas , nem artilharia para batellas ; porém como na ef- colha das acções preferia fempre as mais honrofas , era- prendendo o feu rendimento por hum bloqueyo , abrio a trincheira do Quartel principal , tanto nas fuás vifi- nhanças , que eraõ ataques verdadeiramente do mais regular fitioj e naõ parando aqui o feu valor, paf- fou ainda muito mais a diante ; porque bem informa- do de que os inimigos efperavaõ todas as horas hum grande comboy com numerofa efcolta de Tapuyas , fuftidos de cincoenta Soldados ; dos poucos que tinha entregou logo vinte ao feu Alferes , e trezentos ín- dios com expreíTa ordem para atacallo na mefma mar- cha ; e executou-a elle com refoluçaõ taÕ valerofa , que matando quatro dos mefmos inimigos , em que entrou o Cabo , e ferindo muitos , poz os mais em fu- gida. 584 Neíla occafiaõ perderão as vidas , depois de bem vingadas y dous dos noíTos Soldados , que nos deixarão fó os appellidos de Velofo , e Valle ; e fe dif- tinguio outro chamado Simaõ Pires , que já com a fe- rida de huma frecha f foy o que declarou aquella vi- toria, rendendo corpo a corpo os últimos alentos do Com- Ufl do miado do Maranhão , Liv. VIL 2 j 5 Commandante dos inimigos ; mas ainda que com for- Armo 1629. tuna pouco diíTemelhante fahia fempre de todas as acções o Capitão Pedro da Coíla , como para haver de continuallas fentia já huma total falta de munições de guerra , muito a feu pezar levantou o bloqueyo j porém retirando-fe para a Aldeã de Mariocay com as efperanças de novos íbccorros , que já tinha pedido ao Capitão mor Manoel de Soufa , fe difpunha com tu- do para fazer mayor o feu triunfo em operações mais arrifcadas. 585 Recebeo o Governador na Cidade de S. Luiz apreflados avifos de todos os fucceflbs deíla expedição com outros mais , de que em vários braços do grande rio das Amazonas , da parte do Norte , fe viaõ algumas embarcações de Eftrangeiros , que fuílentavaõ o co- mercio dos índios com grave prejuízo dos moradores do Pará , além do perigo da confervaçaõ própria na fua efcrupulofa vifinhança ; e tomando logo aqueilas me- didas , que lhe parecerão convenientes , ordenou ao Capitão Pedro Teixeira , que com todas as forças da Capitania paífaífe a Ilha dos Tocujús , fobre o mefmo Forte do Torrego , depois de incorporado com o Ca- pitão Pedro da Coíla na Aldeã de Mariocay. 3 %6 NaÕ neceííitava de muitos incentivos para ac- ções taÕ honrofas o militar efpirito deíle Commandan- te ; mas antes como nellas feguia fempre os naturaes impulfos , adiantou de forte todas as providencias para a jornada , que no primeiro de Setembro largou as vér las no rio do Pará com hum fufficiente corpo de Tro- pas , aílim no numero , como na qualidade ; e enchen- do em tudo as inílrucçÕes do feu General , fez de to- das hum prompto defembarque junto do mefmo Forte, fem que a vigorofa oppofiçaõ dos inimigos podeífe im-.. pedillo. $%j Experimentarão elles femelhante fucceíTo na obra !*'■ 256 Annaes Hifloricos l 1 ":!,^,. Anno 1629. obra dos ataques : porque os abrio , e aperfeiçoou Pe- dro Teixeira taõ viíinhos das fuás muralhas , como fó deíTenhados para a operação da mofquetaria , e contí- nuos aíTaltos - 7 fendo taõ viva a guerra , que lhes fazia por eíle modo , que os trazia todos em hum trabalhofo defafocego , por mais que a conftancia da fua defenfa competia fempre com a mefma expugnaçaõ j até que depois de duas fahidas , em que derramarão baftante fangue , reduzidos já à ukima miferia por falta de com- boyos 7 que fe lhes cortavaõ todas as horas , pedirão ceíTaõ de armas, para tratar das Capitulações do feu rendimento. $$$ Concedeolha o novo Commandante pelo pre- fixo termo de três dias 5 mas acabados elles , inftante- mente pretenderão a renovação do mefmo prazo com a íímulada militar induítria de receberem hum íbccorro de trezentos Soldados , que eíperavaõ todos os inflantes ; porém quando os feus CommiíTarios íe esforçavao mais na pretençaõ , ( rebuçada também com o pretexto , de que os dirTerentes pareceres dos Officiaes na entrega do Forte neceílitavaõ de mais tempo para concordallos ) Pedro Teixeira , que fe achava já bem informado do feu animo por huma Carta , que tinha tomado a hum Correyo , mandou atacar o mefmo foccorro $ e o feu fatal eftrago , fervindo entaõ de defengano ultimo à conftancia de Gemes Porcel , Irlandez de naçaõ , que governava o Forte , o rendeo naquelle mefmo dia , de- pois da valerofa refiftencia de trinta , em que fe conta- vaõ as occafiÕes pelas horas delles , tirando ainda as honrofas Capitulações de fahirem todos com as fuás fa- zendas , e paflagem livre para Portugal , além das mais ceremonias , que authorizando fempre a reputação da humana gloria , faõ verdadeiros apparatõs para os fu- neraes dos vencidos. 589 Para a folemnidade da entrega foy nomeado o Ca- !fc do E/lado do MaranJiaÕ , 'Liv. Vil» 4 J 7 Capitão Aires deSoufa Chichorro, que fez todas as Anno 1.625I4. funções de General de Artilharia j e depois de mandar retirar a do mefmo Forte , e evacuar a fua guarni- ção , que chegava ainda a oitenta Soldados , afMidos de hum grande numero de índios frecheiros , o de- molio inteiramente , por parecer inútil a confervaçaõ delle. . 1 ■.;. ■ 590 Vitoriofo Pedro Teixeira tranfportou logo as fuás Tropas à Aldeã de Mariocay j, onde as refrefcava para novos empregos, quando os rebeldes inimigos , ar- dendo nos defejos de vingança da próxima defgraça , o bufcaraõ dentro de breves dias com duas nãos de força j mas procurando elles com a refoluçaõ mais valerofa poílar em terra as fuás equipagens , foy taõ deftemida a oppofiçaõ no feu defembarque / que depois de flcac fobre a mefma praya amayor parte dos Soldados, de que fe compunha , fe retirarão poucos às embarcações; defpedaçados a feridas ; e fervindo fó as cicatrizes dek las nas laftimofas attenções dos mais Companheiros ,' que fe achava ô a bordo , de lhes inculcar muito mayor, a perda , a foraõ chorar a outro porto. 591 CaminhavaÕ já com muita preíTa os últimos dias deite anno ; e entendendo Pedro Teixeira , que na eftaçaõ do tempo lhe naõ cabiaõ mais triunfos , fê recolhia ao Pará 5 porém naõ foy menos gloriofo , que os paflados , o que logrou ainda o feu valor em nova occafiaõ 5 porque fahindolhe ao encontro o gentio In- gahiba , unido todo aos intereíTes dos inimigos , o def- truio inteiramente , depois de algumas horas de com- bate. 592 Em todos os fucceíTos defta expedição , fe íl- nalarao muitos dos que entravaõ nella 5 mas além do feu Commandante , e dos Capitães Aires de Soufa Chichorro , Pedro da Coíla Favella , e Joaõ Soeiro , fó o Alferes Joaõ do Porto , e o Sargento Pedro Bayaõ Kk de m Annoi m m Sr f l ! "r. 258 Annaes Hipricos de Abreu , fe recommendarao as noíTas memorias. 595 Luiz Aranha de Vafconcellos , já com a mer- cê do habito de Chriíto , tinha fuecedido. por Patente Real a Manoel de Soufa de Eça no emprego de Capitai* mor do Graô Pará em 18 de Outubro $ porém aquelles moradores , que ingratos à memoria do íeu anteceíTor , o receberão como grande fortuna , ( regulando-fe pelas experiências , que haviaõ tirado da civilidade do feu modo na expedição do defcobrimento das Amazonas do anno de 1625 ) conhecerão bem, dentro de poucos dias , que a authoridade no Governo coíluma fer fem- pre o mais feguro exame das condições dos homens j porque aquelle mefmo , que fe inculcava o mais agra- dável nas igualdades de Companheiro , defcobrindo lo- go rias diferenças de fuperior a fua verdadeira nature- za, lhes era já taõ aborrecivel , como moftraraõ mui- to brevemente as futuras memorias , por fer eíla a ulti- ma , que poíTa merecella nas do prefente anno. ANNAES 259 ANN AES HISTÓRICOS DO ESTADO DO MARANHÃO. LIVRO VIII S UM MÁRIO, GOVERNADOR manda emprazar o Capi- tão mor do GraÚ Vara Luiz Aranha de Vafcon- cellos , e fiibjiitiie o governo da Capitania no Provedor mor da Fazenda Real Jac orne Rai- mundo de Noronha. Chega a Cidade de S. Luiz a noti- cia da invajao de Pamambuco com a do nafcimento do Príncipe de Hefpanha , cjue o Governador avifa logo ao Pará ; e para a defenfa da Capitania nomea feujilho Fe- liciano Coelho. Os Hollandezes , com outros levantados? intentao a povoação do grande rio das Amazonas. Orde- na o Governador ajacome Raimundo , que ataaue o For' te de S. Filippe guarnecido de Inglezes ; e fubfiitue no Kk ii lugar p 260 Annaes Hijloricos lugar de Capitão mor a António Cavalcante de Albuquer- que. Ataca o Forte Jacome Raimundo , e o rende com grande gloria fua. Succedelhe no Governo daquellas ar- mas Feliciano Coelho, que toma outro Forte chamado Cumaú , guarnecido também da NaçaÕ Ingleza. Conjir- mao-fe as noticias do projeólo de Hollanda ; e levantados de Inglaterra. Intenta o Governador mudar a Cidade de Belém , efe malograi' as difpofiçoes. Siíccede na Ca- pitania do Tara Luiz do Rego de Barros. PaJJa ejle a Cidade de S. Luiz fem ordem do Governador 5 e voltando ao exercido do feu lugar , naÕ he admittido 5 porem paÇ- fados alguns mezes continua nelle. Vifita o Pará o Go- vernador Francifco Coelho , e morre na Capitania do Ca- mutá. O feu elogio , e o lugar dafiiafepultura. Pajfa a índias Feliciano Coelho. % Anuo 1630. 594 m UCCEDEO o anno de 1630, em que continuava o Capitão mor do Graõ Pará Luiz Ara- nha de Vaíconcellos no exer- cício do feu emprego j porém com taes defordens, que irrita- dos os ânimos daquelles mora- dores , esforçarão tanto a repetição de authorizadas queixas na prefença do General do Eftado , que enten- dendo elle , que fe achava já muito perigofo o focego publico nos defatinos da defefperaçaõ , naô fó o man- dou fufpender , mas também emprazallo , para que no termo de trinta dias appareceíTe na Cidade de S. Luiz , onde refponderia judicialmente a todas as culpas , de que o accufavaõ j e fegurando ao Senado da Camera , que da mefma forte empenharia fempre todo o feu cui- dado na quietação dos povos > lha recommendava com toda a efficacia. Da- do FJiaâo ãõ Maranhão , Liv. FUI. 261 595 Davalhe também a noticia do infeliz fucceífo Anno 1630. de Parnambuco na invafaõ das armas Hollandezas ; e cjue quando a temeridade daquelle projecto fe naõ ref- tringia a menor recinto , que ao de toda a America , como a viíinhança de taõ poderoíbs inimigos , lhe naõ confentia a feparaçaõ da fua reíidencia de S. Luiz, mandava a feu filho Feliciano Coelho , com os feus po- deres , para acodir à Capitania , com a defenfa que lhe foíTe poffivel , nas acanhadas forças de todo o Eílado j efperando fem duvida das obrigações da fua honra , que faberia bem defempenhallas até os últimos alentos da vida. 596 Mas para que fe naõ occupaíTem inteiramente os ânimos nos melancólicos difcurfos de taõ trifte nova com o fatal perigo de fuffocallos , cuidou de divertillos ao mefmo tempo , communicandolhe também a do fui* pirado nafcimento do Príncipe de Hefpanha com en> penhadas ordens para fe feítejar com as demonílrações que merecia : acertadiílíma liçaõ dos melhores meftres da politica em huns taes accidentes , que ameaçando fempre o focego dos povos, na arrebatada confterna- çaõ da mefma novidade , ordinariamente fe deixaÕ ven- cer delia, por apprehenfões menos generofasj porém a fua pratica he de muito perigo nas ponderações dos Príncipes foberanos ; porque preferindo as lifongeiras elevações do efpirito às verdades do fufto , as mais das vezes fe antecipaÕ as fatalidades às fuás providencias , naõ fó com damno irreparável da utilidade publica > mas ainda com conhecido rifco da confervaçaõ própria. $9j Com a ordem do Governador para a fufpenfaõ ^o Capitão mor Luiz Aranha, remettida ao Ouvidor Geral António Vaz Borba , levou também outra Feli- ciano Coelho para a fubílituiçaõ daquelle lugar ; e em virtude delia , a conferio no dia 29 de Mayo ao Prove* dor mor da Fazenda Real Jacome Raimundo de Nqro» nha f 2Ó2 Annaes Hijloricos ir '■*: m A11Í101630. nha, Fidalgo da Cafa Real, e taõ conhecido pela no- breza do nafcimento , como pela fua grande capacida- de, fem que a efficacia das fuás efcufas podeíTe remover a eleição , que approvou Francifco Coelho , como bem prevenida nas meímas inftrucçoes , que tinha dado ao filho 3 mas entre a applicaçaÕ de tantos cuidados , lhe fazia já o mayor pezo o da expedição dos Tocujús , quando lhe chegarão as alegres novas do feu feliz êxito. 598 Tinha também noticias o Governador , de que na boca do grande rio das Amazonas borde] avaõ ainda algumas nãos do Norte , que já favorecidas do novo dominio de Parnambuco, efperavaõ outras de Inglater- ra, queconduziaõ a feu bordo quinhentos homens de defembarque , com as vaílas idéas de fe eftabelecerem na difputada Ilha dos Tocujús para a povoação do mef- mo rio j razaõ porque o gentio daquelles Certões , e de todos os mais do Grão Pará , ou abfolutamente nega- va a obediência à Capitania , ou vacilava muito na fide- lidade com perigo evidente da confervaçaõ delia j por- que unido todo aos mefmos inimigos , lhes ficava taô fácil a execução do feu projecto , como difficultofa às forças Portuguezas a lua oppoííçaõ ; e para deftruillo , antes de fe poder reduzir a pratica , ordenou logo ao Ca- pitão Pedro da Cofta , que examinaífe bem o verdadei- ro eftado de tamanha empreza. 599 Recebeo as ordens efte Commandante ; e co- mo difpunhaõ advertidamente , que a inteira execução delias correíTe fó por conta da fua actividade , a empe- nhou de forte , que fem mais tempo, que o de poucos dias , fahio da Cidade de Belém 5 e chegando com fe- liz viagem aos Tocujús , deu conta logo ao Governa- dor , de que no rio de Filippe ( que he das mefmas ter- ras ) fe achavao já fortificados duzentos Inglezes , que fe faziaÕ formidáveis com a afliftencia de todos os Ta- puyas da fua alliança $ mas que elle ficava obfervando os íiii do EJlaâo do Maranhão , Liv. VIII. 265 os Teus movimentos com a vigilância , que era precifa Armo 1630; paia também fe aproveitar de qualquer lifonj a da fortu- na. 600 Por eílas verdadeiras informações reconheceo Francifco Coelho o grande poder dos inimigos ; e por elle fabendo também, que o que efperavaõ todos os inftantes nos foccorfos da Europa o deixaria incontraf- tavel , procurou atalhar tamanho perigo com militar acordo j porque difpondo logo aquelles esforços j que lhe parecerão neceíTarios para os atacar vigorofamente antes da uniaõ , encarregou a empreza a Jacome Rai- mundo de Noronha com os mefmos poderes de General do Eftado , fubílituindo no. governo da Capitania do Pará a feu cunhado António Cavalcante de Albuquer- que , que o recebeo das mãos do feu anteceífor no dia 28 de Novembro. 601 Entre os marciaes eílrondos tíefta expedição, fuccedeo o anno de 165 1 5 e como além da grande acli- Anno 1631. vidade de Jacome Raimundo , nas prevenções delia , as ajudavaõ muito os poderes , que tinha para vencer to- dos os embaraços , que fe lhe oppunhaõ'.; no dia 28 de Janeiro fahio do rio de Belém do Pará com treze canoas, guarnecidas de boa , ainda que pouca Infantaria, e cref- cido numero de índios guerreiros , que fe augmentou tanto nas populofas Aldeãs do Camutá , que já partio delias com trinta e féis embarcações. 602 Levava por feu primeiro Subalterno, coma Patente de Sargento mor , a Manoel Pires Freire , Ca- pitão a&ual da Artilharia , que também hia encarrega- do de algumas peças de campanha -, e ao Capitão de In- fantaria Aires de Soufa Chichorro , aos quaes fe havia de juntar Pedro da Cofta Favella , que já o efperava com as armas na maõ \ e como o vento da fua fortuna parecia que lhe foprava as velas , dentro de poucos dias tomou a terra dos Tocujus , fem que os inimigos lhe difpu- 0>!\i> V 2Ó4 ; ;; Jlnnaès Hifloricos 1 "1 «., y li Sn An«ò 1631. difputaíTem o defembarque 5 porém elle , que defejava fempre as occafiões de mayor honra , bufcando logo a fua vifinhança , poílou as fuás Tropas taõ perto do For- te de FilippeV que eom total defprezo do vivo fogo da fua guarnição -, que também fe compunha de boa arti- lharia, abrio os ataques a pouco mais de tiro de piftola. 605 Neíle primeiro exame da fua fortuna íe viraõ os inimigos taõ impacientes , que entendendo melhora- riaõ delia nas operações mais vigorofas , entrarão logo nas de varias fahidas , encaminhadas todas à deftruiçaõ das nofías obras j mas como dos perigos fó tiravaõ fem- pre mais evidentes provas da fua defgraça , fe reduzirão todos à interior defenfa das muralhas 5 e aperfeiçoadas as trincheiras , principiarão a laborar as fuás baterias , que naõ fendo capazes de abrir brecha por falta de cali- bre , a confternaçaõ dos mefmos inimigos as fazia formi- dáveis ; até que melhorando muito de valor com as li- , r ;} r ,_ coes , que a todas as horas aprendiaõ no arroj amento da mefma expugnaçaõ , já a deixavaõ cada dia mais glorio- fa -, quando obíervando bem , quanto excedia o nume- ro dos feus cadáveres ao dos defenfores , defmayaraõ os ânimos da mayor parte delles 5 e metendo-fe em hu- ma lancha grande , eduas canoas com o feu Comman- dante , chamado Thomás , Soldado velho , e de repu- tação nas guerras deFlandes, recommendarao a fua fal- vaçaõ às íòmbras da noite ; porém como efta também muitas vezes fe defcuida no favor dos cobardes , per- cebido o rumor das embarcações pelas fentinellas Por- tuguezas , foraõ abordadas , entradas , e rendidas pelo Capitão Aires de Soufa Chichorro , afíiftido de quaren- ta homens com movimento taõ arrebatado , que fendo taõ diftin&as eílas três acções , parecerão fó huma. 604 Cincoenta foraõ os que injuriarão a fua memo- ria nos eílragos últimos das vidas , quando podiaõ im- inòrtalizalias enterrando os corpos na nobre fepultura , ifcil do E/lado do Maranhw , Liv. VIXI- 26$ que cefampararaõ os Teus efpiritos ; e para que fervif- Armo 163 1, fem demais authorizado documento à poíteridade as confifsoes da noíTa vitoria pelas mefmas bocas dos ven- cidos , ficarão ainda de todos elles quatro teílemunhas . deípedaçadas a feridas. 605 Os que tinhaõ ficado na guarnição do Forte ( ou por defattendidos do Commandante , ou por repre- henderem o feu defacordo, naõ querendo feguillo ) de- pois de fazerem todos os esforços para acreditar a fua conílanciano mefmo rendimento, fe entregarão prizio- neiros de guerra o primeiro de Março ; e demolida logo aquella defenfa até os aliceíTes , por fe entender , que fe naõ podia confervar , fe retirou Jacome Raimundo cheyo de defpojos , que generofamente repartidos pelos feus Soldados , refervou elle para íi fó a joya do nome. 606 Naõ acho , que eftas occafiões nos cufta fiem vidas , mas fim muito fangue j porém como era ta 5 il- luítremente derramado , o tratarão fó ainda aquelles mefmos que o vertiaõ , como facrificio o mais honrofo para a celebridade da vitoria ; na qual fe finalaraõ , além do Commandante , os Capitães Pedro da Cofta Favel- la , Aires Chichorro , ejoaõ Soeiro: o Alferes Jero- nymo Corrêa, e Simão Pereira , que fahiraÕ muito mal feridos j e o Soldado Manoel Machado. 607 Paffòu logo Jacome Raimundo à no íTa Fron- teira de Mariocay y mas quando já difpunha novos pro- jectos para o exercício das fuás Tropas , lhe fufpendeo a pratica delles, hum avifo de Feliciano Coelho , que com authoridade de Governador mandava retirallo ; dando por extinda , com. o rendimento do Forte de Fi~ Iippe , a de que ufava como Commandante daquella ex- pedição. 608 Bem defejou elle replicar a ordem ; mas rece- ando , que para a fua inobediencia naõ concorreriaõ os mais Cabos, detidos do temor, de que diílin&amente Li falia- ■ !illl 266 jínnaes Hiftoricos Anno 1631. f aliava com todos ., fe accommodou ao feu cumprimen- to com taõ conhecida repugnância , que bem moílrava que era preceito j e recolhendo-fe à Cidade de Belém do Pará, foraõ muito may ores as demonftrações de fen- timento pelos triunfos que perdia , do que ás de goílo , pelos que alcançara. 609 Em 10 de Março tinha chegado ao Pará Feli- ciano Coelho com todos os poderes do General do Ef- tado , que como fe empenhava na íua exaltação , fe re- folveo a bufcarlhe theatro , para que nas publicas re- prefentações da fua boa capacidade , convencidos bem todos os efcrupulos da eleição , fícaífem defculpadas as naturaes paixões do fangue 5 e para falvar os juílos re- paros da taõ antecipada nomeação dos mefmos poderes, fem que a arrebatada privação delles , na notória orTen- fa do merecimento de Jacome Raimundo , fe podefíe eftranhar como efcandalofa , declarou nas novas inílruc- çoes fe extendiaõ fó até o rim daquella expedição , de que o havia encarregado 5 razaõ porque Feliciano Coe- lho , logo que recebeo os primeiros avifos do feliz fuc- ceflb , com que fahira delia , mandou recolhello. 610 Defejava o Governador Francifco Coelho fa- cilitar por todos os caminhos as promettidas felicidades da futura Campanha , que encarregava ao filho , já taõ intereíTado na íua gloria , como no defempenho da mef- ma eleição ; e expedindo logo com militar acordo da Ci- dade de S. Luiz para a fronteira do Cabo do Norte , que havia de fer o theatro de guerra , a feu primo Luiz do Rego de Barros com huma Companhia dos melhores Soldados daquella guarnição , lhe ordenou , que obfer- vando bem os movimentos dos inimigos , fe aprovei- taífe fempre de qualquer conjuntura , que lhe parecei fe favorável para enfraquecellos , principalmente na fe- paraçaõ de todos os índios feus alliados , que lhes feria o golpe mais íêníivel, pelo que refpeitava à parte do co- -v mercio, I ; í>,l do Eãado do Maranhão, Liv.VIII. 267 mercio, que naõ podiaò fuílentar fem a tal alliança. 6 1 1 No meyo de tantos apparatos entrou a nova fucceílaõ de 1632 < e achou taõ empenhado o Gover- Armo 1632. líador na fortuna do filho , como eíle também no feu defempenho , que lhe vinha a fer próprio por todos os principios ; mas ainda que aprefíadamente caminhava© ambos para o meímo fim , a virtuofa ambição do nome, nos floridos annos de Feliciano Coelho , fazia mais ar- dente a lua a&ividade. 612 Já como Tropas avançadas mandou reforçar ^ com a Companhia do Capitão Miguel de Siqueira, hum deft acamento , que também governava o Capitão Pe- dro da Coita Favella na fronteira de Mariocay , depois do rendimento do Forte de Filippe 5 e transformados os moradores do Pará no mefmo efpirito do novo Com- mandante , ou foíTe por conta da Iifonja , ou das efpe- ranças daquella expedição, fó feefcutavaõ fem horror eftrondofos rumores de apreftos militares 5 mas Felicia- no Coelho ,■ que por foffrer mal acclamações taõ ante- cipadas , fentia bem os fortes embaraços , que lhe dila- tava© o feu merecimento pelas acções próprias /rom- pendo já por todos , paliou ao Camutá , íitio accom- modado para o feu armamento , donde íàhio-no dia 19 de Junho aííiftido de duzentos e quarenta Soldados , e cinco mil índios , a bordo tudo de cento vinte e fete canoas. 613 Era fegundo Cabo , com efpeciaes recommen- dações também de Confeíheiro , o Sargento mor do Maranhão António Teixeira de Mello, ( cujas nobres façanhas feraõ brevemente o mais honrofo aíTumpto deu* a minha Hiftoria ) a que fe feguiaõ o Sargento mor Manoel Teixeira Laborao , Moço da Camera da Cafa Real ; e os Capitães Aires de Soufa Chichorro , e Bento Rodrigues de Oliveira ; além dos Capitães Luiz do Rego de Barros, Pedro daCofta Favella , e Llii Mi- I i.i 268 Annaes Hijloricos ',ii|i I #! Annoi632. Miguel de Siqueira , que campeavaõ já na mefma fron- teira dos inimigos. 614 Os primeiros paíTos encaminhou Feliciano Coe- lho ao caftigo bem merecido dos bárbaros Tapuyas In- gahibas , que fituados todos nas vifmhanças do Pará em difFerentes Ilhas da grande boca das Amazonas f era tanto o feu atrevimento , que ate ameaçava as noíTas Aldeãs { e ainda que juftiííimamente temerofos da fatif- façaõ , que lhes pediamos fe tinhaõ unido com muita parte das fuás forças para o foccorro dos Inglezes , que fe achavaõ com hum novo Forte chamado Camaú , nas mefmas terras dos Tocujús , junto dos dous já demoli- dos ; naõ ficarão poucos nos pátrios domicilios para o triunfo das Armas Portuguezas no feu fatal eftrago j o qual também fervindo de apreíTado correyo para o cui- dado dos inimigos , nas prevenções da fua defenfa , fe promettiaô os vencedores mais illuftre vitoria na valero- ia difputa delia. 615 A guarnição do Forte era nnmerofa , e tam- bém afíiftida de boa artilharia , que fe fazia formidável ; mas Feliciano Coelho fe poílou junto delle com tanto defafogo , que namorados da gentileza defta primeira acçaõ , os mefmos inimigos ficarão fem acordo para dif- putalla 5 e paíTando logo a efcolha de fitio para abrir aí trincheiras , a encarregou ao Capitão Aires de Soufs Chichorro com o deílacamento de trinta Soldados , e duzentos e cincoenta índios. 616 Fez Aires de Soufa a diligencia a todo o rifcc com militar acerto ; e recolhendo-fe a dar conta delia ao feu Commandante , deixou no fitio deíTenhado corr dez Soldados , e todos os índios ao Capitão reformadc Pedro Bayaô de Abreu ; porém elle obfervando berr a infenfibilidade dos inimigos , os efcalou taõ valerofa- mente naquella mefma noite 9 do mez de Julho , que dentro de três horas de combate lhe renderão as armas jul do EJlaão do Maranhão , Liv. VIU- 269 julgando-fe atacados ( nas horrorofas reprefentações do Anno 1632 feu defacordo ) de todo o poder do campo contrario j o qual também attribuindo hum taõ vivo fogo ao empe- nho fó de Pedro Bayaõ , no defaíbcego dos fitiados , fe naõ foube da fua entrega fenaÕ pelos avifos. 617 Achava-fe aufente do Forte o feu Comman- dante Rogero Fray , Inglez de Naçaõ , que em huma nao de boa equipagem havia fahido a comboyar outra , que efperava de Londres com o íbccorro já prome-tti- do de quinhentos homens 5 e malogradas eftas efperan- ças , fe recolhia ao feu Prefidio , quando pelas noticias dadefgraça delle fejadava foberbo , de que o triunfo fó fora de hum cadáver , por lhe faltar o feu efpirito no corpo da defenfa 5 porém Feliciano Coelho para cafti- gar o atrevimento com que o Inglez o hia bufcando , mandou abordallo por algumas canoas armadas em guer- ra , governadas pelo Capitão Aires de Soufa Chichor- ro, que defempenhou bem neíla grande acçaõ a fua mefma fama 5 porque defprezando o formidável fogo dos inimigos , os entrou taõ valerofamente no dia 14 do meímo Julho , que depois de forte reíiílencia , fendo já defpojo aos feus pés o Capitão Rogero , lhe meteo nas mãos as ultimas palmas da vitoria ; e reproduzidas para a devida diítribuiçaõ dos mais vencedores , coube a Pe- dro BayaÕ de Abreu muita parte delias. 618 Feliciano Coelho , que fem fahir do feu aloja- mento logrou duas vitorias no breve termo de cinco dias , depois de moftrarfe taõ bom Catholico 7 como Soldado , dando de ambas as devidas graças ao Senhor de todas , mandou arrazar o Forte Cumaú ; e carrega- do de defpojos, em que entrava também o navio , co- mo o melhor carro para o apparato do triunfo , fe reco- Iheo ao Graõ Pará ; porém nefta Cidade gozando pou- co tempo da fua fama , parlou a dilatalla no Maranhão com taõ empenhada , como virtuofafatisfaçaõ do Ge- neral III < Annaes Hifioricos neral do Eítado , memoria ultima em todo elle nas do prefente anno. 619 Logo no principio da nova fucceíTaõ de 1653, chegou com efFeito o grande navio , que Rogero Fray efperava de Londres o anno paíTado 5 e tomandofelhe da fua equipagem quatro pefíbas , que fahirao a terra , fe conduzirão à Cidade de S. Luiz , onde examinadas pelo Governador declararão uniformemente , que aquel- le foccorro , que fe compunha de baílante gente , e munições de guerra , fe encaminhava ao mefmo Roge- ro , por ordem de Thomás , Conde de Brechier , que com as defpezas do feu cabedal mandava fazer huma Povoação no mefmo fitio do Cumaú , conforme as Pro- vifõès , e Procurações , que trazia fuás 5 e que no por- to de Flexighen flcavaõ já fretadas algumas nãos por conta dos Éftados deHollanda (em que também entra- vaõ levantados de Inglaterra ) para o tranfporte de mui- tas Tropas , com o projecto da Conquiíla do famofo rio das Amazonas , que determinavaõ povoar depois de bem fortificado. 620 Fizeraõ grandes imprefsões todas eftas noti- cias no prudente difcurfo de Francifco Coelho ; mas fó para o cuidado da fua defenfa j porque ainda que o ameaçavaÕ os mefmos inimigos da parte do Sul , que já fe inculcavaõ formidáveis no intrufo abfoluto dominio de Parnambuco , ( tanto nas fuás vifmhanças , que a viagem ordinária da Cofia até a Cidade de S. Luiz , na5 paíía de oito dias ) entre as mais a&ivas afflicções do feu zelo ; prevaleciaõ fempre os defafogos da magnani- midade 5 e para que eíla podeíTe obrar na interpoíiçaô de cento e feíTenta léguas com a virtude reprodu&iva , depois de prefervar a Capitania do Maranhão de todos os fuftos na affiítencia da fua peííba com a do filho, que era também a mefma , fegurou a do Graõ Pará. 621 Levava Feliciano Coelho todos os poderes do Ge- do Eflado do Maranhão, Liv.VlII. 271. General feu pay ; e como nas memorias da mefma pro- Annoió33. ducçaõ também hia aíMido de efpirito dobrado , por mais que cuidou na juncçaõ de todas as Tropas do Pará ( aonde chegou em 1 2 de Mayo ) fe achou ainda com taõ poucas , que apenas baftariao para huma defenfa muito moderada , lhe parecerão ventajofas às fuperiores forças dos inimigos ; mas porque o defafogo do feu mef- mo animo , no total defprezo de tamanho perigo , o naó accufaífe de temerário , deixando viciada a melhor vir* tude , diftribuío logo para a oppofiçaõ todas as provi- dencias , que julgou neceíTarias. 622 Foy nellas a primeira a dos reforços do deíla- camento da fronteira do Curupá , que governava o Ca- pitão Pedro da Coíla com as efpeciaes recommendações de procurar fempre por todos os caminhos , ou foífem da induítria , ou fomente da força , a reconciliação , ou ultimo deílroço dos Tapuyas contrários , pela alliança dos Eílrangeiros ; porque ainda que nos juftos efcru- pulos da fua amifade nos naõ ferviífem elles para engrof- far o noíTo poder , fempre importavaõ muito para debi- litar o dos inimigos , principalmente na fubfiftencia na- tural ; pois faltandolhes efta , fornecida fô pelos mefc mos Tapuyas , mal podiaô fialla dos foccorros da Eu* ropa ; e fegurando bem neftas militares difpoíições a confervaçaõ da Capitania , tratou também das matérias politicas , que fe encaminhavaÔ ao augmento delia. 623 Tinha vifitado Francifco Coelho , logo nos princípios do feu governo , a Povoação de Belém do Pará , como já fica referido j e obfervando com militar acordo a quaíi invencivel irregularidade da íltuaçao pa- ra as defenfas da difciplina , pelos defeitos do terreno-, deu conta delles ao Minifterio de Madrid f que atten- dendo às bem fundadas ponderações do feu grande ze-r lo , lhe encarregou a eleição de outra nova planta para a mudança da Cidade , vifto fe achar ainda tanto na fua infan-» Lni-1. 272 Annaes Hijloricos ,, Anno 1633. infância; como também moílrava , que fendo pouca a perda dos moradores, no abandono dos pobres edifícios das fuás vivendas, eraõ muito importantes osinteref- fes, que fícavaõ lucrando na fegurança própria, além dos avultados das ordinárias grangearias na melhora das terras. 624 Em virtude , pois , de taõ acertada refbluçaõ da Corte , fubftituío logo o Governador em feu filho Feliciano Coelho a pratica delia , com os pareceres do Capitão mor, e mais peííbas de experiência , no que pertencia à efcolha do fitio j porém entrando eile neíla diligencia com tanto zelo , como actividade , fe achou obrigado laílimofamente a fufpendella, por fe lheoppo- rem todos aquelles embaraços , que por fataes influxos da paixão dos ânimos , quaíi fempre coítumaÕ confpi- rar contra os projectos mais bem premeditados da utili- dade publica. 625 Pela fufpenfaõ , e emprazamento do Capitão mor do Graô Pará Luiz Aranha de Vafconcellos , go- vernava ainda a Capitania António Cavalcante de Al- buquerque, quando em 22 doraez de Junho fuccedeo nella por Patente Real Luiz do P^ego de Barros , ap- provando a Corte neíle procedimento , o que tinha ti- do o Governador com Luiz Aranha ; mas eíla fuccef- faõ , que foy agora das mais eftimaveis aquelles mora- dores , lhes fera brevemente taõ odiofa , como fé verá nas memorias futuras , logo no principio do feguinte anno. 626 Já fica referido no lugar a que toca , que o Go- vernador Francifco Coelho , na primeira viagem que fez ao Pará , fundou a Povoação da Vera-Cruz no fitio do Gurupy ,; e como toda fe tinha fó devido aos cabedaes da fua diligencia , para perpetuar a mefma memoria na continuada fucceíTaõ da fua , paíTou delia Carta de Da- ta, eSifmaria a feu filho Feliciano Coelho , com todas as do Eflado do Maranhão, Liv. VIU. 275 as terras competentes para o feu deítricto , que lhe man- Armo 1633» dou logo demarcar com o titulo de Capitania , como entaõ lhe era permittido pelas preeminências do feu em-, prego , fem reftricçaõ alguma j porém quando neíta , que parecia fegura confiança por huns taes fundamen^ tos , gozava Feliciano Coelho da pacifica poíTe da ília doação , a Corte de Madrid , que a naõ confirmou , a conferio a Álvaro de Souía , filho primogénito de Gafpar de Soufa 5 Fidalgo , que nas fuás gloriofas ac- ções havia confeguido fazer tao illultre, como a fua a£ cendencia , a fama do feu nome , principalmente na grande occupaçaÕ do governo geral do Eftado do Bra? fil , que comprehendia naquelle tempo as Conquiftas do Maranhão , e Grão Pará , devidas ambas aos acer- tos bem acreditados das fuás repetidas expedições. 627 O Cartaz da graça fe prefentou ao Governa- dor Francifco Coelho nefte mefmo anno j e vendo el- le , que naõ podia replicalla com as reverentes reprefen? tacões dafuajuíta queixa na offenfa do carader , fem que fe entendeíTe , que era paixão própria , pela fenfivel '•' perda dos intereíTes , refignadamente lhe poz o cumpra- fe j mas no dia 14 de Dezembro paliou ao filho nova conceíTaõ de todas as terras do Camutá, muito mais vifinhas da Cidade de NoíFa Senhora de Belém , para fazer nellas outra Capitania ; na qual melhorou tanto de conveniências , que confolou bem a primeira magoa. ! 628 Sem outra novidade , que mereça memoria, fuccedeo o anno de 1634 ; mas como corre fpon de rri Anno 1634, poucas vezes as fantafias do difcurfo às \ verdades das experiências , logo nos princípios do mez de Janeiro ameaçou fataes alterações à Capitania do Pará ; por- que já convertidas as grandes, efperanças , que tinhaõ concebido aquelles moradores , pela entrada do feu Ca- pitão mor Luiz do Rego de Barros > no juílo fentimen* ' tmh to das fuás afperezas, lhe haviaõ eílas grangeado taõ Mm uni- Annaes Hi/loricos a Anno 1634. univerfal ódio , que temerofo elle dos bárbaros effeitos da fua commoçaõ , arrebatadamente defertou da Cida- de de Belém para a de S. Luiz. 629 Na íubftituiçaõ do feu lugar , deixou com tu* do nomeado a Feliciano Coelho , que fe efperava todos os inílantes das fuás terras do Camutá , onde já fe acha- va havia muitos dias j mas chegando logo no feguinte , fe efcufou delia com toda a modeília j e naô podendo reduzillo os moradores mais intereífados no focego pu- blico , pedirão todos com as inílancias mais aclivas pa- ra feu Commandante a António Cavalcante de Albu- querque , de que tinhaõ feguras experiências no exerci- do da mefma occupaçaõ , que tornou elle a aceitar , perfuadido também de Feliciano Coelho , que era feu fobrinho. . " ■ 630 Chegou Luiz do Rego à Cidade de S. Luiz , onde nas apparencias naõ foy mal recebido do Gover- nador , tanto por defculpar o arrebatamento da refolu- çaõ com a neceífídade, que fazia precifa de bufcar a to- da a diligencia para as graves queixas, que padecia na faude , a mudança de ares , que fe lhes receitava co- mo remédio único, como pelas razoes de parentefco , que fegundo a ordinária politica do Mundo , eraÕ as mais forçofas ; mas logo que o vio mais convalecido , o advertio da fua obrigação , lembrandolhe o muito que faltava a ella na feparaçaô da Capitania , de que o feu Príncipe o tinha encarregado, principalmente naquel- le tempo, em que fe achavaõ todas taõ ameaçadas do poder formidável dos Hollandezes com as vifinhanças de Parnambuco , e cabo do Norte. 631 NaÕ defconhecia Luiz do Rego a força do ar* gumento do Governador j mas a confiança de eftreito parentefco, como fazia frouxa a fua coacção , o achou Anno 1635. ainda o novo anno de 163 5 na Cidade de S. Luiz ; e ef- crevendo delia varias Cartas para a de Bellem , cheyas de do miado do Maranhão , Liv. VIII. 17? de exprefsões as mais apaixonadas , quando com efFeito Anno 1635. fe reftituío ao exercício do feu emprego no dia 29 de Março , foy taõ mal recebido , que na manha feguinte, juntos em Tribunal os Miniftros da Camera, mandarão chamar a António Cavalcante , e o notificarão da parte do povo , para que naõ largaífe a occupaçaõ , que ef- tava exercendo por eleição delle , confirmada por Feli* ciano Coelho , como Lugar-Tenente do General do Eflado ; fem expreíTa refoluçaô fua j porque reveílido Luiz do Rego da authoridade do Minifterio , reduziria a pezados golpes todos os ameaços com evidente rifco do focego publico , a que deviaõ todos attender , co- mo amantes da Pátria , e leaes vaíTallos do feu Prínci- pe : como fe a liberdade de hum procedimento taõ ab- íbluto naõ convenceíTe de facrilega efta confifíaÕ ! Po- rém António Cavalcante prudentemente receando , que paíTafTe ainda a mayores exceíTos aquelle defatino , lhe íufpendeo o curfo , fegurando , que continuaria na mefma ferventia até fuperior ordem. 632 No mefmo dia efcreveo o Senado a Feliciano Coelho , que já tinha voltado para o Camutá , pedin- dolhe , que como taõ intereífado no focego do povo , quizeíTe approvar a refoluçaô , que fe havia tomado até nova diípofiçao do General feu pay , que efperavaõ todos , que elle também patrocinaífe na fua prefença » aonde logo recorreriaõ ; pois conhecia bem , que o íeu procedimento era fó argumento da fidelidade, por mais que o julgaíTe como defordem a feveridade da boa dií- ciplina. 635 Com a formalidade deíla diligencia , parecia já que ficava tudo focegado até a repofta de Feliciano Coelho j porém no breve termo de dous dias , em que ella naõ podia caber pela di.ftancia da jornada , reque- reo no mefmo Tribunal o feu Procurador Mattheus Ca- bral ; que por quanto Luiz do Rego de Barros fem li- i Mmii cença Jnnaes Hiftoricos Anno 163^ cença do General do Eítado tinha fàhid.o da Capitania , abandonando o feu governo , que havia também exerci- tado com notório eícandalo , de nenhum modo fe lhe confentiíTe a nova introducçaõ , porque lha proteftava todo o povo j e apparecendo logo as principaes peíToas delle , em que entra vaõ as da Milícia , Juíiiça , e Fa- zenda , ( que tao geral era a fua commoçao neíle mor- tal ódio ) naõ fó ratificarão uniformemente a reprefen- táçaõ do Procurador , mas ainda inftaraõ nas mais altas vozes , que fe Luiz do Rego , íuggerido dos feus pou- cos fequazes , quizeíTe ufaf da authoridade de Capitão mór , valendo-fe da força , fe empenhaíTem todas na fua oppoílçaõ, fe naõ baftaílem para accommodallo as da boa politica 5 no que concordando aquella AíTemblea tumultuofa , íè formou aíTento , que todos aflinaraõ. 654 Feito efte a&o com a referida folemnidade em Domingo de Ramos ; , paífaraõ à Igreja Matriz 5 na qual achando huma cadeira de Luiz do Rego poíla no feu lugar para affiílir aos Officios Divinos , a mandarão logo lançar fora 5 e chegando à defordem do povo , inf- tantaneamente fe vio defpedaçada : ao mefmo tempo appareceo elle com todo o focego , ou por noticias mal averiguadas do verdadeiro eítado das revoluções , ou defprezando ainda os feus ameaços ; mas apreíTadamèn- tefahindo a encontralió os fediciofos , que eílavaõ na Igreja , o confeguirao junto da porta , onde lhe diíTe- raõ : Que fe recolheíTe a fua cafa , que o naõ reconhe- ciaõ por feu Capitão mor , por ter perdido aquelle lu- gar no feu abandono. 655 Refpondeo elle, que fendo provido por El- Rey , fó o mefmo Senhor podia privallo da fua occu- paçaõ ; e que fe pagara à Cidade de S. Luiz a bufcar remédio às penofas queixas , que padecia na faude , fubf- tituira na fua falta a Feliciano Coelho ; termos em que devia reputarfe o feu procedimento por hum tumulto, a que do Efiadõ do Maranhão , Liv. VIII. 2 jj a que gritarão todos , que eraõ os vaíTallos mais obedi- Anno n entes , que tinha o feu Príncipe , como elle mefmo ex- perimentara no continuado fonrimento de tantas info- lendas j porém que vifto os ter defamparado, fem lhes deixar quem os governaíTe , ( porque Feliciano Coelho naõ admittira a fua chamada fubílituiçaõ ) o nao que- riaõ receber , e To fim confervar o Capitão mor eleito pelo povo até íuperior determinação. 63 6 Replicou ainda Luiz do Rego , que fe lhe ne- gavaõ a obediência , o prendeíTem também para o re- meter para Portugal , que fem iflb fe naÔ daria por fuf- penfo. A que refponderaõ os fediciofos , que largaíTe o baftaõ , ou voltaíTe para a fua vivenda , da qual naõ fa- hiíTe com èlle até refoluçaõ do Governador, a quem da- vaÕ conta ; porque fe aííim o naõ fizeíTe , o embarca- riaõ , por mais que o repugnaífe ; e com grande afpere- za lhe pedirão logo a meíma infignia , que naõ quiz en- tregar j mas quando já fe via ria confternaçaõ ultima , fe fugeitou então às femrazões da fua defgraça , retirarí* do-fe , feguido de todos , até a fua porta , onde accu^ fando-os , de que o prendiaõ , fendo feu legitimo Com- mandante , declararão os principaes cabeças do tUmul- • to , já voltandolhe as coitas , que fó lhe ordenavao , que com baítaõ fe nao pozeífe em publico. 637 Como fe o baítaõ , que fe venera como honrofa infignia do carader na fubmiífaõ rendida dos verdadei- ros fubditos y faltando ella , podeífe merecer outro algum refpeito , que o de hum fimplez bordão para arrimo do corpo ! Mas o certo he , que os moradores do Pará , en- furecidos contra Luiz do Rego , pretendiaõ tirarlhe tu- do, para que opprimido do formidável pezo do juftofen* timento , melhor feguraíTem na fua ruina a fatisfaçaõ de taõ infernal odío , que nao parou ainda neíle deteílavel procedimento ; porque chamado ao Senado da Came- ra António Cavalcante , lhe repetirão todos os feus Mi- niílros , 27 Annaes Hiftoricos Ánnoi63£. niílros , com a aífíftencia das^peífoas mais graves, a notificação , que lhe tinhaõ feito , para que na5 largaíTe a occupaçao , que eftava fervindo , fem expreffa ordem do General do Eftado, também intimandolhe o requeri- mento , que lhes propozera o íèu Procurador em nome do povo , com o aífento que fe havia tomado na palia- da Junta fobre a mefma matéria j e ratificando a pri- meira repofta , fe fez termo delia , que todos affinaraô. 638 Socegada efta alteração , pelo eftranho modo que fica referido., fe deu conta de tudo ao Governador, que informado bem de huns , e outros procedimentos , mandou tirar de todos exacta devaíTa por António Mo- niz Barreiros ; e diffirindo-fe a refoluçaõ deila até os princípios do anno feguinte , fe occuparaõ no refto do- prefente os principaes difcurfos daquelles moradores nos juftos receyos de huma quaíí geral confpiraçaõ dos ín- dios Aldeados , de que erao cabeças os Topinambazes ,. com os da Aldeã de Una $ mas furTòcada por acertadas difpoííções do Capitão mor António Cavalcante, ácou. íudo reftituido à ília antiga tranquillidade. 639 Sem outra noticia , que fe recommende às nof- Ânuo 1636. fas memorias ,, principiou o anno de 1656 ; mas como», a ordinária fucceíTao dos dias he huma verdadeira meta- morfoíis da humana natureza , aquelles mefmos ânimos, que apurarão todas as fuás iras no aborrecimento do feu Capitão mór Luiz do Rego, fe viraõ de forte tranf- formados na interpofiçaõ de menos de dez mezes, que. tendo ordem do Governador , para que em virtude do merecimento da devaífa do feu procedimento , fone ref- tituido à mefma occupaçao , o receberão logo fem a mais leve repugnância ; e continuando com as devidas attenções no exercido delia , chegou a grangear a qua- íi geral aceitação da Capitania , principalmente pelo exemplar defprezo das fuás paixões particulares , no juf- tificado fentimento das paíTadas injurias. Nefta do EJlado do Maranhão , Liv. FIJI. 279 640 Nefta virtuofa conformidade achou a Cidade Aimo 1636. de Belém do Pará o Governador Francifco Coelho , vi- fitando-a nos princípios de Mayo 5 e detido nella até o primeiro de Setembro , fem novidade alguma , que feja de importância às fadigas da Hiftoria , paflbu à Povoa- ção do Camutá a convalecer de queixas da faude na me- lhora do clima , acompanhado de feu filho Feliciano Coelho. Mas bem parece, que deixava já à ingratidão daquelles moradores os argumentos últimos da fua fine-i za nas affe&uofas exprefsões , com que fe defpedio da fua companhia j porque a poucos dias , depois de en- trar no fitio , onde o efperava a irrevogável execução da fentença Divina , nos quafi fempre mal avaliados ca- bedaes da humana natureza , orTerecendo o efpirito ao feu Creador , recommendou a verdadeira fama das ac- ções da vida à immortalidade da memoria. 641 Foy grande a perda de Francifco Coelho para o Eftado do Maranhão 5 e fe faria inconíblavel aos mo- radores delíe , fe a larga duração do feu governo lhes naõ tiveíTe taõ eftragado ogoílo, que aquelles di&a- mes , que nos primeiros annos profundamente venera- vaõ como vozes de Oráculo , os desfiguravaÕ já nos úl- timos comhuns difcurfos taõ irreverentes, que nare- íignaçaõ ainda mais rendida da fua obediência , lhe profanava o culto o mefmo facrifício. Mas eíle abo- minável procedimento da inconílancia dos homens , que ingratamente na fua morte trocou em galas os me- recidos lutos , ficou também fervindo da mais honrofa pompa para oapparato das exéquias} porque encare- cido da malevolencia . como monílruofo , o defpa- cho de huma Commenda da Ordem de Chriílo no mefmo exercicio do feu cargo , como o regulavaõ os rectos juizos pelas ordinárias attençoes dos Príncipes , deixava ainda muito mais avultado o feu merecimen- to , perfeguido com tal barbaridade da vileza do ódio , que Jbinaes lliftoricos Jtnno 1636, que chegou a paffar a fua paixão além da fepultura. 642 Na mefma Igreja da Povoação do Camutá , de que feu filho era Donatário , teve o cadáver do Go- vernador o feu nobre jazigo ; e Feliciano Coelho , ain- do naõ enxutas as primeiras lagrimas , com razaõ teme- rofo , de que faltandolhe o reípeito do pay , fe atrevef- fe ao feu a infolencia dos mal intencionados , entrou a difpor a fua viagem para Portugal pela efcala das índias Gaílelhanas com tanta actividade , que fazendo-fe à ve- la do rio de Belém do Pará , nos princípios de Outubro, tomou felizmente a Cidade de Caracas dentro de pou- cos dias. ^.nuíiH^i^Ti^iii i ii ií iN.t i k i ^ i w if ^tHMíi i nti^iHiim i jhtwr iiiiiriHtinriMiriLffiírfff^ ■ ANNAES 28l ANN AES HISTÓRICOS DO ESTADO DO MARANHÃO. LIVRO IX S UM MAR IO. A falta de Francifco Coelho fe faz acclamar Governador do Efiado do Maranhão o Provedor mor da Fazenda Real Jacome Raimundo de Noronha. Manda emprazar ao CapitaÓ mor do Grão Vara Luiz do Rego de Barros , forque o naò* quer reconhecer. Subjlitue nofeu lugar ao Capitão Fran- cifco de Azevedo. Morre ejie dentro de poucos dias ; e continua no mefmo exercido , por nova nomeação 1 , Aires de Soufa Chichorro. Conjuração contra a pejo a de Jaco- me Raimundo. Afua confiando , e os efeitos delia com aconfufaò de feus inimigos. Chegou de Quito ao Paro íeis Soldados com dons Religiofos Leigos deS. Francifco. Nn ' Poffa* 282 Annaes Hiíloricos A\ Anno 1636. Pajjaú a Cidade de S. Luiz ; ejacome Raimundo ; per- fundido das fuás noticias , intenta o de f cobri mento dofa- mofo rio das Amazonas. Forma huma Tropa para o mef- mo efeito , de cjue nomea Capitão mor a Pedro Teixeira. Sahe ejle da Capitania do Fará , e navega até a Ilha das *A.rèas. I)uas nãos Hollandezas , auejahem do Recife deParnatábuco , occupao 1 o Seara. Succede no Governo geral do? Maranhão Bento Maciel Parente. Manda co- nhecer de facome Raimundo 5 e julgando fe por nao Go- vernador , o remete prezo para Portugal. 'Nomea Capi- tão mor do Gr do Pará a Feliciano de Soufa e Menezes* Faz Pedro Teixeira hum dejiacamento a ordem do Capi- tão Pedro da Cojia Favella 7 que je aloja na Provinda dos Encabellados. Continua a fua viagem até a Cidade de Quito 7 onde entra com geraes applaufos dos [eus mo- radores. m 645 M 1 5 de Setembro do preferi- te anno paíTou o Governador Francifco Coelho de Carva* lho da vida caduca para a eter- na 5 e aíTiílindo acaíb à íiia morte hum morador honrado do Maranhão , que fe chama- va António Portilho , da obrigação do Provedor mor da Fazenda Real Jacome Raimundo de Noronha , na- vegou com tal prefla em huma canoa , fempre à força dqs remos, para lhe dar efta noticia , que entendia já lhe feria agradável pelas confequencias , que chegou à Ci- dade de S. Luiz com a breve viagem de quatorze dias , fendo a ordinária de mais de vinte e cinco. 644 Concebeologo Jacome Raimundo alegres ef- peranças de fucceder a Francifco Coelho 5 e adiantando as negociações deíle projecto com a adividade do feu ar- dente efpirito j contraílou de modo a forte oppoíiçaõ do Capi- do E/lado do Maranhão ] Liv. IX. 285 Capitão mor António Cavalcante de Albuquerque , Anno 1636. que o Governador tinha deixado encarregado da Capi- tania do Maranhão , que no dia 9 do mez de Outubro recebeo da Camera de S. Luiz a íblemne poíTe do Go- verno do Eftado , como cabeça delle , confervando também o exercício de Provedor mor , ou foíTe zelo de naõ querer fiar de menos fegura adminiftraçaõ o feu Mi* nifterio , ou aftuta politica de os unir todos à fua autho- ridade , para deixalla mais fortalecida na prefervaçaõ dos feus ciúmes, como fuccede commummente aos que entraõ na de grandes empregos por huns caminhos taõ irregulares. ■ r;« 645 Era digno fem duvida Jacome Raimundo de lugares mayores , affim pela nobreza do feu nafcimen- to, como pelas acções da fua vida , reprefentadas no mefmo Eftado , já nos theatros da politica , já nos da guerra 5 porém efta ultima afeou de forte no conceito commum todas as primeiras , que até chegou a desfia gurallas j porque ainda que naõ faltavaõ vozes no Ma- ranhão , de que o Governador Francifco Coelho tinha recebido vias de Madrid para a fucceíTaõ daquelle Go- verno no prefente cafo 5 e que nellas era o primeiro no- meado o mefmo Provedor , naõ havia certeza , que fundamentalmente podeíTe defculpar o feu procedimen* to em matéria taõ grave. 646 Concluído eíle acto com a felicidade , que ã* ca referida, defpachou logo para a Cidade de Belém do Pará com Procuração fua a Francifco de Azevedo , Capitão do Forte de S. Francifco , que reveftido da velocidade da lifonja , paíTou cento e feíTenta léguas de mar ; vencidas as marés , e a mayor parte delias , fó da força dos remos , em menos de onze dias 5 e no de 23 do mefmo Outubro, depois defegurar o bom fuc- ceíTo da fua commiíTaÕ , no foborno dos ânimos , con- vocando o Senado da Camera , prefentou nelle 3 para as Nn ii cere- * Annaes Hijloricos Annoi^ó. ceremonias da formalidade , a copia do aflento , que fe tinha tomado na de S. Luiz do Maranhão na poiTe do feu conílituinte , para que naquella fe regiílraíTe co? mo documento da fua obediência. 647 Mal podia alterar àquèlles Mililitros efta no- vidade , quando fe achavao já bem informados delia j mas ainda que defejaraõ todos dar os primeiros pafíbs da fua fuggeílaõ fem outro concurfo , convocarão com tudo o do Capitão mor também com efperanças de fa- zello parcial do mefmo defacordo ■; porém fabendo pe- la fua repoíla , que eftava de cama , donde zelofamen- te os ajudaria com o feu parecer , fe quizeíTem bufcal- lo para a refoluçaó de taõ grave matéria , como elles procediaõ fó com a paixão de particulares intereífes , dando-fe logo por defobrigados da fua affiílencia , fen- dolhes precifa , ordenarão ao Porteiro , que lançaíTe pregão pelas principaes ruas , para que os moradores , fém diítinçaõ alguma de qualidade, acodiíTem àquelle Tribunal, s 648 Chegou eíla noticia a Luiz do Rego, que ponderando bem o fatal precipício , a que caminhava aquelledefatino, por atalharlhe o curíb , fe levantou da cama com hum total defprezo da fua faude ; e en- trando no Senado , onde fe achava já muita parte do povo com toda a nobreza, lhe propozeraõ os feus Minif- tros o prefente negocio cheyo de circunftanciás , que fa- cilita vaõ ã fua approvaçaõ ■; porém elle por mais que co- nheceo , que eraõ fuggeridas pelas induílriofas negocia- ções do Capitão Francifco de Azevedo , prudentemen- te preferindo as dependências publicas ao fentimento particular , diíTe , que fe a Camera de S. Luiz tinha po- der do Príncipe para a eleição de Governador , que fe obedeceíTe a Jacome Raimundo; e que ainda faltando- Ihe , como fe entendia ( principalmente quando ria mor* te de Francifco Coelho haviaõ ficado as Capitanias pro- vidas do EJlado do Maranhão , Liv. IX. 285 vidas de remédio com o governo dos Teus Capitães mó- Anão 1636. res ) fe fugeitaria fem a menor duvida à pluralidade dos pareceres da Milicia , e Nobreza j no que aífentando todos , fe procedeo a votos. 649 Declarou a Milicia , por boca do feu Sargento mor Filippe de Matos Cotrim , que fe lhe moílraííem algum exemplo , fe accommodava a elle 5 e o Capitão mor Luiz do Rego , como na íubftancia do feu fenti- mento fe vio feguido do principal corpo , fe levantou logo da Junta , acompanhado já naõ fó dos Militares ; mas também da Nobreza do primeiro nome. 650 Sufpendeo os ânimos daquelles Miniílros eíle contratempo ; mas logo arrebatados da mefma fuggef- taõ , que os havia poílo em tamanho empenho , rize- raõ delle as orientações ultimas com notória injuria das obrigações , que tinhaõ jurado j< declarando a vozes , que obedeciao a Jacome Raimundo de Noronha , víf- ■ to fer eleito Governador pela Camera do Maranhão ,• Cabeça do Eftado , e fugeito muito benemérito daquel- la grande occupaçaõ , de que formarão aífento , que af- finaraõ todos ; e continuando nosdefatinos, o Juiz Or- dinário Joaõ de Mello gritou ao povo , que fe acha- va junto , que o reconheceíTe por feu legitimo General até novas ordens da Corte de Madrid , no que elle naõ teve repugnância 5 como procedimento muito natural da fua loucura em todas as acções mais precipitadas. 651 Defte modo ficou obedecido Jacome Raimun- do por todo o povo da Cidade de Belém do Pará > e Se* nado da Camera , a pezar da forte oppofiçaõ do CapU taõ mor ; porém eíle, que fuftentava ainda a : mefma in- dependência como doutrina muito mais fegura > reque* reo ao mefmo Tribunal lhe mandaíTe dar Certidão au- thentica da fua repoíla íbbre a propofiçaõ do Governo intrufo , ( que aífim lhe chamou fempre ) paramoílrai? em toda a parte a inteireza do feu procedimento 5 .mas pafían- IM i f II m mH M i 286 Annaes Hiftoricos Anno 1636. paflando logo eílas noticias a Jacome Raimundo por ordem fua , que teve prompto cumprimento , foy em- prazado para apparecer na Cidade de S. Luiz em termo peremptório , defertado já das principaes forças do feu grande partido ; porque vilmente unidas ao triunfo bár- baro da fortuna profpera , ajudavaõ a conduzir o carro da lifonja , como efcravos delia. 652 Em 24 de Dezembro fahio Luiz do Rego da Cidade de Belém do Pará, ficando já fubftituido no governo da Capitania o Capitão Francifco de Azeve- do , primeiro confidente de Jacome Raimundo 5 mas ta5 merecedor de mayores honras pela fua boa capaci- dade, que foy recebido daquelles moradores com as mais verdadeiras eftimações. 655 Nefta geral tranquillidade , depois de taõ amea- çado o focego publico de todo o Eílado , fuccedeo o Anno 1637. anno de 1637; e o Capitão mor Francifco de Azeve- do , defempenhando Bem no exercício da fubítituiçaõ daquelle lugar as expectações, com que foy nelle rece- bido, multiplicava cada dia os applaufos do nome j mas quando os gozava com conhecidos intereífes da Capitania , padeceo ella o jufto fèntimento da fua mor- te em 3 de Fevereiro g fem que o breve termo da fua duração nos deixaíTé outra alguma memoria, que pof- fa merecella. 654 Tinha elle íldó hum dos mais empenhados na exaltação de Jacome Raimundo 5 e como a fua perda pelas efpeciaes razões da amifade lhe ficava fendo taõ fenfivel , teve noticia delia pelos ligeiros voos com que coftumaõ fempre caminhar as defta qualidade 5 mas que- rendo na nova eleição ratificar as provas do feu mereci- mento , encheo bem o lugar , que fe achava vafio com a peíToa do Capitão Aires de Soufa Chichorro , que en- trou a occupallo no dia 17 de Março. 6 5 5 Continuava Jacome Raimundo no governo do Eíta- do Ejlaão do Maranhão , Liv. IX. 287 Eftado com elogios públicos dos feus moradores , pela Anno 1637. re&a juftiça com que procedia j mas fendo os da Cida- de de S. Luiz neílas demonftraçoes os mais empenha- dos , por conta da eleição , naõ faltava também entre elles quem já a reprovaíTe ; porque nao podendo abran- ger a todos aquelles intereífes , dê que fe coftuma fug- gerir em femelhantes cafos o orgulho dos povos , os que fe viaõ enganados das fuás efperanças as afiança- vaõ em novo defatino da mefma qualidade \ e commu- nicando-fe diííimuladamente os fequazes delle , chega- rão a formar huma conjuração para o pôr em pratica. 656 Deite louco projecto teve logo noticia Jaco- me Raimundo 5 porque raras vezes prevalece a cautela mais diiíimulada contra a vigilância de hum bom Go* vernador ; e fabendo também , que António Cavalcan- te , como queixofo de fe lhe haver tirado o governo da Capitania , fe naõ defagradava de fer o efcolhido para o de todo o Eílado , na depofiçaÕ da fua peíToa, tratou de prevenirfe para a oppoíiçaõ de tamanho golpe com huma tal conftancia , que naõ paífou a mais demonílra- çaÕ , que à de fe recolher na Fortaleza de S. Filippe , com o corado titulo de mudar para ella a fua refidencia , por fer entaÕ a dos Governadores. 65 j Porém os confidentes da conjuração , quô acertarão bem na verdadeira caufa delle movimento , fazendo delle apreíTados avifos aos feus Companheiros , de forte os conílernaraõ , que com a mefma fúria com que já navegavaõ defde o Itapicurú bufcando a Cidade de S. Luiz para a execução de taõ fatal defordem , ar- ribarão fobre o mefmo fitio, de que tinhaõ fahido, juf- tiííimamente temerofos do rigor do caíligo , que os ameaçava ; mas convencidos todos por huma devaíTa , foy ta5 leve , o que receberão da piedofa maÕ de Jaco- me Raimundo , que i^contentou fó da feparaçaÕ dos mais culpados por breves diílancias 5 o que bailando pa- ra Annaes Hijloricos Armo 1637. ra focegar aquella commoçaõ , lhe grangeou de novo merecidos applaufos , deixando-o também com mayor liberdade para o exercício de mais nobres empregos. 658 Entro aefcrever huma das mais heróicas ac- ções dos noíTos Portuguezes do Graõ Pará com os prin- cípios fundamentaes , que houve para ella 5 e para que fique fem o menor efcrupulo a verdade da fua relação , y fubftancialmente feguirey a do Padre Chriílovaô da Cu- „ r íiy: nha , referido , e em varias partes também addicionado a. cap. 5 . uique ' 7 * 1 t» i« • »/• j adfin. cap. 14. pelo Padre Manoel Rodrigues , ambos Keligioios da Companhia de Jefus do Collegio de Quito, accreícen- tandofó, corrigendo, ou omittindo algumas das fuás noticias $ porém fempre naquellas , aonde naÕ chegarão as oculares indagações do mefmo Padre Cunha ; porque neftas naõ paflará a minha critica de breve explicação , na inviolável obfervancia dos preceitos da Hiftoria. 659 No anno paflado , e já também no anteceden- te , abrazados no mais ardente zelo da falvaçaõ das al- mas , fahiraõ alguns Religiofos Francifcanos da Cida- de de Quito bufcando o Paganifmo do grande Mara- nhão , ou Amazonas; e o Capitão Joaõ de Palácios, com hum pequeno corpo de Tropas voluntárias , os fe- guio em taõ íanta empreza , comos generofos interef- fes de immortalifar ao mefmo tempo a fua memoria no defcobrimento defte famofo rio pela pregação da verda- deira Ley , que já no mez de Março de 1 6 1 1 tinha cuf- tado a vida ao virtuofo Padre Rafael Ferrer, infultada dos bárbaros Tapuyas feus habitadores , quando aíTifti- do do Padre Fernando Arnulííno , Mifíionarios ambos da Companhia de Jefus da MiíTaÕ dos Cofanes , empre- gava todo o cabedal do feu efpirito Apoftolico no im- portantifíímo reígate da efcravidaõ da fua cegueira ; porque as expedições de Gonçalo PiíTarro , e Pedro de Orfua , ainda que deixarão copiofas noticias do mefmo Maranhão, eraõ taõ confufas , que ferviaÕ fó para em- penhar do Eíiado do Maranhão , Liv. IX. 2 8 9 penhar mais o catholico animo defte Commandante. Armo 1637. 660 Em huma empreza taõ virtuofa em todos os fentidos, acompanhou elle os Religiofos Francifcanos j e chegando todos à grande Província dos Encabellados, íituada na boca do rio Aguarico ( chamado do Ouro ) a acharão logo taõ abundante de gentilifmo, que à pro- porção do numero, contavaõ já aquelles Apoftolicos Operários os progreííbs da fua doutrina ; porém defen- ganados dentro de poucos mezes , de que naô baftava to- da a efficacia do feu efpiritopara abrandar os empeder- nidos corações deíles abortos da humanidade , voltarão alguns para o feu Convento. 66 1 Ficou com tudo a mayor parte deíles na com- panhia de João de Palácios , que affiílido já de poucos Soldados, era taõ invencível a fua conflancia na op- pofiçaô da mefma defgraça , que irritada ella de dífpu- tarlhe as forças a fraqueza de hum homem , as inrluío todas nos aleivofos peitos daquelles brutos racionaes 5 porque ingratamente lhe tirarão a vida , ao mefmo tem- po que com total deíprezo de tamanhos perigos lhes fo- licitava o feu eterno bem.: porém fe faltou o agradeci- mento à barbaridade , lhe grangeou também mayores intereíTes na immortalidade da memoria , que taõ ufu- rarias coílumaÕ fer fempre as negociações da magnani- midade. 662 Com a fatal perda do nobre Capitão das ban- deiras de Chrifto defmayaraõ logo os valentes efpiri- tos de todo aquelle corpo ; porém recolhendo-fe à CU dade de Quito os Religiofos Sacerdotes com a mayor parte dos Soldados , deíles ficarão féis no mefmo íítio > e ainda dous Leigos , chamados Fr. Domingos de Brie- ba , e Fr. André de Toledo , que movidos fem duvi* da de fuperior impulfo , defembocando o rio Napo em huma pequena canoa , encommendaraÕ a fua fama às precipitadas correntes do das Amazonas. Oo Sem Anno 1637. 290 Annaes Hifloricos 665 Sem mais derrota , que a da Divina Providen- cia, ( depois de hum a larga navegação , em que tratan- do innumeraveis Provincias de Gentios , que fe alimen- tavaõ da carne humana, nao ío fe naõ ferviraõ daquella occafiaõ para banquetear a fua voraz gula , mas liberal- mente os foccorreraõ dos mantimentos neceíTarios para a viagem ) chegarão à Cidade de Belém do Pará com huma geral admiração dos feus moradores ; dos quaes favorecidos com muita largueza , parlar aõ logo à de S. Luiz do Maranhão ; e informando bem o Governador da fua jornada , feguraraÕ todos , que faberiaô repetir os perigos delia até dentro de Quito , fe achaífem com- panheiros do mefmo animo. 664 Merecia bem Jacome Raimundo o lugar , que occupava 5 mas como tinha entrado nelle com mais ef- candalo , do que gloria , defejavà generofamente puri- fícarfe daquella mancha , empenhando toda a grandeza do feu efpirito nas acções mais* heróicas f e confideran- do já defta qualidade , a que fe lhe ofFerecia , quizera logo declararfe a favor delia , fe as confequencias , que também ponderava na fua execução , o naõ embaraça- rão. 665 Via, que arrifcava a cbnfervaçaõ de todo o Eílado , fe o debilitava nas principaes forças , quando neceífitava de fornecerias para a refiílencia das inimigas, que com os progreíTos de Parnambuco fefaziaõ todos os inílantes muito mais formidáveis : por outra parte nao difcorria menos na contradição dos pareceres fobre aquella matéria , apoyados dos mefmos fundamentos, que reconhecia taõ vigorofos ; porque para ufar da in- dependente authoridade do feu minifterio , advertia prudentemente , que carregava fobre os feus hombros o horrivel pezo das contingências da fortuna , 'a qual fe muitas vezes apadrinhava os atrevimentos , as mais del- ias os caíligava como temerários ; deixando-os com ef- te do EJlado do Maranhão , Liv. IX. 291 telabéo, naõ íb infelices , mas injuriofos j e para fu- A111101637. geitarfe aos confelhos maduros , já lhe parecia , ( regu- lando o íucceíTb da empreza pelas elevadas apprehen- fões da fua fantafia ) que cortava as azas à mais honro- fà fama j até que efcolhendo entre os dous perigos o mais generoíb , ( naõ fey Te commovido de fuperiores influencias ) tomou com eflèito as ultimas medidas à expedição de Quito. 666 Mas na certeza já de que fe murmurava o feti empenho como loucura , o procurou juftificar moítran- do, que eraÕ taes as conveniências, que fe feguiaõ del- le ao ferviço deDeos, ao do Príncipe , e utilidade publica , que preferiaõ bem a todos os receyos da con- fervaçaõ própria 5 principalmente quando também fe naõ inculcavaõ menos attendiveis , os de que commu- nicando-fe aquelle grande rio com o Reino do Peru , e preciofo ferro doPotoíTy , fe achavaõ expoftos todos os feus thcfouros à ambiciofa navegação dos Hollandezes, que naõ poderiaõ confeguir , nem ainda intentar depois de prevenidos da útil amifade Portugueza os muitos Ta? puyas feus habitadores j e focegados já por eíle cami- nho os principaes efcrupulos da fua opinião , tratou fó da jornada. 66j Foy a primeira providencia para adiantalla , e que fegurou bem a fortuna de todas , a nomeação de Commandante na peíToa de Pedro Teixeira com a Pa- tente de Capitão mor , e todos os poderes de General do Eílado : elegeo também ao me fm o tempo por Me& tre de Campo ao Capitão de Infantaria António de Al- meida de Azambuja , com huma das três Companhias, de que fe compunha aquelle corpo j a Filippe de Matos Cotrim no pofto de Sargento mor, que já tinha occupa- do na Capitania do Pará; a Pedro, da Coita Favella , e a Pedro BayaÕ de Abreu em Capitães de Infantaria : e recebidas logo as ultimas ordens , partio Pedro Teixei- Oo ii ra li i.IL 2p2 Annaes Hiftoricos •1 1 u ' Annoi637. rapara a Cidade de Belém , onde tomou porto em 25 do mez de Julho. 668 Com achegada deíle Commandante fe divul- gou a fama da íua expedição , que alterou de forte to- dos aquelles moradores , que os Miniílros do Senado da Camera fe virão obrigados a reprefentar logo ao Go- vernador com toda a efficacia os inconvenientes , que fe feguiaõ delia , pedindolhe quizeífe deferilla para me- lhor tempo j porque faltando no prefente as principaes forças para a defenfa da Capitania , nas que fe achavaó nomeadas para acompanhar a Pedro Teixeira , lhes fi- cava , naoppofiçaõ dos inimigos, taõ perigofa a liber- dade , como a mefma honra j pois bem fabia elle , que os argumentos Militares fe decidiaõ quafi fempre , no conceito dos homens, fó pelos fucceflbs j e já com a juíliça , de que eílava pendente na fuperior inftancia efta prudente fupplica , requereo o Senado ao Capitão mor Aires de Soufa , que até a fua pofitiva refoluçaô , fufpendeífe a viagem y mas defenganadas todas as efpe- ranças de divertilla comarepoíla de Jacome Raimun- do , fe lhe deu principio em 28 de Outubro, tendo aju- dado muito para os feus apreílos os cabedaes cio mef- mo Commandante , generofamente diílribuidos. 669 Sahio Pedro Teixeira da Capitania do Camu- tá , onde formou aquelle corpo com dezafeis canoas , guarnecidas- de fetenta Soldados , e mayor numero de trezentos índios , que crefceo a mais de novecentos , com os que foy tirando das Aldeãs domefticas , e o das embarcações a quarenta e cinco , e os Officiaes de gra- duação eraÕ os que já ficaõ referidos , exceptuando o Meftre de Campo António de Almeida de Azambuja , que por motivos particulares defiílio da empreza j mas occupou o feu lugar , com a Patente de Coronel , Ben- to Rodrigues de Oliveira. 670 Com taõ pequenas forças intentou efte Com- mandante do Hfiado do Maranhão \ Liv. IX. 2 9 ) mandante huma acçaõ tamanha j porém que muito, fe Anno 1637. influídas todas do feu mefmo efpirito as julgava fó pela qualidade , defattendendo o numero , que ainda fendo cile taõ acanhado , Te foy diminuindo todos os dias , já com as doenças , já com as fugidas dos índios remeiros j mas quando tudo eraõ apertados exames da fua conftan* cia , fahia fempre deiks com mayores créditos : e con- tinuando a fua derrota pelo farhofo rio das Amazonas ( intitulado então S. Francifco de Quito) para refazer- fe do trabalho delia , fe alojou em 4 de Dezembro em huma Ilha grande , a que deu nome das Arêas , onde o deixarey defcançando no feu mefmo cuidado , até que me chame a relação de novos fucceífos , no lugar a que tocaõ , por naÔ interromper a inalterável ordem da mi- nha Hiíloria. 6jí Neíle tempo tinha já chegado à Cidade deS. "Luiz a melancólica noticia , de que fahindo do Recife de Parnambuco duas nãos Hollandezas , commandadas pelo Sargento mor Gufman ? cafado com huma Portu- gueza na Povoação do Rio Grande , fe pozera elle fo- bre a Fortaleza do Seara (guarnecida fó de trinta e dous homens , de que era Capitão Bartholomeu de Brito ) com as forças de trezentos e quarenta Soldados , e feif- centos e cincoenta índios da fua alliança ; e que com o ataque de nove horas , valerofamente difputado , a ef- calara naquelle mefmo dia por huma total falta de mu- nições de guerra , depois da morte de oito Portuguezes, e outros tantos feridos , todos muy bem vingados j mas Jacome Raimundo , achando fempre o defafogo das fuás afflicçôes na conftancia do animo , o difpunha com militar acordo para a oppoíiçaõ dos inimigos, fem fazer cafo da fua vifinhança , mais que para o cuidado. 672 No exercício deíle , e no da fua grande expe- dição do defcobrimento das Amazonas , o achou ainda o novo anno de 163 S 5 mas em 27 de Janeiro fe vio aco- Anno 1638. mettido Annaes Hííloricos Anno 1637. mettido de outros mayores com a chegada de Bento Maciel Parente , que levando o defpacho do Governo do Eftado , recebeo logo a poíTe delle. 67} Tinha muitos ferviços Bento Maciel 3 e aju- dados da negociação , os fez taõ relevantes , que além defte emprego , obteve a mercê do foro de Fidalgo , a At Cavalleiro do habito de Chrifto , e a de perpetuo Senhor , e Donatário da Capitania do Cabo do Norte , por Doação de Filippe IV. de Caílella de 14 de Junho do anno paflado , expedida pelo Miniílerio de Portu- gal 5 com a honro fa claufula , de que todos os feus her- deiros , e fucceíTores na Capitania fe chamariaõ Ma- cieis Parentes y ufando das armas , que por taes lhes tocavaõ, de baixo da comminaçaõ , de que faltando al- gum a eíla obfervancia y paíTaria logo a fua fucceífaó a, quem direitamente pertenceíTe , como fe foíTe morto \ como tudo confia do feu mefmo Cartaz , regiftrado no livro fegundo da Provedoria do Pará , onde fe acha de- marcada a tal Capitania na forma feguinte. 674 Hey por bem , e me praz de lhe fazer , como com efeito faço , por ejla prefente Carta irrevogável DoaçaÕ entre vivos valedoura , dejie dia para. todo fem~- pre , de juro , e herdade , para elle , e todos osjeusjil/ios , netos f herdeiros , e fucceffores , que após elle vierem , aj- fim defcendentes , como tranfverfaes t e collateraes (Je* gundo ao diante hirá declarado ) das terras , que jazem no Cabo do Norte , com os rios , que dentro nellas ejliverem, que tem pela cojla do mar trinta e cinco , até quarenta lé- guas de dejiriólo , que fe contao do dito Cabo , até o rio de Vicente Vinçcn 7 aonde entra a repartição das índias do Keino de Cajlella ; e pela terra dentro , rio das Amazo- nas arriba , da parte do Canal , que vayfahir ao mar , oi- tenta para cem le fruas até o rio dos Tapuyaujfás ; com de- claração , que nas partes referidas , por onde acabará^ as ditas trinta e cinco , ou quarenta léguas da fua Capitania, do EJlado do Maranhão , Liv. IX. 29? fe porão marcos de pedra , e ejles marcos correrão via re- Armo 1638, cia pelo CertaÔ dentro 5 e bem afjim mais ferao do dito Bento Maciel Parente , efeus fuccejfores , as Ilhas , que houver até dez léguas ao mar , na fronteira demarcação das ditas trinta e cinco , ou quarenta léguas de cqjia da fua Capitania 5 as quaesje entenderão medidas via reâía > e entrarão pelo Certao t e terra jir me dentro pela manei- ra referida até o rio Tapuyaujfás , e dahi por diante tanto, quanto poderem entrar , e forem da minha Gohquijla , tfci 675 Naõ fey na verdade , com que jufto titulo , à viíla deíle teílemunho taô irrefragavel , { não falíando 1 já no da demarcação de Carlos V. , que precedeo a eíla mais de hum feculo ) pretendia ainda a Coroa de Fraiir ça , que atropellados os notórios limites de Vicente Pii> çon , fe contaífem os da fua Colónia de Caena pelo gran* de rio das Amazonas , ficando nelles comprehendida toda a banda do Norte com tanto prejuízo dos vaftos Domínios Portuguezes j mas o certo he , que a gran- deza dos Príncipes raras vezes coftuma fuftentaríe ío dos cabedaes próprios. 6j6 Com a chegada do Governador Bento Maciel^ fe decidirão todas as duvidas , fobre as adminiftrações dos índios forros , que tinhaõ fido huma das matérias mais debatidas na Capitania do Pará , com tanto perigo do focego delia , como já deixo referido nos íucceííbs paíTados ; porque attendendo a Corte de Madrid , af- íim a eíles , como a outros muito inconvenientes , e ao mefmo tempo a utilidade publica na conceíTaõ das mef- mas graças , ( como lhe moílravaõ as fuás experiências nas índias Caílelhanas com grandes intereífes do reba- nho Catholico) foraõ permittidas por refoluçaô de 8 de Junho de 1625 : e fe empenhadas negociações dilata- rão ainda a fua expedição até o defpacho de Bento Ma- ciel , elle as venceo todas com grande gloria fua. 6jj Levava elle muito recommendada a devaíTa do Mf. h#: m f! 29a í Annaes Hiftoricos Anno 1633, do procedimento do feu anteceíTor na introducçaõ ao Governo do Eftado , na qual naÕ entrou logo , ou por* que o feu naô pareceíTe apaixonado na aceleração , ou porque com efta nao ficafle a verdade com menos pure- za 5 mas depois de alguns dias , fazendo fó efcrupulo da fua omiífaõ em matéria taõ grave , mandou conhe- cer delia j e por fentença de 10 de Abril , foy julgado por naõ Governador , declaradas por nullas todas as luas Provisões /e remetido prezo para Portugal 7 onde íe revogou a mefma fentença na fuperior inftancia com fundamentos menos juílificados $ porque ainda que Ja- come Raimundo merecia bem aquelle lugar pelas boas partes , de que fe compunha a fua peífoa ; e allegaífe também , que para a fucceíTao fora o primeiro nomea- do nas vias ,jcomo eftas nunca appareceraÒ no Mara- nhão , nem outro documento para a eleição do Senado da Camera-de S. Luiz, que o da fua defordem , fempre o caftigo era o melhor exemplo. 67 8 11 Durava ainda o emprazamento do Capitão mor do Grão Pará Luiz do Rego de Barros , quando fucce- deò no Governo do Eftado Bento Maciel; e efcufan- do fe Aires de Soufa Chichorro da fubftituiçaõ do feu lugar , a encarregou elle a feu cunhado Feliciano de Soufa e Menezes, que no dia 17 de Abril entrou no ex- ercido defta occupaçaõ ? aonde o levou mais a paixão da eftreita affinidade , que o impedimento de Luiz do Rego; porque fe o governo dejacome Raimundo de Noronha fe julgou por intrufo , também ficava nullo o procedimento da fua fufpenfaõ. 6j9 Deixey ao Capitão mor Pedro Teixeira na Ilha grande das Arêas , ( huma das do mayor de todos os rios ) já no fim do anno paífado ; e continuando no pre- fente a mefma viagem com trabalhofa navegação, prin- cipalmente pela fua incerteza na falta de guias , ( por- que os dous Religiofos Leigos ? e os féis Soldados Caf- telhanos > do afiado do Maranhão , Liv. IX 297 telhanos , naõ tinhaÕ feguido outro algum rumo mais Annoi638. que o do feu deftino) defefperado o fofíumento dos Ta- puyas remeiros , determinavaõ defertallo , quando fa- zendo elle as ultimas provas da valentia do feu animo , ., os perfuadio a que a levavaõ já vencida, tendo apenas chegado ao meyo delia, como depois moftraraõ as pró- prias experiências. 680 Bem conheceo com tudo eíle Commandante , que neceffitava de mayores esforços para confírmallos em taõ alegres efperanças 5 porque de outra forte o mef- mo tempo as defvaneceria brevemente com a total ruí- na de todas as fuás 5 e para confeguillo em 27 de Feve- reiro , adiantou da fua conferva com oito canoas o Co- ronel Bento Rodrigues de Oliveira , que pela fua mui- ta capacidade , ajudada da pratica da terra, e do feu idioma , ( por fer natural do Brafil ) confervava também geral eftimaçaõ entre aquelles bárbaros j a qual faben do elle nefta occafiaõ defempenhar com todos , depois de atropellar os mayores perigos , chegou com eíFeito dia do Precurfor da noíTa Redempçaõ o foberano Bau- tifta ao porto de Payamino , primeira povoação de Cas- telhanos, fugeita à Província dosQuixos, jurifdicçaõ de Quito , oitenta léguas defta Cidade , que principiou logo a marchar , vencendo as afperezas das fuás monta nhãs. 681 O Capitão mor Pedro Teixeira feguia fempre as fuás poppas , pelos avifos que lhe hia deixando nos portos , que largava 5 e alentados todos com tamanhos esforços , fe congratularão cada dia , por conta já de que era aquelle o ultimo dos feus grandes trabalhos j quando também o mefmo Commandante tomou em 5 de Julho as aprafiveis prayas de hum formofo rio , que fahe da Província dos Encabellados , povoado todo de índios rebeldes , pela aleivofa morte do Capitão João de Palácios , referida já no lugar a que toca : e parecen- Pp dolhe Annaes Hiftorlcòs dolhe accommodado íltio para fegurar a Tua retirada', depois de poftar nelle a mayor parte das fuás Tropas 1 , (encarregadas ao Capitão Pedro da Coita Favella com a affiííencia do Capitão Pedro Bayaõ de Abreu ) foy continuando com poucos Companheiros a mefma der- rota, que levava até Payamino, onde defembarcou em 15 de Agofto. [ 682 Neíle lugar achou as canoas do Coronel Ben- to Rodrigues de Oliveira com as alegres novas da ília jornada, que feguin do logo pelos mefmos paíTos com hum total defprezo das afperezas , e efterilidade do Paiz , que lhos difficultavao , chegou à Cidade de Bae- ça , onde foy foccorrido por ordem já da Real Audien* cia de Quito, que executou taô generofamente o feu CommiíTario, que fe chamava N.. Pinto , que naÕ fa- tisfeito de difpender fó o cabedal alheyo , gaitou muito do próprio , aíTim na profufaõ da hofpedagem de oito dias , aiTiítida fempre de plauílveis feftejos , como na abundância de mantimentos para todo o caminho , em que naÕ moílrou menos a grandeza do animo ; e mon- tados já os Portuguezes em cavallos , e mullas , fahiraõ defta Povoação em 14 de Outubro. ! 685 Com poucas jornadas chegou Pedro Teixeira à Aldeã de Pupas , doutrina de Religiofos Francifca- n05 , junto da qual havia também huma Povoação de Caftelhanos , onde o efperava o Coronel Bento Rodri- gues de Oliveira com todo o corpo do feu deftacamen-; to , depois de ter gozado por muitos dias dos regalos de Quito 5 e aquelles moradores para darem mais evi- dentes provas do feu contentamento nas muitas fedas, com que receberão aos novos hofpedes , entrou a de touros, que correrão dousdias, accrefcentando age-* neroíldade de permittirem aos noíTos índios , que ma- taífem todos com as fuás frechas ; o que fazendo elles com grande deílreza , fe multiplicavam os applaufos dó povo. Já do EJlado âo Maranhão , Liv. IX. 299 684 Já em Baeça tinha Pedro Teixeira recebido Armões. Cartas de D. AfTbnfo Peres de Salazar , Prefidente da Real Audiência de Quito , do Bifpo daquella Diocefe , e dos Prelados principaes das Religiões , com os para- béns da íingular vitoria , que havia confeguido na íua jornada, e vivas exprefsões dos alvoroços, com que o efperavaÕ , para a feftejarem com as demonítrações que ella merecia ; e vendo- fe agora cinco léguas ío da mef- ma Cidade , avifando-a da íua vifinhança , lhe chegou logo a corteza repoíla , de que continuando a íua mar- cha , fizeíTe alto no Santuário de NoíTa Senhora de Guapúlo, que fica na diílancia de meya légua , pa- ra as formalidades da íua entrada ; mas eítava ella taò ajuizadamente prevenida , que occupando o íitio finala- do com toda a boa ordem da diíciplina militar, reveíti- dos de Capas de Afperges os Sacerdotes daquelle Tem- plo , o receberão com o íagrado Hymno do Te Deum laudamus , acompanhado da fonora harmonia de hum grande numero de inílrumentos , e vozes 5 e conduzin- do-o pelo meyo delia para a Capella mor , ( onde achou huma rica cadeira de veludo carmefim , franjada de ou- ro , com almofadas da mefma qualidade ) depois de fa- zer devota oração , lhe pozeraÕ patente , com a mais reverente folemnidade , a Imagem milagrofa , que fe re- buçava com féis véos. 685 Entre as adorações daquella fagrada efcultura, pelo que figurava , admirarão também os Portuguezes a fciencia do artífice na fermofura delia ; e fahindo da Igreja Pedro Teixeira para continuar o feu caminho , achou junto da porta excellentes cavallos com preciofos jaezes 5 onde montando logo a mayor parte dos feus Soldados , celebrarão muito os Caílelhanos a deftreza de todos : mas pouco fe tinha adiantado , quando teve mayores fundamentos para a fua gloria ; porque en- controu a nobreza de Quito ricamente vertida, corte- jando o Tribunal da Camera , que em corpo de cere- Pp ii monia 300 Annaes Hijloricos ..„ w.. : ir ih '.li Antio 1638". monia lhe deu os parabéns da fua chegada por huma dif- creta Oração cheya de elogios , que recitou hum dos feus Miniftros. 686 Era o Preíidente deíle Tribunal D. Joaõ Vaf- ques da Cunha , Cavalleiro do habito de Calatrava ; e tendo já pofto a Pedro Teixeira no melhor lugar delle , com as ultimas claufulas das boas vindas , o fo.y encami- nhando para a Cidade 5 na qual crefceo de forte o feíli- vo concurfo de hum ? e outro fexo 7 que fe fez trabalho- fo o defpejo das ruas para a paífagem de tamanho triun- fo até a Real Audiência 7 que he o fupremo Tribunal do Reino de Quito , que obedece ao Governo geral do Peru : e entrando nelle bem affiílido de cortejos , os ac- erefcentou muito o feu Prefidente j porque fahindo al- guns paíTos da fua cadeira, (que fe cobria de hum cuf- tofo docel de veludo carmeíim ? guarnecido de ouro ) depois de o abraçar com afFeduofas demonílrações , engrandeceo com elegantes termos a heroicidade da ac- ção , tratando-a também como parto legitimo do valor Portuguez , para mayor gloria de Pedro Teixeira , ao qual conduzindo para outra cafa , fe eíleve informan- do , pelo efpaço de mais de huma hora 7 de todos os fuc- ceífos do feu defcobrimento j mas na6 o divertindo ef- te cuidado , do que devia ter na accommodaçaõ de taõ honrados hofpedes , ao mefmo tempo que os defpedio , a recommendou muito a quem pertencia. 687 Como fez logo eíte Miniftro hum maduro con- ceito do muito , que convinha ao ferviço do Príncipe , e utilidade publica a confervaçaõ de hum tal defcobri- mento , confultou os meyos de facilitalla ao Vice-Rey Conde de Chinchou por hum ExpreíTo , que lhe defpa- chou no feguinte dia , com a relação , e carta hydrogra- fica de toda a jornada : e continuando aquelles morado- res nas demonílrações do feu contentamento , nenhum houve , que o naõ ratificaífe pelo mais empenhado , po- rém encarecendo todos a acção com as mayores honras, as do EJlado do Maranhão , Liv. XX. 501 as das Religiões fe diftinguiraõ tanto , que cada huma Armo 1638* delias offereceo com fervorofo zelo os Operários mais virtuofos para o trabalho de ta6 inculta vinha. 688 Naõ pararão ainda neftas attençôes os Caíle- Ihanos ; porque paíTando muito mais adiante os appara- tos delias , correrão touros por alguns dias , e depois ca- valhadas ; e para que as noites naõ interrompeíTem os divertimentos, houve também em todas excellentes mu« ficas , e danças , com humas geraes illuminações , e fo- gos de artifício $ demonftraçÕes honrofas , a que corref- ponderaõ com tanta igualdade as que fe feguiraÕ , que nenhuma deixou de publicar a merecida gloria da Na* çaõ Portugueza. 689 Chegou entaõ a efperada repoíla do Conde de Chinchon , que attendendo bem ao perigofo eílado , em que confiderava o do Maranhão com a vifinhança dos Hollandezes , ordenou por defpacho de 10 de No* vembro , que a Armada Portugueza , abundantemente fornecida de munições de guerra , e boca , voltaífe ao Pará pelo mefmo caminho , que tinha levado , acompa* nhando-a fó duas peífoas das de melhor opinião , para que como teftemunhas de vifta , podeífe grangear a fua relação \ na Corte de Madrid , o mais inteiro credito ; e ao Capitão mor Pedro Teixeira efcreveo huma Carta taÕ cheya de honras , que conheceo fem duvida aquel- le Fidalgo , que fó feria o premio do feu merecimento. 690 A difpofiçaõ da efcolha de fogeitos , coníler- nou os ânimos da mayor parte dos moradores daquella Cidade ; porque engolfados nas fuás delicias , ( que fa- zia ainda muito mais liíbngeiras o natural amor da pá- tria ) já confiderando cada hum era dos nomeados para a jornada , receavaõ todos , preoccupados do fufto , ou acabar a vida nos perigos delia , ou infamar a honra na efcufa ; mas com total defprezo de humas apprehensÕes taõ pouco generofas , havendo com tudo alguns do pri- meiro caracíer, que a defejavaÕ como fortuna grande , fe Annaes Hiftoricos Anno 1638. fe íinalou bem no meyo delles o Corregedor D. João Vafques da Cunha 5 ( Tenente de Capitão General da mefma Cidade , e de nobreza conhecida , que também eílimava comoPortugueza) porque àoíFerta da fua pef- foa accrefcentou com heróica liberalidade a de toda a fazenda que poíTuía , para levantar gente , e mais defpe- zas , que foffem neceíTarias para tamanha empreza j e ainda que fahio efcufada eíla pretençaõ com o juílo mo- tivo da importante falta, que ficava fazendo 110 exerci- cio dos feus empregos , lhe adquirio merecidamente a immortalidade da memoria. 691 Naõ foy admittida a generofa pretençaõ de D. Joaõ Vafques j mas quando os Miniftros da Real Au- diência entre as mais peíToas , em que reconheciaõ ca- pacidade, e nas que fe offereciaõ deviaõ fazer a eleição, que lhes pareceíTe mais conveniente , attendendo fó nel- la ao ferviço do Príncipe , em apaixonadas irrefoiuções confumiaõ o tempo , fem outra utilidade , que a dos apreftos da mefma expedição ; nos quaes he força, que os deixe já nos últimos dias do prefente anno , para fe- guir no que fe continua a ordem deíla minha Hiíloria. 692 No dia 17 de Abril foy encarregado do gover- no da Capitania do Grão Pará Feliciano de Soufa e Me- nezes , como já fica referido 5 porém paífando da prefen- te vida dentro de pouco tempo , fem nos deixar memo- ria , que poíTa merecelía , lhe fuccedeo de novo Aires de Soufa Chichorro em 9 de N ovembro , naõ fe queren- do já aproveitar o feu grande zelo das forço fas razoes , que naõ havia ainda fete mezes o tinhaõ obrigado à de- miíTaÕ do mefmo lugar j e depois daquellas primeiras ac- ções , com que deu principio Bento Maciel ao Governo do Eílado , he eíla a única noticia , que fe nos recom- mende em todo elle na rigorofa ordem da chronologia , além da jornada de Pedro Teixeira, que vay também feguindo a que lhe pertence. ANNAES '5°3 ANN AES .. s .; ISTORICÔS DO ESTADO DO MARANHÃO. LIVRO X i SUMMARIO. .• --. H ^4HE pita<) Pedro da Cofia Favella. No mefmo filio ajfenta os limites das duas Coroas , e vay feguindo ajua derrota até a Provinda dos Cambebas. Efpecial noticia dejles ín- dios. Continua-je na mef ma jornada com a informação de todos os rios ate a Cidade de Belém do Pará. Chega a ella Pedro Teixeira , epaja logo adeS. Luiz do Ma- ranhão. Annaes Hiíloricos i ranhdo. Succede na Capitania do ~Pará Manoel Madei- ra. Entra pela parte do Norte hum patacho Hollandez até junto da Fortaleza do Ciirupá ; e ofeu Commandante João Pereira de Cáceres , o aborda , e rende. Vay em- prazado ao Maranhão 1 o Capitad mor do Grão Pará Ma- noel Madeira ; e rejiituindo-fe a Capitania , dejerta para índias comhumfoccorro de fetent a Soldados. UCCEDEO o anno de 1639, em que fe achava já prompto o Capitão mor Pedro Teixeira para fe pôr em marcha j mas continuando as contradições na Cidade de Quito , fobre a nomeação dos dous íbgeitos , que haviao defeguillo, fe dilatava ainda a fua ultima expedição , até que o Fifcal da Real Audiência Bel- chior Soares de Poago , Miniílro muy zelofo do fervi- ço de Deos , e do feu Príncipe , maduramente ponde- rando, que a Companhia dejefus defempenharia por todos os principios o acerto da efcolha , propoz efte dif- curfo no mefmo Tribunal $ e merecendo elle huma uni- forme appróvaçaõ , fe mandou logo communicar ao Pa- dre Francifco de Fuentes , Provincial da mefma Com- panhia. 694 Eftimou eíle exemplar Prelado , como grande honra da fua íàgrada Religião , o conceito , que faziaõ delia huns taõ doutos Miniftros j e tratando-o já como infpiraçao da alta Providencia , elegeo promptamente para tamanho emprego o Padre ChriftovaÓ da Cunha , Reitor actual do Collegio de Cuenca , irmaô do Corre- gedor D. João Vafques , ( parece , que difpondo a Di- vina Juíliça , que os merecidos créditos , que fe ufur- parao à fua peflba } fe reílituiífem multiplicados ao feu mef- do EJlado do Maranhão , Liv. X. |o| mefmo fangue ) e em fegundo lugar o Padre André de Anno 1639. Artieda , Leitor de Theologia nos eftudos de Quito , Religiofos ambos de tantas letras , como virtudes. 695 Com razaõ fatisfeito do louvável acerto deita nomeação , a entregou logo na Real Audiência , que a recebeo com as honrofas demonftrações, que conftaõ bem da Provifaõ , que lhe mandou paliar, que fe acha copiada na relação da meíma viagem , que traslada o Padre Manoel Rodrigues , no feu Marafwn , y Amazo- M ara % õn ■ « nas : e vencidos já todos os embaraços , entrou Pedro Amazonas , liv. Teixeira na fua nova empreza , nao fó acompanhado 2 - ca P' 6 ' dos Padres Chriílovaõ da Cunha , e André de Artieda , mas também , por virtuofo impulíb de huma vocaça5 fanta , dos Padres Fr. Pedro de la Rua Cirne , Fr. João da Mercê , e Fr. Diogo da Conceição , e Superior dos três Fr. Affoníb de Armejo , Pveligiofos da Ordem Cal- çada de Noíía Senhora das Mercês j dos quaes morrenr do o ultimo , e hum dos Companheiros no mefmo ca- minho , foy depois Fr. Pedro o feu Fundador nas Ci-í dades de Belém do Pará , e S. Luiz do Maranhão. 696 Pede o Padre Cunha , com a modeftia mais Religiofa , que fe lhe dê inteiro credito em todas as no* ticias da fua relação , como teflemunha ocular da ma- yor parte delias , e tao fidedigna pelas obrigações do feu eftado, o que merece de juftiça pelo grande trabalho da fua indagação , que nao defauthorifaÕ os mais apurados exames da minha na correçao de algumas j porque fuc- cedefempre taõ fomente naquellas, que fiou a fua íln- geleza das menos verdadeiras informações dos bárbaros Tapuyas. 69J Mas antes, que as proas de Pedro Teixeira , heroicamente encaminhadas , cheguem a romper fegun- da vez o prodigiofo mar das Amazonas , ( que tributa a mayor porçaô das fuás aguas à Monarquia Portugueza nos mefmos Dominios defta minha Hiftoria ) devo pri- Qq meiro Annaes Hifloricos Ánno 1639. meiro averiguar a fua certa origem 5 porque ainda que ella por efpaço de feifcentas léguas lhe fique fendo ef- tranha pela fugeiçaÔ , como accefforio ha de feguir o principal. 69% He o rio das Amazonas o mayor do Mundo defcuberto 5 e como fó nefta indifputavel aíTeveraçaõ fe explica bem a fua grandeza , todos os mais hyperbo- les , para períuadilla, íicaõ já viciofos. Tem o feu illuf- tre nafcimento no Reino do Peru ; e fertilizando-lhe as melhores terras , e povoações , lhe demanda cada huma delias os honroíbs refpeitos da maternidade com a am- bição mais generofa. 699 Quer a Província Amena , ou Governo de Po- payan , que nas vertentes do Mocoá tenha a primeira fonte efte fupremo príncipe de todos os rios com a alcu- nha de Graõ Caquetá 5 ( nome próprio de outro feu tri- butário ) porem com huma prefumpçaõ taõ cheya de vangloria , que a notória falta de fundamentos a deixa logo defvanecida ; porque naô fe communicando as fuás aguas na larga diílancia de fetecentas léguas , quando fe chegaô a encontrar, torcendo logo o curfo o GraÔ Ca- quetá com reverente fubmiíTaõ , reconhece bem a ma- geftade do das Amazonas , feguindo o apparato do feu grande cortejo. 700 Por outros argumentos pretende o Reino do Peru a meíma vaidade j e com princípios mais apparen- tes , ou menos fabulofos , ( efpecialmente na opinião dò Padre Cunha ) a oito léguas da Cidade de Quito , nas faldas de huma cordilheira , que divide da fua jurifdic- çaô o Governo dos Quixos, ao pé de dous montes, junto dos quaes , e de duas lagoas , que os régaô , naf- cem dous rios caudalofos , hum chamado Guamaná , o outro Pulca , que com poucas léguas de caminho unem as fuás aguas -, e engroííando mais o cabedal delias com o de alguns feus feudatarios , lifongeados os natura es da fua do E/lado do Maranhão , Lm. X. 3 07 fua grandeza , lhe daõ o titulo de Amazonas , que o Pa- Anho 1639. dre Cunha ( íinalandolhe a fua origem vinte minutos ao Sul da Linha ) chama também o verdadeiro , ou quan- do menos o que procuraõ como may todos os outros rios 5 porém íeguindo eu os fabios documentos do Pa- dre Samuel Fritz , da meíma Companhia de Jefus , mof- trarey com clareza a fua legitima producçaõ. 701 O famofo rio das Amazonas , Orelhana , Graõ Pará, ou Maranhão , ( nome eíte ultimo, que lhe daõ os melhores Cofmografos defde o Teu próprio berço > onde os naturaes lhe chamao Apurimac ) he certo, que nafce no Reino do Peru ; porém da celebrelagoa Lau^; ricocla , junto da Cidade de Guanuco dosCavalleiros. r ! 702 Até a Cidade dejaem.de Bracamouros fefaz impraticável à navegação, que principia- delia na direi- tura da de Borja , perto da qual tem hum eftreito prodi- giofo , chamado Pongo ( que quer dizer porta ) de vin- te pés de largo , e três léguas de comprimento , talha- do de huma penha de duzentas braças de elevação pára cima da fuperíicie da agua 5 e correm as fuás com taõ precipitado movimento , que fe naõ gafta na paíTagem mais de hum quarto de hora ; porém pouco a baixo da boca efpraya duas léguas com hum grande fundo. 705 O Padre Samuel Fritz ,. na breve Defcripçaô Hiftorica , que traz no fim da fua Carta Geográfica , efc tende a largura do mefmo canal a vinte e cinco varas ; mas he fem duvida , que ou padece equivocaçaõ eíla fua memoria, ou a tirou de algumas menos verdaden ras ; porque fe na jornada de Gonçalo Piífarro , como referem fem difputa os feus Efcritores , fe lançarão vigas de huma a outra banda , de que fe formou ponte taõ capaz , que deu paflb feguro a todas as Tropas : ef- ta operação , que fe pondera juftiffimamente por aíTaz trabalhofa na curta diílancia de vinte pés, que lhe dá Descobrimentos também António Galvão , nos feus Dejcohrimentos do f ^ 0j&n ' Qqii Mim- Annaes Hiflorkos Anno 1639. Mundo , na que lhe confidera o Padre Samuel fe deve tratar como impoííivel. 704 Caminha eíle rio da fua origem , até onde o Napo defemboca nelle , de Sul a Norte , e dahi por Úb- ante de Oefte a Lefte em dilatados gyros , vifinhos fen> pre da Equinocial dous, três , quatro , e cinco grãos , e dous terços na mayor altura : a largura ordinária he de huma, duas, três, e quatro léguas j em algumas partes fe reílringe a menos , porém commummente eípraya muito mais : o fundo , que também fe perde varias ve- zes , conferva quando pouco fete , e oito braças defde as viíinhanças do feu nafeimento j e depois do efpaço- fo curíb de mil e oitocentas léguas Caftelhanas , entra já com oitenta e quatro de boca no mayor Oceano do Cabo do Norte ; mas como a defcripçaõ defte diluvio de aguas pertence dejufíiça à viagem de Pedro Teixei* ra, a deixo paraella. 705 No dia 16 de Fevereiro fahio da Cidade de Quito eíle Commandante , naõ pela eftrada de Payami* no , que lhe tinha fido taÔ trabalhofa , mas por ou- tra nova porta , que defcobrio a fua a&ividade pela Ci- dade de Archidona ; até a qual lograda venturosamente a fua marcha, chegou ao Napo, rio caudalofo , com mais hum fó dia , que a feguio a pé , por fer de Inverno, que de Veraõ a podia vencer a cavallo com menos dif- commodos ; e metendo-fe a bordo das canoas , que já o efperavaõ naquelle mefmo fitio, continuou a fua via- gem até fe incorporar com o deílacamento de Pedro da Coíla. 706 Tinha elle deixado a eíle Capitão com quaren* ta Soldados , e muita parte dos índios guerreiros nas terras da boca do rio dos Encabellados j mas ainda que entre aquelles bárbaros feus naturaes , confervou no principio huma grande amifade , como aceufados do feu procedimento na traidora morte do Capitão JoaÔ de Pala- âo Eflado do Maranhão, Liv. X. 3 09 Palácios fe lhes fez logo efcrupulofa , provocarão de Annoi639« novo as juflas iras de Pedro da Coíla com outra feme- Jhante infidelidade ; porque debaixo de toda a íingele- za defta boa harmonia lhe matarão três índios : e toman- do as armas para a oppoílçaõ da efperada vingança, co- mo taõ merecida , até já a tratavaò com hum total àe{- prezo , lifongeados do poder formidável da fua NaçaÕ : porém a Portugueza , que apurando fempre a fua conf- tancia no fonrimento das honrofas fadigas , lhe falta to- do nas injurias , reputando por tal os noflos Soldados o bárbaro infulto daquelles Tapuyas na repetição da fua ■aleivofia, forao ta5 feveras as demonílraçÕes para o caf- tigo delia , que depois de fervir de importante defpojo da vitoria hum coníideravel numero dos feus cadáveres > accrefcentou-o muito o de mais de fetecentos prizionei- ros ', porque ainda que deites romperão alguns as groíTas cadeyas , agradecerão poucos à fua induflria a falvaçaõ das liberdades. 707 Com tudo taõ pouco efcarmentou a fua fereza neíle fatal eílrago , que logo refazendo-fe de novas for- ças , chegarão a reduzir a fubfiftencia do Capitão Pe* dro da Cofta a perigofo eítado , pela penúria de manti- mentos j porém elle , depois de efgotar na fua pretendi- da reconciliação todos os meyos da brandura, fe empe* nhou de forte nas hoítilidades , que as que padecia, af- fim no feu alojamento , como n,a campanha, as deixava fempre recompenfadas com avultados juros ; mas já lhe fahiaõ bem cuílofos nas largas fadigas de onze mezes , quando fe vio reílituido dos feus Companheiros : e ce- lebrando-fe reciprocamente a felicidade de humas , e outras acções com os applaufos que ellas mereciaÕ , fe difpozeraõ todos para continuallas. 708 Os primeiros Soldados Caftelhanos , que de f- cobriraõ eíles índios , lhes deraõ o nome de Encabella- dos, por ufarem de taõ longos cabellos , aíTim osho* mens , Annaes Hiftoricos ■ - . - ' - - . _•■ &rínâ 1639. mens , como as mulheres ; que a muitas deitas lhes paf- favaõ abaixo dos joelhos : as fuás armas offenfivas^ faÒ agudos dardos , de paostaÔ duros como o meímo ferro: as cafas de palmeira brava > e o mantimento mais rega- lado o de carne humana , tjue he o ordinário de^todo o gentio daquelles rios. Trazem continuas guerras Com as Nações viíinhas , como fuccede commummente.a todos os Tapuyas para fazerem paíto dos vencidos com laílimofo horror da própria natureza. 70^ Nefte mefmo campo , que fica vinte léguas Amai™ ' - y a ^ xo ^° r ^° Aguarico , chamado do Ouro, mas ain- 2. cap. iq.' ' da à vifta da fua mefma boca , fe dilatou o Capitão Pe- dro Teixeira por alguns mezes ; que utilifou muito , a£ íim no caftigo daquelles Tapuyas, como na fabrica de novas canoas, por fe acharem as mais das que deixou no porto delle com o Capitão Pedro da Cofta , defpe-i daçadas pelos mefmos bárbaros , e muitas das outras confumidas do ufo ; e entendendo logo , que era o fitio mais accommodado pára fundar huma Povoação , que também ferviíFe debaíliza aosDominios das duas Co-* roas , conforme as inftrueçôes do feu Regimento , de- pois de concordar nefte parecer toda a fua Armada , mandou formar o feguinte auto , que fe acha regiftrâdo nos livros , da Provedoria de Belém do Pará , e Senado daCamera. r 710 An/20 do Naf cimento deN. Senhor Jefu Chrif- to de 1639 7 aos 16 dias domez de Agojio , defronte das bocainas do rio do Ouro , ejlando ahi Pedro Teixeira , Ca- pitão mor por S . Magejiadedas entradas , e defcohrimen- to de Quito y e rio das Amazonas 5 e vindo já na volta do dito âefcolrimento , mandou vir perante Ji Capitães , ^Al- feres f e Solda Jos das fuás Companhias , e prefentes todas lhe communicou, e declarou , que elle trazia ordem do Go- vernador do Ejlado do Maranhão , conforme o Regimen» to , que tinha o dito Governador de Sua Magefiade , pa- ra do liflado do Maranhão , Liv. X. 311 ra no dito descobrimento efcolher humfitio, que melhor lhe Anno 1639. par ecejfe para nel/efe fazer Povoação 5 e por quanto aqueU le , em que de prejènte ejlavaõ , lhe parecia conveniente , cijfim por razad do ouro , de que havia noticia , como por ferem bons ares , e campinas para todas as plantas , paf- tos de gados, e criações , lhes pedia jeus pareceres , por quanto tinhadjâ vifio tudo o mais no de f cobri mento, e rio : c logo por todos , e cada humfoy dito , que em todo o difcur- fo do dito defcobrimento , naõ havia jtio melhor , e mais accommodado y e fiificiente para a dita Povoação , que cquelle em que ejlavaõ , pelas razões ditas , e declaradas : o que vijlo pelo dito Capitão* mor , em nome de EIRey Fi- lippe IV. nojo Senhor tomou poje pela Coroa de Portu- gal do ditojitio , e mais terras , rios , navegações , e co* mercios , tomando terra nas mãos , e lançando-a ao ar , dizendo em altes vozes : Que tomava poje das ditas ter* ras , efitio em nome de EIRey Filippe IV. nojo Senhor pela Coroa de Portugal , je havia quem a dita poje con- tradijeje , ou tiveje embargos , que lhe pôr , que alli ef* tava o EfcrivaÕ da dita jornada , e defcobrimento , que lhos receberia ; por quanto alli vinhaõ Religiofos da Com* panhia dejefus por ordem da Real Audiência de Quito y e porque he terra remota , e povoada de muitos índios , naõ houve por elles , nem por outrem ; quem lhe contradijeje a dita poje : pelo que eu EfcrivaÕ tomey terra nas mãos, e a dey na maõ do Capitão mor , e em nome de EIRey Filippe IV. nojo Senhor o houve por metido , e envejlido na dita pojfe pela Coroa de Portugal do ditojitio , e mais terras , rios , navegações , e comércios \ ao qualjtio o dito Capitão mòrpozpor nome a Francifcana, de que tu- do eu EfcrivaÕJiz ejle auto de pojfe , em que ajinou o dito Capitão mor. Tejlemunhas , que prefentes foraÕ , o Coro- nel Bento Rodrigues de Oliveira , o Sargento mor Filip- pe de Matos Cotrim , o Capitão Pedro da Cofia Favella , o CapitaÕ Pedro BayaÕ de Abreu , o Alferes FernaÓ Mén- m Annaes Hiftoricos i $ j'i Anno 1639. Mendes Gago , o Alferes Bartlwlomeu Dias de Matos , o Alferes •António Gomes de Oliveira , o Ajudante Maurício de Aliarte , o Sargento Diogo Rodrigues , o Almoxarife de Sua Magejlade Manoel de Matos de Oli- veira, o Sargento Domingos Gonçalves , e o Capitai Do- mingos Pires da Cofia ; os (juaes todos fohr éditos aqui af. Jmarao com o dito Capitão mor Pedro Teixeira : e eu João Gomes de Andrade, Efcrivao da dita jornada, que o efe revi. 711 Feita efta funçaS com as folemnidades referi- das , perto de mil e duzentas léguas da Cidade de Be- lém do Pará, ( que a tanto fe eftendem os vaftos Domí- nios Portuguezes na demarcação das índias Caítelhanas) continuou Pedro Teixeira a fua viagem até as Provín- cias dos índios Abigiras , JuruíTúnez , Zaparás , e Yqui- tás , que correm pela parte do Sul quafi na altura de dous grãos, defronte da dos Encabellados , que caminha pe- lo meímo rumo 5 e encerradas já eftas Nações entre o grande rio defte nome , e o de Curaray , na diftancia de quarenta léguas, em que unem ambos as fuás aguas, acaba também a habitação daquelle gentilifmo. 712 Pela mefma banda do Sul, oitenta léguas mais abaixo do rio Curaray , defemboca no das Amazonas o de Tunguragua , que defee da Província dos Maynas com o nome ufurpado de Maranhão ; e arrogando no titulo a própria mageftade , até fe faria refpeitar deite fendo feu legitimo foberano , fe detendo elle algumas léguas antes o ordinário curfo , lhe naõ deixaíTe politi- camente confumir o grande cabedal das fuás aguas , de que fe alimenta tanta vangloria ; porque empobrecido na profufaõ do largo território de huma légua , confeíTa logo vaíTallagem ao Maranhão , ou Amazonas , pagan- dolhe também , para merecer o perdão da fua rebeldia , alem do titulo commum, o de muitos, e regalados pei- xes de varias qualidades. De- do Ejiaão do Maranhão , Liv. X. 3 1 j 7 1 3 Depois do exame deite grande rio , continuou Anno 1639. a noíTa Armada a fua derrota j e na diftancia de feífen- ta léguas , onde já cadáver o caudalofo Napo fepulta a fua fama no honrofo tumulo das Amazonas , entrou na Província dos Cambebas , que principia pela parte do Norte no rio Huiray ; pouco abaixo da boca do qual ef- tá a Aldeã de S.Joaquim , íitio deílinado para a funda- ção de huma Fortaleza , por fer o mais conveniente pe- la capacidade do terreno , depois da junção do rio Na- po , ainda que rica muito dentro da demarcação de Por- tugal. 714 Aos Cambebas chama o Padre Cunha ( fegui- do também do Padre Samuel Fritz ) Omaguaz , ou Ma- guaz ; he certo , que equivocadamente . por lhes trocar o nome pelo de outra Naçaõ : a fua Província he a mais dilatada de todo o gentilifmo, porque comprehende duzentas léguas de longitude ; porém a latitude naõ pafla da das Amazonas , que alli he menos avultada 5 e nas fuás Ilhas , que faõ muitas ', fe achaõ íituados todos eíles Tapuyas com habitação aífaz incommoda , pe- las annuaes inundações do rio ; mas confervao-fe nel- la fò para viverem mais defendidos dos feus inimigos , que faõ poderofos. 715 Alguns deites índios fe communicaraõ por muito tempo com as Povoações do Governo dos Qui- xos, donde pouco antes fe tinhaÕ retirado queixofos do máo trato dos feus moradores ; e como incorporando- fe com a fua Naçaõ, na mayor força delia , a infiruiraõ naquella doutrina , que pode tirar a fua fereza dos do- cumentos Caítelhanos , ficarão todos menos bárbaros. 716 Confervavaõ pela banda do Sul huma conti- nua guerra com varias Províncias , feado principal a dos Mayorunas ; Nação taõ poderofa , que naõ fomen- te fe defendia delles pela parte do rio , mas de outras muitas pela da terra j e na do Norte naõ encontravaÔ Rr me- m Annaes Hiftoricos Anuo 1639. menos oppofiçaõ nos índios Tocunas ; porém hoje fe achaõ. quafi todos domeílicados. 717 Naô fe fuftentaõ os Cambebas de carne hu- mana ? e já naquelle tempo fe tratava hum , e outro fe- xo com algum recato ; porque fuppofto, que da cintu- ra para cima naõ ufaíTem delle , dahi para baixo era me- nos a fua indecencia , por fe cobrirem todos de huns par nos curtos de algodão , que teciaõ com fufficiente cu oitavadas , e triangulares j e huns pân- tanos taõ dilatados , que fe reputaõ pela longitude de oitenta íeguas , cheyos todos de arroz de taõ excellente , qualidade , como o de Veneza. 735 Mais abaixo atraveflbu aboca do rio Urubu- cuára , e pouco adiante a do Mapaú : o Certaõ defte taõ fértil de cacáo , e falfa parrilha , como o de ambos de gentilidade , alguma delia miííionada hoje pelos Re- ligiofos da Piedade , e de Santo António. Pela mefma banda vio logo o fitio do Paru , que defende outra For- taleza , guarnecidas todas por deftacamentos da Praça do Pará , e nas fuás elevadas ferras também fe confide- raõ preciofos thefouros. 756 Defronte defte fitio , já reduzido a mar com o cabedal groflb de trinta e féis rios o príncipe de todos , bufca --■ do EJlaão do Maranhão , Liv. X. %2 1 bufca o Oceano, e defemboca nelle pelo Cabo do Nor- Atino 1639^ te com huma oppofiçaõ taõ foberbamente generofa > que difputandolhe a própria natureza , chega a introdu- zirlhe as fuás aguas pela diftancia de quarenta léguas , com taõ pouca mudança na doçura , que os navegantes as aproveitaõ como regalo , ainda quando lhes naõ dá o fabor a fua muita fede. 737 As correntes íèmpre precipitadas defte illuftre rio , fe fazem invencíveis' na fubida a todo o género de embarcações, que naõ fejaõ de remo: e como neftas forças faõ as Portuguezas por aquella parte conhecida- mente ventajofas às dos feus confinantes , tanto na qua- lidade , como também no numero , lhes fica fendo pou- co cuftofa a confervaçao delle; 738 Apartado já Pedro Teixeira da navegação das Amazonas, continuou a fua pela banda do Sul; e por hum efíreito , que formão duas Ilhas , entrou na boca do caudalofo rio do Ningú ( que o P. Cunha chama Para-; nahiba ) taõ abundante de páo cravo , como de gentio, muita parte delle já hoje miííionada pelos Religiofos da Companhia de Jefus 5 íitio admirável para huma gran- de povoação , com excellentes terras para engenhos de aífucar , e outras muitas lavouras. 739 Com mais hum dia de viagem chegou à Forta< leza de Santo António do Gurupá , onde fe deteve ; e fazendo-fe à vela pelo mefmo rio do Xingu , o largou brevemente, embocando o eílreito de Tanajepurú , que o meteo no de Paraitaú , que defagoa no mar 5 o qual cofteando fahio por outro muito mais apertado ( chama- do hoje do Limoeiro ) à efpaçofa boca dos Tocantins , que deixando logo , o conduzio outro novo eftreito , a que daÕ o nome de Igarapémirim (que quer dizer cami- nho apertado de canoas) ao caudalofo rio doMojúj que fendo hum dos três , que.formaÕ a bahia de Belém do Pará , como já fe veria na defcripçaõ da mefma Ci- Ss dade , ■' "! Annaes Hlfioricos Anno 1639. dade, orecolheo nella com a jornada de oito dias de- pois de partir do Curupá , que he a ordinária deíla na- vegaçaô. 740 Neílesrios, que naõ eftaõ ainda detododef- cobertos , e em outros muitos, que defagoaõ nelles , an« tes que entrem no. das Amazonas , ha infinito numero de Tapuyas , que fe alimentaõ de carne humana , como já fica referido 5 vivendo também tanto como brutos em todos os mais ufos da racionalidade , que fe acafo foíTe admittida nas efcolas terceira efpecie delia 7 bem lha po- díamos confiderar com fundamentos muito mais vigo- rofos, que os com que fe negou aos da nova Hefpanha, pelo largo efpaço de mais de quarenta annos até o de 1537, que por Breve Apoítolico de 10 de Junho lha de- clarou o fantiffimo Padre Paulo III. , habilitando-os pa- ra os Sacramentos 5 porque na policia do feu governo nos moílraô claramente repetidas hiftorias, que fe acha- vaô longe defta barbaridade 5 e fenaõ lea-fe , como ar- gumento o mais authorizado de todas ellas, a do taõ fa- bio, como eloquente Efcritor D. António de Soliz, na famofa Conquijla do Império Mexicano. 741 Pelos certões dos mefmos rios fe defcobrem fí- niííimas madeiras 5 e além das drogas referidas , fe pre- fumem outras muito mais preciofas , principalmente na qualidade. Divididas pelas entradas delles , e nos que defembocaõ nas viíinhanças de Belém do Pará , confer- vamos hoje dezanove Aldeãs deites Tapuyas já domef- ticados , miífionadas pelos Religiofos da Companhia de Jefus : pelos do Carmo doze : pelos de Santo António , Conceição , e Piedade quinze 5 e cinco pelos de NoíTa Senhora das Mercês , com mayor numero de vinte mil almas. 742 Efta he fem duvida a eífencial defcripçaÕ hif- torica , e natural do fupremo monarca de todos os rios , ( defde o feu illuftre nafcimento na celebre lagoa Lauri- cocha y do afiado do Maranhão , Liv. X. 525 cocha , até deixallo mais efclarecido na fepultura do Anno 1639. Oceano ) abraçando eu as noticias modernas , que ave- riguey pelos melhores práticos , e mais fidedignos , com huma exacçaõ taÔ efcrupulofa , que com razão poflb aíTeverar he fó a verdadeira ; e naõ individuo outras taõ dirTerentes , como dirfufas informações para criticallas ? por me na5 arfaílar , inutilmente , da ordem com que eícrevo. 745 Em 1 2 de Dezembro entrou Pedro Teixeira na Cidade de Belém do Pará , onde fe celebrarão as fuás acções com taõ publicas honras , que refpeitarao bem o feu merecimento , e naõ coube também pequena par- te nellas aos feus Companheiros j porque lograrão to- dos nas acclamações daquelles moradores o mais precio- fo fruto de tamanhas fadigas , fendo a mefma memoria das primeiras inftancias ; com que intentarão impedir eíla gloriofa expedição , a que as fez ainda muito mais eítimaveis. 744 Vio-fe Pedro Teixeira juftamente goílofo en- tre os applaufos da Capitania do Pará , e a reílituiçaõ da fua cafa ; mas para poder dar fatisfaçaõ cabal aos en- cargos da fua commiííao , e melhor gozar da fua mef- ma fama na extenfaõ delia , paífou logo à prefença do Governador Bento Maciel , que affiítia ainda na Cida- de de S. Luiz ; e os Padres ChriílovaÕ da Cunha \ e André de Artieda , ficarão defcançando na delSoíTa Senhora de Belém j na qual os deixarey efperando mon- ção , e adquirindo o primeiro novas noticias para autho- rizar mais a relação de todas as fuás na Corte de Ma- drid ; em quanto vou feguindo a ordem dos fucceíTos , na informação dos do prefente anno , que dilatey até ef- te lugar , por naõ interromper a defcripçao do grande rio das Amazonas \ quando nao faltava aos rigorofos termos da chronologia. 745 Em 9 de Novembro do anno paíTado tinha no- Ss ii vãmente HT 524 Annaes Hiftoricos Anno 1639. vãmente fuccedido no governo da Capitania do Pará Aires de Soufa Ghichorro por falecimento do Capitão mor Feliciano de Soufa e Menezes , facrifícando já a fua obediência em obfequio do ferviço do Príncipe , e utilidade publica ; mas em 26 do mez de Abril deite prefente anno , o aliviou daquella occupaçaõ , por Pa- tente Real , Manoel Madeira , que havia fervido no Reino de Angola com muita diftinçaô j e vendo Bento Maciel , que o conhecido preílimo do feu anteceíTor fi- cava fem emprego 7 lhe conferio logo o de Capitão mor co Camutá, que entrou a fervir dentro de poucos dias , depois de recebida a nomeação. 746 Achou Manoel Madeira a Capitania em hum geral focego 5 porém os Hollandezes , que fe naõ podiaó ainda apartar daquellas viíinhanças , ambiciofamente faudofos das utilidades , que tiravaõ delias nos annos pafíados com as feitorias das fuás drogas , intentarão de novo perturballo ; e querendo tentar a fortuna no exame dos ânimos dos noíTos índios , em outro tempo feus al- liados , fubiraô até perto da Fortaleza de Santo António do Curupá com hum patacho armado em guerra , mui- to bem fornecido de todos os géneros , de que mais fe obriga a barbaridade daquelles Tapuyas , para que lo- grando eíte proje&o , à proporção das fuás medidas , po- deííem desfrutallas 5 mas o Commandante da mefma Fortaleza Joaô Pereira de Cáceres , fem mais forças, que as da fua pouca guarnição , os bufcou , e abordou com tanta valentia, que faltandolhes já a conílancia pa- ra a reíiílencia dos feus pezados golpes , lhes renderão a embarcação com toda a fua carga , que diílribuío a ge- neralidade do vencedor como defpojo da vitoria. 747 Sem mais outra memoria , que poíía merecelía em todo o Eftado do Maranhão , entrou o novo anno Anno 1640. de 1640 $ porém no feu principio encontramos já a do emprazamento do Capitão mor do GraÔ Pará Manoel Ma- do EJlado do Maranhão , Liv. X. 3 § } Madeira ; porque excedendo muito ao numero dos dias Anno 1640; do feu governo as reiteradas queixas do feu procedimen- to, para refponder judicialmente a todas ellas o mandou ir Bento Maciel à Cidade de S. Luiz em termo perem- ptório, por expreíTa ordem de 23. do mez de Janeiro ; e. encarregando a Capitania ao Senado da Camera , até o provimento da íua fucceífaõ , a conferio logo a Pedro Teixeira , Capitão mor da jornada de Quito , que ío por eftaacçaõ, quando fe naõ achaífe taõ habilitado pelas antecedentes , fe fazia digno de mayores empregos. 748 A ordem para o emprazamento do Capitão mor Manoel Madeira, chegou em 16 de Fevereiro à Cidade de Belém do Pará , onde teve prompta execu-, çaõ , entrando também logo na fubftituiçaÕ do feu mi- niílerio os primeiros nomeados nella ; mas durou-lhes taõ pouco , que naõ paíTou do dia 28 do mefmo Feve- reiro ; porque chegando neíTe Pedro Teixeira .1, e mof- trando naquelle Tribunal a nova Patente de, Capitão mor , recebeo a poífe do governo da Capitania com hu- ma geral fatisfaçaõ dos feus moradores. 749 Ao mefmo tempo nomeou também ío Gover- nador , por Capitão mor do Curupá , e Amazonas , e da fua Capitania do Cabo do Norte , a feu fobrinho Joaõ Velho do Valle , aótual Capitão de Infantaria j mas querendo inculcar neftas difpofições , que fó fe encami- nhavaÕ à fegurança de todo o E fiado ,. nos ameaços das Armas Hollandezas , concorrerão muito para a fua rui- na , como lerá a noífa juíla magoa nos Livros feguintes -defta Hiftoria. 750 No mez de Dezembro do anno paíTado tinhaõ entrado na Cidade de Belém do Pará os Padres Chriílo- vaõ da Cunha , e André de Artieda ; e offerencendo- felhes favorável monção de navios da Europa , fe apro- veitarão delia nos principios de Março do prefente an- no j mas tirando primeiro do Capitão mor Pedro Tei- xeira Annaes Hiíloricos xeira huma atteftaçaÕ do feu procedimento na jornada de Quito , que traslada o Padre Manoei Rodrigues no feu Marafíqn , y Amazonas ; porque ainda que eftes Religiofos da Companhia de Jefus eraõ fem duvida de huma vida exemplar , entenderão , que neceffitavaõ das abonações daquelle Commandante , que deixarão , e aos mais moradores do Pará , juftiííimamente faudofos da communicaçaõ das fuás virtudes. 75 1 Toda a feveridade do Governador Bento Ma- ciel , no emprazamento do Capitão mor Manoel Ma- deira , parou na frouxidão de o abfolver de todas as culpas , de que o arguíaõ , logo que chegou à fua pre- fença ; com huma prova tao arrebatada , na juílificaçaõ do feu procedimento , que moftrou bem ? que ou o pri- meiro da fua fufpenfaô fora apaixonado , ou efte mais que leve ; e embarcando-fe elle em huma caravela pa- ra reftituirfe ao Pará , com o foccorro de feíTenta Solda- dos , e doze eafaes de moradores para a Capitania do Cabo de Norte ? mancomunado com o Piloto , arribou a índias , por vingança ainda ao Governador ; quando foy mais pezada a que tomou , por d i Aferentes princí- pios , da fua mefma honra , na deferçao do cargo , de que tinha dado homenagem. 752 Sentio efte accidente Bento Maciel ? e difcor- rendo entaõ nas fuás confequencias , defpedio logo hum barco para as mefmas Conquiftas Caftelhanas , com em- penhadas recommendações , de que os avifos , que fa- zia das poucas forças , com que fe achava para a oppo- fiçaõ das inimigas , paíTaífem promptamente à Corte de Madrid , procurando já neílas antecipadas prevenções , ou fazer mayor a fua fortuna na defenfa do Eítado , ou iJefculpar a fua defgraça no rendimento delle , que na errada diílribuiçaõ das fuás providencias era o mais pro- vável. ANNAES ANN AES HISTÓRICOS DO ESTADO DO MARANHÃO. LIVRO XI; SUMMARIO. SB UCCEDE no governo da Capitania do Tara ^MFrancifco Cordovil Camacho , e morre o feu teSa^ES antecejfor Pedro Teixeira. Chega a Cidade de 5. Luiz a feliz noticia da rejlauraçaà de Portu- gal , que o Governador participa logo a Cidade de Be- lém. JoaÒ Comelles , Commandante de huma ^Armada Hollandeza , occupa com aleivofia o Maranhad , efaquea a Cidade de S. Luiz com a prizoà do Governador Bento Maciel. Os moradores , que tinhai defertado dos feus domicílios, tornao a occupallos ; ejoao Comelles , te- merofo de alguns , os fazfahir do Maranhão em hum na- vio quaji desmantelado. Segura a confervaçai daquella Ilha com a guarnição 1 de feif centos homens , e quatro na° vios j e com o rejlo dasjuas forças fe recolhe para Par- namhico. !(' i M" t, !'; ,<, Anno 1641. 32S Annaes Hifioricos nambuco. A noticia da invafao 1 do Maranhão* pqjfa a CU da de de Belém do Pará , e os j eus moradores fe difpoem valerofamente para afua defenfa. Chega a mefma Cida- de com hum corpo de Tropas o Capitão mor do Cabo do Norte Joaò Velho do Valle , efe movem perigofas du- vidas no governo das Armas. Sabe-fe no Pará 7 que os Hollandezes tinhaójá chegado até a Villa do Gurupy 5 e João 1 Velho do Valle continuando na mefma difputa do Governo , def ampara a Capitania. Dá fundo fora da barra do Pará hum navio Hollandez , que levava a feu bordo a Pedro Maciel , muito tempo antes provido já no poflo de Capitão mor da Capitania , e os [eus moradores nao querem admittillo. As medidas , que toma para obrU gallos. Morre na Cidade de Belém o feu Capitai mor Francifco Cordovil , e o Senado da Camera fubjlitue o governo da Capitania. Alguns moradores da Capitania do Maranhão intentai facodir o jugo dos Hollandezes , e nomeao por feu Commandante a ^António Moniz Barrei- ros. Aceita o emprego , e acredita bem com as fuás ac- ções o acerto da ef colha. Com a noticia dos movimentos dos moradores do MaranhoÚ fahem da Capitania do Pará para feu foc corro os Capitães mores Pedro Maciel , e JoaÕ Velho do Valle. O Governador dos Hollandezes remete a Cidade de Belém o Tratado da Tregoa dafua Republica com a Coroa de Portugal. A R E C I A que nos últimos períodos do anno parlado dei- xava já a Bento Maciel menos efquecido do poder formidável dos Hollandezes ; porém na nova íucceíTaÕ de 1641 , eílava ainda taõ allucinado , ou ta6 ambicioíb da confervaçaõ dos Teus cabedaes , ( como juftamente o confidera o excellente Hiíloriador D. Luiz de „ 1 âoEflado do Maranhão , Liv.XL de Menezes , Conde da Ericeira , no feu Vortugal Ref- Anão 1641. taurado ) que quando efperava todos os inílantes os pri- Portugal Ref- meiros golpes das armas inimigas na Cidade de S. Luiz, naõ tratou mais que de debilitar a ília defenfa j porque depois da perda dos feíTenta Soldados arribados a ín- dias , lhe tirou outros muitos , que remeteo para o Graõ Pará j e encarregando ao feu Capitão mor Pedro Tei- xeira , que reclutaífe fó aquella guarnição até o nume- ro com que fe achava no tempo do feu anteceííor Frán cifco Coelho de Carvalho , lhe ordenou também , que todos os mais tranfportaífe logo à Capitania do Cabo do Norte , de que era Donatário 5 mas o certo he , que huns taes defa tinos eraõ já fymptomas mortaes da enfer- midade da fua honra. 754 Executou com tudo o Capitão mor Pedro Tei- xeira taÕ erradas ordens , por fe naó atrever a replicai- las 5 e continuando no exercicio da fua occupaçaÔ | multiplicava cada inílante os elogios do feu nome que entendendo juíliffimamente , que a defattençaõ pu- blica , com que tratava os feus ferviços , naÕ lhes pro- curando o devido premio, fe lhe fazia já efcrupulofa determinou paífar a Portugal com efta dependência ; e pedindo logo fucceíTor > lhe nomeou Bento Maciel a Francifco Cordovil Camacho , Cavalieiro do habito de Chrifto , que tendo chegado ao Maranhão havia pou- cos dias com o emprego de Provedor mor da Fazenda Real do Eílado , fe encarregou da Capitania em 26 de Mayo. 755 Deixou Pedro Teixeira o Governo do Graõ Pa- rá com merecida magoa daquelles moradores , que fe lhes fez inconfolavel dentro de poucos dias com o fatal golpe da fua perda $ porque quando difpunha a fua jornada pa- ra Lisboa , lha embaraçou huma doença taÕ aguda , que lhe tirou a vida ; mas fe foy eíla breve na duração do Mundo , a immortalizaraô as fuás acções para as memo- rias delle. Tt Ncf- Annaes Hiíloricos j$6 Neíte mefmo tempo tinha já chegado à Cida* de de S. Luiz do Maranhão Pedro Maciel com a feliz nova de fe achar reílaurada a liberdade Portugueza pe- lo feu heróico redemptor o SerenilTimo D. Joaõ , V1IL Duque de Bragança ; e fem outra alguma difficuldade , que a que naturalmente produzia no exceflb do conten* tamento a confuíaõ dos alvoroços , o jurarão no meyo delles por feu legitimo Monarca todos os Eílados da- quella Republica , com a affiftencia do Governador Bento Maciel , confirmado já neííe minifterio pelo mef- mo Senhor. j$j Era Portuguez Bento Maciel , e querendo moílrar a fidelidade da Naçaõ com os teftemunhos mais verdadeiros , communicou logo efta mefma noticia ao Pará pela feguinte Carta , efcrita ao feu Capitão mor Francifco Cordovil , que me pareceo aqui trasladar , para fazermos fobre ella as merecidas reflexões. y$8 „ Foy NoíTo Senhor fervido darnos Rey Por- „ tuguez, o qual he D. Joaõ IV. , Duque que até ago- „rafoy de Bragança; eílá jurado, e obedecido geral- „ mente em todo o Reino de Portugal , e fuás Ilhas , „ fem cuftar fangue , nem morte , mais que a de Miguel de Vafconcellos : foy huma refoluçaõ milagrofa ; „ guardeno-lo Deos muitos annos. Veyo com eíle avi- „ fo , e ordens meu fobrinho Pedro Maciel defpachado „ para fervir o governo deíTa Capitania : aqui o accla- >, mamos por Rey na Camera , onde fuy com os Offi- „ ciaes Reaes , e mais peflbas Nobres , e Prelados das „ Ordens ; e fizemos o negocio com juramento , pelo „ eftylo que fe fez em Cabo- Verde , de que vay copia „ para VoíTas Mercês lá feguirem o mefmo : temos fei- i, to muitas feitas ; VoíTas Mercês aífim lá o devem fa- >, zer , porque foy obra milagrofa , como VoíTas Mer- , cês faberáõ de meu fobrinho quando lá for; e o ter- e. papeis , que fe hao de fazer para hirem a Sua >i Ma- do Ejlaão do Maranhão , Liv. XI. ? 3 1 „ Mageítade ■, haõ de fer pelo eílylo , de que vay a co Anno 1641. „ pia authentica , mudando a fubftancia da terra , e „ nomes das pefíbas , &c. 759 No dia 1 5 do mez de Junho recebeo eíla fuc- cinta Carta o Capitão mor Francifco Cordovil ; e levan do-a logo ao Senado da Camera, já feguido do povo. naõ fó foy acclamado a publicas vozes por feu legitimo Soberano o Senhor Rey D.Joaõ IV. , mas também fê efmeraraõ com hum tal empenho todos aquelles mora- dores , verdadeiramente Portuguezes- , nas demonílra- ções dos alvoroços , que no cabedal , que difpenderaõ nellas , até chegarão a exceder a fua meíhia poííibilida- de. & 760 Sem outras armas , que as da fua juftiça , que femprefaõ as mais poderofas nos exércitos invencíveis: daCeleílial Omnipotência, fe vio folemnemente obe- decido por Rey natural em todas as partes do Mundo (que a tanto fe extendem os vaftos Dominios Portugue- zes ) efte heróico Principe : agora difcorraõ , com re- flexões defapaixonadas , os mais efcrupulofos Contem- plativos , fe foy , ou naõ das mãos de Deos efta grande obra 2 * 761 Bem conheço, que o ódio lhe quererá ainda negar a natureza , em quanto ao Continente de Portu- gal , fuppondo-o arraftrado do primeiro impulfo da com- moçaõ dos ânimos, fuggerida , e capitaneada da prin- cipal Nobreza da Corte de Lisboa, injuriada já no fof- frimento dopezado jugo Caftelhano. Mas qual foy a Nobreza, ou quaes foraõ as Tropas , que reduzirão à mefma fugeiçaô as Conquiílas de Africa ? As remotas da America , e da Afia ? Mais que humas Cartas or- dinárias , como a que efcreveo na diílancia de cento e feíTenta léguas ao Capitão mor do Graô Pará o Gover- nador Bento Maciel ? Achando taõ pouco duvidofa a obediência daquelles moradores , que fem tratar de lha Tt ii per- I Annaes • Hifioricos perfuadir, nem com hum avifo feparado ao Senado da Camera ( como era obrigado em hum negocio de tan- to pezo ) cuidou ío de recommendar as formalidades daquelle a&o já como feguro , e os feílejos delle ? Ora confundaõ-fe para fempre os corações mais endurecidos na obftinaçaõ barbara de huma paixão taõ cega. 762 PaíTados poucos dias chegou ordem de Bento Maciel à mefma Cidade de Belém para os aviíbs de Por- tugal, e com effeito fe expedirão em 6 de Julho por dous navios , que fe achavaÕ furtos naquelle rio , de que eraõ Capitães Francifco de Oliveira , e Duarte de Leaõ, fegurando o Governador ao feu novo Príncipe o fummo goílo , com que lhe obedecia todo aquelle E£ tado, por celebrar juftiíHmamente na reftituiçaõ da Mo- narquia a redempçaô do feu cativeiro •• mas eílas verda- deiras proteílações repetirão também nas fuás Cartas , com exprefsões mais vivas , os Senados das Cameras j porque fofírendo mal as aíperezas de Bento Maciel , ef- peravaô melhorar de fortuna na moderação do feu pro- cedimento, ou na fua breve fucceífaõ a clamores dos povos. 763 Com a noticia da noffa gloriofa feparaçaõ re- cebeo também ordem o mefmo General para naõ tratar como a inimigos mais que fó a Mouros , e Caftelhanos 5 e fem advertirem as fuás reflexões , que o cuidado da confervaçaõ própria naÕ neceííitava de recommendaçaõ efpecial , por preferir a tudo nas attenções de quem go- verna, foy tam indefculpavel o feu defacordo, por lhe naõ dar outro nome mais feyo , que naÕ baftou para def- pertallo aefcrupulofa viíinhança das Armas Hollande- zas , quando via bem , que continuavaÕ no injufto do- mínio das Conquiílas de Portugal , tendo já ceifado to- dos os feus pretextos com a reftituiçaõ defta Coroa ao feu legitimo Soberano; mas antes chegando em huma embarcação da Ilha de S. Miguel hum Inglez , que fe chama- do Eftado do Maranhão chamava Thomás Guilherme com os certos avifos , de Anno 1641. que a tyrannia das mefmas Armas fe difpunha já para a invafaõ daquelle Eftado , naÕ ferviraÕ eftes mais que para o defprezo , de que fazia ainda huma grande van? gloria jj arrogando -lhe o efpecioíò titulo de conftancia de animo. 764 Para defculpar huma frouxidão , que paíTava já a infenfibilidade , também injuriava todas eílas noti- cias de menos verdadeiras ; e ainda que a primeira con- firmação delias naò tardou muitos dias , por alguns ín- dios das vifinhanças do Periá , que lhe feguraraõ 7 que hum copiofo numero de embarcações vinha demandan- do aquella barra , a que fe feguio no de 22 do mez de Novembro a certa informação , de que ficavaõ já an- coradas na enfeada de AraíTagy , diftante quatro léguas da mefma Cidade , taõ pouco fe alterou com eíle def- engano , que mandando-as logo reconhecer pelo Capi taõ Francifco Coelho de Carvalho a bordo de huma lan- cha , por mais que teve o ultimo , de que eraõ dezoito, e todas Hollandezas , ficou taõ focegado , quebufcan* do ellas a entrada da bahia , na manhã do dia 25 as fez falvar, como fe foíTem muito amigas -, até que vendo, que fem amainar , nem refponder a hiaõ occupando , lhes difparou entaÕ toda a artilharia da Fortaleza carre- gada de bala^ mas fem fazer com tudo no feu animo outra alguma impreílaõ taõ forte accidente , mais que fó para Ofufto. 765 Pouco foy o damno, que receberão osHol- landezes defta defcarga 5 mas querendo tomar fatisfaçaõ delle, flzeraõ huma de todas as fuás embarcações 5 e para fe falvarem do mayor perigo , que lhes ameaçava a repetição do primeiro fogo , embocaraõ debaixo do feu o rio chamado da Bacanga , que divide a Ilha da terra firme pela banda de Leíle , na diftancia de tiro de canhão j até que dando fundo defronte da Ermida de NoíTa Atinaes Hifioricos :• Noíla Senhora do Defterro, difpozjoaõ Cornelles, feu Commandante General , hum prompto defembarque de mil homens , ficando-lhe ainda outros tantos a bordo pa? ra poder fuftentallo quando lhe foíTe neceflario ; porém como por aquella parte naõ havia defenfas , fem a me- nor oppofiçaõ fe poftaraõ em terra. j66 Na6 fahiria a efte Hollandez taõ venturofo o feu arrojamento , fe encontraífe valor , que lho difpu- taífe ; mas como aos moradores da Cidade , entorpeci- dos com o vil ócio , em que os criava a frouxidão do feu Governador , lhes faltou o acordo para melhor fe- gurarem nas forças dos braços a confervaçaõ das fuás famílias , tratando fó de fe falvar com ellas no refugio dos matos , até abandonarão abfolutamente nos próprios domicílios todos os outros intereíTes > que as mais das vezes coftumaÕ levar o primeiro cuidado na cegueira dos homens ; e Bento Maciel encerrado também na For- taleza com coufa de cento e cincoenta , ( que na mayor parte deímereciaô efte nome ) aecrefcentou tanto nos defmayos do animo a refoluçaÕ dos inimigos , que apro- veitando-fe de hum accidente taõ favorável , fe move- rão logo fobre elle. j6j Deu então efte General alguns indicios de vi- vente , mandando dizer a Joaõ Cornelles , que aquel- la Ilha era de EIRey de Portugal , que tinha os feus Em- baixadores na Corte de Hollanda , e que na tyrannia de huma tal invafaõ f fazia abominável a todo o Mundo o procedimento das fuás Armas. A que refpondeo elle , íuípendendo a marcha : „ Que violentado de hum tem- „ poral havia bufcado aquella bahia ; porque fabia bem, „ que a fua Republica fe achava unida aos intereíTes da „ Monarquia Portugueza 5 e que fe fizera o defembar- „ que de alguma parte das fuás Tropas , em forma de „ guerra , fora provocado da oppofiçaõ de tanta artilha- „riaj mas que vendo-fe ambos, fe trataria amigável- „ mente do Eflado do Maranhão , Liv. XI. 3 3 5 „ mente das conveniências de huma , e outra Naçaõ. Anno 768 Aceitou o partido Bento Maciel, mais con- vencido dos argumentos do feu íufto , que das razões frivoias de huma tal propoíla 5 e fem advertir , que con- fentia já na Tua injuria , quando largava a Fortaleza , fa- bio delia para bufear a Joaõ Cornelles ; mas eíle Com- mandante , que conheceo bem a confternaçaõ , em que o tinha poílo , depois de lhe perfuadir com aííe&adas ponderações , que pelas ordens , que levava do Conde de Nazau , General das Armas de Parnambuco , naõ podia já apartarfe daquella Ilha , fem a reíbluçaõ dos Eftados Geraes , que também dependia da de Portugal; aíTentou com elle , que continuaíTe no feu Governo até a repofta dos avtfos da Europa j e que para quartel dos Hollandezes , nomearia logo alguma parte da Cidade , onde fe lhes forneceriaõ todos os mantimentos neceíTa- rios , que pagariaõ pelos preços da terra com a devida pontualidade. 769 Bem fe deixava conhecer do procedimento de Joaõ Cornelles , que eraõ cavilofos , por todos os prin- cípios i os apparatos defta pratica ;< mas Bento Maciel , que fem attençaõ a fua honra tratava fó de fe fegurar dos perigos da vida com a vaidade do governo j também como caminho para a confervaçaõ das fuás riquezas, fe moítrou muito fatisfeito da negociação 3 e expedindo logo em virtude delia todas as ordens , que lhe parece- rão neceíTarias , fe recolheo à Fortaleza. 770 Os Hollandezes , que fe achavaõ já todos em terra , na ordem de batalha , desfilarão logo ; mas incul- cando neíle primeiro movimento , que fó queriaõ oceu- par o alojamento , que fe lhes tinha deílinado , publica- rão bem a falfidade do feu animo com os infultos , que hiaõ repetindo no breve caminho da fua mefma marcha; e intentando impedilla já na entrada da Cidade o Capi- tão Paulo Soares do Avellar , que guarnecia huma das por- Annaes Hifloricos portas , nao pode rebater a ília conílancia a força do ataque. 771 A efte tempo tinhaõ já comettido aquelles He- reges o facrilegio bárbaro de defpedaçar a Imagem de N. Senhora do Deílerro , Orago da Ermida do mefmo íitio do feu defembarque , e adiante delle a do glorio- íiífímo Santo António , depois de roubarem , com im- piedade pouco diíTemelhante , a exemplar pobreza dos feus Religiofos $ e já defaíTombrados da oppofiçaõ , que ainda receavaõ , como bem merecida/ deraÕ então os teftemnnhos últimos da fua aleivoíia , faqueando o povo : acções , que certamente lhes cuílariaõ o feu juf- to caftigo , fe naõ foíTe mayor a coníternaçaõ do Go- vernador , que a tyrannia delias : como defordens mili- tares as defculpou o feu Commandante , para melhor fa- cilitar todas as medidas do feu projecto j e recebeo ef- ta mal rebuçada fatisfaçaõ Bento Maciel como grande lifonja ; que a tal eílado o tinha reduzido, o fatal acci- dente do feu defacordo , ou da fua ambição. 772 Em quanto JoaÕ Cornelles metia as fuás Tro- pas , defmandadas no roubo , na boa ordem da difcipli- na ? os Officiaes da Fortaleza perfuadiaõ o Governador, a que fe difpozeífe para a defenfa 5 porque os Hollande- zes o bufcariaõ logo , fendo o mais empenhado neílas inftancias , taõ cheyas de valor , como de fciencia mili- tar , o Capitão Francifco Coelho de Carvalho , Gover- nador depois do mefmo Eílado do Maranhão j mas Ben- to Maciel , que fe tinha deixado dominar abfolutamen- te dos defmayos do animo , fó attendia já ao facriflcio da fua honra. 773 Ainda com tudo lha intentou falvar nos últi- mos alentos hum Artilheiro , que fe chamava Mathias Joaõ j porque depois de cobrir de rama mais de trinta peças de canhaõ , carregadas de bala miúda , ( que fe achavaõ fora da Fortaleza em hum fitio , que fica fobre o mar ) âo Eâado do Maranhão \ Liv. XL 5 3 7 o mar) as aíTeílou à Praça de Armas, para que ao mef- Atino 1641 mo tempo , que a occupaíTem os Hollandezes , entre as acclamações da fua aleivofia, experimentaíTem hum fa- tal eítrago , como jufto caftigo ; e para fazello mais fan- guinolento com huma fahida vigorofa , communicou eíta taõ militar, como generofa difpofiçao a Bento Ma- ciel j porém quando devia agradecella com as demonf- traçÕes que merecia, tratou fó deculpalla, embaraçan- do por todos os caminhos a pratica delia , para que naõ houve ííe circunftancia , que naõ concorre íTe para a fua injuria. 774 A eíle tempo , formadas já todas as Tropas ini- migas , bufcou JoaÕ Cornelles a Fortaleza como fegu- 10 da vitoria ; e Bento Maciel para authorizar no con- ceito do Mundo eílas fuás foberbas prefumpçoes, re- cebendo-o com as portas abertas , lhe entregou as cha- ves : abateo elle logo todas as bandeiras Portuguezas , e arvorou as de Hollanda ; e depois de trataílo como vil prizioneiro , relaxou de novo a Cidade à ambiça6 barbara dos feus Soldados , que difcorrendo livremente por ella , fizeraô ainda mais abominável eíla tyrannia na repetição dos facrilegios ; mas o mayor de todos fou- be bem evitar o ardente zelo do Padre Meílre Fr. Luiz de Miranda , Prior actual do Convento de NoíTa Se- nhora do Monte do Carmo ; porque advertido , de que o Pároco da Igreja Matriz , attendendo mais à feguran- ça dafuapeííòa, que às indifpenfaveis obrigações do feu minifterio , deixara no Sacrário algumas Formas confagradas , as foy confumir todas , atropellando nef- te taõ catholico arrojamento os perigos da vida , para mais claro teftemunho das virtudes da alma , que palia- do algum tempo o conduzirão em Portugal aos primei- ros cargos da lua fagrada Religião. 775 O Iaftimofo eftrago da Povoação de S. Luiz extinguio a matéria , por aquella parte , para a ambição Uu dos 3 5 8 Annaes. Hifloricos taurcido , tom i. liv. 5. pag 3°1- Anno 1641. dos Hollandezes ; mas paíTando logo às fazendas do campo, que fe achavaõ defamparadas , também tom a* raõ poííe delias : porém Joaó Cornelles como fe via já abfoluto fenhor de toda a Ilha , querendo inculcar hum procedimento menos inhumano com aterra firme do Itapicurú, onde viviaõ alguns moradores ■, occupados na útil cultura de cinco engenhos de fazer aíTucar , fe- gurou melhor os feus intereífes na contribuição de cin* co mil arrobas , e naÕ féis mil caixas ; ( como efcreve Portugal Ref- o Conde da Ericeira , fem duvida que equivocadamen- te ) porque porção taÕ grande naõ podia caber no pe-? queno numero das me fmas fabricas , ainda que foíTem todas de agua , ( a que chamaõ reaes ) o que nenhuma era. 776 Quando os Hollandezes entrarão na Ilha do Maranhão , tinha paíTado delia para a terra firme de Ta* puytapera Pedro Maciel Parente , fobrinho do Gover- nador Bento Maciel , nomeado depois da Acclamaçaô ( como já fica referido ) Capitão mor da Capitania do Pará, aonde caminhava para o exercido do feu empre- go j mas achando-fe ainda naquelle fitio, que fegurava bem a fua jornada, (aífiílido de trinta Companheiros , e trezentos índios , com muitas fazendas de particula- res , que fe conduziaÔ por negociação para a Cidade de Belém à fua mefma ordem ) lhe chegou a noticia defta invafaõ com a do rendimento de feu tio : e perfuadido de hum exemplo taõ feyo , tornou a tranfportarfe a mef- ma Ilha , para fe entregar voluntariamente nas mãos dos inimigos com todo aquelle cabedal , e a mayor parte da fua gente , que quiz imitallo 5 o que executou fem ver- gonha do Mundo , accrefcentando muito a fua infâmia na circunílancia de tamanha perda , a que também fe feguio logo a da Povoação , e Capitania de Tapuyta- pera. •jjj Depois deite fucceíTo os moradores da Cidade, que do EJlado do Maranhão , Liv. XI. 339 que fe tinhaõ metido no CertaÕ , também fe refolveraõ Anno 1641» a povoar de novo os feus domicílios ; mas obrigados já da neceííidade , e naó dos ameaços , nem das promeíTas de Joaõ Cornelles , que continuando nas tyrannias, lhc$ fez jurar obediência aos Eílados de Hollanda. i 778 Reedificou logo o meímo Commandante , corri muito mayor capacidade , hum pequeno Forte arruina- do , chamado do Calvário , que achou na boca do rio Icapicurú fem defenfa alguma j e depois de bem guar* necido, fe adiantou mais na utilidade dos engenhos de aíTucar , confervando fó nelles para feitorizallos os feus mefmos fenhores com boas Efquadras de Soldados. 779 Conhecia bem eíte Hollandez a injuíliça das fuás Armas na occupaçaõ daquella Ilha 5 e pela mefma caufa , haõ focegando ainda nafegurança delia , meteo em hum navio quaíi defmantelado cento e cincoenta peíToas , das que fe lhe faziaõ mais efcrupulofás ; mas accumulando novas circunftancias à fua tyrannia, na barbaridade deíle procedimento , a procurou diffimular çom a liberdade da derrota , que encaminharão logo os deíterrados navegantes à Ilha da Madeira 5 porém naõ podendo vencer huma agua aberta , que os levava api- que , arribarão à Ilha de S. ChriítovaÕ , Povoação de Inglezes , e Francezes , nas índias Caftelhanas , que to- marão com boa fortuna ; e depois de huma generofiffi- ma hofpedagem , paífaraõ a Lisboa. 780 Ao mefmo tempo tinha já difpofta Joaõ Cor- nelles a confervaçaô do Maranhão com a fobrada força de feifcentos homens , e quatro navios à ordem de hum bom Governador , que fe chamava Pedro com a anto- nomafia do Politico ; e com o reíto da fua Armada, fa- zendo-fe à vela para Parnambuco em 5 1 de Dezembro > levou também, em lugar de créditos , as may ores inju- rias para os apparatos daquelle vil triunfo da fua perfídia na peífoa do Governador Bento Maciel ? que o Conde Uuii de Annaes Hifloricos de Nazau tratou com ó defprezo , que merecia j por- que o mandou logo para a Fortaleza do Rio grande , on- de morreo dentro de poucos dias ,.. deixando laftimofa- mente amortalhadas todas as memorias da fua antiga fa- ma nas ultimas acções da fua vida , que acabou na ida- de avançada de fetenta e cinco annos. 78 1 Tinha elle occupado todos os empregos Mili- tares até o de Capitão mor do Graô Pará com taõ hon- rofa diílinçaõ , que fe inculcava digno de outros mayo- res j mas como aquelle ,- na inerravel diílribuiçaõ da re- da juftiça , parece que era o ultimo para a mediania da fua esfera , paflando depois ao de Governador de todo hum Eftado , foy para ella taõ defmedido , que naõ po- dia enchello.. 782 Cuidaõ os Príncipes , com huma politica as mais das vezes muito perigofa , que nas monílruofas exaltações perfuadem melhor o cara&er da fua fobera- nia ; e fem advertirem , que nefta mefma deíígualdade arrifcaõ já evidentemente o acerto da efcolha , até con- demnaõ nella os intereíTes próprios comprehendidos nos públicos. 783 Eu naõ digo, que o merecimento íè deixe fem premio ; porque bem conheço , que he degráo feguro para fe fubir às mais altas virtudes : porém fó deve pra- ticarfe na proporção diftributiva , que refpeita com to- da a exacçaõ as qualidades do premiado 5 pois fendo mayor a remuneração , do que todas ellas , tratando-a quaíl fempre como eílranha , naõ ha caminho , que naõ bufque para fuftentalla , temendo mais a fua perda , que a da gloria do nome j e fenaõ vejamos a Bento Maciel , que moílrando-fe fuperior a todos os perigos , nos me- dianos empregos , quando fe via já no mais elevado , íe fuíFocou de forte , fó dos primeiros ameaços das Armas Hollandezas , que faltandolhe de todo o valor para lhes fazer oppofiçaõ , ainda nas ventagens de huma Fortale- za, do EJlado do Maranhão \ Liv. XI. ? 4| za , que havia fiado a generofidade do feu Príncipe das Anno obrigações da ília honra , a facriíicou voluntariamente nas mãos de Joaõ Cornelles com as ambiciofas efperan- çás de fe confervar por hum modo taõ injuriofo nffim nos intereíTes , como na vangloria do governo , quando nos últimos esforços da conftancia do animo muito melhor fegurava hum a., e outra fortuna , o que naturalmente íuccederia ; fe à grandeza da occupaçaõ refpondeíTenr bem os predicados da peííba ; porque aííiítida ella das influencias dofeumefmo efpirito, íe naõ triunfa íTe do poder inimigo por falta de forças , naõ fe deixaria ven- cer delle , efcolhendo antes entre a difputa da vitoria a mais illuílre fepultura no templo da Fama. 784 Tenho chegado com as noticias da Capitania do Maranhão até o fim do prefente anno j e para feguií a ordem dos tempos com a devida formalidade , efcreve- rey também as poucas , que pertencem à do Graõ Pará; j2<> Em 16 do mez de Dezembro entrou na Cida- de de Belém hum morador da de S. Luiz com a triíle no- va da fua invafaõ ; e no feguinte dia a confirmarão oito Soldados , dos que fe achavaõ em Tapuytapera com o Capitão mor Pedro Maciel , quando tomou a vil refo- luçaõ de fe ir entregar nas mãos dos Hollandezes ; ex* emplo , que elles valerofamente defprezaraõ para mayor injuria do mefmo Commandante. 786 Com o primeiro avifo deu as providencias mais neceíTarias, para a defenfa da Capitania, o feu Capitão mor Francifco Cordovil , fazendo-o também para o foc- corro delia aos Capitães mores do Cabo do Norte , e Camutá Joaõ Velho do Valle , e Cypriano Maciel Ara- nha , fucceflbr já de Aires de Soufa Chichorro 5 mas como asfegundas informações também certifícavaõ o bárbaro proje&o dos mefmos inimigos para a occupa- çaõ de todo oEftado, esforçou muito Francifco Cor- dovil as diligencias do feu zelo , deíTenhando logo va^ rias jfànàes HiHoricos ' rias fortificações , que promptamente tiveraõ principio; e crefceraÕ fem tempo. . 787 Entre tantos apreftos militares fuccedeo no Armo 1642. Pará o anno de 1642 5 mas o Capitão mór do Cabo do Norte João Velho do Valle para moftrar melhor, que era irmão legitimo de Pedro Maciel , e íbbrinhos am- bos do Governador, podendo foccorrer a Capitania em pouco mais de quinze dias , gaftou dous mezes na jor- nada até a Cidade de Belém , onde entrou com oitenta Soldados , divididos em duas Companhias , que gover- navao o Sargento mór Pedro BayaÕ de Abreu , e o Ca-< pitão Pedro da Cofta Favella , e quinhentos índios man* dados pelos Cabos das fuás IS ações : mayor era a força, que lhe obedecia ,. porque fe compunha de cento e cin- coenta homens , pagos todos pela Vedoria do mefaio Pará , e grande numero de índios guerreiros ; porém elle , que cuidava menos no ferviço do Príncipe , e uti-í lidade publica , que nos feus próprios intereíTes , tratou primeiro de os fegurar nas largas affiftencias de imporá tantes lavouras de tabacos. 788 Logo que tomou porto na Cidade de KoíTa Se- nhora de Belém , fe aquartelou no Convento de Santo António ; naquelle tempo feparado delia , no fitio cha- mado da Campina ,: hoje já povoado ; e mandando dar parte da fua chegada ao Capitão mór, e Senado da Ca- mera , lhes declarou também , com grande arrogância , que fe naõ forneceíTem as fuás Tropas os mantimentos neceíTarios , depois de obedecerlhe como a Comman-f dante General da guerra , ( de que fe nomeava Superin- tendente por huma Provifaó de Bento Maciel ) fe retira- va na meíma hora para a fua Capitania. 789 , Refpondeo o Senado , que aprefentando nelle a fua Provifaõ , fe attenderia como foíTe juílo , e que na aífifténcia dos mantimentos fe lhe na5 orTerecia o me- nor reparo - ? mas que como o povo fentia falta delles , con- do EJlado do Maranhão , Liv. XI. 44 5 convinha muito mais , que toda a fua gente fe alojafle Anno 1641. com os moradores 5 porque fuftentando-fe do que co- mia cada hum na fua mefma cafa [ ficava a todos muito mais fácil, e fuave aquella defpeza , ainda que foíTe muito mayor o feu difcommodo , a que goftofamente fe facrificavaÕ pela defenfa da fua Pátria , taõ empenhados no natural amor « como no ferviço do feu Príncipe ; po- rém Joaó Velho j que pretendia fó quartel feparado pa- ra melhor fegurar na injuftiça da força a obediência , que demandava , conhecendo bem , que por efte caminho f& lhe rompiao as fuás medidas ,' tomou outras de novo; e para praticallas com menos embaraços , aproveitan- do-fe do filencio da noite , paliou ao fitio de Una , pou- co diftante -da Cidade , fem que podeíTem impedillo al- gumas peças de artilharia , que fendo fentido fe lhe dif- pararaÕ da Fortaleza. 790 No feguinte dia , depois de querer juítificar a fua retirada com vários pretextos afFedados , repetio então a primeira propoíla com dobrada foberba 5 mas refpondendo-lhe pelo mefmo modo o Senado da Came- ra , no que tocava a mantimentos , em quanto à Provi- faõ de Superintendente , lhe declarou logo , que como fé naõ achava regiílrada naquelle Tribunal , naõ podia cumprilla , conforme outra do primeiro Governador do Eftado Francifco Coelho de Carvalho ,, confirmada pe- lo mefmo feu tio Bento Maciel Parente. . 791 Pagados poucos dias chegou da Cidade de S. JLuíz , durando ainda as mefmas difputas , o Alferes Manoel Cordeiro Jardim com a noticia, de que os Hol- landezes naõ fó tinhaõ entrado até à Villa do Gurupy , mas que também para a Conquifta da Capitania do Pa- rá efperavaõ de Parnambuco todos os inftantes huma toa Armada \ e atemorifados deftes avifos aquejles mo- radores , os communicaraõ fem dilação a JoaÕ Velho do Valle , que fe confervava no fitio de Una , fazen- dolhe Annaes Hifloricos dolhe novas inílancias , para que fe uniífe com toda a fua gente para a defenfa daquella Praça , já com os pre- textos de que refponderia pela fua perda , quando lhe fakaíTe com os promptos foccorros , de que precifamen- te neceíiitava para a oppoflçao de huns inimigos taõ po- derofos ; porém eJIe, que attendendo fó à deíbrdenada paixão do animo do grande aperto , que fe lhe propu-r nha , queria ainda fazer trocedor para a fuperioridade , que pretendia no governo das Armas , tornou a refpon- der no mefmo fentido. 792 Ultimamente lhe offereceraõ quartel para as fuás Tropas , e mantimentos para ellas , huma fó légua da Povoação ; em fitio accommodado para a prefente conjuntura $ mas em lugar de fe fatisfazer , fe moftrou taõ queixofo , de que ainda fe lhe duvidaíTe a obediên- cia , que demandava , que rompendo em hum milhão de defcompoíluras , cheyas de foberba , encaminhadas todas aos Officiaes do Senado da Camera , fe recolheo à fua Capitania do Cabo do Norte , inculcando bem , no total defprezo da confervaçaÕ daquella Conquiíla , que bufcava mais a femrazaõ de fugeitalla , que a obri- gação de defendella. 793 O Capitão mor Francifco Cordovil , feguindo neíla parte huma politica neutralidade , tinha deixado todas as contendas por conta do Senado 5 mas ao mef- mo tempo fe difpunha Valerofamente para a oppofiçaõ das Armas HoJJandezas ; e já abandonado de João Ve- lho do Valle, quando crefcia o rifco na relação das fuás forças, fe animava mais para a difputa delias , naÔ ha- vendo também morador, que fe naõ offereceífe a acom- panhallo até os últimos alentos da vida. 794 Com tudo fem outra novidade , mais que a das prevenções para a defenfa da Capitania , tinha já chega- do Francifco Cordovil ao mez de Julho , quando no dia 19 montou aquella barra hum navio Hollandez, de que era do EJlado do Maranhão , Liv. XI. 3 4 J era Capitão Jaques Vandiquier ; e propondo-Ihe eíle ; Anno 1642. que hia da Ilha de S. Chriftovaõ fó com os defejos de fervir a EIRey de Portugal , lhe refpondeo logo , que prefentando os feus paífaportes, poderia entrar com to- da a fegurança no rio da Cidade ; porém elle , que leva- va a feu bordo o Capitão mor Pedro Maciel , a diligen- cias fuás fe retirou mais delia , dando fundo no íltio cha- mado do Mofqueiro , que fica na diftancia de féis léguas do mefmo rio. 79$ Pedro Maciel era hum dos que Joaõ Cornel- les, Commandante das Armas Hollandezas, na invafaõ da Capitania do Maranhão , tinha lançado daquella Ilha em hum navio mal aparelhado , merecido caftigo do fa- tal defacordo, com que bufcou a fua fugeiçao , paífan- do-fe a ella voluntariamente da Povoação de Tapuyta- pera, como já fica referido ; e levava agora na fua com- panhia quarenta Soldados Portuguezes , dos que tam- bém experimentarão a mefma fortuna na tyrannia da- quelles Hereges : porém elle como fabia bem , que pa- ra os moradores do Pará era defagradavel a fua peífoa , por mais que os achava neceffitados deíle foccorro , nao fe atrevia ainda a entrar na Cidade , fem que primeiro lhes tentaífe os ânimos. 796 Entendia elle , que eíle arrebatado movimen- to , fazendo declarar a inclinação do povo ordinário , em que fe fuppunha com baílante partido , por conta já de intereífes futuros , concorreria muito para a felicida- de do proje&o 5 mas difcorrendo logo melhor a fegura- va na fua mefma força , tomou a nova refoluçaõ de fe aviíinhar mais, o que fez no dia feguinte ; e pondo-fe em franquia , na diftancia de huma pequena légua , man- dou preíèntar a fua Patente no Senado da Camera pelo Capitão Bento Rodrigues de Oliveira , com huma Car- ta para os Miniftros do mefmo Senado , em que lhes de- mandava a obediência da Capitania , com exprefsões taõ Xx cheyas Annaes Hiíloricos Anno 1642. cheyas de foberba, que ferviraÕ fó de foprar o fogo da fua repugnância : com tudo para de alguma forte ficar difíimulada , ainda refponderaò , que apparecendo na- quelle Tribunal ? como era coílume , fe lhe deferiria co- mo fe julgaíTe por mais conveniente. J9j Défembarcou entaõ Pedro Maciel , deixando o navio no mefmo lugar , em que fe achava ; e com a fe empenhou de forte na jorna- da , que affiftido já de vinte canoas com a guarnição de feíTenta Soldados , e avultado numero de índios guer- reiros , entrou no quartel da Ilha do Sol em pouco mais de quinze dias , ainda que fe achava na mefma diftan- cia , de que gaitou o tempo de dous mezes para o foc- corro daquelles moradores , que bufcava agora como inimigos , quando fó o eraõ jiiítiíTimarnente dos feus defabrimentos , e dos de feu irmaõ Pedro Maciel. 800 Entaõ mais cuidadofo o Senado daCamera, reque- do EJlado do Maranhão ,Liv.XI. 547 requereo de novo a Pedro Maciel , que fe recolhe /Te à Anno 1642^ defcenfa da Praça ; também protefíando-lhe , que com a divifaõ , em que fe tinha pofto, arrifcava mais a con- fervaçaõ delia , na perigofa deferçaõ de todos os Ta- puyas , que andavaõ já muito alterados pelo mefmo mo- tivo ; porém elle , que tratava fó da íua vingança par- ticular , abfolutamente defprezando a utilidade publi- ca , refpondeo a tudo com os ameaços mais efcandalo- fos j e paíTou a tanto a fua demaíla , que refolvendo-fe Jaques Vattdiquier a navegar o feu navio para Lisboa , mandou dizer ao mefmo Tribunal , que naõ queria, que efcreveíTe por elle j porque feriaõ todas as fuás Cartas menos verdadeiras : o que com efFeito confeguiria , fe o Hollandez , que abominava já a fua foberba , fe naõ oíFereceíTe com diffimulaçaõ para conduzillas. Soi A eílas , e outras vexações femelhantes , fe feguirao também as do mefmo Paiz , que nao podendo já lavrar mantimentos, opprimido delias , ameaçava ain- da o Senado da Camera , que fe acafo lhe naõ afTiftiíTe com os que lhe foíTem neceflarios para a fubíiftencia das fuás Tropas , os tomaria donde os achaíTe fó pelo feu arbítrio. 1 802 Bem defejava opporfe a temeridade deíles pro- cedimentos o Capitão mor Francifco Cordovil 5 porém além das fuás poucas forças , também fe fuggeria de es- treitas razoes de parentefco : e continuando na fua pri- meira neutralidade , como politica muito mais fegura , tratava fó da confervaçaÓ da Capitania , fem mais guar- nição , que a de oitenta homens mal armados 5 até que confumido das fuás mefmas afflicçoes , lhes deu fim com a vida em 1 5 de Setembro, depois de nomear na íucceí- fàÔ daquelle Governo o Senado da Camera ; acçaó fem duvida , em que deixou todas as fuás bem canonizadas ; pois foube moftrar nella , que attendia mais aos interef- (es públicos no focego dos povos , que às particulares Xx ii re- - ' Annaes Hifioricos Armo 1642. recommendações da natureza , fendo commummente as mais poderofas. 80,5 Tomou o Senado o governo da Capitania, e como fuccedia no zelofo cuidado do feu defunto Com* mandante, procurou imitallo , naÕ perdoando a provi- dencia alguma , que podefle melhor fegurar a conferva- çaõ delia j porém os dous irmãos, a quem o refpeito do parente de alguma forte: reprimia , defprezando já com a fua morte, as attenções devidas ao focego publico , o arrifcavaõ mais todos os inítantes na repetição das info- lencias ; mas também permittia a Divina Juftiça , que bufcando-as fempre como trocedor para a reducçaõ da- quelles moradores , ferviaõ fomente de obftinallos. 804 Na perigofa fituaçaõ , que fica referida , fe achava a Capitania de Belém do Pará , quando alguns moradores da de S. Luiz do Maranhão , afpirando ge- nerofamente à immortálidade da memoria , reprefenta- raò no honrofo theatro da heroicidade huma das mayo- res acções , que eftampou o Mundo nos annaes da fa- ma. Bem neceffitava eu agora, para defcrever a for- mofura delia , da eloquência de hum Cicero j porém todos aquelles , que com jufta razaõ fe enfaftiarem dos defconcertos do meu eftylo , poderáõ muito facilmente Portugal Rej- faborear ogofto no elegantiífimo Portugal Kejlaurado , taurado , tom. ^ ue com deleitavalabbreviatura relata também alguma pag. '370 , e parte deitas mefmas noticias. 44;. 805 Gemiao laílimofamente os moradores da Capi- tania do Maranhão , debaixo do jugo crneliffimo das Armas Holiandezas ; porém como para poderem facu? dillo lhes faltavaõ forças , diffimulavaõ a fua dor com muito menos refignaçaõ , do que impaciência ; mas pro- curando fempre todos os caminhos de fuavifalla , humas vezes fe aparentavaõ com os feus mefmos inimigos pe- los eílreitos Vínculos do Matrimonio 5 e outras fe quei- xavam ao feu Commandante. das vexações , que pade- ciaõ j do EJlaâo do Maranhão , Liv. XI. 549 ciaõ , aífim nas fazendas , como nas honras j até que Anno 1645,. vendo , que todas eftas diligencias naõ ferviaõ mais que de circunstancias , que faziaõ mayor a fua deígraça, al- guns dos mais briofos , e pela mefma conta dos mais of- fendidos , que tratavaÕ já como injuriofo o fofFnmento delia , entendendo também , que os últimos extremos da defefperaçao as mais das vezes produziaÕ os meímos effeitos do valor , entrarão a difpor a fua vingança , co- mo fatisfaçaõ juítiílimamente merecida por todos os princípios 5 e conferindo-a com huma tal cautela , que naõ chegou a perceber alguma das praticas aquella fum- ma defconfiança , com que coíluma fempre fegurar ,a fua odiofa confervaçao a tyrannia da violência , fe f or r mou o projedo. 806 Naõ chegavaõ ainda ao efcaço numero de cii> coenta homens , os que primeiro unidos para a emprer za heróica da reftauraçaõ da liberdade, nomearão por Commandante delia a António Moniz Barreiros , ( e naõ Barreto , como lhe chama por equivoca çaõ o Con- Portugal fcf. de da Ericeira ) fegurando defde logo a felicidade do tamacío > tom. fucceílo no acerto da efcolha j porque além dos credi- * " ' pas * tos , que tinha grangeado no exemplar governo daquel? la mefma Capitania , como já fica referido , em outros differentes empregos, aífim politicos , como militares, havia também multiplicado os elogios do feu nome 5 e ajuíladas já todas as medidas, fe deftinou para a primei-. ra acçaõ o ultimo dia de Setembro , fendo o Capitão Paulo Soares de Avellar hum dos mais empenhados. 8 07 Para dar fem duvida os teftemunhos últimos da heroicidade do feu animo , aceitou António Moniz hu- ma occupaçaõ taÕ.cheya de perigos ; e confiderando bem , que na principal parte dos intereífes dos Hollam dezes fe devia defcarregar o primeiro golpe da fatisfa-' çaõ publica , para que lhes ficaíTe mais fenfivel , o de- terminou nos cinco engenhos do Itapicuru j porque ain- da p Annaes Hiftoricos Anno 1642. da que a guarnição daquelle rio , em que entrava tam- bém a do Forte delle , fe compunha de trezentos ho- mens, as difpoftções da fua interpreza lha reprefentavaõ menos difficultofa -, mas para melhor feguraila nas ge- nerofas influencias do feu grande efpirito , o communi- cou aos feus novos fubditos , com muito mayor a&ivi* dade ,. pelas feguintes vozes. 808 „ Ha já mais de dez mezes , (Amigos , Paren- „ tes , e Companheiros meus ) que triunfando do fatal „ defacordo do Governador Bento Maciel a perfídia „ Hollandeza , eftabeleceo o feu dominio com a força das Armas neíla Capitania de EIRey de Portugal , fem advertir, que hum tal procedimento fe fazia o .., mais abominável a todo o Mundo , por fe praticar nas: ^terras de hum Príncipe, a quem a foberania da fua „ Republica , tratava já como alliado ; mas antes in- „ culcando , como jufto titulo da fua polTe a tyrannia „ delia, nenhuma ha , que até o dia de hoje naõ tenha „ exercitado na noíTa fugeiçaõ ; pois naõ fe contentan- „ do com os ambiciofos , e cruéis eílragos da fazenda , „ fe emprega também nos da mefma honra , para que o „ fentimento nos fique inconfolavel , o que fe moftra „ bem no total defprezo dos noíTos clamores : naô ha „ caminho , que em todo eíle tempo naô hajamos buf- „ cado para vencer a fua dureza 5 porém as diligencias „ das noíTas afflicçòes fó fervem de obftinalla : confef- „ fo , que as medidas , que temos tomado para a fatis- „ façao de tantas injurias , parecem temerárias , por ex- „ cederem muito a capacidade das noíTas forças ; mas „ igualmente vejo , que faltando-nos todas com as vi* „ das , deixamos já illuftre a acçaõ na immortalidade da „ memoria : e fe a fortuna a favorecer , namorada da „ fua formofura, como fuccede as mais das vezes, e „ myfteriofamente me prognofticaraÔ os ardentes im- „ pulfos do mefmo coração 5 quaes feraõ os applaufos 7; dos ão Ejlado do Maranhão , Liv. XI. 3 5 1 „ dos noíTos nomes no theatro da Fama ? Bem conhe- Anno 1642. „ ço , que as qualidades de huma tal empreza neceífí- „ tavao de outra qualidade de Commandante $ mas já „ que a minha forte perfuadio a voíTa inclinação , po- „ deis eílar certos, que hey de faber acreditalla, quan- „ do naÔ feja nas acclamaçoes da noíTa vitoria ( porque „ eftas fó Deos coíluma repartillas como Senhor delias ) „ nos epitáfios da minha fepultura ; porém a vencer , „ Amigos valerofos , que a juíliça da caufa defempenha „ já os meus vaticínios. 809 ForaÔ taô activas as generofas influencias def- te breve diícuríb , que penetrados delias todos os ouvin- tes, defejavaõ já com impaciência o principio da acçaõ, como feguros no felice êxito 5 e como os fenhores dos cinco engenhos , que também eraÕ dos colligados , ef- tavaõ prevenidos para facilitar ainterpreza (que o feu Commandante tinha determinado no filencio da noite a huma mefma hora, querendo pareceíTe fó hum o impul- fo na pluralidade dos movimentos ) para defmentir as fentinellas dos Hollandezes na paíTagem do Forte , dif- tribuío logo todas as providencias , que julgou neceífa- rias , que fe lograrão com grande fortuna ; porque fa- vorecidos do rebuço das fombras , fe juntarão todos , por difFerentes caminhos , quafi ao mefmo tempo no lu- gar deflinado para fe receberem as ultimas ordens. 810 Com a felicidade deites primeiros paílòs , ex- aminou bem António Moniz a debilidade das fuás for- ças $ e ponderando com reflexões maduras , que na pre- meditada divifaÕ delias deixava o fucceíTo muito mais arrifcado , mudou de fyftema , mandando , que todo o Corpo unido atacaíTe o engenho de Bento Maciel Pa- rente , que adminiílrava feu irmão Vital Maciel ; ( fi- lhos naturaes ambos do Governador do primeiro nome, e appellidos ) e que deítruida aquella guarnição , como efperava do favor Divino , fe demandaíTe logo o feu en- genho Annaes Hifloricos Anno 1642. genho , que era o fegundo no regreffo do rio , aonde el- le antecipadamente fe retirava para melhor fegurar nas difpofições da mefma empreza toda a íua fortuna, para a qual também ajudaria o final de huma luz , que mof- traria o porto , no fitio mais accommodado para o def- embarque ; e depois de logrado com o deftroço daquel- les inimigos , fe regulariaõ as feguintes acções pelas me- didas dos accidentes. 811 Tinha grande credito com todos eíle Com- mandante , juftiffimamente merecido da fua muita ca- pacidade } e approvado por huma geral acclamaçaõ o novo projedo , paíTou elle logo ao feu engenho j mas como já ficava em pequena diftancia o de Bento Maciel, deílinado para o primeiro golpe , feguraraó as fuás cau- telas aquelles nobres Aventureiros y bufcando o feu por- to com a vafante da maré , tanto a remo furdo , que fem ferem fentidos o occuparaõ com felicidade perto da meya noite. 8 1 2 Era efta huma das mais efcuras , por lhe faltar na aufencia da Lua a ordinária fubftituiçao da luz do Sol , quando a dasEílrellas fe via também tap cuberta de nu- vens , que ou pareciaõ já fúnebres apparatos para as exéquias dos inimigos , ou antecipadas prevenções pa- ra deixarem mais refplandecente o vivo fogo das Armas Portuguezas j pois com o mefmo impulfo , com que to- marão porto , entrarão o quartel , atropellando as fuás fentinellas. Quizeraõ refiílirlhe os Hollandezes , entre a confufaõ do feu defacordo 5 porém deites esforços tirando fó os defenganos últimos , no eílrago das vidas, em muito menos de meya hora nao contendia já o furoi da vingança , mais que com os cadáveres ; e entaõ me- lhor armados os vitoriofos com os defpojos da batalha , bufcaraÕ a toda a diligencia o engenho de António Mo- niz na fiel obfervancia das fuás mefmas ordens. 8 1 3 Ainda de longe divifaraõ a fenha , que lhes ha vií do EJlado do Maranhão , Liv. XI. § y 3 via dado , que lhes fervio de guia ; e reveílidos de no- vos alentos , faltarão em terra , onde já acharão aquel- le famofb Commandante s porém os Hollandezes , que logo os fentiraõ , fe fizeraõ fortes dentro da mefma ca- fa 5 mas pouco lhes valeo para a fua defenfa ; porque fendo cuberta de palmeira brava , matéria bem difpofta para atear o fogo , applicando-felhe por difFerentes par- tes , fe naõ ouviao nella , em breves inftantes , mais que fó ge midos impacientes , que fe efcutavao já como ver- dadeiras acclamações de nova vitoria. 814 Inftigados com tudo da fua ultima defefpera- çao , como as paredes eraÕ de taipa , na que defcobri- rao mais enfraquecida , abrirão alguns huma pequena brecha p por onde intentarão arrebatadamente a falva- çaõ das vidas 5 mas também recebidos dos vitoriofos golpes Portuguezes,. melhorarão fó de fepultura : to- dos os mais morrerão , como Hereges , abrazados nas chammas , juftiífimo caftigo dos feus bárbaros erros. 815 Favorecido da fortuna , foube o vencedor apro- veitarfe bem das lifonjas delia , tranfportando logo as armas vitoriofas no mayor ardor da fua jufta cólera ao terceiro engenho, que fe achava defronte na outra ban- da do mefmo rio. Era pouca a diftancia , que fe inter- punha 5 e percebendo aquella guarnição o fatal eítrago dos feus Companheiros , já prevenida de valor para a ©ppofiçaõ defemelhante golpe, efperava vingallos 5 mas opprimida com igual defgraça, fervirao fó todos os feus esforços de novas circunílancias para os applaufos do triunfo. 8 1 6 Confeguio o mefmo António Moniz nos dous • engenhos , que ainda lhe reftavaÕ , fem outra differença no fucceífo , que no ultimo , que era o do Sargento mor António Teixeira de Mello , ( fegundo Commandante dos Colligados ) a diligencias da fua piedade fe conce- der quartel a alguns dos rendidos ; generofa acçaõ , que y y inten- Annaes Hiftoricos Armo 1642. intentou malograr com mais deteftavel o Cabo da ef- colta, a quem fe entregarão , dando expreíTa ordem pa- ra que fe mataíTem ; porém louvavelmente deíbbedici- da de todos os Soldados , fe accrefcentou muito a fua injuria. 8 1 7 Achava-fe já António Moniz nos últimos pe- ríodos do quarto da Alva , quando para remate de ta- manha obra lhe faltava ainda a coroa delia na empreza do Forte , que era fem duvida a mais arrifcada , por fe compor a fua guarnição de fetenta homens bem muni- ciados com oito peças de artilharia -, mas attendendo fó o feu grande efpirito aos documentos da magnanimida- de , intentou pela parte da terra efta famofa acçaõ , a que também valerofamente fe convidarão todos os Com- panheiros , adiantando a fua marcha com tanto defpre- zo dos perigos , que principiava a amanhecer , quando fe viraô junto do mefmo Forte. Si % Os batedores fízeraÕ logo prizionciro a hum Soldado , que havia ficado aquella noite fora das mura- lhas 5 e como pratico na campanha , obrigado do medo, poftou aquelle corpo na breve diftaneia de cincoenta paflbs , cuberto todo de hum grande penedo , que fe ficou chamando da Paciência ádds aquelle dia , pela que tiveraõ à fuafombra os noíTos Portuguezes , jufta- mente perplexos na refoluçaõ , que tomariaõ , já confi- derando-fe prevenidos do fuperior poder dos Hollande- zes ; até que paíTadas algumas horas da manha , ao pri- meiro toque de huma trombeta , fe abrirão as portas. 819 Sahio então huma pequena Efquadra adefco-. brir o campo ; porém os Hollandezes como naÔ tinhao recebido nem o menor avifo da fua defgraça , eftando já perto daquelle mefmo fitio , fe retirarão fem reconhe- ceDo , por tratarem efta diligencia fó como ceremonia da boa difciplina na fegurança , em que fe fuppunhao ; e com tal confiança, ou defacordo, que pondo-fe logo L na do Eflado do Maranhão, Liv. XI. na fua retaguarda os noíTos Soldados , nao fentiraõ eíle Armo 1642. movimento 5 íucceííb , que fe avaliou como milagrofo, quando também fe experimentou outro femelhante nas fentinellas da muralha y porque entrando já todos como companheiros pela porta delia , foraô os mortaes golpes os primeiros defpertadores do feu fatal letargo. . 820 -Quiz o Commandante emendar ainda a fua fortuna , ou fazella menos injuriofa na oppofíçaõ da- quella interpreza 5 porém formando corpo na Praça de Armas, como os membros , de que fe compunha efta- vaõ já entorpecidos com a fatal força de hum tal acci- dente , fe acharão fem alguma para a reíiftencia dos bra« cos inimigos : e apurando com tudo para difputarlhes a vitoria os últimos alentos , defpedaçados a feridas al- guns dos feus Soldados , todos os mais defenganaraô a fua conftancia , bufcando logo a falvaçao no mefmo precipício ; porque conduzidos atropelladamente à por- ta falfa , que occupavaõ já os noíTos Portuguezes , fe- riaõ todos vidima da fua juíliííima vingança ? fe naõ in- tercedeífem pelas vidas de alguns os efficazes rogos de hum virtuofo Sacerdote , affiftido de huma devota Ima- gem de Chriíto Senhor NoíTo , que levava arvorada , permittindo fem duvida o mefmo Senhor , que a gene- roíldade , com que fervia fegunda vez para a redemp- caÕ daquelles Hereges , lhes fizeífe mais abominável a ingratidão na obílinaçaõ barbara da fua perfídia. 821 Com o ultimo eílrago dos Hollandezes cef- fou a matéria por aquella parte para o exercido das nof- fas Armas , mas naõ o ardor em António Moniz para a em preza de novas vitorias ; porque guarnecido o Forte do Calvário de alguns dos moradores do mefmo rio , que novamente fe lhe incorporarão , bufcou mayor theatro para as heróicas reprefentaçoes do feu grande efpirito na principal força dos inimigos , paífando logo à Ilha do Maranhão para feavifmhar à Fortaleza de S. Filippe 5 Yy ii com Annaes Hiíloricos Armo 1642. com o projecto de lograr também a fua furpreza nos dcf- cuidos daquella guarnição , por fe perfuadir fundamen- talmente , que a acharia fem o menor avifb do fatal deílroço dos feus Companheiros. 822 Naò refpondeo cabalmente o fucceíTo às efpe- ranças de António Moniz % porque avançando trinta Soldados , logo que tomou terra, para o defcobrimento da Campanha, fe encontrarão dentro de poucas horas com quarenta Hollandezes , que tinhaô fahido da Cida- de na mefma diligencia , informado já o feu Governa- dor da defgraça do Itapecurú , por noticias de hum ne- gro , que fem alguma noíTa fe falvou a nado no ardor da peleja : porém como eftas fe communicaraõ igualmen- te aos moradores Portuguezes , já alguns delles ( mais venturofos , que duzentos , de que fez logo preza a ty- rannia do mefmo Commandante ) fe haviaõ unido à nof- fa partida, quando febateo com a dos inimigos , que mais opprimidos do valor , do que do numero , ficarão todos degollados- 825 Depois dede accidente , incorporado já Antó- nio Moniz aos feus Soldados vitoriofos , mudou de pro- jecto poftando-fe em hum fitio forte , três léguas da Ci- dade ; mas na diftancia de huma avançou ainda hum deftacamento pouco numerofo , às margens do rio Co- ty , para melhor fegurar a commodidade do feu acampa- mento no focego delle. 824 Manoel Freire Loufada , hum dos Soldados de melhor nome , pedio logo licença ao Commandante daquelle Corpo , para defcer em huma canoinha pelo mefmo rio no útil penfamento de tomar lingua dos Hol- landezes ; e reduzindo-o a pratica , parece que movido de fuperior impulfo , encontrou alguns índios pefcado- res já muito perto da Povoação , que conhecendo os nonos , ( que eraô fó dous remeiros ) fem que viíTem a Manoel Freire , por fe efconder debaixo da tolda , che- garão do EJlâdo do Maranhão , Liv. XI. j £ 7 garao a feu bordo , onde depois de preguntarem pelos Anno Portuguezes , recommendaraõ com grande efficacia os aviíaíTem a toda a preíTa , de que os inimigos intenta- vaõ bufcallos no feguinte dia com muita parte das fuás Tropas. 825 Reconheceo Manoel Freire a importância deitas noticias ; e voltando logo para o feu campo a to- da a diligencia, com a mefma fe rizeraõ também repeti- dos avifos a António Moniz , de que elle fe foube apro- veitar taõ cuidadofamente , que principiava a amanhe- cer quando fe achava naquelle mefmo fitio , e taõ fegu- ro da vitoria , que nas demonílrações dos feus alvoro- ços antecipava já os feílejos delia 5 mas bufcando com tudo como varaÕ prudente todos os meyos naturaes pa- ra confeguilla de todo o feu corpo , que fe compunha fó de feífenta Soldados , e oitenta índios , difpoz huma embofcada na mefma eftrada dos inimigos , ajudando- fe da boa difciplina para o conhecimento do terreno. $26 Foraõ muy pontuaes as informações dos In* dios pefcadores na expedição dos Hollandezes ; porque pelas féis horas da manhã fahiraõ com effeito cento e vinte da Cidade de S. Luiz , commandados por hum Capitão de Infantaria chamado Sandalim , e como nos fuppunha feparados pelas noticias das fuás parti- das , bufcava fó o noíTo pequeno deftacamento taõ con- fiado nas fuás ventagens , que fe achava elle já metido na principal força da embofcada , fem o menor avifo delia , quando lhe deu o mais verdadeiro huma defcar- ga de mofquetaria , feguida também das flechas dos índios. S27 Obfervou bem António Moniz a conílerna- çaõ , em que tinha pofto aos inimigos hum tal acciden- te , e fervindo-fe delia com militar acordo , os atacou ao mefmo tempo por todas as partes com taõ pezados golpes , que para refiftirlhes aproveitarão pouco os gran- des Annaes Hifioricos des esforços de Sandalim nas empenhadas diligencias dô reduzir os feus Soldados à boa ordem da difciplina ; por- que eftragada toda nas arrebatadas confuzoes dofufto, fó folicitava cada hum deiles a fua fepultura nos mea- mos caminhos por onde cuidava , que feguramente lhe fugia. 828 Mas já naõ contendia a juíla cólera dos Portu- guezes , mais que com os defpojos dos inimigos , quan- do o feu Commandante Sandalim defpedaçado a feridas confiantemente fe fuftentava ainda na vanguarda de to- dos , parece , que intentando vencer até a mefma mor- te no feu total defprezo : namorado da valentia do feu animo , lhe havia offerecido bom quartel , no ardor do combate, António Teixeira de Mello $ porém def- attendendo eíla piedade , lhe naò valeo ella quando a procurava , cedendo já à fua fortuna $ porque embra- vecidos os vencedores na ultima difputa da vitoria , en- tenderão fem duvida , que fó a acabavaõ de fegurar no laílimofo eftrago daquella nobre vida. 829 Cuftou efte a António Moniz dous Solda* dos , que merecendo bem , como todos os mais , a im- mortalidade da memoria nas recommendações da pofte- ridade , a huns , e outros efcondeo os nomes a femra- zaõ da inveja 5 e dos Hollandezes efcaparaÕ fó cinco com hum Alferes , que agradecerão a falvaçaõ ao am- paro dos matos 5 até que recolhendo-fe à fua Fortale- za , ferviraÕ mais para a confternaçaõ nas encarecidas informações do feu fatal deílroço, do que para o cuida- do da defenfa. 830 Os moradores da Cidade , que proximamente fetinhaÕ unido aos feus nacionaes, fe armarão do def- pojo ; e difcorrendo todos fobre as medidas das feguin- tes acções, diziaõ alguns : „ Se deviaõ logo aprovei- tar do favor da fortuna , bufcando os Hollandezes na „ mefma Praça 5 porque faltando-lhes ainda , como fe do Ejtado do Maranhão , Liv. XI. 5 j 9 , fuppunhaõ , os avifos daquella vitoria , a fua foberba Armo 1642.. ; conriança nos facilitaria o melhor fruto delia no feu y ultimo eftrago 5 e quando do primeiro fe achaíTem já ; bem informados , feria tal o feu defacordo pela eílra- , nheza do fucceíTò , nas ponderações barbaras da fua , fantaíla , que atinando apenas com a defenfa natural , , no recinto da fua Fortaleza , nefte arrojamento do va- , lor nunca ficava perigando a confervaçaõ das armas ; vencedoras ; mas antes , quando pouco , tirariaÕ fem- , pre as grandes ventagens de fe eílabelecerem dentro , da Cidade em algum fitio fuperior j que fe naô impor- ; taíTe para a expugnaçaõ da Fortaleza , por falta de for- , ças , ferviria ao menos para bloquealla pela parte da , terra , embaraçando-lhe por ella os baílimentos de to- , da a Ilha , de que livremente também nos ficaríamos , utilizando , além da confideravel conveniência de fe- 7 gurarmos os nofíbs foccorros no mefmo quartel dos , inimigos : que a empreza fó a poderia fazer defgraça- , da a frialdade dos ânimos ; o que fuppoílo trataííem , de valerfe do feu primeiro ardor , entre as acclama- y ções da mefma vitoria , fe naô queriaÔ malograr com , merecida laftima as felicidades 7 que promettiaõ as fuás , confequencias. 83 1 Apoyava eíla refoluçaõ como mais generofa o Capitão mor António Moniz ; mas António Teixeira de Mello , que por ter occupado vários poílos com mui- ta diftinçaõ no feu procedimento , naõ era inferior na ef- timaçaõ de todos os Soldados, feguia com muitos: diffe- rente confelho , fuftentando : „ Que as felicidades das „ vitorias , nas fuás confequencias , fó fe coftumavaõ fe- „ gurar ufando-fe delias com a devida moderação rj por- „ que em nenhuma parte fazia mais foberbas oílenta- „ ções das fuás inconftancias o poder da fortuna , que „ nas emprezas militares , onde fe muitas vezes eraõ '„ venturofos os atrevimentos , ficavaõ fempre na.òpi- - niaõ Annaes Hiíloricos „ niaõ dos prudentes , infamados de temerários ; e que „ na defgraça naô havia injuria , a que fe naò viíTem re- „ duzidos ? principalmente na jufta indignação do fen- v timento publico ; o que merecia mais particulares at- „ tenções no prefente cafo , quando de hum fó golpe fe v arruinava todo o edifício da fua mayor gloria , trocan- „ do-fe a todos os honrofos applaufos das acclamações „ da liberdade nos mortaes gemidos da efcravidaÕ mais „ dura , que a de que pouco antes os havia remido a „ heroicidade dos feus ânimos : que era mais que prova- „ vel , que os inimigos teriaÕ já cabaes informações da fi fatalidade de Sandalim , e que fendo ainda até à Cida- „ de huma grande légua , premeditando como taõ bons „ Soldados aquelle arroj amento , muito natural na bifo- „ nharia das Tropas vencedoras ; para deílruillas na mef- ;; ma marcha . fe faberiaõ bem aproveitar da qualidade „ do terreno , por mais que a monílruofa defigualdade „ das fuás forças naõ neceffitaíTe delias ventagens 5 por- „ que os difcurfos da conílernaçaÕ , em que já os fuppu- „nhamos, eraõ fó delírios , fendo elles huns homens „ com tantas experiências nos fucceííos da guerra : o „ que tudo maduramente ponderado com a total falta fJ de munições , e mais petrechos neceííarios para ta- „ manha empreza , fó deviaÕ bufcar novo alojamento „ em algum íitio forte , para que engroíTados com os „ foccorros , que tinhaõ pedido ao Pará , e os que ef- „ peravaõ com fundamentos folidos nos mefmos mora- -„ dores do Maranhão , chamados da Vi&oria , podef- „ fem entaõ adiantar as fuás medidas à proporção delles, „ logrando entre tanto com menos perigo , e mais com- „ modidade os grandes intereífes , que fe propunhaõ de „ desfrutarem a campanha com graviffimo damno dos „ Hollandezes. 832 Penetrou de forte eíle difcurfo os corações de todos, que ainda aquelles , que fe lhe oppunhaõ , o pre- ferirão do Eflaâo do Maranhão , Liv. XI. 3 6 1 ferirão como mais prudente, ou como menos arrifca- Annoi642r. do no prefente fyftema 3 e António Moniz mais con- vencido da neceííidade nas ventagens do numero , que da efficacia dos feus fundamentos , fe accommodou tam- bém a elles , alojando-fe fobre o mefmo campo da bata- lha ; onde fe paííbu o refto do dia , e a feguinte noite entre os alvoroços da vitoria , que accrefcentavaõ mui- to os intereíTes dos defpojos ; porém amanhecendo-lhes nova luz , parece que todos iiluílrados de outra mais fu- perior , romperão em uniformes vozes , de que fe bu£ caíTe logo a Cidade 5 porque fem duvida a occupariaô com grande fortuna , por fer mal defendida pela banda da terra $ e que recobrados os Hollandezes do feu pri- meiro fuílo , naõ fó para a conquifta , mas ainda na na- tural defenfa, crefcia o perigo , por fe achar já então entorpecida muita parte dos ânimos nas melancólicas ponderações delle. 83 3 Bem defejou António Teixeira fuílentar o feu voto , reprehendendo , como defacordos da razaõ , ef- tes novos impulfos do valor ; porém como António Moniz os avaliava pelos mais generofos , tratando-os já como felices vaticinios , cuidou de fomentallos : e fem dar mais lugar à repetição dos argumentos juftiííima- mente temorofo de fe ver fuffòcado da fua muita força , fe poz logo em marcha. 834 Difcorria António Teixeira como Soldado ve- terano ; mas António Moniz , que naõ tinha menos ex- periências dos fucceííbs da guerra, defattendendo entaõ as fuás doutrinas , naõ fó falto de forças , e inftrumen- tos para a empreza de hum fitio, mas ainda de todo o género de munições para qualquer combate , fe foube bem aproveitar do bifonho ardor dos feus Companhei- ros ? bufcando logo huns inimigos taõ poderofos , pare- ce que chamado dos brados da fama. 835 No breve termo de huma hora defcobrio a Po- Zz voaçaõ, 1 51 ;:„; »* 362 Annaes Hifloricos Anno 1642. voaçaõ , e tomando alguns índios dos Hollandezes , que encarecidamente o informarão da confternaçaõ , em . que ainda fe achavaõ t com efta noticia taõ duvidofa nas mal feguras atteftações dos authores delia , conti- nuou a marcha com tamanho defprezo dos perigos, que ío parecia , que caminhava para os applaufos da vitoria , que com eífeito principiou a celebrar na in- fenfibilidade dos mefmos inimigos ; porque fem a me- nor oppoíiçaõ , penetrou o arrebalde da Cidade , até occupar o Convento dos Religioíbs de NoíTa Senho- ra do Monte do Carmo , que com alguma elevação ficava pouco mais de tiro de mofquete das fuás mura- lhas : e como o feu aílento fe cobria todo por aquella parte de alguns edifícios , fez alto nelle António Mo- niz 5 até que aproveitando -fe do amparo da noite , ga- . nhoú outros portos mais avançados à Fortaleza , on- de logo fe fortificou com o defenho de huma meya lua. 836 Com a primeira luz do dia , conhecendo me- lhor os inimigos o feu defacordo nos adiantamentos das noflas obras, quizerao impedir os progreíTos del- ias com varias furtidas 5 mas rechaçados deftemida- mente do valor Portuguez , lhe grangeavaô cada dia mayores ventagens nos feus mefmos esforços , por lhe deixarem fempre muito mais illuílres aquellas vitorias os defpojos do fangue j até que tirando António Mo- niz novas oufadias das felicidades dos fucceíTos , che- gou a poftar as fuás poucas Tropas na diflancia de cen- to e cincoenta paíTos da mefma Fortaleza : e ampara- do fó de humas pequenas cafas , onde os Hollandezes feguravaõ as fuás retiradas , confeíTaraõ efles com huma tal injuria a grande oppreíTaõ , em que os ti- nha pofto taõ leve accidente , que reduzidos todos à guarnição das fuás muralhas , pedirão logo apreílados foccorros ao Conde de Nazau. Efta '■ * do Eftado do Maranhão , Liv. XI. 563 3)7 Efta foy a ultima acçaõ do prefente anno na Anno 1642 Capitania do Maranhão $ e paílarey agora à do GraÕ Pará , para feguir com a relação das fuás noticias a formalidade da minha Hiftoria. 838 Logo que aquelles valerofiííimos Portuguezes de S. Luiz do Maranhão facudiraÕ dos opprimidos hombros o tyranno jugo dos Hollandezes , o Com- mandante defta gloriofa acçaõ António Moniz fez avifo delia aos moradores de Belém do Pará , pedindo- Ihes as fuás affiftencias para os esforços de huma taõ grande empreza , também com ajuftiça de que afor- tuna , ou a defgraça do fucceíTo ficava fendo igual a todos , aííim pelos refpeitos particulares nos eftreitos vinculos das amifades , e parentefcos , como pelos públicos , por ferem vaífallos huns , e outros daquelle mefmo Príncipe , que havia ainda pouco mais de hum anno, que tinhaõ acclamado por feu legitimo Monar- ca. r 839 Os Miniftros do Senado da Camera , r que go- vernavaÕ a Capitania , depois da morte do feu Capitão mor Francifco Cordovil , ainda que pelas controver- fias , que flcaõ referidas , fe achavaõ feparados da com- municaçaõ dos Capitães mores Pedro Maciel, ejoaõ Velho do Valle , que fe confervavaõ no acampamen- to da Ilha do Sol , lhes participarão eíla noticia no mefmo dia , em que a receberão , attendendo fó à uti- lidade publica ; mas ponderando bem com a neceííida- de do foccorro a grande gloria , que lhes grangearia , naõ difcorriaÕ menos nas injurias , a que infelicemen- te fe condemnavaõ na immortalidade da memoria , fe continuando nos incivís pretextos da fua divifaõ , fe efcufaífem de huma tal jornada , quando naõ havia para ella naquella Conquifta mais forças , do que as fuás. 840 Moílraraõ elles, que fe deixavaõ convencer Zz ii def- Annaes Hiftoricos JLnno 1642. deitas razões , que verdadeiramente naõ tinhaõ repof- ta } mas pondo-fe logo no caminho do mar , o navega- rão nas íuas canoas com taõ culpável fleuma , que naõ chegarão ao Maranhão , fenaõ já no principio do fe- guinte anno , como veremos nos fucceíTos delle j con- fumindo muito mais de dous mezes em huma viagem , que ainda que feja trabalhofa , folgadamente fe coftu- ma fazer em pouco mais de vinte e cinco dias , fem que as inconftancias do mefmo mar poífaõ dilatalla , naô fendo por defgraça , ou por defcuido , por fer con- tinuada à força de remos por trinta e três bahias , fe- guidas todas ellas de canaes mancos, a que chamaò Rios. 841 PaíTados poucos dias , depois da partida dos dous Capitães mores , chegarão à Cidade de Belém do Pará o Sargento mór Marcos Corrêa , e António Fer- ros , moradores ambos de S. Luiz do Maranhão $ e defpachados pelo Governador dos Hollandezes com a copia authentica do Tratado da Tregoa de dez annos , que em 12 de Junho do antecedente havia celebrado a fua Republica com a Coroa de Portugal , pelas ne- gociações do.Embaixador Triílaô de Mendoça Furta- do , em quanto fe naõ ajuítava entre as duas Potencias huma perpetua liga 5 porém ao mefmo tempo , que ponderava bem as reciprocas conveniências , que fe feguiaõ a ambas as Nações da religiofa obfervancia delle , o eílava violando na confervaçaõ daquella Ilha , invadida cavilofamente pelas fuás Armas , naõ fó de- pois da fua felice reftituiçaõ à pacifica poífe de hum Principe, a quem devia reconhecer por feu legitimo Soberano, mas também com a noticia do mefmo Tra- tado , que communicava como nova na fua , fendo- Ihe taõ antiga. 842 Naõ defconheciaõ aquelles Portuguezes , que as alterações do Maranhão , que diílimulava efte Com- mandante,. do EJlctâo do Maranhão , Liv. XI. 3 6 «; mandante, eraõ fem duvida as que o faziaõ tao atten- Annoi642. to , por difcorrer elle com a boa politica , de que ador- mecidos no liíbngeiro leito das delicias da paz, ou naõ concorreriaõ para os esforços de huma guerra domef- tica com tantas ventagens nos inimigos , ou feria õ os foccorros tao frouxos , que refpondendo mal às efpe? ranças dos authores delia , ferviriaõ fó de defenganal- las , entregando-lhe nas fuás mãos huma vitoria fem peleja , depois de haverem já capitulado à difcriçaõ da fua tyrannia ; porque ainda que os primeiros impulfos de hum arrojamento deílemido , favorecidos da fortu- na , nas mayores defordens da mefma difciplina , o en- curralarão nas fuás muralhas pela parte da terra , como lhe ficava livre o mar , por onde recebia todos os dias as affiítencias de Parnambuco , por mais que as vigo* rofas , de que neceííitava para a fua vingança , fe lhe retardaífem por alguns mezes , eftas dilações fó pode- riao mortificallo na paciência , fe acafo muito antes fe naõ defefperaíTe a dos íltiadores j o que parecia mais que provável na bifonharia , de que fe compu- nha. 845 Com os feguros fundamentos deftes mefmos difcuríbs , penetravaõ bem os moradores do Pará o mi- litar projecto dos Hollandezes 5 mas como tinhao fei- to a expedição para o foccorro dos feus nacionaes , aíTentaraõ uniformemente , que fe recebeíTe aquella proporia 5 porque além de fe naõ oíFerecer na fua acei- tação o mais leve perigo , fe tiravaõ delia para o fo- cego publico grandes utilidades , quando a duvida de naõ ir remettido pelo Miniílerio de Portugal o Tra- tado da Tregoa , os punha fó na obrigação de o naõ publicar em quanto lhe faltaíTe eíTa formalidade ; e na de ufar também da fua obfervancia com aquellas cau- telas , que fe faziaõ fempre mais que preciías no cavi- lofo trato de femelhantes homens. Defta ;t!!''f.'lii,i(f' 366 Annaes Hifioricos Anno 1642. £44 Defta bem ponderada refoluçaõ Te formou logo aflento no Senado da Camera ; e dando com el- la numa repofta poíítiva aos Enviados dos Hollande- zes , fe defpedirao do Pará , inteiramente fatisfeitos do feliz fucceíTo da fua commiflaõ ; porque confide- rando-lhe as mayores ventagens para os feus nacionaes, as eítimavaõ já como verdadeiros Portuguezes. ANNAES ANNAES HISTÓRICOS DO ESTADO DO MARANHÃO- LIVRO XII SUMMARIO. O quartel da Cidade de S. Luiz chega foccor- ro do Pará , e morre o General da Guerra An- tónio Moniz Barreiros. Succede no me fino emprego o Sargento mor António Teixeira de Mello. Intenta ejle a inter preza da Fortaleza de S. Fi- lippe , e entra nella hum grande Joc corro de Par nambu- co. Ofeu Comm andante Andrezom faz logo humafahi- da , efe retira rechaçado. Sacrilégio bárbaro dos HoU landezes , e o feu jujlo cajligo. Deftituido de munições de guerra abandona ^António Teixeira o auartel da Cida- de de S. Luiz , efe refolve apaffar logo para a terra fir- me de Tapuy tapera. O Governador dos Hollandezes faz hum deflac amento f obre a retaguarda de António Teixei- va , eefie o dejiroe inteiramente. Favorecido dofuccef- fi Ànno 164 ■3« 568 Annaes Hifioricos fofufpenâe otranfporte das fuás Tropas , e as aauarteU la em hum fitio forte da mefma Ilha. Procedimento bár- baro do Governador dos Hollandezes. Pa/a com efeito António Teixeira para Tapuy tapera , e os Auxiliares do Pará vergonhosamente o abandonai. Intenta retirarfe para a Cidade de Belém , efoccorrido de poucas munições de guerra fufpende afua marcha. Toma a refoluçaõ de fujientar a guerra-, e mandando reconhecer o ejlado da Ilha do Maranhão por António Dias Madeira, muda o feu alojamento para junto delia. Mete na mefma vários dejlac amentos ; e recolhendo-je com feliz fucceffo , pajja a occupalla, » M os últimos dias do anno paíTado deixey as Armas Por- tuguezas na Cidade de S.Luiz do Maranhão , e na fuccef- faÕnova de 1645 íuftentaraõ ainda o mefmo quartel, quan- do entrarão nella em 2 de Ja- neiro os Capitães mores Pedro Maciel , e feu irmão Joa5 Velho doValle com o foccorro de cento ^e treze Soldados , que conduziaõ do Pará , de que eraõ Capi- tães Aires de Soufa Chichorro , Bento Rodrigues de Oliveira , e Pedro da Cofta Favella , e fetecentos ín- dios dos de melhor nome , governados pelos feus Prin- cipaes j mas quando o valor do General da Guerra An- tónio Moniz , afíiftido já de mayores forças , as difpu- nha para grandes emprezas, lhe embaraçou o exercicio huma perigofa enfermidade com magoa tal fenfivel de todos os feus fubditos , que para a natural confolaçaõ naõ encontrariaõ defafogo , fe lho naõ difpozeífe a alta Providencia na fubítituiçaõ do Sargento mor António Teixeira de Mello , como fegundo Commandante. 846 Tinha elle feguido as difpofiçôes de Antónia Moniz do Ejiado do Maranhão , Liv. XII. j 69 Moniz na opprefTaõ forte dos Hollandazes ; porque a Anno 164?. mefma militar efficacia , com que fe oppoz à occupa- çaõ daquelle quartel , julgando-a empreza temerária , empregou depois para fuftentar o credito das Armas na confervaçaõ delle , trazendo fempre os inimigos em hum continuo defaíbcego , a que também ajudavaÕ muito duas peças de artilharia , conduzidas a diligen- cias fuás do Forte do Calvário , chamado vulgarmente do Itapicurú : e vendo-fe engroífado com o novo foc- corro do Pará, ( ainda que taõ pobre de munições de guerra , que levava fó quatro quintaes de pólvora com muy pouca bala , quando padecia a falta de tudo na ul- tima miferia ) intentou a acçaõ , filha fem duvida do feu grande efpirito , de tomar por aííalto a Fortaleza de S. Fiiippe , compondo-fe a fua guarnição de pouco me- nos de quinhentos Soldados , além de muitos índios ; forças , que fazia mais formidáveis o breve recinto das fuás muralhas , aíiiftidas de boa artilharia: mas feguran- do a felicidade do fucceífo na confternaçaõ dos mefmos inimigos , embaraçada a prompta execução defte pro- jecto pela apaixonada contradição dos emulos , quando contendia com mayor ardor na fua reducçao , entrou na Fortaleza na manha de 15 de Janeiro o importante foc- corro de fetecentos e íetenta Soldados , com ^copiofo numero de índios. 847 Era o Commandante deíle reforço ( conduzi- do de Parnambuco , abordo de hum navio , duas barcas e cinco lanchas ) hum Hollandez chamado Andrezom $ e como em Outubro do anno de 1641 o tinha também fido da invafaõ da Ilha de S. Thomé , com tanta tyran- nia , como felicidade , afiançava nefta o Conde Mau- rício deNazau, naõ fó a fegurança da Fortaleza , mas a reítauraçaõ de toda a Ilha , com o caftigo ultimo dos moradores delia, pelas acclamaçoes da fua liberdade ; acçaõ fem duvida , que fendo taõ heróica , como juíli- Aaa ficada , 57o . Armões Hijíoricos '4 •* Anno 1643. ficada, a fentenciava como culpa de primeira cabeça o tribunal bárbaro da fua perfídia. 848 Quiz Andrezom defempenhar , com huma fó acçaÕ , a obrigação , em que o tinha pofto o feu Gene- ral na confiança , que fazia delle , fuggerido também dos grandes intereíTes da fua mefma fama : e obfervan- do logo com as mais militares reflexões , aííim o ardor dos feus Soldados foberbamente fomentado das venta- gens do numero , como o defcuido das noíTas fentinel- las , principalmente a horas de fexta , na precifa vigia do quartel avançado , que fó fe guarnecia de cincoen- ta homens , com perto de oitocentos de guerra , e ou- tros tantos índios , fahio da Fortaleza pouco depois do meyo dia no feguinte ao da fua chegada j mas ainda que entradas por aquella parte as primeiras defenfas , que governava o Capitão Pedro da Coíla, ferviraõ nel- Ias de defpertadores os pezados golpes inimigos , pre- valecendo fempre o natural valor dos noíTos Soldados entre as confuzões do mefmo defacordo , fe recobrarão delle com hum animo taõ defafogado , que Andrezom chorou bem a fua vitoria no laftimofo exame dos defpo- jos delia ; porque fendo muitos os cadáveres , de que fe compunhaõ , fó achou três dos que lha difputaraó , que com quatro mais que fahiraõ feridos , foy toda a noíTa perda j aífaz recompenfada , tanto na gloria do combate , como na galhardia da retirada , à vifta de nu- mas forças taó monftruofamente fuperiores , affim no numero , como na difciplina. 849 Enfurecido elle com os eftimulos defte fatal ef- trago , promettia vingallo , ameaçando-nos a mais crua guerra no vigorofo ataque das Trincheiras do Carmo j porém achando já com as armas na maô os feus defenfo- res , nao pode forçallas nos primeiros impulfos do feu arrojamento , por mais que deftemido ; e ainda que a nobreza da acçaõ fez crefcer o empenho , tirando fó del- le do EJlaâo do Maranhão , Liv. XII. 3 71 le os defenganos últimos , na repetição do feu deílroço , Anno 1643, paííliva já fem duvida a argumento da defefperaçaõ a mefma difputa do valor , quando aconíelhado da boa difciplina fe poz em retirada $ e taõ efcarmentado nas experiências de taõ pezados golpes 7 que chegou a tra- tar como milagrofa a grande força delles , ou fofíe naô querer confeíTarlhes a fua inveja a natureza de huma tal virtude 7 ou para moftrar a fua vangloria 7 que fó huns esforços fobrenaturaes podiaô vencello. 850 O noífo Commandante António Teixeira pa- receo no combate taõ bom General , como Soldado j porque em toda a parte o achavaõ fempre as difpofi- çÕes , e os perigos 5 e o Capitão Paulo Soares de. Avel- lar também fe foube diftinguir nas acções deite dia ; por- que virtuofamente ambiciofo de fama , lançando-fc com poucos Companheiros fobre a retaguarda dos inimigos , accrefcentou muito a fua perda ; e corri a de cento e feífenta Soldados 7 além da mayor parte dos feus Ta- puyas, e duzentos feridos (fem mais defconto para con^ folalla , que o de demolimos o primeiro quartel ) en- trou Andrezom arrebatadamente as mefmas muralhas , de que havia fahido duas horas antes com huns taes fe- guros da vitoria , que antecipava já as acclamações dei- la. 851 Perderão também fó nefta occaíiaõ osnoíTos Portuguezes três dos feus Soldados , e fete dos índios ; mas ao mefmo tempo , que celebravao todos a felicida- de do fucceíTo , com as demonílrações que elle merecia, ihes mortificou muita parte do goílo o jufto fentimento efcolhendo antes como caminho mais feguro o de taõ longa eílrada nos evidentes rifcos das fuás afperezas, do que os contingentes de huma guerra taõ jufta , que ainda nos últimos eftragos das vidas , liberalmente lhes offereciaÕ os mais illuftres epitáfios na immortalidade da memoria. 865 António Teixeira , que fe achava já deílituido de munições de guerra , reconheceo mayor o perigo neíla deferçaõ $ e fujeitando-fe como varaõ prudente aos documentos da racionalidade , fe refolveo a paflar logo para a Cidade de Belém com as bem fundadas ef- peranças , de que ainda que fe lhe retardaíTem as aílif- tencias de Portugal, naõ podia õ faltarlhe , quando no meyo tempo fegurava a fua fubííftencia na união da- cjuelles moradores , que pela mefma conta fícavaõ tam- bém nella muito intereíTados , por naõ viverem menos receofos de huma viílnhança taõ inimiga. .864 Na neceífidade defta refoluçaõ entrou a difpor a fua retirada j porém ainda fem o ultimo aííento fobre a forma delia ; porque querendo huns fe fizeíTe por mar, por ficar fendo menos trabalhofa , faltavaõ para iíTo as embarcações, que eraõ neceífarias : e inftando outros fe intentaífe por terra , como mais fegura , fe naõ ofTe- reciaõ menos dificuldades que vencer, nas afperezas de cento e feífenta léguas de caminho , fem mais eftrada , que a de medonhos matos : mas quando eílava mais a&iva a contradição dos pareceres , os conciliou todos a chegada do Capitão António de Deos , que conduzia do Pará cinco quintaes de pólvora , com murraõ , e ba- la à fua proporção. 865 Deu também a noticia , de que encontrara pou- cos dias antes os dous Capitães mores defertores j mas que naõ poderá reduzillos a que voltaíTem para aquella guerra , por mais que procurara perfuadirlhes a felicida- de de fua conclufaõ com as efperanças de promptos foc- corros 3 do E/lado do Maranhão , LivX.lI. 5 77 coitos $ e que afeando-lhes a refoluçaõ , que tinhaõ to- Anno 1643 mado , a defculparaõ fó com a totai falta de munições, para a oppofiçaõ de huns inimigos taõ poderofos : co- mo fe deixando pelo mefmo principio muito mais arris- cados os feus Companheiros , naõ accumulaífem mais injuriofas circunílancias à memoria defte procedimen- to. Porém o certo he , que raras vezes fe acerta com remédios , que poífaõ curar os accidentes, em que che- gou a perigar a honra por facriflcio voluntário ! 866 Bem conheceo António Teixeira , que quan- do fe achava taõ enfraquecido na divifaõ das fuás for- ças , a novidade de taõ débil foccorro de munições de guerra naõ era a que bailava, para que mudando de projecto , podeíTe entrar no de outras medidas mais ge- nerofas , fem o certo perigo , de que fe infamaíTem de temerárias , ainda nos mais rect.os juizos do Mundo : mas parece , que já affiflido de fuperiores influencias , depois de tomar a refoluçaõ ultima fobre a mefma ma- téria , intereíTòu nella a univerfal approvaçaÕ dos feus Companheiros , pelas infpirações do feguinte difcurfo. 867 ,, ConfeíTo ( valerofos Amigos ) que reconhe- „ cendo fundamentalmente a debilidadecTas noíTas for- ,j ças , pelo que toca ao numero , nunca me parecerão >, mais vigorofas , pela qualidade , que no prefente dia 5 „ porque fazendo maduras reflexões no venturofo acafo, „ com que nos vemos foccorridos , naõ ha alguma , que „ fe me naõ oíFereça por fiadora , a mais abonada da nof- „ fa mayor gloria na oppofiçaõ dos Hollandezes. E fe „ naõ dizey-me ? Se naõ havendo mais que hum fó ca- „ minho para as canoas do Pará , ( coffiO fabemos todos, „ e naõ ignoraõ os mefmos inimigos ) como he crivei , ,, que fendo elles taõ poderofos pela parte do mar , co- „ mo pela da terra , nos deixafTem livre efta tao impor- „ tante communicaçaõ fem fuperior myílerio ? Que „ também naõ menos fe nos perfuade , na ponderação Anno 1643. W 378 Annaes Hijloricos „ da conjuntura , em que recebemos as munições de „ guerra ? de que precifamente neceífitavamos ; pois „ quando a falta delias era a principal , que nos impedia „ os felices progreíTos das acclamações da liberdade , ao „ mefmo tempo, que já abandonávamos com merecida „ laílima os pátrios domicilios , pela feparaçaõ de cen- „ to e feíTenta léguas , para íufpendermos a execução „ ultima de taÕ tyranno golpe , nos chega eíte foceor- „ ro com a circunítancia , que acho fobre todas a mais „ prodigiofa j de que expedindo-o o Governador do Ef- „ tado do Brafil António Telles da Silva , fem mais inf- „ tancias ,. que as do feu grande zelo , depois de paíTar „ em hum patacho , incapaz de defenfa , tantas Efqua- „ dras Hollandezas defde a Bahia de Todos os Santos „ até o rio de Belém do Pará , defembarcou naquella „ Cidade privilegiado de todo o perigo .? Bem vejo me „ podeis reíponder , que a pobreza do mefmo foccorro „ nao ferve mais , que de nos confirmar nas primeiras „ medidas ; pois com cinco quintaes de pólvora como „ podemos alterallas, fem que fe fentenceem todas as v que forem mais generofas , antes defatinos da defefpe* „ raçaõ , que arroj amentos do valor , mayormente de- „ pois da deferçao dos Auxiliares do Pará ? Mas para ,, convencervos neíle , que prefumís indiífoluvel argu- „ mento de noíTo defengano , fó quero preguntarvos : „ Se quando rompemos asgroíTas cadeas do noílb ca- ,, tiveiro , tinhamos nós mais forças , ou menos também „ os mefmos inimigos ? Porque fe Andresom fe lhes „ unio com o reforço de fetecentos fetenta e cinco ho- „ mens , quantos mais agora nos fataes eílragos do Ita- „ picurú , e outras occafiões, que fe lhes feguiraÕ (que „ para os grandes créditos dos noíTos nomes , repeti- „ ráõ eternamente os annaes da fama ) faÔ já merecida „ fatisfaçao de tantas injurias ? O que fuppofto , no- „ bres Companheiros , fe as noífas acções tiveraõ o feu „ berço • io EJlado do Maranhão , LivXII. 5 79 „ berço na fuperior esfera da heroicidade , neíTe mefmo Anno 1645. , ; lugar devemos fuftentallas , para o merecimento da .„ pretendida gloria , fem que a elevação das noflas ef- „ peranças chegue a orTender a Divina Juftiça ; porque „ na inteireza defte Tribunal naô he pofíivel , que pade- „ ça duvidas a da nofla caufa , quando fó contendemos „ por todos os principies pela fídeliffima obfervancia , y dos feus meímos Decretos : mas antes eu entendo „ que a deferçaõ da gente do Pará foy difpofiçaõ dei- „ les , para mais clara demonílraçao do invencivel esfor* „ ço, com que nos aífifte ; e aííim já defprezando todos „ os reparos (valerofos Amigos ) principiemos a colher .,_, as palmas , que como infignias do triunfo , ha de col- „ locar a noíTa memoria no honrofo templo da immor- „ talidade. ; 868 Com as ultimas vozes defte valerofo.Comman- dante , influídos já todos os Soldados dos féus mefmos efpiritos , pela virtude da fua actividade , naó fó fe ofFe* reciaõ deftemidamente para a confervaçaõ daqúelle íi- tio , que já abandonavaõ por falta.de forças y mas tam?- bem pretendiaõ a oppofiçaõ das Hollandezas nas ventar gens da Ilha , quando guarneçiaõ os mais importantes poftos delia , fendo taÕ fuperiores ; e António Teixei* ra fabendo bem ufar defte primeiro ardor daquelles no- bres Portuguezes , depois de eftimulado com os incen* tivos das mais honrofas exprefsôes , tratou também lo- go de o moderar ; porém applicando taó pouca porçaô de agua à voracidade de hum tal incêndio , que apagan- do-lhe fó as lavaredas > fervia ao mefmo tempo de fo- mentallo, como nova matéria 5 porque dando todas as providencias para fegurar a fua fubfiftencia no mefmo quartel de Tapuytapera , mandou reconhecer o eftado da Ilha , para que regulando-fe pela informação dos feus exames , podeíTe entaô mudar de fyftema , aproveitan- do-fe militarmente do beneficio da conjuntura. Bbb ii Achava- 1 M Mj o Annaes Hiftoricos- .ÍVimoi64§. 8 $69 Achava-feiêlle com o pequeno corpQ^efefle rv ta Soldados , e duzentos índios , mas feguindo como •CapitaÕ experimentado a boa ordem da diíciplina mili- tar, o dividio em duas iguaes partes , de que nomeou -logo Commandantes a Manoel de Carvalho Barreiros , ( irmaÕ do General defunto António Moniz )' e a Joaõ Vafco , Officiaes ambos muito beneméritos 'daquella honra ; e fegurando bem ao mefmo tempo a verdadeira indagação de humas noticias tao importantes , a encar- regou ao conhecido preílimo dó féu Tenente António Dias Madeira , afliêido em duas canoas de Manoel Al- vares de Caftro. f outrO. Manoel Alvares , Mathias João, •Manoel Couceiro V Simão Rodrigues-, André Fernan- des da Arrábida, e outrd Soldaio mais, que nao dei- xou o nome às noíTas memorias , fendo todos merecedo- res delias. ãú ■/- M 870 Como o inimigo naõ fó occupava toda a Ilha , mas também o Forte do Itapicuru , que António Tei- -xeira tinha abandonado*, quando paliou a Tapuy tape- ra , para a parte defte encaminhou António Dias as Tuas •proas , promettendo-fe já nos défçuidos daquella guar- nição, de que fe achava bem informado , a felicidade daemprezu} porém para melhor feguralla , antes deap- parecer à fua viria , que já lhe ficava pouco diftante , •tratou de defmentilla , cobrindo de rama as duas ca- noas ; e introduzindo-as por hum caminho eftreito , (que o fucceffivo embate das ondas , enfoberbecido com a communicaçaõ do Oceano , abrio nas margens do mefmo rio, reveílidas todas dedenfos arvoredos) efcolheo o fitio mais accommodado , para que na en- chente da maré , que fobe por elle baílantes léguas , aproveitando-fe do amparo da noite , podeíTe entrar na pratica do feu proje&o , ou novamente regulado pelos accidentes da fortuna. 871 Para efperar a opportunidade damonçaÕ, fal- tou do EJtado do Maranhão 7 Liv. XII. $ 8 1 tou em terra com os feus Companheiros quafi no fim Anuo 164^ da tarde ; e tendo dado ainda poucos paífos , viraõ to* dos por entre as mefmas ramas daquelles arvoredos de£ cer hum Hoiiandez , que fuppozeraõ fer da guarnição do Forte j porque levava alguma roupa branca , que principiou logo a lavar na viíinhança dosnofíos Solda* dos , fem dar noticia delles , ou fbíTe pelo grande cui- dado , com que fe recàtavaõ>>òu pelo feu, deíquido , por fe confiderar muito- feparado de huma; companhia taõ perigofa ■; porém dentro de breves inftantes pagou bem oexceíTo defta confiança com a fenfivel perda da própria liberdade. :-;fj aup rtá ou,%j2 Com as cabaes noticias deíle pnzácMiíeínO-tevíe também António Dias a de que na manha daquelle «dia havia íubido pelo rio hum barcoíde cubertahj cqne leva* va a feu bordo trinta e cinco Soldados dos mais válejo*- fos , como projeclo ;de o defçQbrirem ; e examinadas bem as utilidades , que podiaõ tararfe da .ré edificação ; e nova cultura de todas as fazendas abandonadas dos Portuguezes , fe aproveitarão delias , depoisi de ;fegu> rallas mais vigorofamente-naxommunicaçaiõ de todo5 gentilifmo daquellas vifinhanças-^DÍFerecendo-lhe- a"fuà amifade com os partidos mais ventajofos. Jôgôaàf oíh 8 7 5 Bem conhecia ,efte , QffoãaL O íhfedOr rkurriero das fuás forças ; masractendendò fói a quaBdaBe:dellais4 adefejou logo difputar na abordagem do barc© ^eacfeth* do também em lugar das efcufas $ que receava , os inclen> tivos mais generofos para tamanha.acçaÕ^UQ/deftemi! do animo dos feus Companheiros , tanto que; a ooiíe r, £ a maré lhe Facilitarão as fuás idéas -> as principiou a. rei duzir a pratica com huma tal fortuna , quepaííbu o Foi> te , fem que o percebeífem as fuás fentinellas. .. ■ : 874 O Hollandez , olhando bem para a monítruofa defigualdade da guarnição do barco- ? fe temerofo fe naõ ria de tamanha empreza , a tratava fó como temerárias po- i [ ■# 582 Anhaes Hifloricos W '* ■H Ànno 1643* P or ^ m oS no ^* os Portugueses a intentarão com tal arro- j amento , que pareciaõ provocados de fuperior impuk {o 5 e navegando toda aquella noite , quando já a Au- rora annunciava o dia , fe viraõ muito perto da embar- cação , que fe achava furta : mas conhecendo ella , que eraõ inimigos os que a bufcavaõ ; fe preparou logo para a peleja. , %-jy Com huma breve fufpenfaõ difpoz António Dias , que paíTaíTem avante as duas canoas , para que voltando fobre o barco com todo o Ímpeto dos remos , o atacaíTem ao mefrao tempo por hum , e outro bordo 5 e os Hollandezes , que perceberão bem efta refoluçaõ , quizeraõ impedilla com fucceffivo fogo j mas ainda que a pouca diílancia lhes facilitava o acerto dos tiros , nao receberão delles os deílemidos Portuguezes nem o me- nor damno :; e animados mais com eftas primeiras expe- riências dafua fortuna , procurarão também fazer as ul* timas da valentia dos feus braços, bufcando prompta- mente a embarcação por meyo de chuveiros de balas com hum tal defafogo no perigo delias , que alagando- 4e ao virar huma das canoas , fem a menor alteração f feguio fó a outra^ que-era a do Commandante, o mef- mo perigo. <• 876 Os Hollandezes , que examinavaõ bem a de- bilidade das forças inimigas na íua união, vendo-as di- vididas y âs tratarão com hum total defprezo j e para caftigarem efte , que chamariaõ atrevimento bárbaro da fua loucura, defcarregaraõ todas as armas offenfivas fo- bre a canoa , que valerofamente os tinha atracados por hum dos feus bordos : porém os quatro Portuguezes , da que eftava alagada , que obfervaraõ o outro fem a menor defenfa, efgotando logo a tal embarcação , ( que por fer de páo leve naÕ padeceo o ultimo naufrágio ) fe aproveitarão deftenovo accidente com tamanha fortu- na , que pela mefma banda , que os inimigos fe confide- -oq ravaõ do EJlaâo do Maranhão, Liv.XII. 385 ravao muito feguros , fe acharão atacados com taÕ pe- Armo 1643, zados golpes , que prevalecendo entre as confuzões do íeu deíacordo os deímayos do animo , lhes faltou de to do para a reíiftencia por aquella parte 3 e defamparada também a outra pelo mefmo motivo , multiplicou de forte António Dias o feu fatal eílrago , que fó hum del- les , que fe lançou ao rio, pode falvar a vida ; mas de- vendo-a mais à generofidade dos vencedores , que às di- ligencias do feu medo. 877 António Dias , depois de recolher todos os def- pojos , achando que o barco por falta de mareaçaÕ naõ podia também authorizar a fua vitoria , o entregou às chammas , para que lhe íerviíTem de luminárias no fef- tejo delia 5 e efperando favorável hora para fazer a fua retirada , a executou no principio da noite , defembo^ cando o rio pelo mefmo Forte , que lhe defende a en trada , tao refpeitado já da artilharia dos Hollandezes > que difparando toda fobre as duas canoas , por fer logo fentido, a receberão os feus Soldados, em tao curta dif- tancia , fó como honrofa falva. \ 878 Todos os que fe acharão neíla occafiaõ mere- cerão bem a grande gloria , que grangearaõ nella 5 e pa- ra que em tudo foíTe venturofa , até fe recolheo Antó- nio Dias a Tapuytapera , fem mais outra perda , que a do pouco fangue , que derramarão dous dos feus Com- panheiros por algumas feridas nada perigofas. 879 PaíTados alguns dias , no de 28 do mefmo mez de Mayo, apparecerao oito navios Hollandezes ao mar do quartel de Tapuytapera 5 e faltando valor ao feu Commandante , para a refoluçaõ de hum defembarque na oppofiçaõ das forças inimigas , fe quiz aproveitar das barbaras doutrinas, de quejoaõ Cornelles fe tinha fer- vido havia já perto de dousannos para a invafao daquel- las mefmas terras ; entendendo fem duvida , que acha- ria outra femelhante frouxidão à do Governador Bento Ma- / 3 8 4 Annaes Hiftoricos Anno 1643. Maciel no Capitão mor António Teixeira ; mas ouvin- do elle com focegado animo a pérfida propofta deíle Hollandez, ( que authorizava mais com huma Carta do Conde de Nazau , que fe íuppoz fingida ) em que lhe fegurava , que recolhendo-fe à Povoação de S. Luiz, governaria todos os Portuguezes fem dependência algu- ma. Refpondeo também por efcrito , que fim difpu- nha já o feu alojamento naquella Cidade ; porque bre- vemente lançaria delia hofpedes taõ infames. 880 Deíla grande conílancia conheceo logo aquel- le Commandante , que naõ lograria as fuás medidas ; e naõ podendo elle difpor o animo para tratar outras mais generofas , fe fez à vela para a bailia do Maranhão , donde tomando terra , impaciente o feu Governador , deu expreíTa ordem , para que fe naõ déíTe dalli em di- ante quartel a Portuguezes : porém a mefma parlou também António Teixeira contra as fuás Tropas , ex- ceptuando todos os Francezes , que ferviaõ nellas 5 mi- litar politica para deixallos mais fufpeitofos, como con- feguio com muita utilidade. 8 8 1 Bem entendeo o Capitão mor , que reforçados os inimigos com o novo foccorro 7 entrariaõ fem duvi- da em operações mais vigorofas ; porém averiguando por feguras efpias , que era tal a conílernaçaõ , em que ainda fe achavaõ , que fegurando fó o feu focego na muita agua , que os dividia do alojamento de Tapuyta- pera, até já desfrutavaÕ com difciplina frouxa as fazen- das da Ilha , introduzio nella varias partidas dos melho- res Soldados : e fabendo também aproveitarfe dos feus úteis progreflbs , mudou logo de fitio , paíTando a outro de boa fortaleza 5 mas taõ vifinho da mefma Ilha , que hum eftreito rio , que a forma por aquella parte , o fe- parava fó do feu continente. Naõ defpertou mais aos Hollandezes efte movimento ; e António Teixeira ven- do-fe em todos lifongeado da fortuna , adiantou mui- to do EJiado do Maranhão 7 Liv. XII. 5 8 1 to cada dia as fuás ventagens nos esforços da guerra. 882 Neíle mefmo tempo, que chegava já aos 13 de Junho , ouvio o eílrondo de muita artilharia para a parte da barra da Cidade de S. Lui promptas duas canoas , Tem mais equipagem , que a de oito Soldados , e cincoenta índios , ordenou ao Alfe- res João da Paz , que examinaíTe nelias a verdadeira cauía daquella novidade. Era valerofo o Commandan- te $ e guiado ío dos mefmos eccos , bufcava o fitio donde elles fahiaõ , quando oppondo-felhe huma lan- cha grande , que guameciaõ vinte e fete homens com duas peças de canhão de pequeno calibre , a abordou , e rendeo com tanto arrojamento , como felicidade j por- que a do fucceíTo até lhe cuílou pouco fangue : mas os defordenados alvoroços defta gloriofa acção , confun- dirão de forte a inalterável ordem da boa difciplina que obedecendo fó às lifongeiras vozes dos applaufos , que já lhe parecia , que o eftavao chamando defde o alojamento , defattendeo a diligencia , de que hia encar- regado, com grave prejuizo dos intereííes públicos , co- mo veremos nas futuras memorias. 885 Ainda que louvou o Capitão mor António Teixeira com exprefsões h&irofas o grande valor, com que procedeo o Alferes Joaõ da Paz , eílranhou tam- bém com feveridade a fua defordem 5 porém como fe via taÕ favorecido da fortuna , naõ fe embaraçou mui- to nas melancólicas ponderações delia 5 porque fazen- do logo hum deítacamento de quarenta Soldados , e cem índios frecheiros , o entregou ao Capitão Manoel de Carvalho , com o útil proje&o , de que metendo-fe na Ilha (que já defamparavao os Hollandezes , temero» fos das fuás embofcadas) fe aproveitaífe bem do bene- fício dos accidentes 5 e como elle fabia conhecellos , íe fervia de todos com tal felicidade , que fem oppoftçao talou a Campanha 5 e para tirar ao mefmo tempo multi° Ccc plicados 386 Annaes Hiftoricos ít ií, Anno 1643. plicados intereífes no abundante fornecimento das fuás Tropas , principiou a fazer farinhas no fitio chamado das Nhaúmas , desfrutando as mefmas fearas , ( a que lá chamaõ roças ) abandonadas dos Portuguezes. havia poucos mezes. 884 Para a fabrica deíle mantimento fe neceííita fempre de larga dilação 5 e como toda a gente , que fe occupanella, anda feparada em muito diferentes minif- terios , fe efqueciaõ já tanto os Portuguezes das obri- gações da boa difciplina , que os que fe achavao naquel- le mefmo Titio , até defattendiaõ o precifo cuidado das mais vigilantes fentinellas j porque fiando fó à de dous índios a fua fegurança , dormiaõ todos taÕ defcança- dos , como fe naõ tiveíTem inimigos : porém o Com- mandante delles , que fe defvelava como bom Capitão para melhorar o feu partido , fabendo logo , que eíle deílacamento tinha entrado na Ilha , e que recolhia eom grande focego todos os frutos delia , em que nao ficava menos prejudicado pela muita falta , que pade- cia , principalmente de farinhas , fez fahir da Praça ití- fenta Soldados , e cem índios guerreiros com apertadas ordens, para que bufcando a toda a diligencia taÕ pe- queno corpo , efcarmentaíTán por huma vez a fua ou- íadia no mais cruel eílrago. 8 8 5 Bem poderá entender eíle Hollandez , regulan- do-fe por experiências próprias , que era fem duvida muito arrifcada a obediência da fua ordem , quando a encontrava neceíTariamente a forte oppofiçaõ daquel- les mefmos homens , que tantas vezes o tinhaõ ven- cido com mais defigualdade : porém ou informado da fua divifaô, e grande defcuido, ou influido dos fober- bos eílimulos da vingança, enfayava já a fua cegueira os mais alegres alvoroços para a celebridade da vito- ria. 886 Achava-fe o deílacamento Portuguez em 7 ^ e \ do miado do Maranhão \ . Liv. XII. 3 8 7 Agofto , nao fó dividido nos vários ferviços da fua co- Anno 1643. lheita , mas ainda mais enfraquecido com a falta do feu Commandante , que com alguns Soldados tinha parlado a outro fido 5 e como a guarda deite das Nhaúmas cui- dava taõ pouco na fegurança delle , avançando logo de madrugada as fuás coítumadas vigias , naó tratou mais que da fua mayor commodidade , fem attençao alguma aos perigofos accidentes da guerra. 8 Sj As fentinelías, que eraõ os dous índios, ou por perceberem algum rumor diítante , ( porque nos primeiros dous fentidos parece fe efmerou a natureza humana com todas eítas racionaes feras ) ou chamados também de fuperior deítino , fe adiantarão muito do feu poíto até junto das margens de hum pequeno re- gato , onde viraõ bem os Hollandezes y que defcan- çando das fadigas da marcha, e defvélos da noite, fa- boreavaô mais na goítofa doçura daquella amenidade o mefmo corporal alimento , com que fe refaziaõ ; mas a pouca cautela deites bárbaros os defcobrio logo aos mefmos inimigos : e tirando elles de huma tal confian- ça os fortes argumentos , de que eraÔ batedores do groíTo Portuguez , informado já do feu deítacamento , toda a braveza , que lhe ameaçavaõ , fe converteo em fuíto, arrebatando as armas com huma defordem taõ precipitada , que mais parecia , que fe preparava© para a fugida , do que para a peleja. 888 Bem fe podiaÕ contentar os dous bárbaros ín- dios com a brutalidade da primeira acção ; porque ain- da lhes deixava lugar para emendalla , fe fe retiraíTem com ligeiros paflòs para defpertar os feus Companheiros do fatal letargo , a que fe achavaS reduzidos , por def- cançarem todos fó no feu cuidado ; mas defaproveitan- do como feras huma occafiaò de tanta importância , adiantarão mais o feu defatino , difparando as flechas fobre os Hollandezes , que reítituidos da coníternaçao Ccc ii com Annaes Hiílorlcos I Anno 1643. com o verdadeiro conhecimento da debilidade dos ini- migos, defpedaçaraõ hum nos primeiros Ímpetos da fua juíia coiera ; porém entre ella, prevalecendo já as at- tenções da diíciplina militar , fizeraõ o outro prizionei- ro para fe fervirem das fuás noticias : e informados bem, affim do fitio do alojamento Portuguez , como da fua diviíaõ , e negligencia , com que fe guardavaõ todos os poftos , tomando logo a refoluçaÕ de o atacarem , o bufcarao a toda a diligencia com tantas certezas da vitoria , que já diftribuíaõ foberbamente os defpojos delia. 889 Prevenindo com tudo , como Soldados vete- ranos , todos os accidentes da fortuna , quizerao me- lhor feguralla na fua boa ordem indo fempre dobrados , a que também os ajudava muito a capacidade do ter- reno 5 mas como o caminho até o fitio das Nhaumas naõ paífava de hum quarto de légua , fe pozeraõ logo fobre elle : e confirmando bem as informações do índio prizioneiro no defacordo dos inimigos , o procurarão accrefcentar com huma vozaria , a mais efpantofa , pa- ra deixallo irremediável. 890 Efta militar regra , eíludada fem duvida nas barbaras efcolas Mahometanas , naò obrou pouco na mayor parte dos Portuguezes ; porque impellidos das confuzões do fufto , defampararaô laftimofamente a fua mefmafama, largando huns as armas como embaraços da falvaçaÕ das vidas , e outros arrebatando-as fem mais attençaõ , que a do vil intereííe de as naô perderemj porém doze , que fendo os mais viíinhos do perigo, na o pode fufFocallos , ôppondo-fe com deftemido animo a todas as forças inimigas , as difpntaraõ por algum tem- po com igual conftancia ; e ainda que opprimidos de huma taõ monílruofa defigualdade , fora5 cedendo^al- gum terreno para fe melhorarem , como confervavao o mefmo defafogo , tanto que chegarão a hum cotovello, que do Eflado do Maranhão , Liv. XII. 3 8 9 que fazia a eítrada , cuberto todo de corpulentas arvo- Anno 1643. res , entaõ fortificando-fe dos feus robuftos troncos moftrarao bem , que fó fe retiravao daquelle confli&o para fazello mais fanguinolento. 891 Os Hollandezes , que fem adiantarem hum fó paííb , viaó que o feu empenho , naõ fervindo mais que de influir mayores esforços no valor invencivel daquel- les inimigos , accrefcentava o feu eftrago ; para evitar o ultimo , ou para a vingança , do que já padeciaõ , qui- zeraõ abraçallos ao mefmo tempo por hum , e outro flanco com toda a boa ordem das doutrinas da guerra : porém elles , que obfervaraÕ também com militar acor- do a contramarcha da fua retaguarda , perceberão bem efte feu projeóto ; e afpirando generofamente à immor- talidade da memoria no defprezo das vidas ? repetindo logo em altas vozes : %A elles , a e/pada \ que àfua mef- ma divifaÒ os leva já vencidos \ os carregarão com taô pezados golpes , que naõ havendo refiflencia , que ne* ceííitaíTe de fegundo, em breves inílantes fe acharão todos ociofos. 892 Alguns dos Hollandezes, faltandolhes o animo para entrar nas mefmas experiências , fim dilatarão a fua deígraça no amparo das brenhas , mas para fazella mais injuriofa nos epitáfios vis das fuás fepulturas •.; porque fugindo às mãos de huns taõ heróicos vencedores , os que efcaparaõ das dos índios , morrerão às das feras 5 e aquelles nobres Portuguezes , vendo -fe já fem exercí- cio para o emprego da fua juíla ira , fe aproveitarão da vitoria. 895 Defcançava6 elles de tantas fadigas febre o mefmo campo de batalha , repartindo focegadamente os defpojos delia , quando os alterou hum novo acci- dente $ porque defcobrindo por entre os arvoredos al- guma gente armada , que metida na forma \ acelerava a fua marcha na demanda do fitio , a tratarão logo como reli- , III» :"iKil 390 Antiaes Hiíloricos MH tm Annoi643. relíquias do paflado deílroço , foccorridas de alguma referva da fua retaguarda , que naõ chegaria a entrar na peleja j mas prevenidos já para fegunda acçaõ , co- nhecerão , que era o feu Capitão Manoel de Carvalho , que no lugar em que fe achara , imitando-os em tudo , havia derrotado muitos inimigos , ( dos de hum deíla- camento , que no principio do ataque tinhaõ elles fei- to para cortallos ) ainda que com grande deípeza do feu nobre fangue , porque levava féis feridas : porém íem que baílaíTe para enfraquecello o muito que havia derramado delias , unidos já todos os feus Soldados , fez feguir o alcance dos Hollandezes até as portas da Cidade ; e como nella de todo o corpo do deftacamen- to entrarão fomente dez Francezes , o Governador mandou enforcallos com o pretexto bárbaro de terem fugido , por naõ quererem pelejar contra os Portugue- zes , também accufando-os de igual procedimento em outros fucceíTos femelhantes. 894 Sem outra perda , que a do Sargento Anto* nio da Coita , com mais três Soldados , e a de cinco feridos , mas todos valerofos , fe recolheo Manoel de Carvalho ao quartel General , tendo-o já fornecido de baftantes farinhas ; porém o Commandante António Teixeira, ainda que naõ neceílítava de mais mantimen- tos , para tirar com tudo aos Hollandezes todos os da Ilha , meteo nella paífados poucos dias nova partida de trinta Soldados , e cincoenta índios à ordem do Alferes Manoel Dornelles , Official de muita honra , que logo que atravefíbu o rio , íbube que os inimigos no mefmo caminho , que fe fazia inexcufavel a fua marcha , haviaõ levantado hum capaz reduclo , que guarneciaõ com qua- renta homens j e aproveitando-fe affim do feu valor, co- mo do conhecimento do terreno , o efcalou antes de amanhecer com huma tal fortuna , que quando elles conhecerão a fua deígraça, naõ poderão já remedialla. De- do E/lado do Maranhão , Liv. XII. 591 895 Demolio logo aqnella defenfa o vitoriofo ; e como o fucceíTo lhe ficava alterando as primeiras medi- das , repaíTando o rio , fe recolheo no mefmo dia ao feu alojamento, onde mereceo os mais honrofos elogios do Capitão mor António Teixeira. 896 A felicidade defta occafiaõ eílimulou de forte o deftemido animo do Capitão Paulo Soares , que in- formado , de que vinte e cinco Hollandezes guardavaõ o engenho de aífucar de Bento Maciel , ( fituado na terra rirme do Itapicurú , como já fica referido ) lhe tomou a porta fó com féis Soldados , e alguns índios : e confervando-a valerofamente com três dos Compa> nheiros , em quanto os outros três , ajudados dos ín- dios , lhe applicavaÕ fogo por difFerentes partes , o fez arder com toda a guarnição. %9j Depois defte fucceíTo fufpendeo as entradas António Teixeira até o mez de Outubro ; mas ainda que já nefte tempo lhe havia chegado a rrifte noticia do infeliz naufrágio do Governador Pedro de Albuquer- que , ( que referirey no lugar a que toca ) como tam- bém fe lhe tinhaõ unido alguns Portuguezes commayor numero de índios , além de confervarfe na antiga conf- tancia , parece que esforçando-fe mais dos mefmos ac- cidentes , que procuravao deftruilla , determinou paf- far o feu alojamento para dentro da Ilha do Maranhão 5 procedendo porém com as devidas attençoes à difcipli- na militar, ordenou primeiro ao Sargento mor Agofli- nho Corrêa , que arMido da Companhia do Capitão Joaõ Vafco , reconheceíTe o Forte do Itapicurú , já com o projecto de o furprender, para fegurar em todos os fucceífos a fua retirada. 898 O Sargento mor bufcou o Forte a toda a dili- gencia ; porém ficarão ociofos os valentes esforços que tinha prevenido para a fua furpreza , porque o achou abandonado já dos inimigos : e unindo-felhe den- tro Annaes Hifloricos Anno 1643. tro de poucas horas o Commandante General António Teixeira , que feguia a íua retaguarda para íuítello em qualquer accidente , o guarneceo de novo. < 899 Do mefmo lugar deítacou elle logo trinta e féis Soldados , guiados de hum valeroíb índio , que fe chamava Sebaftiaô , com ordem para que penetrando toda a Ilha , lançaíTem fogo a todos os frutos , que por mais viíínhos da Cidade , podeífem fervir para a fubfif- tencia dos Hollandezes : e bem lograda efta hoftilidade, paífou à mefma Ilha , onde o deixarey difpondo o feu alojamento , com toda a boa fituaçaõ , para as defenfas da arte militar , até o principio do anno futuro , por fer nefte o ultimo fucceffo digno de memoria na Capitania de S. Luiz do Maranhão , quando me bradao já os da de Belém do GraÕ Pará. . j ANNAES A NN AES HISTÓRICOS DO ESTADO DO MARANHÃO- LIVRO xui S UM MA RI O. |J||g|g LOGIO do Governador do EJlado do Brqfií ^António Telles da Silva. Feliciano Corrêa chega da Bahia de Todos os Santos ao Para com algumas munições de guerra , de que fe ficcorre o Maranhão. Nomea EIRey Governador do Ejlado a Fedro de Albuquerque. Sahe do rio de Lisboa com algum foccorro de Soldados , e munições de guerra ; e naufragando nos baixos do Pará , fefalva com algumas peffoas. Elogio dejle Governador , que morre na Cidade , tendo nomeado fará a fuafubjiituiçaõ a Feliciano Corrêa. Na Capitania do Maranhão continua António Teixeira ja entrado na Ilha ; e os Hollandezes abandonao a Capi- tania ^ embarcando-fe para a de Parnambuco. António Teixeira avija a Lisboa da feliz rejlauraçaõ da Capita* Ddd » IH» ':« íl.íl 394 Annaes Hiftoricos , • Ânno 1643. '^ > 3$^ continuando no governo delia. Succede no go- verno geral do Ejiado o Sargento mor delle Francifco Coelho de Carvalho. Elogio do Governador. No me a e/le no emprego de Captai) mor do Grai Vara a Paulo Soares do Avellar. Succede nelle Sebqfiiai de Lucena de Azeve- do. Chega o Governador a Cidade de Belém do Pará , e morre brevemente na mefma Cidade. Fica encarregado do governo da Capitania Aires de Souja Chichorro 5 e na do Maranhai , também independente no governo , Manoel Pitta da Veiga. Succede no governo do E/lado Luiz de. Magalhães. Supprime-Je o governo geral , eje divide nas duas principaes Capitanias , (juefe encarregai a BaU thafar de Soufa Pereira , e Ignacio do Rego Barreto. Abfoluta prohibiçao dos cativeiros 5 e por efie motivo alte- rações das Capitanias , quejocegao osfeus Capitães mores. Morre o Capitai mor do Gr ai Pará Ignacio do Rego ; e o Senado daCamera de Belém encarrega o governo da Ca* pitania ao Sargento mor Pedro Corrêa. Pa/a também bre- vijjimamente da prejente vida ; efuccede-lhe o Capitai de Infantaria Domingos Machado. Chega ao Ejiado a refor- ma da Leyfobre a abfoluta prohibiçai dos cativeiros , eji- caifatisf eitos todos os povos. Movem-fe na Cidade de Be* lem de Pará novas difputas fobre o governo da Capitania ? e por eleiqai dos feus moradores fe confere a Aires de Sou- fa Chichorro. No governo da Capitania do Maranhão continua ofeu Capitão mòrBalthajar de Soufa Pereira. 9 00 fÊSSÊÊÊGSÊÊÈÈ GRANDE zelo, que ref- plandecia no Governador do Eítado do Brafil António Tel- les da Silva , naõ cabendo já na dilatada esfera dos cuidados próprios , ílthindo dos limites da fua mefma jurifdicçao , acu- dia também aos alheyos , fem que a viíinhanca do po- der âoEjlado do Maranhão, Liv.XIII. 59 g der formidável dos inimigos lhe reprimiíTe o animo ; por- Anno 1643. que informado bem, aífim da aleivoíia com que os Hol- landezes haviaõ occupado a Capitania do Maranhão , como da heróica refoluçao dos moradores delia , para o juílo caftigo de hum procedimento taõ abominável , me- teo a bordo de hum patacho as munições de guerra f que pode tirar das poucas , que tinha para a fua defen- fa , militarmente difcorrendo , que feria efta a princi- pal neceífidade daquelles nobres Aventureiros : e encar- regando tudo com acertada efcolha ao Capitão Felícia-* no Corrêa, lhe ordenou , que correndo a Cofta , até en- trar no rio de Belém do Pará , defembarcaíTe naquella Cidade , para que delia fe foccorreíTe o Maranhão con- forme a conjun&ura. 901 Acreditou bem a eleição deíle fciente General o Capitão Feliciano Corrêa 5 porque paífando por mui- tos navios Hollandezes com hum total defprezo dos pe- rigos da vida , livre de todos , tomou nos fins de Mar- ço a Povoação mefma , que bufcava , onde entregou aquellas munições aos Officiaes do Senado da Camera , que por morte do Capitão mor Francifco Cordovil go- vernavaÕ ainda a Capitania : e enchendo elles taõ intei- ramente como deviaõ as obrigações do feu minifterio ; naõ fó expedirão para o Maranhão o Capitão António de Deos com a mayor parte do foccorro , que produzio aquelles eíFeitos , que ficaõ referidos ; mas também o patacho para Portugal a ordem do CapitaÕ Paulo Soa- res de Avellar j que tendo chegado do mefmo Mara- nhão com a incumbência de reprefentar na Corte de Lisboa o perigofo eftado daquella tonquifta , fe encar- regou de outra femelhante por parte do Pará. 902 Logo que a Corte recebeo os primeiros avifos da invafaõ das Armas Hollandezas na Capitania do Ma^ ranhaõ , menos laftimada da fua grande perda na ufur- paçao de huma tao boa parte do Real Património 7 do Ddd ii que uM i 396 Annaes lliftoricos 'v.-t m Anno.1643. que das vexações, que padeciaõ aquelles VaíTalIos , intentou foccorrellos : mas a dependência dos Eftados Geraes , auxiliares dos intereíTes Portuguezes na for- midável guerra Caftelhana , ( quando as occurrencias da meíma guerra occupavaõ também todas as forças da Monarquia) traziaõ taõ embaraçado o animo deElRey, que na5 confiderando menor perigo na enfermidade , que no remédio delia , fe nao refolvia a applicarlho 5 até que chegando-lhe por via da Bahia de Todos os San- tos as fecundas noticias do valor heróico , com que al- guns dos mefmos opprimidos , apurado de todo o forTri- mento , haviaõ já dado venturofo principio à redemp- çaõ do feu cativeiro nas acclamações da liberdade , que fuílentavao na campanha com muitos fucceíTos glorio- fos , lhe pareceo entaõ , que nao devia retardar mais tempo as fuás Reaes demonftraçÕes ; e tendo conferida o governo geral daquelle Eftado a Pedro de Albuquer- que por Patente de 4 de Setembro do anno paíTado , expedio no prefente todas as ordens neceíTarias para a fua partida. 903 A bordo de hum navio , com mais de cem Sol- dados , e abundante fornecimento de munições de guer- ra , fahio do rio de Lisboa no dia 29 de Abril Pedro de Albuquerque , Fidalgo da Cafa Real , e Cavalleiro do habito de Chriílo ; e feguindo logo a fua viagem na direitura da mefma Ilha do Maranhão , deu vifta delia em 13 de Junho : porém naõ querendo advertidamente entrar na bahia da Cidade de S. Luiz , fem que primei- ro averiguaíFe o verdadeiro eftado da nofla íubfiftencia , para tirar eftas informações , fez difparar aquella artilha- ria , que obrigou o Capitão mor António Teixeira à acertada expedição das ordens , que malogrou a defat- tençao do Alferes JoaÕ da Paz \ como já fica referido. 904 Defenganadas as efperanças do Governador , bufcou logo a barra do Pará } mas naquelle tempo era taõ do Eftado do Maranhão , Liv.XIII. 3 9 7 taõ pouco o conhecimento , que fe tinha delia , que o Armo 1643. Piloto danao, depois de repetidos bordos, a encalhou em 30 de Junho na reílinga de hum banco de área 5 e como os mares eílavaõ muito grofíbs , efperavaõ todos o feu fatal naufrágio fem humano remédio , quando lhes acudio com duas canoas o Capitão Pedro da Coita Fa- vella, que acafo andava em huma pefcaria nas viíinhan- ças do mefmo baixo : porém por mais , que poíto já a bordo do navio procurou animar a fua equipagem , di- minuindo-lhe o perigo , bem informado delle Pedro de Albuquerque , mandou lançar ao mar o efcaler , e lan- cha , onde fazendo embarcar , e nas duas canoas trinta e três peíibas ( em que entravaõ algumas mulheres , e o Padre Frey Pedro da Magdalena , CommiíTario dos íveligiofos de Noffa Senhora do Monte do Carmo com mais dous Companheiros ) deu expreíTa ordem para que tomando a primeira praya voltafíem a toda a diligencia as quatro embarcações. 905 Foy obedecida com pontualidade efta acerta- da difpofiçaõ 5 mas o furor das ondas , com a enchente da maré, tinha crefcido tanto, que na volta já huma das canoas naô podendo rompellas, arribou logo à mef* ma terra , donde havia fahido ; e a outra ,• ainda que tomou a embarcação , deu humas taes pancadas no cof- iado delia , que abrindo vários rombos , até os remeiros a defampararaõ : com tudo , livres de perigo , chegarão a feu bordo a lancha , e o efcaler j e metendo-fe nefté o Governador , com a fua familia , occuparaô a lancha todas as peíToas , que lhe couberaõ , em que também entrarão três Religiofos da Companhia de Jèfus de qua- torze , que hiaõ no navio , de que era fuperior o Padre Luiz Figueira , que conduzido do feu efpirito apoftoli- co tornava ao Maranhão , virtuofamente diííimulando o jufto fentimento das antigas perfeguiçôes daquelles moradores. O 398 Annaes Hiftoricos Ms Atino 1643, 9°^ ^ Piloto da nao fegurou a todos os que fíca- vaÔ nella , que no termo de vinte e quatro horas ne- nhum tinha perigo j e nefta confiança efperavaô com muita , que a diligencias de Pedro de Albuquerque pafíariaÕ logo a feu bordo as embarcações , que foíTem neceílarias para o tranfporte de toda a carga : porém el- le , que apenas tomou terra , na que lhe ficava mais vi- finha , vio que amefma nao fe metia no fundo ; e enten- dendo , que todo o feu cuidado era já inútil , o poz fó então em fe recolher à Ilha do Sol , onde fabia bem , por informações do Capitão Pedro da Cofta , que ain- da fe mantinhaô os dous Macieis com o feu arrayal. 907 Os naufragantes infelices , perdidas de todo as efperanças da falvaçaõ das vidas , entrarão logo a beber o horrível caliz da mais penofa morte 5 mas no meyo ain- da de humas taes afflicções , confervando alguns a conf- tancia do animo , tanto que a embarcação fe principiou a desfazer , formarão duas das pipas da aguada com tal ^capacidade, que fe meterão nellas fetenta peíToas : po- rém como por falta de todos aquelles materiaes , que eraõ neceífarios para a fegurança da fua conftrucçaõ , ficarão com pouca para poderem refiftir a medonha fú- ria , com que os mares rebentavaÕ no baixo , antes de a vencerem , laílimofamente fe defpedaçaraõ com a fen- íível perda de toda a gente 7 que conduziaõ , a que fa- zia numero , e muito importante para a mais juíla ma- goa o virtuofo Padre Luiz Figueira com oito Compa- nheiros , que por mais , que o Piloto fiado com defcul- pa na força de feus braços , e deftreza delles , tomando hum filho fobre os hombros da tenra idade de quatro annos , fe lançou à bahia com a refoluçaõ de a paífar a nado , acharão ambos nella a mefma fepultura. 908 Em hum pedaço grande do navio , que fe naõ foy ao fundo , ficarão ainda onze homens de todo o ref- to da fua equipagem , e já examinando com os feus mef- mos do miado do Maranhão , Liv. XIII. 399 mos olhos a infelicidade dos Companheiras , fabricarão Anno 1643. huma boa jangada com as efperanças de lhe fugirem ; mas no fegundo dia hum mar encapellado arrebatou dons delles , Religiofos ambos da Companhia de Jefus * e na manhã feguinte tomando os nove a Ilha de Joan- nes , habitada dos índios Aruans , quando efcapavaõ tao venturofamente dos perigos das ondas , o naõ encon- trarão menor, e com circunílancias muito mais Jaftimo- ías na hofpedagem barbara deitas racionaes feras $ por- que nos próprios braços , que lhes oíFereciaô com gran- de humanidade , aleivofamente lhes tiravaÕ as vidas , que falvaraõ fó três , que tardando-lhes mais a fua def- graça , tiverao a fortuna de ferem foccorridos de hum valerofo moço, ( natural da Villa de Viana na Provín- cia do Minho , e morador no Graô Pará) que com al- guns efcravos andava fazendo huma falga de peixe jun- to do mefmo íitio. 909 Defcançou alguns dias Pedro de Albuquerque no arrayal da Ilha do Sol j e difpondo delle a fua entra- da publica , tomou folemne poííe do governo do Efta- do na Cidade de Belém do Pará em 1 3 de Julho com ge- raes applaufos dos feus moradores 5 porque ainda que naõ faltarão murmurações da frouxidão , com que fe tinha havido no foccorro da gente naufragada , as de- pendências do feu lugar , bem inculcadas da lifonja , as deixarão logo fufFocadas. 910 Tinha elle fervido com muita diítinçaÕ por ef- paço de fete annos na Capitania de Parnambuco , don- de era natural 5 e fendo os três últimos depois da entra- da dos Hollandezes , e cruenta guerra , que fe lhe fe- guio , fe fmalou mais na defenfa do Forte do rio For- mofo , que fe lhe havia encarregado ; porque perdendo em hum aíTalto quafi toda a fua guarnição , fó o largou com a liberdade já defpedaçado a feridas : por troco paf- fou depois a Portugal , e accrefcentando o feu mereci- mento Annaes Hiftoricos :.\  imo 1643. mento com novas acções militares, o premiou a gran- deza de EIRey com eíle honrofo emprego. 911 Os Capitães mores Pedro Maciel , e Joaõ Ve- lho do Valle , depois da fugida do Maranhão , fe refti- tuiraõ ao feu alojamento da Ilha do Sol, onde os achou o Governador , como já fica referido j mas ainda que elle naõ caftigou o feu procedimento , taõ pouco os oc- cupou nos empregos do Eílado , que nem admittio ao de Capitão mor do Grão Pará a Pedro Maciel , fendo- Ihe conferido por Patente Real havia já mais de dous annos , o que bem juítifica as reiteradas queixas da Ca- pitania. 9 1 2 Padecia Pedro de Albuquerque perigofas quei- xas na faude , e chegou à Cidade de Belém taÕ oppri- mido delias , que muito mal podia fuftentar o pezo do governo em huma conjuntura taõ cheya de occurren- cias as mais trabalhofas , pela viíiiihança das armas ini- migas : porém excedendo as fuás mefmas forças , mof- trava bem nas promptas providencias , aííim politicas , como militares , as louváveis virtudes , que o habilita- rão para aquelle emprego 5 e fem que faltaíTe à corref- pondencia , que fe entretinha ainda com os Hollande- zes do Maranhão na conformidade da primeira propof- ta do feu Governador , acudio logo à neceífidade do Capitão mor António Teixeira com diferentes foccor» ros , principal obje&o do feu grande cuidado. 9 1 3 Nefte mefmo eftado fe achava a Cidade de Be- Anno 1644. lem do Pará na fucceíTaõ do anno de 1 644 j mas os feus moradores , que reflectindo já no perigolb , em que fe hia pondo o Governador , o temiaõ ainda muito mais arrifcado para o focego publico nas orgulhofas maqui- nas dos Capitães mores Pedro Maciel , e Joaõ Velho do Valle , logo na mudança ordinária de Miniílros da Camera , flzeraõ que o feu Procurador requereífe nella em nome do povo , que em nenhum tempo foíTem ad- mittidos do Eflado do Maranhão , Liv. XIII. 401 mittidos aquelles dous homens a emprego algum da Ca- Armo 1644. pitanía ; e que na attençaõ da mefma propoíla, fe en- caminhafle a juftiça aos ouvidos do Príncipe com empe- nhadas íupplicas , para que fe extendeíTe efta tal exclu*. ílva a toda a geração dos Macieis : e bem recebida dos novos Senadores a reprefentaçaõ , fe encarecia no con- ceito geral como parto legitimo das mais advertidas: providencias do zelo ; quando também o era da vil pai- xão do ódio. 914 Com razão receavaõ os moradores do Pará as perturbações do focego publico na ameaçada falta de Pedro de Albuquerque ; porém elle , que nos ligeiros paíTos , com que fe via ir conduzindo para a fepultura > naõ defconhecia os fortes fundamentos deites mefmos temores , tratou também de prevenillos com taÕ feguro animo , que em 50 de Janeiro difpoz prudentemente a fubftituiçaõ do feu lugar depois da fua morte na pef- foa de Feliciano Corrêa 5 e ainda que entre eítreitos vin- çulos de parentefco fe acreditava bem o acerto da efco- lha nas vozes dos applaufos , para melhor juftiflcar o feu procedimento nefta já confiderada ultima acçaõ de to- das as fuás , lhe declarou por adjunto ao Sargento mor do Eílado Francifco Coelho de Carvalho. 915 Já a efte tempo conhecia bem o Governador a breve duração da vida caduca ; e como confervava a mefma conftancia , fuperior fempre a todos os peri- gos , depois delias politicas difpofiçÕes , cuidando fó naquellas ? que lhe podiao fegurar a fua eterna felicida- de , entregou o efpirito nas mãos do Creador em 6 de Fevereiro , deixando os feus fubditos taõ fenfivelmente magoados , como certificarão as demonftrações publi- cas , com que affiftiraô ao funeral , que fe celebrou com a devida pompa na Igreja do Convento dos Religiofos de NoíTa Senhora do Monte do Carmo , depofitando- fe o cadáver na Capella mor delia. Eee Bem 1!<" 402 Annaes Hifioricos Annoi644* 91o Bem ignorante da infelicidade , quê fe chora- va na Capitania do Graõ Pará , continuava a guerra na do Maranhão o feu Commandante General já metido na Ilha j e multiplicando as hoftilidades , chegou a re- duzir os inimigos a tal conílernaçaõ , que nenhum fe atrevia a fahir das feguras defenfas da Cidade , efcar- mentados todos nas experiências próprias do feu certo perigo j porque apenas fe feparavaÕ delias , ou perdiaò as vidas, ou as liberdades nas embofcadas dos Portugue- zes , que lhes facilitavaõ , muito na fua viíinhança , a qualidade , e conhecimento do terreno. 917 Nefte mefmo tempo recebeo António Teixei- ra a trifte noticia do falecimento de Pedro de Albuquer- que j porém como fempre nos mais pezados golpes da fortuna experimentava as forças do feu animo , tratou de fazer delias as ultimas provas na total qppreíTaÕ dos Hollandezes : e embaraçando-lhes a fubfiílencia por to- dos os caminhos , logrou inteiramente as fuás medidas ; porque dando fundo na enfeada de Araçagy , vifmha da Cidade de S. Luiz , hum navio da Ilha do Fayal , de que era Capitão hum Domingos Pinheiro , ( que nave- gando para a Bahia de Todos os Santos carregado de vinhos , o conílrangeo o tempo a efta arribada , para efcapar a mayor infortúnio ) como nao tinha forças pa- ra a reíiílencia , o occuparaó logo os mefmos inimigos, que ainda chegavaõ a perto de quinhentos , além de oi- tenta índios j e no dia 28 de Fevereiro embarcando-fe todos em outros três mais , de que fe naõ ferviaõ por mal aparelhados , correrão a coíla até a Ilha de S. Chrif- tovaÕ , que tomarão livres de perigo , mas com grande trabalho. 918 O Capitão mor teve logo a noticia defta defer- e para celebralla com as demonílrações , que me- recia , marchou para a Cidade , que mais conheceo pe- la íítuaçaõ , que pela femelhança do quê tinha íido '; por- ção, <• do EJlaâo do Maranhão, Liv.XIII. 40} porque os Hollandezes enfurecidos com a fua deígraça , Armo 1644 quizeraõ vingalla por defafogo ultimo na infenfibilidade daquelles edifícios ; mas naõ baftaraõ todas eftas ruínas para cobrir as fepulturas de mayor numero de mil e qui- nhentos , que ficarão nellas enterrados, que por mais que fejaõ vozes mudas , ferviráõ fempre de defpertado- res aos brados da fama ,_para os immortaes créditos da- quelles Por tuguezes- , que imitando bem os feus Com- mandantes Generaes António Moniz Barreiros , e An- tónio Teixeira de Mello , aííim no defprezo dos perigos, como no fofFrimento dos trabalhos , fizeraõ de huns , e outros indifloluveis argumentos para a conílancia herói- ca , que fuftentaraÕ dezafete mezes com taÕ poucas for- ças contra as formidáveis de tantos inimigos. 9 1 9 Logo que a tyrannia das Armas Hollandezas fe eftabeleceo na Capitania do Maranhão, chamou mui- tos Tapuyas de toda a cofta do Seara até o rio Camocyy que já lhe obedeciaõ ; e como os poucos , que falvaraô as vidas ( porque mais de quinhentos as facriflcaraõ no feu ferviço) tiveraõ fó por premio do muito fangue , que derramarão nelle , o de os lançarem nas deferias prayas do mefmo Camocy , fetenta léguas da Povoação de S. Luiz, ofFendidos deíla ingratidão , tratarão de vingalla. 1 920 ConfervavaÕ ainda osmefmos inimigos hum pequeno redu&o junto daquelle íitio , onde forao lan- çados os Tapuyas. queixofos ; e unidos todos para o feu defaggravo , o entrarão por furpreza , fazendo na fua guarnição tal eftrago , que de toda ella naõ efcapou hum homem $ mas naõ parando neíla demonílraçaÔ as da fua fereza , a mefma defgraça experimentou também outra defenfa femelhante , dez léguas mais acima : e in- fluídos da felicidade dos fucceíTos , fe difpozeraõ logo para outros mayores. 921 O rendimento da Fortaleza do Seara , que lhes ficava ainda na larga diftancia de cem léguas , foy o no-. Eee ii bre 1 4 404 Annaes Hifioricos h. ií, Anno 1644. í>re proje&o deites valentes bárbaros ; e como práticos naquelle Paiz , depois de aceleradas marchas , chegan- do-fe a ella huma noite j fem ferem fentidos da guarni- ção, que era numerofa , fe embofcaraõ nos fragofos matos da fua vifinhança para efperar o dia. 922 Sabiaõ elles , que com a primeira luz do Sol , a ma y 01* parte dos Soldados fe eípalhava logo por aquel- la campanha , naõ cuidando mais , que nas negociações dos intereíTes delia 5 e nao os enganando as fuás experi- ências , taõ acertadamente fe aproveitarão da occaíiaõ, que pela mefma porta , que achou aberta a ira , entrou a Fortaleza com taõ feroz impulfo , que naõ podendo reíiílillo apppofiçaõ conítantô de poucos defenfores, a defampararaõ com as vidas , fazendo venturofa a fua defgraça nòs últimos esforços da valentia do feu animo. Bem defejariaÕ imitallos os que fe acharão fora 5 porém fem mais acçaõ , que as queixas , que formarão contra a defordem da fua difciplina , fe renderão todos prizio- neiros de guerra. 923 Os valerofos índios avifaraõ logo de todos os fucceífos a António Teixeira , que cuidadofamente mandou guarnecer aquelles Prefidios ; e coroando com eftas ultimas acções a grande obra da fua condu&a na formidável guerra dos Hollandezes , informou de todas a Corte de Lisboa pelo Capitão de Infantaria Joaõ Vaf» co , fogeito muy capaz para o emprego defta commif- faõ. 924 O Capitão Paulo Soares de Avellar, que no anno paíTado deixey de viagem para Portugal com o en- cargo de reprefentar no feu Miniíleiio o perigofo efta- do das Capitanias do Maranhão , e Graõ Pará , chegou a falvamento à Corte de Lisboa ; e foraõ taõ aclivas as íuas inílancias , que nos primeiros mezes fe via deferido : porém como para as providencias , que fe lhe decreta- rão, faltavaõ os meyos, empregados todos naoppoíiçaõ dos í do EJlaâo do Maranhão , Liv.XIII. 405. • dos Caílelhanos , fe atrazou tanto a expedição delias , Anno 1644. que quando voltou ao Maranhão já achou ocioíos, com a deferçaõ dos Hollandezes , todos os foccorros , que conduzia ; mas fempre grangeou univerfaes applauibs daquelles moradores a efficacia da fua diligencia. 925 Foy Paulo Soares acompanhado deFrancifco Barradas de Mendoça , que fendo o primeiro Bacharel, que fe defpachou para aquelle Eílado com o emprego de Ouvidor Geral , defattendeo de forte as obrigações , em que fe tinha conílituido , que quafi fempre, menos zelofo delias , que da vangloria própria, fó procurava perturbar no abufo da fua authoridade o focego dos povos com grave prejuizo da utilidade publica : e como he efta a ultima memoria do prefente anno , paífarey já com a entrada do feguinte a novas matérias , ainda que fe façaõ muito menos goftofas no filencio das Armas para aquelles efpiritos , que fó fe coftumaô generofa- mente alimentar dos marciaes eftrondos. 926 Succedeo o anno de 1645, e já nos mezes ul- Ánno 1645. timos do paíTado tinha chegado à Corte de Lisboa o Capitão João Vafco com afelice nova da reftauraçaÕ da Capitania do Maranhão , que grangeou nas atten- ções do Reino os devidos applaufos j porém parece que a grandeza da acçaõ até embaraçou a da Magefta tade o feu natural exercício nas ventagens do premio ; porque conhecendo o Author defta Hiftoria na mefma Cidade de S. Luiz , naõ fó muitos netos , mas também huma filha do Capitão mór António Teixeira , em ne- nhum delles vio o menor defpacho , que podeííe fervir de gloriofo eílimulo nas recommendações da poílerida^ de , para a imitação de hum homem tamanho : com a circunílancia , de que as mercês mayores , além de fe- rem juftiffimamente merecidas das virtudes próprias , afTentavaõ na qualidade do feu nafcimento ; pois por hum inftrumento judicial fe prova a fua origem ( conti- nuada I 406 Annaes Hijloricos Armo 1645'. nuada fempre com fucceíTaõ legitima ) na cafa de Dru* mond , huma das mais illuílres do Reino de Efcocia 5 mas o certo he , que os Príncipes foberanos , quando fe conflituem em humas taes dividas, antes querem dei- xar efcrupulofa a fua confciencia pela total falta de fa- tisfaçaõ , do que oíFendida a Mageftade na inferiorida- de do defempenho. 927 Faltou com tudo o premio a António Teixei- ra para as utilidades da fua defcendencia , porém naò para os créditos da fua memoria ; porque as mefmas reaes atteftações a deixarão aífás canonizada na confir- mação de todos os poílos , que elle tinha provido em todo o tempo 7 que governou a guerra dos Hollandezes, como bem femoítra pela refoluçao de 26 deMayo do prefente anno : e fendo eíla para os epitáfios da fua fe- pultura a mercê mais honrofa , a mayor inveja , do que laítima , na defattençao do feu merecimento , nos de- vem provocar aquellas nobres cinzas. 928 Com a reftauraçaÕ da Capitania do Maranhão ficou continuando António Teixeira no governo delia >■ e o Capitão mor Feliciano Corrêa com o feu adjunto Francifco Coelho no da do Graô Pará ; e como o fim da guerra as reduzio ambas a hum tal focego, que fe naô acha nellas no prefente anno outra alguma noticia , que fe faça digna das fadigas da Hiíloria , as emprega- rey nos fucceííbs futuros. 929 Entrou o novo anno de 1646 , mas ainda com huma tal eflerilidade de memorias , que poífaõ mere- eella 5 que nenhuma encontro deíla qualidade até o dia 17 de Junho, em que na Cidade de S. Luiz do Mara- nhão tomou poífe do governo do Eftado com geraes ap- plaufos dos feus moradores o Sargento mor delle Fran- cifco Coelho de Carvalho , adjunto na Capitania do Pa- rá ao feu Capitão mor Feliciano Corrêa ; e como nefte tempo parece que havia já paífado da prefente vida o Ca- pitão Anno 1646. ' » do afiado do Maranhão, Liv.XIII. 407, pitão mor António Teixeira , fe celebrou o a&o fó Amxoiiéqó. com a aíMencia dos Miniílros da Camera , em cujas mãos deu também homenagem o Governador por dif- pofiçaó da fua Patente. 930 Francifco Coelho de Carvalho (chamado o Sardo , por diftinçaó do tio do mefmo nome , e appelli- dos , Governador primeiro do Eftado do Maranhão ) era filho illegitimo de António Coelho de Carvalho r Defembargador do Paço , e Embaixador de Portugal na Corte de França j mas fendo relevantes os ferviços" do pay , lhe ferviraó fó de recommendaçaõ , naõ de me-, recimento ; porque o que tinha próprio , o fazia digno de mayores deípachos. 951 Havia fervido pelo largo efpaça de vinte e quatro annos , aííim no Eftado do Brafil , como também no do Maranhão ; e fempre finalando-fe nas bccafióes de mayor honra , deixou a fua bem canonizada , quan- do confiantemente perfuadio o Governador Bento Ma- ciel a que trataíTe com o rigor da guerra a Armada Hol* Jandeza , que invadio a Cidade de S. Luiz , debaixo da. paz , como já fica referido. 932 A primeira acção do feu governo principiou logo a acreditar a inteireza da fua juftiça no conceito dos povos ; porque no breve termo de três dias nomeou por Capitão mor do Graõ Pará ao Capitão Paulo Soa- res deAvellar, que em 28 de Julho entrou no exerci- do defta occupaçaÒ com hum geral applaufo daquelles moradores. 93 5 Levava elle ordem do Governador ( em virtu- de de outra da Corte de Lisboa) para a depofiçaÕ do Ou» vidor Geral Francifco Barradas de Mendoça , que fen- do efcolhido por primeiro Miniftro de letras para aquel- le Eftado havia ainda taõ pouco tempo , como já fica efcrito , foraõ taes as queixas das fuás injuíliças, que provocarão à feveridade deite procedimento o animo de Annaes Hifloricos Anno 1646. de hum Príncipe de tanta bondade , como o de EIRey D.JoaÕ, quando parecia o occupavaõ todo os préd- ios cuidados da confervaçaõ da Monarquia : e execu- tada eíla difpofiçaõ , hia enchendo bem Paulo Soares , na adminiftraçaõ do feu minifterio, as expectações com que foy nelle recebido , quando lhe fuccedeo Sebaítiaõ de Lucena de Azevedo por Patente Real deíle mefmo anno , ultima noticia até o fim delle. 954 Na nova fucceífaõ de 1647 poucos mezes ha- via , que a Capitania do Pará obedecia ao Capitão mor SebaftiaÕ de Lucena , mas já com defagrado pelas aspe- rezas do feu natural 1 e aggravando-fe mais todas as ho- ras o fentimento publico na repetição delias , o chegou: a eftado de mortal o yeneno do ódio no feguinte acci- dente. 955 Recebeo elle apreíTados avifos do Comman- dante da Fortaleza do Curupá , de que nas Ilhas do Ca- bo do Norte fe achavaõ furtos oito navios Hollandezes na diligencia de commo verem todos os índios da fujei- çaõ da mefma Fortaleza para a atacarem , e depois tam- bém aquella capital da Capitania , fe o primeiro fuccef- fo lhes foíTe ventajofo : e propondo em Camera humas informações de tanto cuidado , declarou logo nella , que os moradores trataíTem de difpor a fegurança da Ci- dade , elegendo peíToa capaz para o feu governo ; por- que elle fó defenderia a Fortaleza ? de que tinha dado homenagem. 956 Os Miniflros daquelle Tribunal , comamayor parte da Nobreza , e Povo , que fe achava prefente , refponderao , que todos confeífavaõ , que elle era o feu Commandante , e que como tal tinha a obrigação de os governar , e defender 7 o que repetiao a publicas vo- zes , para que na defgraça da Capitania fe naÕ podeíie injuriar a fua conhecida fidelidade , que de novo empe- nhavaõ para a oppofiçaÕ dos Hollandezes até a ultima gota do Eãado do Maranhão , Liv.XIIL 409 gota de fangue 5 mas o Capitão mor preoccupado to- Anno 1647 do de imprefsões taõ indignas , defattendeo de forte a nobre conílancia deftas proteftações , que difíblveo a Junta com a reíbluçaõ ., que havia tomado : Que nos fataes defprezos da immortalidade da memoria , raras vezes fe coftumao ouvir os brados da honra sp&msè pa- rando ainda neíle defatino o da fua loucura , o quiz fa- zer mais injuriofo , paíTando a praticallo , porque logo que fahio da Junta , mandou entrar de guarda na mef- ma Fortaleza , com a Infantaria da fua guarnição , as Ordenanças da Cidade , deftituindo-a de todas as for- ças para a fua defenfa , quando defobrigandò-fe total- mente delia 7 a largava nas mãos dos feus moradores. 9)7 Entaõ impacientes os Mrniftros da Camera \ judicialmente lhe proteftaraõ a fuá ruina j porém ellè cerrando os ouvidos apodos os clamores , naõ tratava mais que de defprezallos : o que advertido do mefmò Tribunal , com jufto fentimento os encaminhou ao Ge- neral do Eílado ( que affiftia ainda no Maranhão ) pelo Juiz Amaro de Mendoça Furtado, também encarregan- do-o de lhe reprefentar em viva voz as vexações , què todos padeciaõ , debaixo do governo daquelle Comman- dante, para que pode/Te prover em tudo doprompto remédio , que era neceíTario para a confervaçaõ , e fo- cego publico da Capitania. 938 Teve logo noticia deita refoluçaõ" Sebaftiaõ de Lucena ; e temerofo , ou já envergonhado , da que to- maria o Governador em taõ grave matéria , quiz ante- cipar as fatisfaçoes publicas da fua honra nos defempe* nhos delia , bufcando no feu mefmo quartel , com infe- riores forças , aquelles inimigos , de que o accufavaõ , que fugia na Praça , com as grandes ventagens da fua guarnição , que fazia fempre muito mais vigorofa r a na- tural defenfa dos pátrios domicílios ; expedição para que pondo promptas dentro em breves dias as poucas Fíf ca- 410 Annaes Hiftoricos Anno 164?. canoas , que pode armar em guerra , a diligencias da fua actividade , encaminhou as fuás proas à Fortaleza do Curupá , onde defembarcou fem o menor encontro dos Hollandezes : e marchando com militar ordem fobre o forte íltio deMaricary , que todos occupavao como feu Commandante Bandergús , Soldado valerofo , def- temidamente os atacou, e defalojou delle , depois de hum combate dos mais Sanguinolentos 5 no qual tam- bém fe fmalou o Alferes António da Cofta , que foy o único , que deixou o nome às noíFas memorias , quando todos os mais Companheiros naô mereeiaõ menos as da pofteridade. 959 Cheyo de gloria militar ferecolheo a fua refi- dencia o Capitão mórSebaftiao de Lucena , juítamente entendendo j que tinha grangeado a reconciliação de todos os queixofos 5 porém elles , que endurecidos no feuodio fe lembravaõ fó dasofFenfas pafladas, infiíli- tirãô de forte nos primeiros clamores , que obrigarão o Governador a que partiíFe logo para a Cidade de Be- lém , aonde chegou nos princípios de Agofto j mas co- mo achava defaííbmbrada a Capitania do terror das Ar* mas Hollandezas pelo valor domefmo Commandante , foy diítimulando até o fim do anno todas as culpas , de que o accufavaõ , como bem merecida remuneração de tamanho ferviço. , 940 Nefte mefmo eftado entrou ainda na Capitania Anno 1648. do Pará a nova fucceíTaõ de 1648 ; mas a paixão daquel- les moradores , que no defagrado do feu Capitão mor confervava as mefmas raizes , repetio com humas taes inílancias as reprefentações das antigas queixas , que o Governador fe vio obrigado a informarfe delias por ter- mos jurídicos : e fazendo logo devaíTar do feu procedi- mento , fahio taõ convencido , que por mais que defê- jou valerlhe, mandou retirallo para a Povoação do Gu- rupy, fetenta léguas da Cidade, já com juílo receyo da I do E/lado do Maranhão > Liv.XIIL 411 da commoçaõ do povo , que com a inteireza defla de- Anno 164& monílraçaÔ ficou rebatida. 941 Chegou o Governador ao Pará com graviffi- mas queixas na íaude 5 e conhecendo bem , que por inf- tantes fe lhe aggravavaõ com perigo da vida , para preve- nir, como zeJoíb do focego publico, as confequencias da Tua morte , logo que fufpendeo o Capitão mor Se- baíliaõ de Lucena , conferio a fubítituiçaõ do feu lugar por Patente de 10 de Janeiro a Aires de Souía. Chichor- ro, efcolhido já repetidas vezes para omeímo empre- go pelas recommendações do feu merecimento. 942 Quando fahio do Maranhão tinha elle também encarregado a Capitania com a Patente de Capitão mor à conhecida capacidade do Provedor mor da Fazenda Pveal Manoel Pitta da Veiga ; mas lembrando-fe bem das alterações , que fe feguiraÕ a todo o Eílado na fal- ta do tio , primeiro Governador delle , pela intrufaõ do Provedor mor Jacome Raimundo de Noronha, accref- centou na ultima Patente , que em femelhante cafo os dous Capitães mores nomeados fícariaõ independentes nas Capitanias até a refoluçaõ do Minifterio de Portu- gal , a que dariaõ conta com a brevidade , que lhes fo£ fe poffivel , acordo prudentiífimo para atalhar todas as defordens , que ordinariamente coíluma produzir o ar- bítrio dos povos nas arrebatadas eleições de governo. 945 Ajuíladas eítas , e todas as mais difpoílções , que lhe parecerão neceíTarias para a confervaçaõ do fo- cego do Eílado , depois da fua vida , empregou entaõ todos os cuidados nas prevenções da morte , procuran- do bem fegurar na fua catholica refignaçaõ a eterna fe- licidade da alma j e para dar mais evidentes provas do ultimo defprezo das vaidades do Mundo , ordenou que fe fepultaífe o feu cadáver aporta da Igreja dosRcli- giofos de Santo António da mefma Cidade de Belém do Pará , onde faleceo dentro de poucos dias com tan- FíFii to 412 Annaes Hiíloricos * Annoi648. to fentimento , como edificação de todos aquelles mo- radores. 944 Com a morte do General do Eílado Francifco Coelho , entrou independente no governo da Capitania do Graõ Pará Aires de Soufa Ghichorro 5 e continuan- do-© COm aquelles acertos , que já tratavaô como natu- raes as taõ antigas experiências dos moradores delia , acabou no mefmo exercício o prefente anno , fem outra novidade , que mereça memoria. 945 Naõ fuccedeo affim na Capitania do Mara- nhão j porque recebida a triíle noticia do falecimento do Governador , o Bacharel António Figueira Durão ( íucceííor já do Ouvidor Geral Francifco Barradas dé Mendoça ) neíle forte accidente , que ameaçava fem- pre em todas as conquiflas a faude publica , esforçando os exceíTos , com que até ene tempo tinha procedido , provocou de forte a grande prudência do Capitão mor Manoel Pitta da Veiga, que vendo- fe já elle com todo o poder para atalhar o fatal precipício a que caminha- va ô , o mandou prezo , carregado de ferros , para o For- te do Itapicurú , vinte léguas diílante da mefma Cidade de S. Luiz j e continuando o feu governo até o fim do anno , fem outra novidade , que podeíTe alterallo , fegu- rou bem a univerfal eleição daquelles moradores. 946 Neíle geral focego entrou o novo anno de Armo 1649. xí >49j m as nos primeiros mezes durava ainda o fenti- mento publico em todo o Eílado do Maranhão pela fa- tal perda do feu Governador Francifco Coelho de Car- valho , quando enxugou as lagrimas daquelles morado- res Luiz de Magalhães , Fidalgo da Cafa Real , e Com- mendador de Santiago de Ganha na Ordem de Chriflo , que fuccedendo-Ihe no mefmo emprego , tomou poíTe delle na Cidade de S. Luiz em 17 de Fevereiro/ 947 Tinha elle fervido com conhecida honra por efpaço de vinte e três annos y em que fez à índia huma via- do EJtado do Maranhão, Liv.XIIL 41 } viagem ; e também embarcando-íè em diíFerentes Ar- Anno 1649. madas na defenfa do Reino , fe achou no anno de 1625 na da glorioía reílauraçaõ da Bahia de Todos os Santos : depois na formidável guerra deParnamhuco., da qual fahio cheyo de feridas , e aleijado de hum braço já com o pofto de Capitão de Infantaria , até que governando ultimamente a Praça de Cacheu no felice tempo da Ac-^ clamaçao de Portugal , accrefcentou de forte o feu me- recimento nas repetidas provas , que deu a todo o Mun* do da fidelidade da naçaô, que na attençaõ de tudo lhe conferio EIRey juíliíTimamente o prefente defpacho. 948 Levava ordem para conhecer do procedimen- to de Manoel Pitta da Veiga na prizaõ do Ouvidor Ge* ral António Figueira Durão j e executada na forma , que difpunha , poz eíle logo na fua liberdade com o ex- ercício do feu lugar , fufpendendo do de Provedor mor da Fazenda Real a Manoel Pitta : mas o tempo mof- trou , que já com algum género de paixão ; porque man- dando devaíTar do cafo por termos jurídicos , ainda que naõ refultou contra elle toda aquella culpa , que era ne- ceíTaria para fazer juíla dalli em diante a fua fufpenfao y o retirou com ella para o Forte do Itapicuru , fubíli-. tuindo no mefmo emprego a hum irmaÕ feu , que o acompanhou de Portugal. 949 Já fica referido , no lugar a que toca , o proce- dimento do defunto Governador Franciíco Coelho de Carvalho , na fufpenfao , e extermínio do Capitão mor do Graõ Pará Sebaíliaõ de Lucena de Azevedo , que declarou a Corte por taô juílificado , que teve elle or- dem para que ferecolheíTe a Portugal , fem que entraf- fe na Capitania , que tinha governado ; e nomeando-lhe por feu fucceíTor a Ignacio do Rego Barreto , Cavallei^ ro profeífo na Religião de S. Bento de Aviz , ( que ha- via já fervido de Provedor mor da Fazenda Real do meímo Eílado ) acompanhou do Reino o Governador Luiz :Í 414 Ánnaes Hifloricos Anno 1649. Luiz de Magalhães ; mas detendo- fe ainda na Cidade de S. Luiz até os dias últimos do mez de Junho, em \f do feguinte entrou no exercicio do feu emprego. 950 Tinha recebido no Maranhão poíitivas ordens do Governador para pôr prompta huma grande Tropa , que encarregou a Bartholomeu Barreiros de Ataide com a Patente de Capitão mor do defcobrimento do rio do Ouro , ou Lago dourado $ e trabalhou de forte Ignacio do Rego na expedição delia , que com a diligencia de pouco mais de hum mez , no dia 24 de Agofto , fahio da Cidade de Belém do Pará o feu Commandante com hum Regimento cheyo de inftrucçoes fobre o mefmo projecto. 951 Os defcobrimentos do Capitão mor Pedro Tei- xeira na viagem de Quito , authorizados mais com a re- lação do Padre ChriftovaÓ da Cunha, da Companhia de Jefus , que o acompanhou da mefma Cidade até a de Belém do Graõ Pará , como já fica referido , engana- rão de forte todos os moradores do Maranhão nas efpe- ranças das fuás riquezas , que naó ceíTavaõ de importu- nar os Governadores para a diligencia de examinallas : mas como o contratempo de Bento Maciel na fatal in- vafaõ das Armas Hollandezas , a breve duração de Pe- dro de Albuquerque , e do fegundo Francifco Coelho de Carvalho , naõ deixarão lugar para tamanho empe- nho , fó fe confeguio efte no prefente anno com a fuc- ceíTaõ do novo Governo ; porém Luiz de Magalhães , que já parece , que confiderava mais feguros thefouros para os intereíTes daquelle Eftado no defcimento de Ta- puyas para o ferviço delle , encarregando a expedição a Bartholomeu Barreiros , lhe deu também expreíTa or- dem , para que fízeíTe todos os refgates , que lhe foíTem poíliveis. 952 Em huma , e outra diligencia trabalhava ainda Aimo 1650. efte Commandante na nova fucceíTao de 1650 ; mas pa- ra II. ** ;-k\ do E/lado âo Maranhão, &V.XIII. 41 ;. ra o defengano da primeira naõ fe tendo quebrado aquel- Annô 165& le encantamento da ambição dos homens , e na fegun- da, parece, que faltando à civilidade, que lhe era preci- fa para fegurar a fua fortuna , teve em ambas taõ pou- ca , que recolhendo-fe à Cidade de Belém do Pará fem outro algum fruto das fuás fadigas , que o fentimento de fe lhe malograrem , chorou também tanto o de ficar mal avaliado o Teu procedimento , pela deva/Ta que íe tirou delle , que lhe cuílou naõ menos , que a vida. 955 O Governador ficou comprehendido na bem provada culpa deftas mefmas defordens , como o pri- meiro movei de todas ellas na relaxação dos refgates dos índios , quando fe achavaõ prohibidos , naõ fendo com as reftricções , que no prefente cafo fe naõ verifícavaõ $ e efte contratempo ( que apreflbu a morte a Bartholo- meu Barreiros ) lhe fez também perder a elle huma gran- de parte da reputação, efpecialmente nos difeurfos da Corte , que quaíi fempre com merecida laftima coftu* maÕ julgar as occaílões fó pelos fuecefíbs. 954 Sentio amargamente Luiz de Magalhães erle pezado golpe da fortuna adverfa ; mas naõ o ferio me- nos o da reíoluçaõ de Portugal fobre o provimento de feu irmaõ no emprego de Provedor mor da Fazenda Real j porque além de eflranharlho aquelle Miniílerio com exprefsões de feveridade , mandou reílituír à fua ferventia o proprietário Manoel Pitta da Veiga , por to- do o tempo que ainda lhe faltava para acabar de enchei- la j de que também fe fica conhecendo , que o procedi- dimento , que elle teve , como Capitão mor do Mara- nhão , com o Ouvidor Geral António Figueira , naõ foy mal recebido , depois de bem pezado o feu mereci- mento na fiel balança da juíliça , pela legalidade da mef- ma devaíTa. 95') No rnez de Julho do anno paíTado tinha entra- do na ocçupaçaÕ de Capitão mor do Grão Pará Ignacio do '.:lf W f • Jumoi6$o. Anno 1651. 41a Annaes Hijloricos do Rego Barreto j mas continuando no exercício delle com tanta afpereza de modo, como defattençaÕ aos in- tereíTes públicos , por tratar fó dos próprios por meyos menos lícitos. Eftas graves culpas inítantemente repre- íentadas aò Governador pelos mefmos queixofos , para ofeu juridico conhecimento, mandou fufpendello j e nomeando logo na fubftituiçaõ daquelle lugar a Aires de Souía Ghichorro, o encheo elle bem no dia 19 de Ju- nho , ultima memoria na eílerilidade do prefente anno. 956 Entrou a nova íucceíTaÕ de 1651 , e no prin- cipio delia chegarão a -Fortaleza de Santo António do Curupá cincoenta* e nove homens da Capitania de S. Paulo , com mais* algum gentio , governado tudo pelo Meílre de Campo António Rapofo , que defencami- nhándo-fe nos feus mefmos GertÕes , depois de vencer as defconhecidas afperezas de taõ longas diftancias , na eppoiíçaô fempre de vários inimigos , valerofamente pe- netrou até o grande rio das Amazonas ; pelo qual def- cendo em humas pequenas embarcações , que fe cha- mao balias , fe incorporou com os feus naturaes no fitio referido. - 9$ pregarão o fanto Evangelho aos valerofos Portuguezes , com a efpada na ma5 , na paíTagem de hum rio , bufcando-os em balfas armadas em guerra. Mas António Rapofo dando , e recebendo os mais pezados golpes na repetição deites encontros , vitorio fo de todos , entre a multidão dos mefmos inimi- gos , fem mais algum foccorro , que o dos feus Compa- nheiros, do Eflado do Maranhão , Liv. XIII. 41 7 nheiros , que cada hora fe lhe diminuíao , fe retirou Anno 1651. com as relíquias delles à Povoação do Curupá , onde lie força , que eu o deixe de todo deícançando de tan- tas fadigas , por naò achar delle outra alguma memo- ria , nem ainda do Eílado no prefente anno , quando apreíTadamente me chamaõ já as do futuro. 958 Succedeo o anno de 1652, e continuava ain- Anno 1651. da nelle a eíterilidade de noticias , quando fe recebeo no Maranhão a de eílar fupprimido o governo geral da- quelle Eílado j porque ouvindo EIRey as apaixonadas reprefentaçoes dos feus moradores , por refoluçaõ de 25 de Fevereiro o havia dividido nas duas principaes Capitanias de S. Luiz , e Graô Pará com jurifdicç ao in- dependente huma da outra, que declarava bem pelas Patentes dos feus Capitães mores. 959 Nomeou para a Capitania âo Maranhão a Bal- thafar de Soufa Pereira , Cavalleiro profeíTo na Ordem de Chriílo, que chegando à Cidade de S. Lui&; lhe en- tregou o governo Luiz de Magalhães no dia 17 de No- vembro j e partindo logo para Lisboa , foy o primeiro Governador do Maranhão 5 ( fendo já o quinto ) que lo- grou a fortuna de fe reftituir a Portugal j porque Fran- cifco Coelho de Carvalho, Bento Maciel Parente , Pe- dro de Albuquerque , e o fegundo Francifco Coelho de Carvalho , que faõ os quatro , que lhe precederão % ( naõ fallando no intrufo Jacome Raimundo de Noro- nha ) os três morrerão na Capitania do Pará , e Ben- to Maciel na Fortaleza do rio Grande , debaixo da pri- zao dos Hollandezes , devendo também ponderarfe \ como circunftancia muito efpecial , que depois da def- graça deites primeiros quatro , naÕ houve outro algum, que fentiíTe a mefma até o dia , em que fe faz eíla me- moria , tendo já mediado o longo efpaço de mais de oi- tenta annos. 960 Tinha fervido Balthafar de Soufa nas Armadas Ggg de - »* - 4 i8 Anuais Wíloricos Amo 165?, de Portugal | e guerra da Coroa contra a de Caílella com muita diítinçaõ , achando-fe nas occafiões mais ar- rifcadas das Províncias do Minho , e Traz os Montes \ e concebendo os moradores do Maranhão deftas mef- mas memorias as mais alegres efperanças da felicidade do feu governo , o receberão nelle já com os alvoroços de quem a poífuía .; mas brevemente fe transformarão todos na fatal defgraça da commoçaõ do povo : que ra- ras vezes deixaõ de fentir, outra correfpondencia as pro- meflas mais efpeciõfas na inconílancia fempre natural da chamada Fortuna. 961 Levava elle ordem, por hum dos Capítulos do feu Regimento , para pôr na fua liberdade todos , e quaefquer índios , que até aquelle tempo tiveíTem vivi- do com o nome de efcravos ; e querendo dar evidentes provas do grande zelo na a&ividade defta execução , a intentou dentro de poucos dias,, fem attençaõ alguma às confequencias de huma tal novidade , que univerfal- . mente comprehendendo os particulares intereífes de to- dos aquelles moradores , ameaçava a ruína publica ; mas para impedilla , penetrado de tanta dor , que os incenti- vos delia faziaÕ ainda muito mais aguda , fe commoveo o povo , elegendo logo por fua Praça de Armas a da mefma Cidade. 962 Moftrou-fe oíFendido o Capitão mor defta al- teração , naõ fó no que tocava ao refpeito do Príncipe , mas também ao feu próprio , medindo cegamente nefte difcurfo ultimo da fua vaidade as elevações delia pe- las foberanias incomparáveis do mefmo minifterio ; e áíTeftando logo a Praça de Armas dos fediciofos toda a artilharia, que a flanqueava, marchou para ella com a Infantaria daqueíla guarnição , em forma de peleja, ja rebentando de Soldado : porém quando queria entrar emacçao, inftigado todo da mais ardente cólera , me- lhor advertido , de que nem íempre nas difputas civis , que lb':. Ill do EJiado do Maranhão , Liv.XIII. 419. que atrevidamente coftuma fuftentar a defordem dos Anno 1651 povos , era raza5 fegura para as ventagens da fua deci« faõ a do rigor da guerra , fem outro movimento fez reti- rar aos feus quartéis todos os Soldados , prudentemente preferindo os confelhos maduros. 96) Os Religiofos da Companhia de Jefus , a que chamava a ira principal inftrumento daquella commo- çaõ nas negociações da nova ley ; também as empenha- rão na accommodaçaõ de ambos os partidos , temero- fos já das defordens do povo : mas confeílando eíle o errado modo do feu procedimento , quiz fuftentar ain« da a juftiça da caufa , proteftando , que a decifaõ delia fó a admittia na refoluçaõ do meímo Príncipe cabal- mente informado , a quem recorreria com a devida fub- miíTaõ por feus Procuradores. 964 Eílipuladas eftas condições , expedio o povo os feus CommiíTarios no mefmo navio , que havia leva- do a feu bordo o Capitão mor Balthafar de Soufa , o qual também deu conta do feu procedimento com o fuccefíb delle. E os Religiofos da Companhia , que fó tinhaõ por juíla a inalterável pratica da mefma Jey , fe empenharão todos para confirmalla 5 mas com pouca fortuna , como veremos das noticias do feguinte anno , depois da relação , que toca ainda nas deíle prefente à Capitania do Graõ Pará. 965 Na companhia de Balthafar de Soufa foy tam- bém do Reino Ignacio do Rego Barreto comodefpa- cho de Capitão mor do GraÕ Pará na independência da nova divifaõ -, e partindo logo para a Cidade de Belém , fez a fua viagem com feliz fucceíTo. Tinha fervido já o mefmo emprego , debaixo das ordens do Governador Luiz de Magalhães , que com o exercício de menos de hum anno o fufpendeo delle a clamores dos povos , co- mo fe terá lido : e julgando a Corte efte procedimento por mal juftirlcado, lhe continuou a mefma mercê 5 mas Ggg ii taõ 42 o Annaes Hifloricos Anno i6$i. IHP taõ fomente por aquelle tempo , que lhe faltava ainda para acabar de enchella no termo peremptório do pri- meiro triennio. 966 Sentirão vivamente efta refoluçaõ os morado- res da Capitania 5 porque fazendo fortes argumentos das incivilidades de Ignaeio do Rego na fujeiçaÕ de hum Governador a quem obedecia , fe lhes reprefentavao as mais horrorofas , recommendadas da vingança própria na independência do governo ; mas preferindo a tudo a fua grande fidelidade , lhe deraõ poífe delle em 5 de De- zembro fem a menor duvida. • $6j O mefmo Regimento , que quiz praticar no Maranhão Balthafar de Soufa , levava também Ignaeio do Rego para a Capitania do Grão Pará ; enaõfaben- do ainda , ou naõ o efearmentando os movimentos da Cidade de S. Luiz j fe expoz a femelhantes na fua exe- euçaÕ-em 22 do mefmo Dezembro ; mas fazendo-fe ef- ta muito mais feníivel àquelles moradores , por fer mui- to mayor a fua perda no numero de eferavos , fe altera- rão de forte , que obrigarão os Miniftros da Camera , a que e eficazmente lhe reprefentaíTern no mefmo Tribu- nal em nome do povo , que já tumultuava aporta del- le , as forçofas razões , que fe lhes orFereciaõ para a fuf- penfaõ do feu procedimento até novas ordens. 96$ Ouvio com attençaõ o Capitão a propofta da Camera ", que entre a cónfuzaõ das mefmas defordens , proteftando fempre a veneração da Mageftade , fe fob- metia toda à refoluçaõ do feu Minifterio ; e obfervan- do também , que já hia paíTando aos excefíbs últimos de amotinada aquella multidão , tratou prudentemente de lhe atalhar o curfo , fufpendendo logo a execução r que a tinha alterado. 969 Declarou com tudo ', que em quanto tardaíTe a decifaõ da Corte , a quem daria conta para a reforma do mefmo Capitulo, todos os índios, que até aquella hora ; âo Ejiado do Maranhão , Liv. XIII. 42 i hora fe poíTuíaõ com titulo de efcravos , fe ficariaõ .Anno 1652. confervando por adminiítraçaõ com o nome de forros , fem que também dalli em diante fe podeííem fazer no- vos reigates fem a comminaçaô de gravifTimas penas., que comprehenderiao toda a qualidade de peííbas ; po- rem o povo , que confentio nefta fegunda parte , repli- cou na primeira ainda commovido j e o Capitão mor a revogou logo para de todo focegallo , o que confeguio com grande fortuna. 97° Naõ fe defcuidaraõ os moradores de S. Luiz na expedição dos feus Procuradores ; porque paíTados poucos dias, depois do novo anno de 1655, entrarão Armo 165*3. na Cidade de Belém do Pará , que também deu logo a mefma commiíTaÕ ao Capitão Manoel Guedes Aranha ; e bem unidos todos nos intereíTes delia , ( que fó fegura- vaõ na permiíTaô geral dos cativeiros , e ferviço dos In* dios , que fe naõ podeíTem licitamente pofluir como ef- cravos ) fahiraô do rio da mefma Cidade para o de liik boa, promettendo4hesjá as empenhadas diligencias da fua efficacia a felicidade da negociação , de que fe en- carregarão por particulares recommendaçôes da utilida- de publica , que tratavaõ elles como própria por todos os princípios , e pela mefma conta deixando também já os feus Conftituintes cheyos de alvoroços. 1 971 Por repetidas vezes tinhaÔ pretendido os Re- ligiofos da Companhia dejefus doEílado do Brafil a fua fundação na Cidade de Belém do Pará j e impugnan- do-a fempre aquelles moradores com todos os esforços das mais melancólicas profecias , a confeguirao logo nos princípios do prefente anno , ainda entre as mefmas fataes defconfianças , fobre a negociação da Ley dos cativos , que pouco tempo antes taõ perigofamente ha- via alterado o focego publico da Capitania j mas debai- xo das claufulas , que conftaõ bem do feguinte termo % que me pareceo aqui trasladar, por ter íido fem duvida are- 'M líi Annaes Hijíoricos Anno 165-3 . a relaxação delle o principal pretexto das commoçoes do Eftado. 972 „Aos 26 dias domez dejaneiro de 1655 an " „ nos, nefta Cidade de Belém , Capitania do Graõ Pa- „ rá , eílando prefentes os Officiaes da Camera , e o Pa- „dre Reitor Joaô de Soutto-Mayor , que vinha fazer „ cafa para enfinar a Doutrina , e Latim aos filhos dos „ moradores, pelo Procurador do Concelho foy dito ao „ dito Padre Reitor , que havia de aííinar hum termo , „ em que naõ havia de entender com efcravos dos bran- „ cos , a que o dito Padre Reitor diíTe , que elle queria „ aííinar o dito termo de em tempo nenhum entender „ com efcravos de brancos , nem ainda queria adminif- „traçaõ de índios forros , mais que enfinarlhes a Dou- „ trina , e que para iíTo levava muito em goílo , que ef* „ te termo fe fízeíTe j e declarou mais , q&& eíla obriga- „ çaõ ficava tíos mais , que vieíTem a fuccederlhe. E /, affinou com os ditos Officiaes. <)-}} Entrou logo o Padre Reitor Joaõ de Soutto- Mayor na fundação do feu Collegio ( a que deu o nome de Santo Alexandre ) com aquella grande actividade , que fempre fe admira em todas as acções deites Reli- giofos ; e cumprindo bem as claufulas do termo da fua obrigação , vivia com todos aquelles moradores na mais virtuofa conformidade , quando chegou ao Pará ( pa£ fados já dez mezes fem mais outra memoria ) com o lu- gar de Superior da mefma Companhia , e a Carta que fe fegue , efcrita ao grande Padre António Vieira \ porque entendendo o catholico zelo do Portuguez Monarca , que naõ convinha ao fervi ço de Deos , nem ao feu tam- bém era decente , que hum homem tamanho fe occupaf- fe fó em taô pequeno emprego , o encarregou do mais honrofo na converfaõ de todo o gentilifmo daquelles vaftiffimos Certões , aonde o levavaõ os mefmos defe- jos com hum total defprezo das acclamaçoes de toda a Europa. »Pa- do EJiado do Maranhão, Liv.XIIl. 42 3 974 „ Padre António Vieira. Eu EIRey vos en- Anno 1655. „ vio muito faudar. Tendo confideraçaõ ao que tan- „ tas vezes me reprefentaftes fobre a refoluçaõ , com 1y que eílais de paflares ao Eílado do Maranhão , para „ profeguir nelle o caminho da ftlvaçaõ das almas , e fa- „ zer fe conheça mais a noíTa fanta Fé , me pareceo naô „ eftorvar taõ fanto , e pio intento ; e fem embargo do „ que antes tinha ordenado , acerca da vofla viagem , ,, mandando-vos tirar do navio , em que eílaveis , con- „ cedervos licença para a fazerdes , pelo fruto que delia 9 devo efperar ao ferviço de Deos , e meu 5 e para que „ melhor fe acerte, vos encommendo muito a continua- „ çao da propagação do Evangelho, que vos leva àquel- „ las partes , e que para iíTo levanteis as Igrejas , que „ vos parecer , nos lugares que para iíTo efcolheres , e „ façais as Mifsões pelo Certaô , e paragens que tiveres „ por mais convenientes, ou por mar , ou por terra , „ ou levando índios comvofco , defcendò-os do Cer- cão, ou deixando-os em Tuas Aldeãs, como então „ julgares por mais neceíTario à fua confervaçaõ , que „ de tudo terey grande contentamento , pelo muito que „ defejo , que aquellas terras fe cultivem com a nofía „ fanta Religião Catholica : e para melhor o confeguir? j } des, ordeno aos Governadores, Capitães mores , Mi- „ niílros de Juftiça f e Guerra , Capitães das Fortalezas, „ Cameras , e Povos , vos dem toda a ajuda , e favor , „ que pedirdes , affim de índios , canoas , peflbas prati- „ cas na terra , e línguas , como do mais que vos foriíé- „ ceílàrio ; para o que lhe moftrareis efta , ou a copia dei- „ Ia , que guardaráõ inviolavelmente como nella fe con- „ tem , e fazendo o contrario , me dareis logo conta, „ para mandar proceder contra os que aííim o naõ fíze-< „ rem , como me parecer juftiça. Efcrita em Lisboa em >, 21 de Outubro de 1652. REY. Vio- Anno 165*3. ■m »" Anno 1654. Annaes Hifioricos 975 Vio-fe efta Carta no Senado da Camera em 24 de Novembro ; e quando em 26 do mez de Janeiro deíle mefmo anno havia vencido o Padre Joaô de Soiu> to-Mayor as fortiffimas difficuldades , que fempre fe op- pozerao à fundação dó feu Collegio naquella Cidade , ainda debaixo das mefmas condições , que ficaô referi- das j fe alterarão ellas de tal modo dentro de poucos dias , por parecer aííim conveniente ao Padre António Vieira , que o fentimento daquelles moradores , confir- mando já a infelicidade dos primeiros prognofticos , apaixonadamente requererão no mefmo Tribunal , por* voz do fea Procurador , que fe lançaiTem fora os Reli- giofos da Companhia , por lhes naõ ferem neceiTarios. 976 Afpera na verdade pareceo com razão a todos os Miniftfos a reprefentaçao do Procurador ; mas como era feita em nome do povo, prudentemente receando as melancólicas confequencias da eommoçaò , que já ameaçava , lhe deferirão logo com a reporia , de que mandariaÕ chamar àquelle Tribunal o Padre Superior da Companhia António Vieira ; e que quando elle fe nao quizeíTe reduzir à moderação devida , o que naõ efpe- ravaÕ das fuás virtudes , tomariaõ então aquellas medi- das , que fe julgalTem por mais convenientes à utilidade publica : porém tanto que viraõ rebatida a primeira fúria , eftudando embaraços até o fim do prefente anno, fe refervou para o futuro a refoluçaó ultima , como eu também o faço , para obfervar em tudo a ordem deíla Hiíloria. 977 Seguio-fe o anno de 1654, e no principio da fua fuccelTaÕ , o Procurador novo do Senado da Came- ra de Belém do Pará , em nome do povo , repetio a pro- poíla do feu anteceíTor , porém já com muita modera- ção ; porque fó pedia , que o Padre Superior António Vieira ratiflcalTe o termo fobre a adminiftraçaõ de to- dos os índios 5 mas como efte Religiofo fe achava fan- grado , \ do Eftado do Maranhão , Liv. XIII. 42 j grado , rèfponderaÕ aquelles Miniítros : Que logo que Aimo 1654. foubeíTem da fua melhoria , defeririaÕ ao requerimento na mefma forma delle j e paíTando-fe tempo, fem fe po- der tomar pelo meímo motivo refoluçaõ alguma, ceíla-, raõ por então todas as inftancias, com que fe pretendia, como fuccede commummente nas defordens da plebe , quando confente alguma fufpenfaõ nos primeiros Ímpe- tos , em que rompe. 97% Socegadas na Capitania do Pará as alterações do anno de 1652 , pela prudente moderação do feu Ca- pitão mor Ignacio do Rego Barreto , como fica dito no lugar a que toca , tinha elle continuado no exercido do feu emprego com huma taõ geral fatisfaçaõ daquel- les moradores , que confeífavaõ já a falfidade das Tuas melancólicas profecias por boca dos applaufos : porém como nao haja coufa taõ fegura ncfta prefente vida , co« mo a incerteza delia , quando gozava da fua caduca du- ração mais livre de receyos , no dia 24 de Março o a A faltou a morte com arrebatamento taõ precipitado , que nem ainda lhe deixou lugar para as catholicas difpofi- ções , que fe fazem precifas : e como o naõ teve para a nomeação de fuccelTbr no governo da Capitania , acu- dindo logo , como zelofos do focego publico , os Minif- tros do Senado da Camera , o encarregarão ao Sargento mor Pedro Corrêa , a quem direitamente pertencia pela graduação da fua Patente. 979 Tomou poíTe o novo Commandante daquelle Governo em 50 de Março 3 mas também quando princi- piava a acreditar a fua eleição na regularidade do pro- cedimento , com quarenta dias de exercício lhe deu fim com a vida em % de Mayo , entregando as chaves da Fortaleza nas mãos do Capitão de Infantaria Domingos Machado. 980 Com a morte do Sargento mór Pedro Corrêa entrou de novo o Senado da Camera no precifo cuidado Hhh do ~ ' Annaes Hifioricos • :i )t :, Armo ià§4 do governo das Armas da Capitania 5 e difcorrendo lo- go os feus Miniíkos fobre a refoluçaõ mais convenien- te , por mais que refentidos , de que o Capitão Domin-. gos Machado fe introduzia já de poder abfoluto no met- mo minifterio , pareceo a todos , que com a entrega das chaves da Fortaleza lha tinha também feito da guarni- ção da Praça o feu defunto Commandante -, porém ain- da prudentemente receofos, de que a oppofiçaõ gran- de , que lhe fazia o Cápitaõ Frahcifcq Ferreira produzif- fe mayores defordens , mandarão a ambos , que prefen- taíTem as fuás Patentes , das quaes vendo , que fó a do primeiro era firmada pela maô Real , o houveraõ por metido de poíTe ; mas fem jurifdicçao nos moradores : e fuffocada na fua mefma origem a ameaçada commo- çao dos ânimos , fe fegurou bem o focego publico. 981 Neíle mefmo tempo havia já muito , que os Procuradores do Maranhão , e Graõ Pará, enchendo bem todas as medidas das fuás efperanças , fe achavao deferidos na Corte de Lisboa fobre a dependência do cativeiro licito do gentio bárbaro daquelles vaílilTimos Certôes ; abfoluta prohibiçaÔ , que tinha fido o motivo único das alterações dehuma , e outra Capitania : e ref- títuindo-fe a ambas no prefente anno , juftiffimamente fatisfeitos do bom fucceíTo da fua commiíTaÕ , em 5 de Junho fe regiílou nos livros da Camera de Belém do Pa- rá o defpacho delia , que he o que fe vê no feguinte traf- lado. 982 „ Eu ElRey. Faço faber aos que efta minha Pro- „ vifaõ , paíTada em forma de Ley , virem , que por fe me „ haver reprefentado por peífoas zelofas do ferviço de „ Deos , e meu , bem r e confervaçaõ do Eílado do Ma- „ ranhaõ , e fuás Capitanias , por feus Procuradores en- „ viados a mim , que da prohibiçaõ geral de poder tra- „ zer gentios cativos , que ao mefmo Eftado mandey o ? , anno paífado em companhia dos Capitães mores Bal- „ thafac do EJlado do Maranhão , Liv.XIII. 4 2 7 „ thaíar de Soufa Pereira , e Ignacio do Rego Barreto , Aimo 1654. „ naõ refultou utilidade alguma , antes cauíbu grande „ perturbação nos moradores , e prometteo inconveni- „ entes de confideraçaõ para o diante , por fer difficul- „ tofiíTimo , e quafi impoflivel de praticar darfe liberda- íf de a todos fem diftinçaõ , com intento de atalhar tu- „ do , mandey ver , e conílderar a matéria , com a at- „ tenção, que pede a qualidade delia , por Miniftros de „ letras , e inteireza , e no meu Confelho de Eftado. E „ por ultima refoluçaõ , revogando todas asProvifões, „ que até o prefente fa6 pafladas em contrario deíla : „ Hey por bem, e mando , que os Officiaes da Camera „ do Maranhão , e Pará , examinem em prefença do De- „ fembargador Joaõ Cabral de Barros, Syndicante, que ,., anda no dito Eílado , e em íua falta com os Ouvido- „ res delias , quaes dos gentios cativos , que já o forem, „ o faõ legitimamente com boa confciencia , e quaes „ nao j e que os taes exames fejao approvados pelo dito ? , Defembargador , ou Ouvidores , e julgados por elle , „ e por eíle modo poíTa dar , e dê por livres os que o ,, forem , e por cativos os que legitimamente o forao 5 „ no qual exame, e declaração fe governarás" pelas clau- „ fulas abaixo declaradas , fobre a forma , em que he li- „ cito, e refolvi, que pode , e deve haver cativeiro da- „ qui em diante, as quaes faõ as feguintes. $. Prece- „ der guerra jufta j e para fe faber fe o he , ha de conf- „ tar , que o dito gentio livre , ou vaíTallo meu impedia „ a pregação do fagrado Evangelho j e fe deixou de de- „ fender as vidas , e fazendas de meus vaíTallos em qual- ,, quer parte. £. Haverfe lançado com os inimigos da „ minha Coroa , e dado ajuda contra os meus vaíTallos. „ \. Exercitar latrocinios por mar, e por terra, infef- „ tando os caminhos , falteando , ou impedindo o co- „ mercio , e trato dos homens , para fuás fazendas , e „ lavouras. ^. Se os índios meus fubditos faltarem às Hhhii „obri- 428 Annaes Hifloricos Anno 1654. „ obrigações , que lhe forem poílas, e aceitadas nos „ princípios das fuás conquiftas , negando os tributos 7 „ e naõ obedecendo quando forem chamados para tra- „ balharem em meu ferviço , ou para pelejarem com os 7 , meus inimigos. $. Se comerem carne humana, fen- „ do meus fubditos. E precedendo as taes claufu- „ Ias , ou cada huma delias , fou fervido fe lhe poíTa fa- „ zer juftamente , e cativallos ; como o poderáõ fer „ também aquelles gentios , que eftiverem em poder de v feus inimigos atados à corda para os comerem , e meus „ vaíTallos os remirem daquelle perigo com as armas , „ ou por outra via ; e os que forem efcravos legitima- i} mente dos fenhores , a quem fe tomarão por guerra „ juíla , ou por via de comercio , e refgate , para cujo „ effeito fe poderáõ fazer entradas pelo Certaõ com „ Religiofos, que vaÕ a tratar da converfaõ do gentio ; „ e as peíToas a que fe encarregarem as taes entradas , 9 , feraõ eleitas a mais votos pelos Capitães mores das „ ditas Capitanias do Maranhão, ePará, e cada hum „ na fua pelos Officiaes da Camera delias , e pelos Pre- „ lados das Religiões , e Vigário Geral , donde o hou- „ ver ; e que offerecendo-fe nas ditas entradas alguma , y das fobreditas claufulas de cativeiro licito , fe poíTa „ ufar delia , como acima fe refere , cuja juíliflcaçaõ fe >, fará pelos Religiofos , que nas ditas entradas forem à „ converfaõ do dito gentio. E para que iílo melhor fe „ poíTa fazer fem os refpeitos particulares , que fe tem jj experimentado : Hey outro fim por bem , que ne- „ nhum Governador , ou Miniílro , que tiver fupremo „ lugar das ditas Capitanias , poíTa mandar lavrar taba- „ co por fua ordem , ou por interporia peíToa , nem ou« „ tro fruto algum da terra , nem o mandem para nenhu- „ ma parte , nem occupem , ou repartaõ índios , fenao „ por caufa publica , ou approvada , nem ponhaõ Ca- pitães nas Aldeãs , antes as deixem governar pelos ?> 1; Prin« do EJlado do Maranhão , Liv. XIII. 429 „ Principaes da fua naçaõ , que os repartirão aos Por- Anno 1654, „ tuguezes voluntariamente pelo falario coílumado 5 „ fobpena de que os que o contrario fizerem , incorraõ „ 110 perdimento dos ditos bens licitamente grangeados j ,, a primeira parte para quem o accufar , e as duas para „ a minha Fazenda , e de em fuás refidencias fe lhe pre- „ guntar por eíla culpa , e ferem caíligados , como me- „ recer a qualidade delia. Pelo que mando aos Gover- „ nadores , e Capitães mores , Officiaes das Cameras , f , mais Miniílros , e peflbas do Eílado do Maranhão , „ de qualquer qualidade , e condição que fejaõ , que ,, t odos em geral , e cada hum em particular , cumprao , f , e guardem eíla Provifaõ ? e Ley , que fe regíílará , e ef- }J tara nas Cameras em toda a boa guarda , muito inteira- „ mente , como nella fe contém , fem duvida , nem in- „ terpretaçaô alguma ; porque affim o hey por bem , fer- „ viço de Deòs , e meu , confervaçaõ dos meus vaíTal- v los j. bem, e augmento do dito Eílado j com adver- ^ tencia , que os que o contrario fizerem , mandarey caf- ,-, tigar com a demonílraçaõ , que o cafo merecer : e ef- ,, ta naô paífará pela Chancellaria , e valerá como Car« „ ta , fem embargo das Ordenações do livro fegundo i7 titulo trinta e nove , e quarenta. E fe parlou por féis ,~, vias. António Serrão a fez em Lisboa a 17 de Outu- „ bro de 1655. O Secretario Marcos Rodrigues Tino- >, coafezefcrever. REY 985 Vigoro famente fe oppozeraõ os Religiofos da Companhia de Jefus à expedição deíla nova Ley , en-* tendendo fem duvida , que a pratica delia ficava fendo muito efcrupulofa , na ambição fempre bem ponderada daquelles moradores ; mas como as repetidas reprefenta- ções deíles deixavao também menos acreditado o fer-, vor do feu zelo , capitulando-o a fua paixão como in- tereíTe próprio no ferviço dos índios , poderão entaô mais 43o Annaes Hiíloricos ■ Ânno 1654. mais os clamores dos povos. Sentio vivamente o gran- de Padre António Vieira a falfidade , com que fe atre- veo a cegueira do ódio a desfigurar o procedimento de huns Miffionarios , de que elle era o Superior ; è vendo ao mefmo paflb, que o abfoluto eílabelecimento da no- va Provifaô deixava também fem exercicio útil , na par- te mais eíTencial , a apoílolica vocação , que o conduzio àquelle Eftado com grande gloria fua no triunfo heróico dos fortes embaraços , que felhe oppozeraõ, confian- temente defprezando os fataes perigos , que ameaçava ainda ao feu ardente efpirito a repetição delles , fe refol- veo logo a bufcar , pelo meyo de todos , o alivio de tan- tas afrlicções , onde fó podia defcobrillo ; e na bahia de S. Luiz do Maranhão , metido em Junho a bordo de hum navio , que fazia viagem para Lisboa , deu fundo no rio defta Capital no mez de Novembro , depois de ter tragado muitas vezes a morte nas tormentòfas ondas do Oceano. 984 Parecia na Capitania do Pará , que ficava tu- do focegado com a pratica da prefente Ley , e difpoíi- ções do feu governo 5 porém como efte nos eflimulos íempre ambiciofos da humana natureza naõ fofFre divi- faõ i nem companhia , fe principiarão novamente a in- quietar os ânimos dos dous competidores : e para fe ata- lharem porhuma vez as melancólicas confequencias , que já ameaçavaõ as mefmas contendas , fe tomou a re- foluçaõ de eleger Commandante , que governaífe a to- dos. 985 Neíle mefmo tempo chegou à Cidade de Be- lém o Defembarga dor João Cabral de Barros , que com a commiíTaô de Syndicante fe achava entaõ naquellas Conquiftas ; o qual fendo também do mefmo parecer do Senado daCamera ( bem informado já da pouca har- monia do Governo) com a fua affiftencia fe procedeo a eleição de Capitão mór na Santa Cafa da Mifericordia em do E/lado do Maranhão , Liv.XIII. 4 3 1 em 9 de Setembro ; e pela pluralidade dos votos daMili- Anno 1654. cia , Nobreza , e Povo , que concorrerão para efte acto, acertadamente fe conferio logo aquelle emprego a Aires de Soufa Chichorro , que tomou poíTe delle no feguinte dia , reílituindo-fe à Capitania a defejada paz na reu-^ nia5 da fua obediência com huma geral fatisfaçaõ dos feus moradores. 986 Com a entrada do feu novo governo quiz o Capitão mor Aires de Soufa continuar nas verdadeiras provas , que havia dado fempre da fua muita capacida- de no exercido da mefma occupaçaõ 5 ; e ponderando com os Officiaes do Senado da Camera , e mais Minif- tros da Capitania a grande oppreíTaõ , em que a tinhaó poílo os bárbaros infultos dos Gentios rebeldes Aruanz, e Ingaibas ( que favorecidos dos Hollandezes , a quem obedeciaõ , até chegava já o feu atrevimento às vifinhas fazendas dos moradores , também ameaçando a mefma Cidade) com uniforme acordo ferefolveo a lhes fazer a guerra , nomeando logo por feu Commandante ao Sar- gento mor JoaÕ Bitancor Moniz , Official\le muita di£ tinçaõ. 987 Sahio do rio de Êelem do Pará efte Comman- dante com o pequeno corpo de fetenta Soldados , e qua- trocentos índios , a bordo tudo das embarcações , que eraõ neceíTarias para o feu tranfporte $ e defembarcan- do nas primeiras terras inimigas , fe poftou no fitio , que lhe pareceo mais accommodado : mas querendo melhor juílificar a guerra nas propoílas da paz , a mandou oíFe- recer aos mefmos rebeldes , também fegurando-lhes o perdão geral de todas as culpas , que tinhaõ comettido, principalmente na feparaçao da vaíTallagem Portugue- za , fe com verdadeiro arrependimento tornaíTem a buf- calla. 988 Encarregou efta diligencia ao Sargento mor feu immediato Subalterno, com amayor porção das fuás forças , 4)2 Annaes Hifioricos ,i •"■:■' ihl Anno 1654. forças ; e com o refto delias , fe fortificou no mefmo fí- tio com huma trincheira de páo a pique , que com o no- me de Cahiçára coftuma fer naquelles Paizes ordinária defenfa às invasões dos bárbaros , de que elles também ufaõ : porém o Commandante do deftacamento , a quem o defcuido daquellas idades naõ deixou outro nome , pe- netrando logo os CertÕes dos rebeldes , para lhes pro- por as praticas da paz com tamanhas ventagens , def- prezadas todas , foy recebido com taõ cruel guerra , que aproveitando-fe os mefmos Tapuyas do conhecimento do terreno , até o chegarão a pôr em fitio fobre a fua marcha j e ainda que o rompeo com arroj amento o mais valerofo, foy já com a perda de alguma gente, que lhe ficou no campo , íèndo muita mais a que levou ferida. 989 Naõ fe contentarão eftas racionaes feras com as primeiras provas da fua obílinaçaÕ , fomentada fem- pre dos HoIIandezes, por aquella parte noflbs inimigos ; porque bufcaraõ logo Joaõ Bitancor Moniz , fabendo- fe fervir da debilidade , em que já o fuppunhaÕ com a divifaõ do deftacamento , que tinhaõ atacado ; porém elle, ainda que nas forças taõ enfraquecido , fe achava taõ robufto no animo , que efcarmentou bem a confian- ça, de tantos bárbaros no feu fatal deftroço. 990 Vitoriofo efte Commandante , fe manteve ain- da nos meímos reparos $ mas recolhendo-fe o feu defta- camento com a grande perda , que tinha padecido , aífim no combate do Gentio rebelde, como nas doenças, que lhe naõ fízeraÕ guerra menos formidável , pareceo a to- dos , que a coníervaçaõ daquelle fitio lhes ficava fendo conhecidamente perigofa , por irem lavrando com hu- ma tal fúria as enfermidades , que já fe fentiaõ como epidemia. 991 Era hum dos Capitulos do feu Regimento, que defembaraçado da fua primeira expedição , fe em- pregaíTe todo no defcimento do Gentio dos matos , para forne- ff ;' * do EJlaâo do Maranhão ,'Liv.XIIL 45 5 fornecimento- das Aldeãs domefticas , de que além dá Atino 165% utilidade publica no ferviço das Capitanias , fe tirava também a mayor de todas na reducçaõ de muitas almas ao grémio da Igreja : e metendo-fe a bordo das fuás ca- noas ,- que confervou fempre no mefmo porto do feu acampamento , navegou na volta do famofo rio das Amazonas ; do qual entrando logo no do Jary , que def- emboca nelle , reduzio à Monarquia Lufitana o grande Reino dos Aruaquizes , Tapuyas bellicofos ; mas com a condição de que- os vingaria do Gentio Anybal feu mortal inimigo. "V 992 -Para fatisfaçaõ da fua palavra fez JoaÕ Bitan- corhum deítacamento , que fe compunha de cincoentá Soldados, e duzentos índios ; e aggregando-lhes mais oitocentos, dos empenhados nefta expedição , nomeou por Commandante delia o feu Sargento mor : mas ain- da com expreíía ordem , de que primeiro , que declarai* fe a guerra , procuraffe efcúfalla com praticas de paz , folicitando por eíle meyo a uniaò daquelles mefmos bar^ baros, em que também ficava fegurando fem o rigor das armas a fujeiçaõ de todos. ç 995 - Evidentes eraõ as premeditadas confequençias defte argumento , tao militar , como politico , fe as fuás premiífas fe verificaíTem j porém fuecedeo tanto pelo contrario, que o Gentio Anybal, (parece) que beben- do os valentes efpiritos do heróico nome da fua naçaõ ) abfolutamente defprezando todas- ás propoftas pacificas do Commandante Portuguez > o récebeo com o rigor da guerra , bem defendido- de hurna cahiçára j e como pratico no Paiz, nao fe contentando com a oppofiçaÕ das noíTas forças , paífou a tanto o feu atrevimento, que intentou derrotallas com huma fahida vigorofa. 994 Vio-fe atacado pela retaguarda o Sargento mor , quando na fua frente contendia também com os mefmos Tapuyas , fortificados da fua cahiçára 5 mas lii fa- 434 Annaes Hifioricos í ih .*■ i Anno 1654. fabendo fervirfe da valentia do feu animo , vendo- fe en- tre dous perigos , efcolheo o mayor , efcalando a trin- cheira , que fe lhe oppunha diante dos olhos com hum fatal eftrago da multidão de bárbaros , que a guarnecia ; e afugentados todos os mais , que lhe difputavaõ a cam- panha , ficou fenhor delia. 99$ Bem fatisfeitos os Aruaquizes do nobre defem- penho deftes valerofos Portuguezes na vingança dos íeus inimigos , fe recolherão às fuás terras ufanos da vi- toria j e cheyo de defpojos para a Cidade do Pará Joaô Bitancor Moniz, por feverjá taÕ debilitado nas fuás forças , que naõ podia fuílentar o credito delias na op- pofiçaõ de novos contrários. 996 Nos fucceífos deíla expedição he fem duvida , que haveria muitos , que fe íinalaíTem 5 mas além dos dous Comman dantes , o fegundo fó pelo lugar , e o pri- meiro também pelo nome , o deixou taô fomente às re- commendações da poíleridade o Alferes António Barra- das de Mendoça , ( filho do Ouvidor Geral Francifco Barradas ) fendo dos primeiros , que forçarão a trinchei- ra dos inimigos com deílemido animo. 99j Na Cidade de S. Luiz , depois de íòcegada a fua cpmmoçaô fobre a liberdade dos Tapuyas efcravos , e íegurado mais o mefmo focego com a favorável refo- luçaô da Corte , continuava o feu governo o Capitão mor Balthafar de Soufa com bem merecida fatisfaçaô daquelles moradores ; e fem outra alguma novidade , que fe recommende às noíTas memorias , fe acabou o prefente anno em huma , e outra Capitania. . ANNAES ANNAES HISTÓRICOS DO ESTADO DO MARANHÃO. LIVRO XIV. SUMMARIO NE-SE outra vez o EJiado do Maranhão 1 , e fe notnea porfeu Governador , e Capitão General a André Vidal de Negreiros, Elogio dofeu merecimento. Chega a Cidade de S. Luiz , da qual pajja logo a de Belém do Grão Pará. ^Defeja mii' dar ejia Povoação para a Ilha dejoannes , e(jue fe faça outra na Ponta do. Mel r o que nao tem effeito. Re colhe» fe a Cidade de S. Luiz, y encarregando a Capitania do Gr ao Pará , com a Patente de Capitão mòr , a-JLuiz Pi- menta de Moraes. Sue cede tio governo delia Feliciano Corrêa . Pajfa por terra André Vidal a oceupar o G over- no da Provinda de Parnamhuco , deixando encarregado o do E/ia do do Maranhão a Agojlinho Corrêa. Sue cede no governo geral D. Pedro de Mello. Elogio das fuás _....,, lii ii acções. •1(1 1\ 456 acçóes Annaes Hifloricos Entra no emprego de Capitão mor do Grão Pará Marçal Nunes da Cofia. Clamores dos povos doEJiado do Maranhão fobre a adminijlraqaÔ dos índios das Al- deãs , e reprefentaqao' do Senado da Camera de Belém do Pará ao Padre ^António Vieira ', Superior dás Mifsoes. Repçjia do me/mo Superior , e novas injiancias do Senado, (juejá defaPtendidas pajfao 1 a prejenqa do Governador , e ao Minijlerio de Portugal. ^Alteração' do povo deS. Luiz para a expulfac? dos Religiofos da Companhia dejejus , e a execução delia f fem que o Governador pojfa impedil» la. Juízos fobre o procedimento do mejmo General nefia novidade, e a verdade delles. Ejcreve huma Carta ao Padre António Vieira , que elle encaminha ao Senado da Camera de Belém do Pará com huma largujjjima repre- fentaqaò 1 fua. Repofta do Senado , e verdadeira anatho* mia nos f eus fenti mentos , por mais que procura defmen- til los nas protejlaqoes da fidelidade. Encarrega lhe ejla com tad politicas , como zelofas exprejsoes D, Pedro de Mello , e avifa a Corte dos movimentos do Maranhão , a que também faz o Senado da Camera j mas ao mejmo tem- po procura efie unir a fediqao do povo o de Belém do Graò Pará. Anno 1655. 998 UCCEDEO o anno de 165;, e nao paíTava ainda da breve duração de dezoito mezes a di« vifao do Eílado do Maranhão, j quando juftamente íè vio reíli- tuido à merecida honra de go- verno geral 5 porque conhe- cendo o grande Rey D. Joaõ IV. muito à eufta do feu catholico fentimento , que o que lhe haviaô reprefenta- do com exprefs<3es taõ vivas aquelles moradores , era mais producçaõ do natural orgulho da antiga liberdade , que amargamente choravaÕ reprimida pela iuprema au- thoridade do Eílado do Maranhão, Liv. XIV. 457 thoridade dos Governadores , que das encarecidas ve- Anno 165^* xações , que eítes lhes faziaõ. Nefta confideraçaõ , com a dos graves damnos , que fe tinhaÔ feguido ao íeu Real ferviço da divifaõ do Eílado , ( como declara bem na introducçaõ do Regimento , que mandou tam- bém lavrar para elle ) tornou a reunillo 5 e por refolu- çaõ de 25 de Agofto do anno páflado , nomeou por feu Governador, e Capitão General a André Vidal de Ne- greiros, Fidalgo da fua Cafa, Commendador de S. Pe- dro do Sul , e Alcaide mor das Villas de Marialva , e Moreira j cujo nome fe tinha feito celebre a toda a America , e Europa na porfiada guerra dos Hollande- zes , fobre a confervaçaõ do intrufo dominio de Par- nambuco , occupado pelas fuás armas no mez de Feve- reiro de 1 6 5 o -, governando a Monarquia de Portugal Fi* lippe IV. de Caílella. 999 Como foy nomeado para eíte emprego já fora de monção , efperou pela das náos da índia do prefente anno j e depois de feparado delias , tomando a derrota da Cidade de S. Luiz , deu fundo na bahia daquella Ca- pitai com feliz viagem em 1 1 de Mayo : e no mefmo dia lhe entregou o governo o Capitão mor Balthafar de Soufa Pereira com taõ geraes applaufos daquelles mora- dores , que defordenados nas demonítrações publicas dos feus alvoroços , até chegarão eftes a parecer tumul- tos j procedimento muito ordinário no Mundo politico. * 1000 PaíTados cinco dias, com trinta e hum com» pletos de huma boa viagem , que teve principio no rio de Lisboa em 16 de Abril , entrou também naquella ba- hia o Padre António Vieira , inteiramente deferido nas juftas pretenções , com que fahio delia o anno antece- dente j porque ainda que attendendo a Corte aos cla- mores dos povos , fobre a abfoluta liberdade dos Ta- puyas cativos , havia reformado efta primeira refoluçaô com a de 17 de Outubro de 1653 , ouvindo de novo as zelo- 4$8 • - Annaes Hyloricos > Ânnoié^V zelofas reprefentaçòes daquelle digno Superior de tan- tos Apoftolicos Operários , lhe pareceo reftringir a re- forma pela Provifaõ de 9 de Abril deite prefente anno com humas providencias taô cheyas de juíliça , que ainda os mefmos a quem mortincavaõ pela grande par- te V que fiçavaõ perdendo nos intereíTes próprios , a re- ceberão fem a menor difputa, que defacreditaífe a fua obediência y mas antes o Senado da Camera , para dar delia as provas mais publicas , foy comprimentar logo em corpo de ceremonia o Padre Vieira , condu&or da Ley , rendendo-lhe as graças pelos grandes bens , que negociara para aquelle povo. Affim o efcreve o Padre André de Barros , da Companhia de Jefus , na Vida do Apoílolico Padre António Vieira , chamado por anto- nomafia o Grande, pag. 1 8; : e o novo General do Ef- tado , fegurado bem o íocego publico da Capitania com a áííiílencia fó de três mézes , que zelofamente diílri- buío nas ordinárias dependências daquelle Governo j paífou à Cidade de Belém do Pará , aonde chegando nos princípios logo de Setembro, ainda que as primeiras vo« zes da fua grande fama occupavaÕ já , defde o Mara- nhão, todas as attençoes deites moradores nas a&ivas imprefsões da vifta , fé augmentaraô de forte , que pa- recerão novas. J . 1001 Para poder dar mais largas noticias do Paiz , poucos dias depois da fua entrada publica , paííou à Ilha grande dejoannes j porém voltando logo para o Pará , foy já taÕ namorado da principal Aldeã dos ín- dios Aruanz feus habitadores , que informou a Corte , de que mudando-fe para o mefmo fitio aquella Cidade f melhoraria muito de intereíTes , tanto na faude dos mo- radores delia pela benignidade do feu clima , como nos avanços das fuás lavouras , por ferem as terras muito rnais pingues , além da regularidade do terreno , para a áefenfa natural com fufficiente furgidouro para todo o gene- [ do Ejladô do Maranhão, Liv.XIV. 459 género de embarcações , que também faltava no rio Anno 1655. da Cidade de Belém. 1002 Mas bem parece, que naô advertia André Vidal , ( cego fem duvida do amor próprio neíle parto do feu entendimento , ou também fuggerido de lifon- geiros práticos do mefmo Paiz , que lho fariaÕ conce- ber por apaixonadas informações ) que era taõ arrifca- da toda aquella coita , tanto pela braveza , como pelos feus baixos , que o navio , que fe lhe aviíínhava , obri- gado dos ventos , ou das fortes correntes da formidável boca do famofo rio das Amazonas , naõ fendo bom de vela , principalmente pela bolina , raras vezes fugia à fatalidade de hum naufrágio ; e que em quanto também às taõ encarecidas qualidades das terras , ainda que al- gumas foíTem muito boas para a criação de gado va- cum , efpecialmente no diítri&o do Marajó , na mayor parte fe tinhaõ por inúteis para todo o género de lavou- ras , neceíTarias fempre para a fuílentaçaõ da vida hu- mana , humas por fecas , outras por pantanofas. 1005 Também aconfelhava o mefmo General fe povoaíle a ponta , que fe chama do Mel ; e lie certo , que dobrando-fe para dentro do rio de Belém do Pará , eílá huma efpaçofa enfeada , fegura ancoragem para to- do o lote de embarcações , e na terra delia , em diftan- cia de pouco mais de hum quarto de légua da mefma ponta , hum agradável fitio da invocação de NoíTa Se- nhora do Livramento , fazenda dos Religiofos Carme- litas, três léguas da Cidade , que era fem duvida o mais proporcionado para huma nobre Povoação j porque além da muita formofura do terreno mais folido , cami- -nha fempre com a mefma , até defpenharfe fobre o mar, flcando-lhe taõ eminentes as duas faces , que olhaÕ para elle , muralhas bem formadas da fabia natureza , que fortificando-fe pela parte da terra , baila por aquella hum parapeito de fachina para refiílir com regularidade àex- I* H l , • Annaes íliftoricos \ Armo ió^^. à expugnaçao mais vigorofa : e levantando-fe huma, Fortaleza na chamada Ilha de Tatuóca , pouco mais de três léguas do mefmo íitio , e outra na ponta do Mof- queiro 2 que fe correfpondem a tiro de peça de canhão, fendo a boca de barra , ficava também eíla fortiffima- mente defendida j porque ainda que por entre humas Ilhas ha outro canal , que fe communica com o mefmo rio da Cidade nas vifmhanças delia , além de fer muito perigoíb para navios grandes , neceffitao todos dos mais fcientes práticos ? que fe naõ acharáo com facilidade nos próprios naturaesy quanto mais nos eílranhos , quando na incorrupta fidelidade Portugueza fó poderáÕ fer eí- tes os feus inimigos. 1004 Com tudo oincanfavel zelo do Governador- indagou bem, que o grande perigo , que corriaô as em* barcaçpes , que bufcavaÕ o rio de Belém do Pará, naf- eia commummente , de que fieando-lhe a fua barra na r krga diílancia de mais de féis léguas , para a demanda- rem os Pilotos, lhes faltava fempre o verdadeiro conhe-: cimento delia f porque para haverem de a marcar , che- gando-íèbcoíla , como eíla he muito efparcellada , fer arrifcavaò nos baixos 5 e fe fe queria5 defviar delles > fa^ zendo-fe ao mar/ logo que deícobriao a primeira terra y defcahiaô de forte muitas vezes f impelíidas das rápidas» correntes do procellofo rio das Amazonas , que arriba* vaô às índias Caftelhaoas 5 e para falvaílas de hum > e outro trabalho ) níandou levantar huma Atalaya nas vi- fínhanças da mefma barra , no íltio mais alto da cofia > (chamado hoje das Salinas ,í pelas que alli lavra a Fa- zenda Real ) onde pondo huma peça de artilharia , dif- poz , que apparecendo qualquer embarcação , fe difpa- raífe Jogo y porque fe claramente naõ percebeífe o ef- trondo do tiro , fempre veria o fumo , repetindo -fe o mefmo final, que lhe ferviria para fugir da terra , levan- do-a já reconhecida para fegurar a fua entrada na cer-! 'Z .; teza do Eflado do Maranhão ) *Liv. XIV. %Pj teza do ponto , o que executou , e eítabeleceo com tan* Anno 1655. ta utilidade , como inculcaõ bem todos os Roteiros ; e Cartas Hydrografícas deíla navegação. 1005 Com eftas , e outras providencias , já defem- baraçado da Capitania do Pará , determinou voltar pa- ra a do Maranhão 5 e achando-fe no fim do prefente an- no, com os princípios de Dezembro , a 8 deíle mez fe poz a caminho, encarregando aquelle Governo , com a Patente de Capitão mor , ao Sargento mor Luiz Pi- menta de Moraes , que no mefmo dia deu homenagem , e tomou poíTe delle. 1006 Logo nos princípios do novo anno de 1656 , Anno 1656. chegou André Vidal à Cidade de S. Luiz com feliz via- gem -, e achando tudo naquelle focego , que bem lhe feguraraõ as fuás zelofas difpofiçoes , continuou nellas com igual cuidado , multiplicando nos acertos a fua mefma fama. 1007 Na Capitania do Pará con ferva va também o Capitão mor Luiz Pimenta a boa aceitação , que juíla» mente merecia no exercicio do feu emprego ; porém vendo-fe com a obrigação de fe recolher a Portugal , o encarregou o Governador a Feliciano Corrêa, que o tinha já fervido com fatisfaçao daquelles moradores , e em 16 de Agoílo tomou poífe delle , paíTando logo o feu anteceílbr à Cidade de S. Luiz , para fazer delia a fua jornada pela efcaía de Parnambuco , a que deu prin- cipio dentro de poucos dias na companhia do mefmo André Vidal. 1008 A grandeza deElRey D. Joaõ fe exercitou de forte no premio dos ferviços deíle General , que além de outras mercês , lhe fez ao mefmo tempo , com a do governo do E Ma do do Maranhão , a das futuras fuc- cefsões dos da Capitania de Parnambuco , e Reino de Angola , dando-lhe também faculdade , para que ainda que no Maranhão naÔ tiveííe cheyo o feu triennio , Kkk po- Ilifl 1 442 Arinaes Hiâoricos tiityi Âflno 165-6, podeíTe encarregallo à pefíba , que lhe pareceíTe para fucceder no de Parnambuco : e vagando eíle pela pro- moção do Medre de Campo General Francifco Barreto ao do Eílado do Brafil , paííòu a occupallo 5 he certo , porém , que chamado çom mais alguma preíTa da juíla vaidade de ter fido o theatro das heróicas reprefenta- ções do feu valor na formidável guerra dos Hollandezes. 1009 Era 25 do mez de Setembro fahio por terra André Vidal da Cidade de S. Luiz na direitura do feu novo governo , deixando encarregado o do Eílado do Maranhão ( em que fe deteve menos deannoemeyo) aò Sargento mor Agoílinho Corrêa , por nomeação do mefmo dia já com homenagem nas fuás mãos j e como pela mefma Patente , que lhe paíTou , o havia por meti- do de poíTe daquelle emprego , entrou também logo no exercício delle fem a menor duvida. 1 o 1 o Tinha fervido Agoílinho Corrêa nas Conquif- tas da America , aííim Portugueza , como Caíleíhana , por mais de quarenta annos ; e como a mayor parte ha- via fido na natural defenfa daquelle mefmo Eílado , dif- tinguindo-fe fempre nas occafiões delia , como bem mof- trou nas do Cabo do Norte , e vigorofa guerra dos Hol- landezes , fobre a confervaçaõ da Capitania de S. Luiz , de que também era morador, mereceo eíle provimento huma geral aceitação , que feguravaõ cada dia mais as acertadas difpofições da fuavidade do feu governo. 1 01 1 A lamentável perda do grande Rey D. Joaõ IV. fez fatal fem duvida a Monarquia Portugueza o dia 6 do mez de Novembro do anno paíTado ; e na fuccef- âijijo i$$y. fao nova de 1657 , communicando-fe ao Eílado do Ma- ranhão a mefma defgraça pelos avifos delia , penetrou vivamente taÓ aguda dor todos os corações daquelles moradores. 1 o 1 2 Com a fatalidade deRe forte accidente , cref- ceo mais o perigo da formidável guerra Caíleíhana ; e - - pela do Ejiado do Maranhão, Liv. XIV. 44 J pela mefma conta o devido cuidado em todas as Con- Anão 1657. quiítas Portuguezas para a oppoíiçaõ das fuás Armas : porém quando às do Maranhão faltavaõ as forças , o deílemido animo do feu Commandante Agoftinho Cor* rea , reputando fempre fó pela qualidade as poucas , que tinha para a defenfa de todo o Eílado , focegadamente fe empregava nas difpofições delia : e exercitando com a mefma igualdade todas as mais funções do feu minif- terio , multiplicava cada inftante os applaufos do nome. 1 01 5 Seguio-fe o anno de 1 65 8 , fem outra novida- Anno 1658. de , que mereça memoria $ e continuando Agoftinho Corrêa na reda adminiftraçao da juíliça ,■ com que fe- gurava a felicidade do feu governo , o entregou na Ci- dade de S. Luiz em 16 de Junho a D. Pedro de Mello, Commendador da Ordem deChriílo, das Commendas de Santa Maria de Anchete , e de Gulfar , Fidalgo taõ illuílre pelo merecimento , como pela origem. 1014 Tinha elle fervido na Provincia do Alentejo com o pofto de Capitão de Infantaria , que exercitava na Praça de Elvas , quando a íitiou o Marquez de Tor- recuza , General das Tropas Caftelhanas ; e continuan- do na mefma guerra , chegou a occupar o governo das Armas da Comarca do Campo de Ourique com tanta diftinçaÓ no feu procedimento , que na attençaõ delia, e também na da fua peíToa , lhe foy conferido o prefen- tedefpacho, por refoluçaõ da Rainha Regente de iS de Março do anno paífado. 1015 Levava ordem , com efpecraes recommenda- çoes , para fe prevenir para a oppofiçaõ dos Hollande- zes , por haver a Corte de Lisboa declarado a guerra à fua Republica , com razaõ oífendida da infolencia das fuás pretençoes 5 mas como os moradores do Mara- nhão , além de terem a memoria taõ frefca das muitas vezes , que os tinhao vencido até lançallos fora da oc- cupaçaõ tyrannica da Capitania com grande gloria fua Kkkii ou- 444 Annaes Hijloricos ÁntiQ 1658. ouviaõ também fem horror havia mais de dezafete an- nos: os marciaes eílrondos da reftauraçaõ de Portugal } pouco cuftou a D. Pedro de Mello a difpor os ânimos •de todo o Eftado para a defenfa delle. 1016 Na companhia do Governador hia também Marçal Nunes da Cofta , Cavalleiro do habito de Chrif- to , com o emprego de CapitaÕ mór doGraõ Pará $ e recebendo logo todas as ordens neceíTarias para poder entrar na occupaçaõ delle , partio para a Cidade de Be- lém : porém paíTados poucos dias efcreveo D. Pedro ao Senado da Camera , que lhe naõ déífe poíTe fem nova ordem íua , pelas razões forçofas, que o obrigavao a dilatallaj fuppondo, que eíle ávifo, queexpedio a to- da a diligencia , fe anteciparia à íua chegada ; e que no cáfo , que aíTim naõ fuccedeíTe , fe procederia do mef- mo modo na fufpenfaõ do feu exercício. 1017 No dia 24 do mez de Julho entrou elle na- qíiella Capital da Capitania j e prefentando a fua Paten- te ao Senado da Camera com o cumpra-fe do Gover- nador, lho naõ quiz pôr efte Tribunal , pelas novas or- dens , que com effeito tinha recebido ; mas em 19 de Setembro , chegando-lhe outras , que já as revogavaõ , lhe deu logo pofle fem a menor duvida. 1.01 8 Tinha fervido Marçal Nunes da Cofta por e£ paço de vinte e dous annos , nos quaes fe embarcou em quatro Armadas j e eftando prezo pelo Miniílerio de Caftella no feliz tempo da Acclamaçaõ de Portugal , fugio para o Reino , onde fe achou na Praça de Elvas , no fitio do Marquez de Torrecuza , já com o pofto de Capitão de Infantaria : com o mefmo continuou na de- fenfa da Pátria até o anno de 1649 , em que tornou a embarcar para o Eftado do Brafil com o emprego de Ca- pitão de Mar, e Guerra de huma náo Ingleza, na qual pelejou valerofamente com nove de Hollanda , que lhe . fahiraõ da enfeada do Recife de Parnambuco ; e pro- cedendo do Eflado do Maranhão , Liv. XIV. 44 J cedendo fempre com igual diítinçaõ, foy attendido o Annoi65&, feu merecimento da grandeza Real. i o 1 9 Acompanhado de tantas acções , e taõ cheyas de honra , entrou no exercicio deíla occupaçaõ ; porém defvanecendo todas as efperanças com que foy nella re- cebido , os defabrimentos do feu modo , fe principiarão a juftiflcar dentro de poucos dias as primeiras duvidas do Governador, que dilatarão a fua poíTe : e fe o fenti- mento daquelles moradores fe naÕ achaíTe occupado to- do em dor , que lhes chegava mais aos corações , paíTa^ ria logo à Cidade de S. Luiz a repetição de taõ geraes clamores. 1020 Sentia vivamente a Capitania do Pará a falta de fervos j e na fucceíTaõ do novo anno de 1659, fe ouviao já mais defentoadas as queixas , que fazia dos Miflionarios da Companhia de Jefus fobre a adminifírá- çaõ dos índios forros , com o fundamento , de que ar- rogando-fe em todas as Aldeãs a jurifdicçaõ temporal , e politica, que lhes nao era permittida , ufavaõ delia com poder abfoluto 5 mas refígnando fempre na juíliça do Principe cabalmente informado a fatisfaçaÕ dos mef- mos clamores , os encaminhou o Senado da Camera à prefença da Rainha Regente por huma larga reprefen- taçao. 1021 Pretendia a Capitania, que fe declarafíe aos Miflionarios das Aldeãs dos índios \ que fó tinhaÕ nel- les a jurifdicçaõ efpiritual , como feus Párocos , que eraõ j e perfuadindo ao mefmo tempo , que a tempo- ral , que exercitavaõ fem verdadeiro titulo , ameaçava huma fatal ruina a todo aquelle Eflado : também aíTe- verava , que concorria muito para elía a tranfgreflaõ da Ley , fobre a ultima forma dos juílos cativeiros , pafla- da em 9 de Abril de 1655 5 porque as epiquêas dos mef- mosjefuitas a accrefcentavaõ , e diminuíaõ , quando havia fido negociada pelas fuás próprias intelligencias ) como U6 Anííaés Hifioticos í Anno 1659. como redacção da de 17 de Outubro de 1655 , que fe traslada nefta Hiíloria na ordem das noticias : e como eftas vozes cobriao bem os interefles particulares com capa dos públicos,, hiaõ tomando fempre muito mayo- res forças . 1022 Ouvia claramente os eítrondoíbs eccos de taô publicas queixas o grande Padre António Vieira j mas tratando-âs fempre por injuílas , por entender , que a primeira júri fdicçaõ dependia tanto da fegunda , que fe naÓ podia fuílentar fem ella, empenhava fó as fuás dili- gencias para introduzir nos Miniftros da Corte efte mef- mo conceito , o que confeguindo com felicidade todos os clamores da Capitania do Pará | avaliando-fe como , 1 apaixonados , era5 mal attendidos : porém aquelles mo- radores, efperando ainda os melhoramentos da fua for- tuna na repetição delles , entre as fuás mefmas impa- ciências , fabiao reduzirfe à moderação devida j e con- tinuando do mefmo modo até o fim do anno , o teve ef- te em todo o Eítado do Maranhão fem outra novidade digna de memoria. 1023 Ainda neíla mefma íituaçaÕ achou o novo an* Ànno 1660. no de 1660 todos aquelles povos ; porque naõ havia al- teração nelles , que perturbaíTe o focego publico , para o que he fem duvida , que concorriao na principal par- te as acertadas difpofições do feu Governador D. Pe- dro de Mello 5 mas os Offieiaes do Senado da Camera de Belém do Pará , que preveniaõ bem os fucceíTos fu- turos , logo no dia 12 do mez de Janeiro , efcreverao aos da Cidade de S. Luiz , pedindo-lhes fe uniífem com elles para fe fegurarem na mefma uniaô os communs in- terefles de huma y e outra Capitania ; porque communi- cando-fe reciprocamente todos os accidentes , em que perigaíTem , fe lhes acudiria com remédio mais promp- to , e de mais efficacia j e os do Maranhão , depois de . alguns mezes de politicas irrefoluções , fe conformarão com do Eflado do Maranhão , Liv. XIV- 447'. com a propoíta, refpondendo : Que fempre lhes fariaõ^ Atino i^o, os zelofos avifos , que lhes parece ífem neceflarios , a que naõ davaõ já principio por falta de matéria , que mereceíTe aquelle cuidado. 1024 Agradecerão os do Pará aos do Maranhão o propicio animo ; com que fe achavaõ para as aífiften- cias da utilidade publica j e depois de lhes encarecerem as opprefsões grandes , que padeciaõ , principalmente com a jurifdicçaõ , que exercitavaÕ os Miífionarios no governo dos índios, a que davaõ o nome de defpotico, lhes pedirão com vivas inftancias quizeflèm entrar logo na dependência de remediallas , reprefentando-as ao Governador Geral do Eílado , ( que até aquelle tempo reíidia fó na Cidade de S. Luiz , como cabeça delle ) para o que os conftituíaõ feus Procuradores ; mas. já fe- gurando-lhes , que quando fe efcufaíTem deita commif- íàõ, fe viaõ obrigados a feguir os povos no total aban- dono dos pátrios domicilios , por naõ experimentarem a ultima miferia , que apreíTadamente os ameaçava. 1025 Aceitarão a procuração aquelles Miniftrosj porem coníiderando menos juílificada , do que encare- cida a reprefentaçaõ , refponderaõ logo /que fe devia fupprimir a mayor parte delia , fabendo bem moítrallo com humas razões taõ cheyas de prudência , como de urbanidade ; e os do Pará mais convencidos , do que fa- tisfeitos deftas reflexões , fe accommodaraõ com as fuás queixas , refervando para melhor tempo o remédio , de que neceííítavaõ j mas o peyor he , que os do Mara- nhão , fendo os que agora contradiziaõ o mais fuave , foraõ os primeiros , que lhes applicaraÕ o mais violento, como veremos nos fucceífos feguintes com merecida magoa deitas mefmas memorias. 102Ó Neíta geral conformidade, ou violenta refi- gnaçaÕ , entrou ainda o novo anno de 166 1 5 mas como Anno 1661= raras vezes deixaõ de fer herança em todo o Tribunal os 44$ '. . Annaes Hiíloricos ] è m Âíiao 1661. os fentimentos públicos , que inteiramente comprehen- dem os particulares intereííes dos Miniílros delle , os que fuccederaõ no Senado da Camera de Belém do Pa- rá j fe acharão também do meímo animo dos feus ante- ceflbres : e para que moílrando-fe zelofos das obriga- ções do miniílerio , podeífem melhorar de fortuna nas fuás próprias commodidades , tomarão logo algumas medidas. ! -io2j O Padre António Vieira, como Superior , e yifitador Geral das Mifsoes do Eílado , tinha todo o poder no ferviço dos índios , que procuravaõ com as mayores anciãs aquelles moradores, como remédio úni- co das Tuas miferias 5 mas querendo com tudo o meímo Senado , que foíTem fó as fuás attençòes as que lhes grangeaífem eíla felicidade , no dia 1$ do mez de Janei- ro lhe fez huma bem commedida reprefentaçaÕ , esfor- çando mais a fua juíliça com o zelo da Fazenda Real , que lamentavaõ em primeiro lugar muito prejudicada na pobreza dos povos , como fe vê da mefma propoíla r que he a que fe fegue , tirada fielmente , com as mais copias, que íecontinúaõ , do feu regiílo original. 1028 ,, Reprefenta a Camera deíla Cidade de Be^ „ lem , Capitania do Graõ Pará , que ferve eíle prefen- „ te anno de 166 1 , ao M. Reverendo Padre António „ Vieira, da Companhia de Jefus , Vifitador Geral das „ Mifsoes defte Eílado , as grandes neceííidades , que „ padecem eíles povos , caufadas da limitação , em que „ vivem, de alguns annos a eíla parte , por muita falta, „ que tem de efcravos com que fe firvaõ , fendo impof- „ fivel o viverem fem elles. Tem diminuído as rendas „ de Sua Mageílade , e feus dízimos , tanto , que eíle „ prefente anno naÔ houve quem déíTe por ellas coufa „ confideravel 5 e por eíla razaõ correm por conta de S. ,, Mageílade, que Deos guarde, e fe cobraõ por fua „ ordem com muito grande diminuiça5 da fua Fazenda „ Real, L do EJlado do Maranhão, Liv. XIV. 449 Real , e perda do Contratador dos annos paíTados , Anno ióór tanto ; que he neceílario fintarfe o povo , e os mora- dores delle para darem farinha à Infantaria j e alguns homens , que a naõ pofluem , a compraõ para acudir a efta neceffidade. Outro fim tem chegado a miferia a eftado , que naõ fe paga ao Vigário da Matriz o feu ordenado , nem aos Capuchos de Santo António 5 e quando fe lhe dá alguma coufa , he taõ limitada , que naõ vem a fer a terça parte , do que Sua Magef- tade ; que Deos guarde > ordena, os moradores delle em eflado o mais miferavel , que fe pode coníiderar 5 razaÕ porque alguns homens no- bres , conquiftadores , e povoadores , que derrama- rão o feu langue , e tem gaitado a fua vida em fervi- ço de Sua Mageftade , e ajudarão a conquiftar efta Conquifta , naõ trazem feus filhos , e familia a efta Cidade , por nao terem remeiros , que lhe comboyem canoas para virem , fendo coufa infallivel , e certa fer a navegação por mar , a qual fe naõ pode confeguir fem efcravos j tanto \ que efta fefta paíTada do Nafci- mento de NoíTo Senhor Jefu Chrifto , naõ vieraõ a ef- ta Cidade as famílias de alguns homens nobres , por caufa de fuás filhas donzelias nao terem , que veftir para irem ouvir MiíTa, nem feus pays poífuem cabedal para o comprarem , e tudo procedido de naõ refgata- rem efcravos j e muitos vivem nefta Cidade , que naõ tem quem lhe vá bufcar hum feixe de lenha , nem hum. pote de agua ; e aflim que eftaõ perecendo muitos , por naõ terem com que lavrarem fazendas , para com- prarem o que lhes hc neceílario , tudo procedido da falta de efcravos , havendo tantos em muitos CertÕes em quantidade , aonde fe podem refgatar : e aííim mais he coufa certa , que padece efte povo em geral muitas , e grandes neceflidades , as quaes eftao à vif- ta de todos padecendo inflnitasfomes , fem poderem Lli „ valer 4ío Annaes Hifloricos » Anno 1661. „ valer huns aos outros , em particular viuvas honeítas, „ moças donzellas , cafadas, muitas órfãs com o mayor „ defamparo , que fe pode coníiderar , as quaes naÕ de- „ ciáramos em particular , por naõ cançar com tantas „ miferias , que por fi fe eítaõ vendo , e pedindo fer cou- )y fa muito urgente acudirlhes , por ferviço de Deos, e v de Sua Mageítade , confervaçaô dos vaífallos do dito „ Senhor , e augmento deita fua terra , e conquiítas. „ He taõ grande a neceífidade , e miferias , com que fe ,, vive nefta Capitania, que todos os homens geralmen- jj te , até os mais principaes , andao vertidos de panno „ de algodão , tinto de preto j e muitos naõ poíTuem , r i com que o comprem , por valer preço exceffivo , co- f , mo faõ três toítoes a vara , fendo que os annos paíTa- ? , dos naÕ valia mais , que cem reis cada vara. He de „ coníiderar a miferia , a que tem chegado os morado- „ res defta Capitania , e mais peíToas delia , que viven- $ do ha tantos annos muitos conquiíladores , e povoa- , y dores neíla Conquiíta, e deitando em tantas occaíioes )} os inimigos da parte do Norte deites rios do Curupá , „ e Tocujú , fujeitando com armas os Gentios feus al- ? , liados, e tomando-lhes Fortalezas, e artilharia, com „ que fe guarneceo eíta de Sua Mageítade, lhe feja ne- „ ceíTario comprar hum efcravo do Gentio da terra por „ fetenta mil reis , como agora proximamente fe com- „ praraõ alguns, que ficarão de Pafcoal da Fonfeca Mo- „ niz , que Deos haja , pelos naõ poderem refgatar 5 fen- „ do que manda Sua Mageítade , que Deos guarde , fe ,, refgatem efcravos , por Ley fua , paííada em Alcan- „ tara , e firmada por fua Real mao em os 9 dias do „ mez de Abril da Era de 1655 annos : e ajuítando-fe p VoíTa Paternidade com ella , fe podem remediar to- ,, das as neceffidades > que propomos , acima referidas , „ junto com hum Capitulo do Regimento , paífado ao • „ Senhor Governador, e Capitão General deite Eítado, .. do Eflado do Maranhão , Liv. XIV- 4?l „ D. Pedro de Mello., no qual ordena Sua Mageílade Ahno 1661. „ VoíTa Paternidade nomee Cabo para as efcoltas , que v fe houverem de fazer ao CertaÕ , quando lhe parecer. „ Pelo que , vifto a Ley , e Regimento de Sua Magef- „ tade, como a VoíTa Paternidade he prefente, parece „ razaõ, e juftiça , que por ferviço de Deos , e de Sua „ Mageílade , bem commum , e remédio dos pobres „ moradores deita Capitania > e Infantaria deíla Praça , „ VoíTa Paternidade acuda com o remédio a todas as „ neceíTidades , que lhe repre Tentamos fe padecem , e a „ VoíTa Paternidade faò prefentes , e notórias 5 pois he „ certo fe pôde confeguir o remédio delias com fefa- „ zer huma entrada ao Certaô ao refgate de efcravos , „ para eíla pobreza, e miferia , em que vivemos todos , „ por Ter a mayor , e mais urgente , que fe pode confia „ derar j e nos affinamos em Camera. Belém do Graô „Pará, 15 de Janeiro de 166 1. Eu Manoel Ribeiro pJloYto , EfcrivaÕ da Camera , o efcrevi. E5 O Ve- „ reador mais velho Bernardino ;de Carvalho. 53 O „ Vereador ManoeLCordeiro Jardim. ^: O Vereador „ Gafpar da Rocha Portocarreiro. :=! O Juiz mais ve- lho Manoel Alvares da Cunha, m O Juiz Braz da ?> ?; Silva, es O Procurador Manoel Braz. 1029 Vio com attençaÕ o Padre Superior António Vieira a reprefentaçaõ do Senado da Camera ; e pare- cendo-lhe mais affe&ada , do que verdadeira , a que fe propunha como caufa total das miferias dos povos , de- pois de ter paíTado muito perto de hum mez nas refle- xões prudentes deíle mefmo difcurfo , para moftrar me- lhor o focegado acordo , com que procediaõ as perfpi- cacias do feu entendimento , refpondeo então na forma feguinte. 1030 „ Li o papel de VoíTas Mercês com o fenti- „ mento , que deve quem he parte da mefma Republi- ca , e quem fempre lhe defejou , e procurou o feu Lllii ;; mayor Armo 1661. 4J2 Annaes Hifioricos „ mayor bem , naõ fó efpiritual , mas ainda temporal. „ Conforme efte zelo , direy a VoíTas Mercês tudo o „ que finto , e poíTo. Primeiramente VoíTas Mercês „attribuem as neceffidades , que padecem, fomente à „ falta de efcravos $ e fegundo as noticias , e experien- „ cias, que tenho de fia terra, acho que faõ também ou- „ trás as caufas. A primeira he o fitio da mefma terra > „ toda cortada , e alagada de rios , com que o comer- „ cio humano fica muy difficultofo , e de grande defpe- „ za , havendo de fer todo por mar. A fegunda irem „ faltando no mefmo fitio os mantimentos naturaes , que >, com a continuação do tempo fempre vaõ a menos , „ como he a caça , e a pefca , de que efte povo fe fuf- „ tenta j coufa, que he impoffivel durar , nem perma- fi necer , e que fempre vay fendo mais cuílofa. A ter- „ ceira a falta de governo politico , naõ havendo pra- „ ça , nem açougue, nem outra coufa de venda , ou alu- „ guer, com que neceífariamente cada família ha de ter i, o que tem huma Republica j porque para a carne ha ,, de ter caçador , para o peixe pefca dor , para o panno ,, fiandeiras , e tecellaõ , para o paõ lavradores , e para „ os caminhos embarcação , e remeiros , a fora todos „ os outros ferviços domefticos. A quarta a mudança , „ e guerra do Reino , com que exceííivamente crefce- „ raõ os preços a todas as mercadorias de fora , e deraó „ em baixa os aíTucares , e tabacos. A quinta ( e mui- >, to notável ) a vaidade , que crefceo neíles últimos „ tempos , naõ fe medindo os gaftos , como antigamen- í, te , com as poíTes , fenaõ com o appetite. E a fora „ deílas caufas publicas , deve de haver também outras >, fecretas em alguns particulares , refervadas à fcien- 7f cia , e providencia divina ; pois as neceffidades , que ,, Voífas Mercês reprefentaõ, nao faõ geraes em to- „ dos j e vemos que alguns , que naõ tinhaÕ efcravos , „ tem hoje muitos 5 e outros que tinhaõ muitos , care- „cem âoEftadoâo MaranhaS, Liv. XIV. 4ÍJ „ cem totalmente delles , porque lhes morrerão por jui- Anno i66i* „ zos fecretos daquelle Senhor , que o he da vida , e da v morte. Aííim , que as neceflidades , que fe apontaõ^ ,, tem também outras caufas, que VoíTas Mercês pó- „ dem , e devem remediar , como aquelles a quem per* „ tence o bom governo da Republica , e a emenda dos „ abufos delia , e as outras induílrias por onde fe confe- „ guem , e fe facilitaõ as utilidades do commum ; e vin- „ do ao remédio , que fe aponta dos efcravos doCertaõj „ poílo que eu o approvo muito, e o folicitey com El* „ Rey , infiftindo Sua Mageílade , que todos foíTem li- >, vres , vejo porém , que o dito remédio por íi fó naô „ he fufficiente 5 porque por mais que fejaõ os efcravos > „ que fe fazem, muitos mais faÔ fempre os que mor- „ rem , como moftra a experiência de cada dia nefte Efc „ tado , e o moítrou no do Brafil , onde os moradores „ nunca tiveraõ remédio , fenaõ depois que fe ferviraS U com efcravos de Angola , por ferem os índios da ter- „ ra menos capazes de trabalho , e de menos refiílencia „ contra as doenças , e que por eftarem perto das fuás „ terras , mais facilmente , ou fogem , ou os mataõ as „ faudades delias. Ido digo a VoíTas Mercês , como „ parte que também fou deíla Republica , e defejofo j, do feu bem. Refpondendo , como quem tem a feu ,, cargo as Mifsões , digo , que o que ordena o Regi- „ mento de Sua Mageílade , he , que o anno , em que „ houver de ir Miífaô ao Certaõ , os efcravos , que fe „ acharem legitimamente cativos , conforme os cafos „ da Ley , depois de examinados , fe refgatem : e nefte „ particular , fe VoíTas Mercês bem lançarem as contas, „ acharão , que naõ fó alguns annos ( como fuppoem o „ Regimento ) houve Mifsões , mas que foraõ mais as „ Mifsões , que os annos ; porque defde o anno de 165 5, „ em que veyo o dito Regimento , fe fez a MiíTaõ dos „ Tupinambaz pelo Padre Francifco Vellofo , a dos „ Khein- • Mmiâes Hifioricos Atino i66t, „ Nheingaíbas pelo Padre João de Soutto-Mayor ) a >; dos Pacajaz pelo mefmo Padre, a dos Aruaquizes ; , pelo Padre Francifco Vellofo ,. a do Rio Negro pelo ,, PadrérFrançiíco Gonçalves , a dos Carajaz pelo Pa- n dre Thomé Ribeiro, a dos Poquiz pelo Padre Ma- ?>noei Jfeines, e a de Ibyapaba pelo Padre António ,j Vieira }" e agora adualmente eftá outra no rio das „ Amazonas , em que mOrreo o Padre Manoel de Sou- „ fa , e ficou o Padre Manoel Pires; nas quaes Miísões, ,> e em outras de menps empenho , fe tem defcido mais „ de três mil almas de índios forros , e mais de mil e oi- „ tocentos efcravos. A iílo refponde o papel de VoíTas „ Mercês > que ainda que houve eíle numero de efcra- „yos, que nao fora o para o povo do Pará -, eque fe ;,;vendem por ta õ grande preço, que nao tem os mora- y j dores cabedal para os comprar. , Niílo direy também „ o que tenho obrado no ferviço de VoíTas Mercês , e » foy , que vindo a eíle Eílado o Governador D. Pedro „ de Mello , pelo zelo que tinha , de que fe acudiíTe ao „ remédio dos povos, fe informou de mim do modo, „ que podia haver , para que os efcravos , que fefizef- „ fem , chegaíTem a todos ; e o que eu lhe apontey , foy, „ que os efcravos fe reparti íTern pro rata por todas as %f Capitanias do Eílado, conforme o numero dos feus ^moradores j e que o preço porque lhos deíTem , foíTe 7> omefmo, que cuílaõ noCertaõ, que na mayor ca- „ reília do ferro naõ chega a quatro mil reis : e fendo ef- r, ta a repartição , e eíle o preço , VoíTas Mercês forao i, os que lhes defcontentou eíle modo , e o nao quize- j, raõ aceitar , nem executar : e como os Miííionarios ,, nos nao metemos na repartição dos efcravos , nem ,4, nos preços delles, VoíTas Mercês , parecendo-lhes , „ podem recorrer nefte particular a quem a decifaõ del- ;; le pertencer, que fem duvida deferirá à neceííidade . r? deíla Republica ; e àjuíliça com que requere fe lhe ;; a PP li- do miado do Maranhão j Liv. XIV. 4 5 í „ appliquem os ditos efcravos ; pois ordinariamente fe Anno i66i. h fazem nos rios , que faõ próprios defta Capitania , e „ com os índios , canoas, Soldados , e mantimentos dei- „ Ja , e por todas as outras razoes , que VoíTas Mercês „ coftumaõ allegar : e quanto à MifTaõ , em que fe hajaô 97 de fazer os ditos efcravos , eftimarey eu muito, que „ feja a primeira , que houver , que eu procurarey dif- „ por com a mayor brevidade pofíivel ; por quanto nefte „ anno eftá já intentado o defcobrimento do rio Iguaífú, „ em que ha fama eftá a naçaõ dos Topinambaz , o qual „ defcobrimento fe ha de fazer pelo rio dos Tocantins : „ e quando VoíTas Mercês no mefmo rio queiraõ entrar „ pelo braço de Araguaya , onde eftaô varias nações , „ que fe diz tem muitos efcravos , e a dos Pirapez , que „ fe podem trazer para o grémio da Igreja , e ferviço da „ Republica , também fe difporá a MuTaõ nefta forma j „ porque em tudo nos defejamos accommodar , quanto „ puder fer , ao bem ainda temporal de todos. Pará , „ 1 2 de Fevereiro de 1661. ãá António Vieira. 103 1 Mal fatisfeitos aquelles Miniftros de taõ for- mal repofta , quizeraõ moílrar o feu refentimento pelas exprefsòes da feguinte Carta ; mas com taõ pouco fru- to , como fe vê da Certidão , que fe lhe continua , pa- recendo fem duvida ao Padre António Vieira^, que pa- ra a paixaõ de humas taes inftancias naõ valiaõ já as fo- luçÕes agudas do feu grande talento. • 1052° „ Vimos a repofta de VoíTa Paternidade da- „ da ao noíTo papel , e naõ efperavamos delia mais que „ o remédio , que eftá pedindo taõ urgente neceflidade , „ a qual naõ pede dilação taõ pouco erTediva , como a. „ que VoíTa Paternidade nos offerece , que vem a fer if mais arrifcado a mayores perdas , e trabalhos , que a „ aliviar a efte povo as miferias , que padece. Primei- „ ramente he coufa certa , que quando Sua Mageftade „ foy fervido mandar paífar Ley , para que fe refgataf- „ fem Armo i66i Annaes Hiftorkos „fem efcravos nos CertÕes deíla Conquiík , com as „ condições, e claufulas declaradas na mefma Ley, he ■„ de crer foy tençaÕ de Sua Mageítade fe fizeífe com os „ Reverendos Padres Miffionarios prefentes ] para fe „ evitarem os efcrupulos , que nostaes refgates podia „ haver y e que os taes fe refgataífem geralmente para >, todos os vaíTallos de Sua Mageftade , moradores def- „ te Eílado \ e parece de direito j juftiça ,■ e razaô eftaõ „ em primeiro lugar os deíla Capitania , pelas razoes , „ que VoíTa Paternidade confeífa na fua repofta , que „nos deu. Segunda razaõ he , naõ duvidamos, de ? , que as Mifsões hajaõ fido mais em numero , que os „annos, e refpondemos a efta razaõ com hum ada- „ gio antigo : Muito, pa"o tem Cajlella ; mal por quem „ Jazera : todas ellas naõ tem fido de utilidade a efte po^ h vo , antes lhe tem caufado perdas ; pois he coufa cer- „ ta, quedefta Capitania vaõ canoas , índios , Solda- „ dos , e moradores , e tudo o neceífario para ellas $. e „ naõ ha duvida , que os índios das Aldeãs ; noífos ai- „ liados , que foraõ às ditas Tropas , tirarão melhor lu- „ cro dos efcravos , que neílas houve , que os brancos „ deíla Capitania , e ainda eífes fe nao venderão nella , ,,e fe entregarão os que lhe tocarão aos Reverendos ?, Padres Miffionarios , e o mayor numero deftes efcra- „ vos mandarão vender à Cidade de S. Luiz do Mara- „ nhaõ , e Capitania do Gurupy , e alguns fe venderão „ a Vicente de Oliveira , e a Manoel da Vide Soutto- „ Mayor 5 e das coufas, que efie povo padece , nos ha-. * vemos de queixar a Sua Mageítade na Corte , e Cida- jf de de Lisboa , e ao Governador, e Capitão Geral def „ te Eílado D. Pedro de Mello. Terceira razaõ he , que naõ duvidamos tenhaõ defcido nas Mifsões apon- tadas todo o numero de Gentio, e almas, que VoíTa Paternidade diz { he coufa certa , todos elles forros , e „ cativos , naõ ferem a eíle povo de 'utilidade', nem lu-, „ cro âoEflaâoâo Maranhão, Liv.XlV- 457 „ cro algum. Também VoíTa Paternidade foy fazer Ànno i66u „ pazes com as nações dos Nheingaíbas , e em fuás ter- „ ras eftaõ fem ferem de eífeito para o ferviço de Sua „ Mageftade, nem para a defenfa defta Capitania, em „ cafo que o inimigo nos cometta , ( o que Deos nao „ permitta ) e nellas fenhores de poderem fazer de íi o „ que quizerem , e feguir a parcialidade , que tiverem em „ vontade, fem as armas de Sua Mageftade os poderem „ fujeitar ao pelas ditas nações promettido. Quarta ra- „ zaõ he , que nos diz VoíTa Paternidade , que quando „ veyo a governar efte Eftado o Senhor D. Pedro de 7 , Mello , confultara com VoíTa Paternidade o modo ? t, com que fe podiaõ fazer refgates, e que as Capitanias „ todas entraflem no lucro delles refpedivamente , con- „ forme o numero dos moradores , e que nós fomos os ,-, primeiros, que excedemos o eftylo. Neíla Capitania „ nao ha homens de cabedal para hum fó dar oitenta re£ ,, gates ; computo em que foy metida eíla Capitania j e „ por eíTa caufa , e falta de nao haver ferro para ferra- „ mentas , foraõ de particulares. Bem pode VoíTa Pa- „ ternidade coníiderar o pouco cabedal de oitenta ref- ,, gates , nos quaes fe mandou meter em computo o Ca- „ pitaõ mor , Officiaes Militares , Provedor da Fazen- „ da , Conventos , e peíToas Ecclefiafticas , cafados , íf viuvas , donzellas , órfãos , e ainda efte pouco nume- „ ro fe nao fez mais que metade , pouco mais , ou me- „ nos , com a Camera fe prevenir , mandando dous ho- „ mens com elles a cargo. Quinta razaõ he , que nós „ nao podemos remediar impoíííveis , contra o que tem „ difpofto o tempo , e o Governo de tantos annos a traz. ,, Impoííivel he haver nefta terra açougue , nem ribeira , „ e mais impoííivel he no tempo prefente haver paga- ? , mento para dar pelo fuftento ordinário ; e para o ter , „ lhe confta a VoíTa Paternidade he neceíTario haver ef- „ cravos para o fazer j mas ainda nos fujeitamos ahu- Mmm 458 : * :; ''.:f lliite Annaes Hifioricos Anno 1661. „ ma couía , já que Deos deu a VoíTa Paternidade taó „ grande juizo , e entendimento , que nos faça mercê ? , por ferviço de Deos ; e de Sua Mageílade ? e remédio „ deíle povo , darnos caminho para nos governar bem , „ e paíTar a vida fem vaidades , nem gaftos exceííivos , ,, mais que os juílos , lícitos , e honeílos , cada qual con- , ; forme a fua qualidade , fem ter efcravos ; que nos íir- „ vaõ. Os Certões deíla Conquifla faõ muitos j os ef- v cravos , que ha nelles tem a experiência moílrado naõ „ ferem poucos ; pois de ordinário vem a eíla Cidade ca- ;; noas delles a tomarem , o que lhes he neceíTario para „ paífarem ao Maranhão. Muito Reverendo Padre Vi- yy íítador Geral deílas Mifsões , S. Mageílade naõ man- „ da , que eíles efcravos fe refgatem a particulares , e „ o dito Senhor manda fe façaõ chriílamente para to- „ dos os feus vaíTallos •• naõ permitta VoíTa Paternida- „ de íer eíle povo o mais defgraçado 5 pois tem tantos , „ e tau leaes vaíTallos Sua Mageílade nelle , e que ha 7 , tantos annos o eílaõ fervindo derramando o feu fan- ? , gue , e os feus antepaíTados paífando muitas fomes ,, em fujeitar os índios avaíTallados a Sua Mageílade ; ?; dos quaes VoíTa Paternidade eílá de prefente fenhor „ delles , e feus fubditos. Sexta razão , que a viagem , „ que VoíTa Paternidade nos oíFerece pelo rio dos To- >; cantins , nos naõ ferve para nenhuma coufa mais que „ para nos deílruirmos nella , e aos índios noífos allia- „ dos , como a experiência tem moílrado proximamente „ na MiíTaõ , que fez o Padre Superior Manoel Nunes, „ a qual naÕ deu lucro. Seja VoíTa Paternidade fervido „ naõ fe moílrar avaro dos Certões , que Deos nos deu, „ e nós conquiílámos , fugeitámos , e avaíTallámos a Sua „ Mageílade : o dito Senhor nos concede licença para „ fe reígatarem efcravos , os lícitos j e nós eíles pedi- „ mos , eíles queremos fazer , debaixo das claufulas da ff Ley ; para com elles fe acudir às neceífidades deíle po- ff vo. í 79 VO, do Eílado do Maranhão , Liv. XIV. 4 $ 9 viílo eílarem-fe comendo nos Certões. Sétima Armo i66i, „ razaõ he , que pelo rio das Amazonas ha muitos Ren „ nos de Gentio , e muitos rios donde fe podem deícec „ muitas almas para o grémio da Igreja Gatholica ; e os „ efcravos , que houver entre eílas nações , refgatallos, „ pois os eílaõ comendo ordinariamente ; o que parece ,,mais ferviço de Deos 9 por quanto , livrando-os da „ morte , fe podem falvar alguns eílando em noíTo po- „ der , ainda que morrão com faudades das fuás terras. ,, Oitava razaõ he , que nós a entrada , que pedimos , he „ para o rio das Amazonas , e nelle naõ entraremos a „ fazella pelos Lugares , e Aldeãs , por onde até o pre- „ fente fe tem feito , e entraremos no rio da Madei- ,, ra, Cabeceiras do rio Negro, Cambebas , e outras „ muitas paragens, que ha j pois podemos viver todos „ logrando o lucro , que Deos nos dá nefta Conquifta , „ e Sua Mageílade nos concede. Voíla Paternidade „ lembre-fe da promeíTa , que os Miííionarios fizera Õ a } } Sua Mageílade , de que naõ haviaõ tirar lucro dos In- „ dios forros , nem com elles fabricar fazendas , nem „ canaviaes , e fó tratarem da doutrina efpiritual ; e „ fe acafo VoíTa Paternidade tem alguma ordem de Sua „ Mageílade no temporal , fera fervido mandalla apre- ,, fentar neíle Tribunal , para que nos coníle delia, por „ quanto tem mandado os Governadores deíle Eílado , ,, que nenhuma peíToa poíTa ufar de jurifdicçaõ alguma, „ fem primeiro regirlar o poder que tem ; e com o rela- ? , tado neíle papel , parecem caufas baftantes- para Vof- „ fa Paternidade nos deferir com o que pedimos , e a „ jurifdicçaõ , que VoíTa Paternidade tem de Sua Ma- „ geílade , lhe dá lugar. Em Camera , Belém 1 5 de Fe- „ vereiro de 166 1. E eu Manoel Ribeiro Porto , Efcri- „ vao da Camera , o efcrevi. bí Manoel Cordeiro Jar- „dim. 3 Braz da Silva. £ Manoel Alvares da Cu- „nha. £ Manoel Braz. S Bernardino de Carvalho-; Mmm ii '■■' í 460 Annaes Hijíoricos Atino 166 r. %•■' ■ ) 1035 „ Manoel Ribeiro Porto, EfcrivaÕ da Ga» „ mera defta Cidade de Belém . Capitania do Paráy &c. „ Certifico , e dou fé , que eu fuy com o Procurador „ do Concelho Manoel Braz ao Collegio , Convento „ de Santo Alexandre , da Companhia de Jefus , por f f mandado dos Officiaes da Camera , que fervem eíle „ prefente anno , e no dito Convento aprefentey ao f' r Muito Reverendo Padre Vifitador Geral das Mifsões ff deíle Eílado António Vieira , o papel a traz efcrito , ff e affinado pelos ditos Officiaes da Camera , com as ra- „ zoes conteudas nelle , e o dito Padre Vifitador Ge- „ ral o leu de verbo adverbum.em minha prefença , e ff do dito Procurador 5 e depois de lido , refpondeo , 9 f que naõ tinha , que dizer mais que o que tinha re£ „ pondido , e que o mefmo diria fempre 7 e que no to^ ff cante à jurifdicçao Real , que fe a tinha , ou naõ f a f f feu tempo o diria j e também que fobre os refgates , ff que fe fazem para outra parte , recorreíTem a quem f , direitamente tocava : e que na matéria da jurifdicçao „ temporal , fe os ditos Officiaes da Camera tiveíTem „ poder para lho perguntar f que elle lho diria , e daria „ razaô diíTo. Paía o referido na verdade pelo juramen- f, to do meu cargo , em fé do que paíTey efta Certidão „ por mim affinada. Belém , Capitania do Pará , 15 de f} Fevereiro de 166 1. 5* Manoel Ribeiro Porto. , 1034 Impacientes os apaixonados Senadores com a repoíla do Padre António Vieira , defejarao bem def- aíFogar o animo nas demonftraçoes publicas ; mas pru- dentemente receando a commoçaõ do povo , diffimu- laraÔ o feu fentimento , repetindo ainda as mefmas inf- tancias para o remédio delle $ até que vendo , que para confeguillo por eíle meyo erao infruduofas as fuás dili- gencias , aíTentaraõ em Camera , com a mayor parte da Nobreza , que também convocarão , que fe encamn nhaífem ao Governador D. Pedro de Mello , com a co- pia do EJlaâo do Maranhão , Liv. XIV. 461 pia de todas as que já tinhaõ feito para melhor fe juílifl- Anno 1661. carem , recommendando tudo a hum CommiíTario , que bem reprefentaíTe a authoridade do mefmo Tribunal j e encarregados eíles officios ao Vereador Manoel Cor- deiro Jardim , hum dos feus Companheiros de mais acti- vidade, entrou elle logo a exercitalla nas difpofições da ília partida. 1035 Ficou ajuítada efta dependência , porém tra- traraõ logo os mefmos Miniftros de affiançar mais as fuás efperanças , levando também a reprefentaçaõ das opprefsões dos povos à prefença da Rainha Regente 5 e bem encarecidas pela paixão dos particulares interef fes , quando fó fe inculcavaô zelofòs dos públicos , fe- guravaÔ todos na obfervancia da Ley de 9 de Agoílo de 1655 , fobre a forma dos judos cativeiros, com a de- claração , de que os Miílionarios das Aldeãs fe naõ po- deíTem intrometer no governo temporal dos índios , mas fim tao fomente no efpiritual , como feus Párocos , que erao. 1036 Em 9 de Abril deíle prefente anno defpedi- raÕ a fupplica para Portugal , efficazmente recommen- dada a António de Albuquerque Maranhão , a quem conílituíaô feu Procurador , empenhando mais os bons officios da fua diligencia na honrofa lembrança , de que feupayjeronymo de Albuquerque Maranhão (como bem moítrava o appellido ultimo a que dera principio ) havia fido o primeiro Conquiftador da Capitania deS. Luiz , cabeça do Eftado , que elle também , e feu irmão Mathias de Albuquerque , com muitos mais parentes , tinhaõ regado com o feu nobre fangue ; e mais focega- dos com eíle defafogo , entrarão logo na expedição do feu Commiífario ao Governador D. Pedro de Mello. 1037 Paífados porém poucos dias alterarão muito o focego publico as Cartas , que teve o mefmo Senado da Camera do de S. Luiz do Maranhão , com os avifos de — — 4Ó2 Annaes Hiíloricos II ■i Anno 1661. de fe tomarem humas, que fe efcreviaõ para Lisboa ao Bifpo eleito do Japaõ André Fernandes , Pveligioíb da Companhia dejefus de grande authoridade diante da Rainha Regente , em que fe lhe pediaõ varias ordens na matéria de índios , que parecendo juftas , e precifa- mente neceffarias para a propagação do fanto Evange- lho, como ao meímo pado deftruíaõ também os inte- reíTes temporaes do Eftado , fentiaõ já os moradores do Pará eftes ameaços , como própria ruina j mas aquelles Miniílros feguindo fó entaõ os indifputaveis documen- tos da fidelidade, atalharão todas as defordens 5 e fegu- rando bem a confervaçaõ da Capitania , fouberaõ con- folar as fuás afflicçÕes com as efperanças do remédio , que affiançavaõ mais nas certas noticias , que ao mefmo tempo receberão de ter parlado já da prefente vida o Bifpo do Japaõ , cujo poder fem duvida era o feu mayor medo. 103 8 Comtudo fazendo apreíTar mais eíla novida- de a expedição do CommiíTario , já nomeado para o Maranhão Manoel Cordeiro Jardim , no dia 17 de Mayo fahio da Cidade de Belém cheyo de inftrucções ; e reprefentando o Tribunal da Camera ao Governador D. Pedro de Mello as opprefsoes grandes , que padecia toda a Capitania com a falta de fervos , lhe pedia mui- to, que quizeífe acudirlhe com o remédio prompto, de que neceííitava j mas para dar mayor actividade a efta mefma fupplica , também recommendava ao Senado da Camera o feu CommiíTario nas aííiílencias delia , depois de fegurarlhe com exprefsÕes muy vivas, que para as medidas , que elle tinha tomado no juíto fentimento das Cartas do Bifpo do JapaÕ , acharia fempre a fua com- panhia , como infeparavel dos communs intereíTes de todo o Eftado, promettendo-fe já as mayores fortunas na firme uniaõ dos moradores delíe. 1039 O Senado de Belém do Pará liberalmente fe- gurava do EJlado do Maranhão , Liv. XIV- 4-6 J gurava as fuás afíi (lendas ao de S. Luiz do Maranhão , Atino 1661. entendendo fem duvida , que nunca romperiaõ os fagra- dos limites da fidelidade os moradores daquelle povo j mas elle , que foy em todo o tempo pouco íbcegado , fazendo pretexto daquellas mefmas Cartas do Bifpo do Japaõ , com outros incidentes de menos entidade , fe commoveo de modo do dia 1 5 até 1 7 do mez de Mayo , que neíle ultimo chegou também a violar a immunidade Eccleíiaftica no defacato mais efcandalofo • porque ar- rancando dos próprios cubiculos os Religiofos da Com- panhia de Jefus , os lançou fora do feu Collegio : e con, tinuando nos bárbaros exceíTos de tamanha defordem , obrigou logo o feu Superior Ricardo Carece , a que de- fiftiífe ; em ado de Camera , da adminiftraçaõ dos ín- dios do Eftado , como obje&o único da paixão do feu ódio , fem que baílaífe a grande authoridade do Gover* nador para embaraçar hum procedimento taõ deteíla- vel j porém que muito , fe faltando-lhe forças para o caf- tigo delle , era mais ceremonia , que veneração aquelle mefmo titulo , que lhe confervavaõ os fediciofos " 1 040 Algumas memorias , que também fegue Fran- cifco Teixeira de Moraes ( natural da Villa de Alen- quer, e Cidadão da mefma Cidade de S. Luiz) em hum manufcrito , que intitula : Relação Hijlorica , e Poli- tica dos Tumultos do Maranhão , querem perfuadirnos , que D. Pedro de Mello, fe naõ defagradou ao principio deftas alterações , por fentir já com pouca paciência , que a muita authoridade dos Miffionarios diminuía a ília de tal modo , que lhe vinha a ficar quafi fem exerci- do na parte mais eíTencial do governo do Eftado 5 mas que vendo depois os defatinos a que tinhao chegado as defordens do povo , procurou atalhallas , receofo já do feu próprio perigo 5 porém examinando a minha diligen- cia eftas mefmas noticias , as acho convencidas de me- nos verdadeiras com merecidos créditos do procedimen- to 4Ó4 Annaes Hidoricos ► 4 }, Armo 1661. to defte Fidalgo, como fe moftra bem da Carta , que efcreveo ao Padre António Vieira , que he a que fe fe- gue , fideliflimamente copiada do feu original , que te- nho em meu poder , onde fe eftá vendo aíTás purificada a fua muita honra nas próprias exprefsôes da fua fmge- leza , que na minha grande veneração fe naõ faz tam- bém menos eftimavel. 1041 „ Ah meu Amigo , e Senhor Padre António „ Vieira ! Naõ fey o que poífo dizer, pelo que amo a „ Companhia , pois eílou fem juizo , e fem forças 5 re- „ porto-me ao filencio, e com iíTo digo tudo. Já Vof- „ fa Paternidade terá noticia das Cartas , que fe publi- „ caraõ, que vieraõ do Reino , que Voíía Paternidade „ efcrevia ao Bifpo , no navio que fe tomou dos Santos , , t com as quaes fe efcandalizou o povo geralmente em „ grande extremo, havendo-o também feito antes difto „ por caufa da Gazeta , que delle veyo 5 e com a pri- „ zaÔ do principal Cupauba , e tudo quaíi a hum tem- „ po, como virão , digo, eftas Cartas, que foraõ viftas, „ fegundo me diíTerao por toda eíla Cidade , e certo , „ que até hontem entendia , que vieraõ remetidas ao „ Provincial do Carmo j mas affirmaraÕ-me nefte dia „ naõ havia tal , mas que a hum fecular parente defta „ gente , &c. , que naõ fey fe eftá cá , ou anda por lá , „ e com ellas fe ajuntarão em Camera j e dizem fe af- „ fentara fe chamaífem os Principaes das Aldeãs , para „ verem de quem fe queixavaõ. Eftando em Camera „ os Officiaes, vieraÕ-me dizer, que fe falia va nas per- „ guntas dos Religiofos da Companhia , e que eftavaõ „ fazendo Juiz do Povo. Mandey pelo Sargento mor „ do Eftado , e hum Efcrivaõ para dar fé , que viífem o ?7 que faziaõ , pois me tinhaõ dito eftavaõ fallando nos 7t Religiofos da Companhia muy indignamente , e ou- „ trás coufas j e que foubeíTem , que os havia pôr em , ; dous páos. Ifto era meya hora de dia , a que refpon- V deraõ do EJlado do Maranhão , Liv. XIV. 46 $ „ deraÕ : Que fe naõ fazia coufa contra os Padres , fe- Armo i66í. „ naõ que fe perguntava geralmente àquelles Princi- , ; pães y de quem fe queixavaõ , e que de tudo me viriaõ „ dar conta. Viera5 pela manhã , e me fegurarao o „ próprio , que ifto era para fua defeza. Antes que ef- „ tes Principaes foíTem chamados , tinha eu dito a muita , 7 gente , por ver quaõ indignados andavaõ , que eftas „ Cartas eraõ efcritas a hum Amigo de VoíTa Paterni- „ dade , com outras muitas razoes , que nao admittiaõ , } , e que por ellas viaõ elles fe nao tinha obrado nada de , t novo , e ferem ha tanto tempo feitas , e que naõ ha- „ via de fer fó aquella via , que viílo Sua Mageftade >? nao ter ordenado nada , final era , que lhe naõ foraô „ moftradas , e com o meu Amigo podia defabafar , e fi que elles fe nao deífem por achados diífo j e que fó , y quando Sua Mageftade mandaífe alguma coufa , que j, poderiaõ juílifícar o que lhe pareceíle era o contrario , y , a que naõ admittiaõ razão, fenaõ que fe haviaõ de f, dar por achados delias. Em fim , feitas as perguntas, f y e juntamente Juiz do Povo , diziaõ , que haviaõ tirar yy o temporal aos Padres , a que os tinha períuadido , „ que iílo ha de fer EIRey , pois elle mefmo o tinha fei- „ to 7 com tantas razões, que os tinha perfuadidos , e a yy gente toda a iífo ; e havia já alguns dias fe naõ faJJa- yy va em nada , quando veyo o diabo dizer , que os In- yy dios da Aldeã de S. Jofeph eílavaõ levantados , e que ; , tinhaÕ pofto huma polé , e que o Padre António Ri- ,y beiro era caufa de tudo ifto , com outras palavras com ,, que fe efcandalizara a Camera; para cujo eíFeito man- ,y daraõ tirar devaíTa ao Ouvidor Geral os mefmos Of- ,y flciaes. Com eftas novas fe tornou a amotinar efte ,, povo de maneira , que de Domingo até terça feira , „ foy neíla Cidade hum dia do juizo. E vendo eu ido ^ ao Domingo , -para os focegar à razaõ , lhe foltey a i, rédea , como VoíTa Paternidade verá por eíTa propof- Nnn .» ta 466 Amiaés Hijloricos ti\ ifljl Âiino 1661. „ ta $ para cujo efFeito mandarão fegunda feira , quando ■ f) a Companhia entrava de guarda , fazer Junta em mi- ?; nha cafa , e mandey , que arrumaíTem huma , e outra >y Companhia , com o pé de dizer , que fe os índios fof- „ fem rebeldes , fe caftigariaõ : quando à terça muy ce- j, do pela manhã me vem dar recado, que queriaÕ bo- 7 , tar fora os Padres do Convento. Mandey tocar ar- -„ ma , e fe achou meu filho com Fauftino Mendes , ?y Francifco Cardofo , que tinha arrumado fem hum fó ? , Soldado , a Companhia , que eítava na torre com qua- ,., tro , e eíles , que fe defmaginaíTem , que as naõ ha- ^ via5 de tomar contra os moradores , pois os fuílenta- ^ vaõ , e que os Padres lhes tiravaõ o feu remédio. Sa- „ hi como defefperado com quatro criados , e tomey $ por rodella a capinha de S. Jofeph , e com ella me cin- yy gi : tanto que fahi , veyo toda aquella gente , que ef- „ tava à porta de VoíTas Paternidades , vendo-os , que „ fe retiravaõ para me virem acompanhar , fuy para a „ Camera , donde da porta , e janella me fiz hum Pré- „ gador. Signiíiquey-lhes para que era chamada a Jun- „ ta com tantas outras razões , que podia perfuadir as v pedras , as quaes fó S. Jofeph entendo me dictava , „ foltando lhe em tudo a rédea , como era neceífario >? em tal occafiaô , de que vay a propofta , que havia de „ fer na Junta por palavra , a qual fe foy efcre vendo na „ Camera , e iílo feria huma hora depois do meyo dia : jí e tendo todos os que eílavamos dentro votado , que „ era belliííima , cheguey à janella da Camera , e me „ torney a fazer Pregador , como de antes o tinha feito ,, às efcadas delia ; de maneira , que tudo era darem-me „ os vivas , para ver fe com taes palavras , quaes lhe ,, difTe, por ferem neceíTarias ao tempo , e por ter vifto „ naõ ter por mim mais que a capinha de S. Jofeph, &:c. ,, lhe figniííquey ultima vez , para cujo efFeito chamava „ ajunta, de que fe tinha feito huma proporia para a „ verem * d' do EJlado ío Maranhão , Liv. XIV. 467 , verem particularmente hum por hum, a qual era fó Annoióór, f, o feu bem, e confervaçaõ; o quenaõ admittirao, fe- , nao que havia de fer lida ao povo em voz alta , e naõ , havia de haver outra coufa , com taes gritos , que fe , nao entendia nada. Ao que refpondi a Que affim fe- , ria , por ver fe nos admittia razaõ , e que à tarde po- , diaõ ir para a ouvirem. Recolhi-me para dentro , e , vim defcendo pelas eícadas a baixo para cafa , e todo , o povo a traz , e diante de mim , fem gritarem , pare- , cendo-me , que à tarde fe faria o que lhe tinha dito. j Eílando-me curando ( porque até então o nao tinha , feito , por ter hido por toda a Praça , e defcompoílo ) , me vieraõ dizer : Senhor, já lávaõ os Padres cami- , nho de Santo António. Julgue VoíTa Paternidade qual eu podia ficar ? Sem juizo , nao era nada ; mas fem forças , era fó o que me atormentava. O tumula to do povo deviaõ de fer mais de feifcentas almas : eu me achava com cinco , ou féis. Daqui por diante tan- to que me diíferao levavaõ os Padres , , naõ me atrevo a fallar huma palavra , e fó os Hereges as poderáõ re- latar j mas , mas , mas , &c. Efcrevo ao Capitão mor, e Camera , e o mefmo faço ao de Gurupy , cuja co- pia vay com eíla , e todas vem a fer quafi do mefmo theor , que certo fera graõ coufa tomarem os confe- Ihos , que lhe dou , e para iífo o faço taõ largam ente, que affim convém neílas occaíiões ; efe houver foce- go, fera grande coufa para o meu intento, o qual naõ declaro por fer ifto Carta : o que me parece por ago- ra convém fe faça, como lá dizem , onde força naõ ha, direito fe perde ; mas quererá S. Jofeph darme algumas , e que haja divifaõ , como entendo começa ja. Por agora me parece convém , que por nenhum cafo VoíTa Paternidade cá appareça , antes eftou r que fe meta no Gurupy , e dahi fe faça forte ; pois te- mos e/Tes índios, e Capitão mor por nós,, que amais Nnn ii „ gen- 468 Annaès Hifioricos Amioi66í. „ gente naõ deve de fer muita ; porque nefla paragem „ fe fazem os avifos com mais preíTa , affim para cá, co- „ mo para o Pará ., e fe defpache huma canoa com to- • n da a preíTa , e cautela ao Curupá com eíTa ordem a v Paulo Martins , e para iíTo efcrevo duas regras ao Pa- 7 , dre Bento Alvares defpache outra a VoíTa Paternida- ,, de ., antes que efta chegue ao Pará com os índios de „ mais fegredo , onde quer que acharem a VoíTa Pater- „ nidade , e tudo o mais difporá VoíTa Paternidade co- „ mo quem tem tanto juizo ; mas fó o vir VoíTa Pater- ,, nidade cá, por nenhum cafo convém ; porque eftá ef- „ ta gente contra VoíTa Paternidade de maneira , co- y , mo o Padre Ricardo deve de efcrever : mas efta Car- „ ta foy neceíTario minhas traças para a mandar , pelas „ vigias que tem ; e em refoluçao me naõ fio de outrem „ mais, que do Ouvidor Geral , e ainda defte com cau^ „ tela. Os Officiaes da Camera ,. e Povo , tinhaõ no^ „ meado o genro de António Arnau j e vindo-me dar „ parte , lhe fignifiquey , que nao era eu aqui nada , que „ podia fazer o-que o Povo , e Officiaes lhe mandavaõ ; „ eftando para ir , naõ foy : fizeraõ hum cunhado de „ Manoel de Carvalho ; e vindo-me dizer o próprio, jy lhe refpondi o mefmo ; também nao foy ; e tentarão „ mandar outro Francifco de Sargez , por ter licença „ minha havia muito tempo , lhe refpondi , que tomara fy ver a licença , o qual ma foy bufcar : tanto , que a vi, „ meti-a na algibeira , e lhe diíTe : Que vido o Povo , f , e Officiaes da Camera o mandavaõ, podia fazer o que , } elles lhe ordenaíTem , pois eu naõ era aqui nada : co- ,, mo viraõ iílo , e que eu lhe tomara a licença , nao foy ,ç;.tambem y affim que fó o Almoxarife, que eftava para „ ir bufcar huns papeis , que lhe efqueceraÕ para as fuás „ contas, lie o que vay , ao qual tenho dito o que era „ razaõ : Que viíTe , que era Miniftro de Sua Magefta- ,, de, que viíTe o que fazia , e que na minha mao efta-: » vaõ -i ' • do Ejlado do Maranhão, Liv.XW. 469 „ vau as fuás contas , pois havia algumas duvidas , e Armo 1 66ú „ outras muitas razões ; com tudo me naÕ fio de nin- „ guem 5 e por iíTo, fuppofto, que entendo naÕ fe abri- „ ráÕ as minhas Cartas , he grande coufa , que naõ ache „ huma peíToa nefte Eftado de quem me poíTa fiar, feja 9J Deos louvado, que aííim foy fervido ; quanto melhor ,> era para mim , Padre António Vieira , eftar às pilou- „ radas com o inimigo , ou em alguma outra parte , que „ verme nefte defamparo ! Deos me guie, e encaminhe „tudo, como fabe eílá melhor aofeu ferviço. Nefta „ Carta fallo como quem eftá fem juizo , affim que naô » fey o que lhe diga ; mas S. Jofeph ha mo de querer „ reftituir outra vez , de que eítou muito confiado. To- „ da a canoa , que paflar fem ordem minha , mando ao „ Capitão mór do Pará , e Gurupy , a tomem , e os „ prendaõ 5 fuppofto, que ha muito lhe tenho feito efte „ avifo , ao do Gurupy entendo que naõ , o que faço „ agora. Dizem fe tem ajuramentado todos , e que fe „ tem feito termo , que fe fe prender alguém , fe enten* „ derem que he por efta caufa , de fe amotinarem , e in* „ veftirem , e o tirarem , e pôr fogo a quem naõ o fi- ,, zer: fem embargo diílo tenho mandado ao Ouvidor „ tire devaífa j mas fe dado cafo venha algum Syndi- „ cante de Lisboa , o mandaráõ outra vez , e fó a agua^ >, da lhe daraõ 5 e que vindo Governador , o naõ deixa- „ ráõ entrar três dias , e nelles fe ajuntarão todos , e lhe 5, pediráõ as ordens , que traz j e que fe naÕ forem boas, j, fe irá outra vez : em refoluçaõ eílá efta gente taõ re- „ bellada , que naÕ pode fer mais , e o coutado do pa* „ tife ouvindo tudo ífto , tudo ifto , mordendo- fe , fem „ poder morder j mas, mas, &c. As Cartas , que Vof- í, fa Paternidade me efcrever , fejaÕ com cautela , e no ^ fobrefcrito , que importaÕ ao ferviço de Sua Magef? „ tade. Fizeraõ por Procurador , para ir à Corte , o „ Senhor S. Payo, eftando agora a&ualmente prezo j „per- i 47o Annaes Hiftoricos Anno i66i. „ perdoe Deos a VoíTa Paternidade, &c. Também „ me fizeraõ efla fegunda petição , fobre a caravela do „ Machado j eftou arrebentando , nao poífof aliar com „ VoíTa Paternidade ; por fer ifto Carta. O Vigário da „ Matriz , diz que diíTe ■: Meus Freguezes , íiaò eftais „ excommungados , vinde rezar todos os dias o Terço 5 „ e fó por eíla palavra ficava elle huma, e muitas vezes „ excommungado. A Deos meu Padre, que eftou mu- „ do. S.Luiz, 25 deMayo de 1661. p Amigo, e „ cativo , D. Pedro de Mello. 1042 Navegava o Padre António Vieira da Capi- tania do Pará para a do Maranhão, a vifitar aquellas Chriftandades , como Superior delias , quando na bahia chamada do Cumá , pouco mais de hum dia de viagem da Cidade de S. Luiz , recebeo a Carta do Governador $ e como nella lhe encarregava tanto , que fe retiraíTe do grande perigo a que fe expunha a íua peíToa no defatino daquella commoçaô , fe fujeitou , como Varaô ta 5 fa- bio , às defordens do tempo , voltando logo para a Po- voação do Gurupy , onde focegou bem o feu jufto re- eeyo 5 porque o Capitão mor Joaô de Herrera da Fon- feca , aíTiftido da Camera daquella Villa , difpoz de forte os ânimos dos feus moradores, que naõ fó con- fervarao a mefma obediência , em que até alli viviaõ , mas confiantemente defprezaraÕ todas as propoftas dos amotinados do Maranhão , eftranhando-lhes muito o feu efeandalofo procedimento. 1045 Era a Povoação do Gurupy a principal efca* Ia da viagem do Maranhão para o Pará , como hoje hc a do Cayté , que com pouca difíèrença fica no meyo delia , como já deixo referido ; e bem efcoltado o gran- de Padre António Vieira de três canoas armadas em guerra, continuou o feu caminho até a Cidade de Be- lém , aonde chegando em 2 1 de Junho, fem dar lugar • a que as triftes noticias da fediçaõ dp povo. de S. Luiz alte- do Eftado âo Maranhão , Liv. XIV. 471 alteraífem aquelle , mandou prefentar no Senado da Ca- Anno 1661. mera pelo Padre Francifco Vellofo , Reitor do feu Col- legio de Santo Alexandre , o papel , que fe fegue , que nos taô ponderoíòs , como elegantes termos das fuás exprefsões , claramente nos moítra , que he huma fiel copia do feu original. 1044 „ O Padre António Vieira, da Companhia „dejefus, Superior, e Vifitador Geral dos Religio- „ fos da mefma Companhia nefte Eftado, com todos os „ poderes do Reverendiííimo Padre Geral ; reprefenta >, aos Senhores Vereadores , Juizes , e mais Oííiciaes da „ Camera defta Cidade de Belém , Capitania do Pará , „ que indo da dita Cidade para o Maranhão , na paíTa- „ gem da bahia do Cumá, entrou huma canoa , em que „ vinha o Almoxarife Domingos Fialho , o qual lhe en^ „ tregou hum maço de Cartas do Governador do Efta- „ do D. Pedro de Mello , em que o avifava , que na i, dita Cidade do Maranhão fe tinha amotinado o povo ,, contra os Religiofos da Companhia de Jefus , que „ tem a feu cargo aquellas Chriftandades , e os tinhao j, expulfado do feu Collegio , obrigando violentamente í7 ao Superior delle o Padre Ricardo Carece, a que de- 5 ', fiftiíTe em Camera da adminiftraçaõ dos índios das Al- ); deas do Eftado, que Sua Mageftade lhe tem encarre- ;, gado por fuás Leys , e Regimentos , naô fendo baf- „ tante a reprimir os motins do povo , a prefença do „ dito Governador 5 nos quaes motins fícaõ continuan- „ do adualmente , ajuramentados contra a obediência j, das Leys , e Miniftros de Sua Mageftade , prefentes , „ e futuros , em huma conhecida , e formada rebelliaõ , „ como tudo confta da Carta inclufa, da letra , e final „ do dito Governador ; o qual outro fim , para que nef- „ tas Capitanias fe atalhaíTe taõ perniciofo exemplo, lhe „ mandou na mefma canoa a copia da Carta , que ef- „ creve aos Capitães mores , e Cameras das ditas Capi- „ tanías ? r.f- »[| II!: 472 Annaes Hijloricos Si V'UI » P7 V ?> Atino 1661. „ tanías , que he a que juntamente fe offerece , da letra do Secretario do dito Governador , j unificada pela fua , e por feu final , encommendando-lhe , como da meíma Carta confia , que fizeíTe acudir antecipada- mente ao Pará , e Curupá , para que eftando preveni- das as peíToas do governo das ditas Praças , melhor „ ordenaíTem tudo o neceífario à quietação delias , e „ que elle Padre António Vieira fe fizeífe forte no Gu- „ rupy , e difpozeíTe tudo o mais , como julgaífe con- „ veniente. E por quanto o Capitão mor do Gurupy „Joaõ de Herrera da Fonfeca , e aCamera daquella „ Villa, recebendo o dito avifo do Governador, e Car- „ ta da Camera do Maranhão , em que lhe pedia certa „ ajuda de cuílo , nao fó eílranharaô o procedimento , 31 e exceíTos do povo , como verdadeiros Chriílãos , e v VaíTallos de Sua Mageítade , mas offereceraõ todos „ fuás peíToas , fazendas , e vidas em defenfa da Igreja , „ e Leys do dito Senhor , ficando a dita Villa , e Capi- „ tanía do Gurupy em toda a quietação , e fegurança : „ e tendo o dito Capitão mor mandado tomar o paífo a ?; qualquer avifo , que vieíTe do Maranhão com algu- „ mas canoas de Soldados , conforme as ordens do Go- „ vernador , elle Padre António Vieira fe partio logo „ em companhia das ditas canoas , que lhe deraô efcol- „ ta até entrar nefta Capitania , para nella fazer conítar „ a Voífas Mercês o referido , e lhes requerer (como em „ nome feu , e de todos os Reiigiofos deitas Mifsões re- „ quere ) nao fó a obfervancia , e obediência das Leys „ de Sua Mageítade, paz , quietação, e credito da Re- „ publica ; porque efta he a obrigação , e officio de „ Voífas Mercês , como taõ fieis Vaííallos , e Miniílros „ de Sua Mageítade, e taõ zelofos dos refpeitos , que fe „ devem às fuás Reaes ordens ; mas que Voífas Mercês „ confiderem nas ditas Leys , e ordens , que o princi- „ pai fim , e intento delias , como Sua Mageítade de- clara doEftado do Maranhão, Liv. XIV. A71 „ clara nasmefmas Leys, he a pregação , a propaga- Annoióói. „ çaõ, e confervaçaõ da Fé entre os Gentios , e a obri-r „ gaçaõ , e defcargo da própria confciencia Real , por „ fer eíle o titulo com que Sua Mageílade poíTue efta , „ e as de mais Conquiílas ; e ao dito íim manda, e fuf- „ tenta nellas os Miífionarios , encarregando o favor, „ e amparo das MifsÕes a feus Governadores , e mais „ Miniílros com o encarecimento , que fe vê em feus „ Regimentos , fendo eíle ponto o mais recommenda- „ do , e repetido nelles , e de que com mayor fe vendar „ de promette S. Mageílade tomar conta. E no cafo em „ que efta Republica ( o que de nenhuma maneira fe „ prefume ) moftraíTe favorecer de algum modo os mo „ vimentos do Maranhão , ou naõ fizeíTe todas as de* „ monftraç5es contrarias a ellas , neceífarias ao reparo )f dos damnos , e abalo , que pode caufar entre os In* „dios, afama, e publicação daquelles exceíTos , ficará „ o dito rim , e os intentos de Sua Mageílade total- „ mente fruílrados , e todos os outros bens , e utilida- „ des , que delle fe feguem , aííim à Igreja, como ao „ Eftado , desbaratados , e perdidos ; porque no diílri* „ do deílas Capitanias , e por feus rios , e terras dentro, „ eílá todo o pezo das nações de Gentios , aííim livres , „ como avaíTallados , ou inclinados ao ferem ; as quaes „ todas ao prefente , pela communicaçaÕ. dos Miíliona „ rios, e pela fama das novas Leys de Sua Mageílade , „ fe achaÕ na mayor difpofiçao , que nunca tiveraõ , pa* „ ra a quieta , e perpetua fujeiçaõ , que delles fe defe- „ ja, crefcendo cada dia novas almas a Igreja , e novos ., vaíTallos a Coroa ; e he certo , que com qualquer ace- „ no de mudança, ou alteração do eílado prefente das „ coufas , fica tudo naõ fó perdido , mas ainda defef- ,, perado , e impoífibilitado para o diante , coníiderada „ a multidão , a qualidade , e a difpoíiçaõ natural das ,, ditas nações , e a forma , e condições , cora que fe re- Ooo ; , duziraõ ? Ânno 1661. . 474 Annaes Hiftoricos „ duziraõ , e vaõ reduzindo , dé que fe fará aqui breve relação a VoíTas Mercês , para que viílo o eílado , era , que cada huma das ditas nações fe acha , fe julgue , e „ pondere melhor , o que delias fe pode efperar , ou te^ ,, mer , aííim em ruina da Fé , como em damno do Eíla- ,-, do. Prefentes faõ a VoíTas Mercês os grandes dam- ,, nos > que neflas Capitanias flzeraõ -, de vinte annos a j>; efta parte ,■ as nações dos Nheingaíbas , taÕ vifinhas , >, e taõ inimigas , e quanto mais perigo fa feria ainda pa- y, ra todo o Eílado auniaõ deftas nações com os Hollan- jp dezes , como VoíTas Mercês mandarão reprèfentar fr taõ efficazmente ao Govenador D. Pedro dé Mello , .pp de que refultou tratarfe da paz naÕ efperada > que „Deos quiz fe concluiíTe , e aíTentaíTe na forma , em ^que hoje eílá. Tem-fe já fahido para cima dos rios f, nove Aldeãs, em cumprimento do que prometteraÕ : fi reíidem com elles o Padre Manoel Nunes , e o Padre >, JoaÕ -Maria, peíToas de tantos talentos , experiência y tffo prudência, por fer neceííaria muita para faber gran- ia gear aquella gente , e tirarlhe todas as defconfianças n do tempo panado, as quaes naÕ ha duvida ■, que reno- , f ; varáõ , e accrefcentaráõ muito com qualquer mudan- „ ça , que haja na obfervancia das Leys , e condições , ff - que lhe fbraõ juradas, e promettidas em nome de Sua „ Mageftade, e de que fe mandarão os papeis authen- „ ticos ao dito Senhor ; e no cafo ( o que DeOs naÕ per? n mitta) que efta gente fe torne a meter nos matos , e pp fazemos a guerra , bem fe vê quanto mais fe deve te- ,, mer agora os damnos , que de antes fe temiaõ , e quaõ „ perdidas ficariaõ as efperanças de fe reconciliarem já pp mais por nenhuma via. Os índios da ferra de Hibia- ,, paba , também he notório quanto importa a fua ami- p, fade , e fujeiçaÕ para coníervaçaÕ da Fortaleza do „ Seara , principalmente em tempo , que os Hol lande-? >p zes ( com quem tiveraõ taõ cumprido trato ) tem „ guerras do Eâado do Maranhão, Liv.XIV. 475 „ guerras apregoadas com Portugal ; por occaíiaõ das Annoi66r. „ quaes guerras , fazendo Confelho no Maranhão o Go« „ vernador D. Pedro de Mello , lhe foy refpondido por „ todos os Cabos de mayor experiência , que ío tendo „ por íl os Hollandezes aos índios do Seara , poderia a „ Campanha daquella Cidade fer conquiílada , em que y) confiíle toda a fua defenfa. Aííiílem com os ditos „ índios o Padre Pedro de Pedrofa , e o Padre Gonçalo ,y de Veras : jurarão todos em mãos do Padre António „ Vieira vaíTallagem a Sua Mageílade , debaixo das di- „ tas Leys , que lhes foraÓ moftradas 7 e lidas ; a paíTa- „ gem de Parnambuco por efte meyo deíímpedida , o „ mar feguro , e o comercio corrente , e tudo ifto fe „ perderá, faltando-fe aos ditos índios com o prometti- „ do. Lembrando a Voílas Mercês , que ha alguns en- „ tre elles , que fabem ler as ditas Leys , e entendellas „ como nós. Os Topinambaz , naçaõ de quem os Con- „ quiftadores deíle Eftado íizerao fempre tanto cafo , „ foraõ trazidos doCertaô pelo Padre Francifco Vello- yy {o, e depois pelo Padre Manoel Nunes , e faõ os me- y, lhores Companheiros , que tem eíla Conquifta , para „ dominar com elles as outras nações pela fama de vale- „ rofos , que tem entre elles. Ao prefente tratamos , „ nao fó de defcer aos que ainda ficarão no rio dos To- „ cantins , mas de defcobrir o rio Iguaflu , em que eftá ,y toda eíla naçaÔ , que he muito poderofa , e fera de „ grande utilidade para todo o Eftado ; e fe os Defco- „ bridores , que eftaÔ para partir , levarem novas de íe „ terem quebrado as Leys , com que foraÕ defcidos os „ primeiros , julguem VoíTas Mercês os eííeitos , que „ eíla mudança obrará nos ânimos dos que eílaÕ no ma- „ to , e ainda dos que vivem entre nós de menos difcur- „ fo , e de mais barbaras refoluçoes. Os Poquiguaraz, „ defcidos ha pouco tempo pelo Padre Manoel Nunes , >, e pelo Padre Thomé Ribeiro , eílaÕ juntos , e quie- Ooo ii ,, tos n 476 Annaes Hijloricos t\ ,f|!lgl Ánnoi66i. „ tos com o Padre Francifco da Veiga, e o Padre Pe- j-; dro Monteiro , que os affiftem , e vigiao. VoíTas v Mercês conhecem quaõ impaciente he eíla naçaò de v viverem fora das fuás terras , quaõ fácil tem o cami- v nho para ellas , e quaõ magoados eílaõ dos parentes , í7 que lhes foraõ cativados na guerra paflada. Vieraõ „ todos debaixo das mefmas condições , e promeíTa de „ fe lhes guardarem as Leys de Sua Mageftade : fe as i, virem quebradas , quem os ha de ter maõ ? E que , /conta dará aDeos de tantas almas bautizadas , quem » for caufa deíles damnos , ou quem os nao impedir ? „ O que fe tem dito dos Poquiguaraz , fe entende tam- „ bem dos Catingas , e com muita mayor razaõ ; por- „ que eftaõ acima dos Tocantins , nao ío perto das fuás „ terras , mas quaíi dentro nellas. Os Bocas , novamen- )f te defcidos pelo Padre Salvador do Valle , com efta- „ rem huma ío jornada dift antes deita Cidade , em dous „ dias fe podem paíTar à fua terra , como já o fizeraõ ?> alguns fó com o rumor , que fe efpalhou em certa ca- j, noa , de que os Padres do Maranhão haviaõ fer lan- j, çados das Aldeãs dos índios ; e depois de fe publicar j 7 a verdade do cafo , fe nefta Republica fe naó fizerem „ demonílrações muito contrarias a elle, quem terá maõ „ no refto dos Bocas , e nos Nheingaíbas , que vivem „ entre nós ? Deixo a coníideraçaõ dos efcravos , que „ he reparo , que como mais domeftico , nao deve dar ,, menos cuidado a toda a Republica , que a cada hum ji dos membros delia. No rio Parnahiba eftá o Padre „ Thomé Ribeiro , e o Padre Gafpar Mefch continuan- „ do ambos a converfaõ dos Jurunas , que começou o fl Padre Manoel de Soufa , e a dos Panxiz , que come- » çou o Padre Salvador do Valle ; e dando principio à „dos Mondunas, que faõ vinte Aldeãs da língua geral, „ que tem promettido defcerem-fe eíle anno , e para // que fe eftá difpondo MiíTaõ , tanto em utilidade defta „ Re- ■ do Eftado do Maranhão, Liv. XIV. AlH „ Republica , como a VoíTas Mercês he notório j e o Armo i6ó4 5 „ Padre Joaõ FilippeEílanderf refide novamente entre v os Tapajoz, para os inílruir , e bautizar , e para viíi- -„ tar todas as Aldeãs vifinhas , e ir adiantando a Fé > „ quanto lhe for poffivel , por aquelle grande rio das , ; Amazonas. O modo de pregar deíles Miííionarios he ',, com o Evangelho em huma maõ , e com as Leys de ty Sua Mageílade na outra ; porque tem moílrado a ex- Q periencia :., que fó na confiança do bom tratamento, , ; que nas ditas Leys fe lhe promette , e na fé , e credi- „ to , que daraõ aos Religiofos da Companhia , fe atre- - 1y vem as ditas nações a fahir dos matos , onde geral* ■ J} mente os tem retirado a lembrança, e temor das op- 7f prefsoes paílàdas j crendo até agora , que o patroci- ,, nio das ditas Leys , e dos ditos Padres , os deFende- h ria das ditas opprefsões : mas quando agora virem , f9 que nem as Leys , nem os Padres fe defendem a íi , u como crerão , que os podem defender a elles ? Final- „ mente os Aruaquiz , que he huma das mais nomeadas „ nações , de que ha noticia neílas Conquiílas - 7 já ad- }) mittiraõ Igreja , que deixou edificada entre elles o Pa- „ dre Manoel de Soufa antes de morrer ; e o mayor y} Principal daquella nação mandou cá hum feu irmão , „ que anualmente -refide na Aldeã de Mortigura , fó „ com o intento de aprender a lingua , e de notar fe he „ verdadeiro o trato , que lá publicarão os Padres da- „ vaõ os Portuguezes aos índios depois das novas Leys „ de Sua Mageílade ; e entre os Nheihgaíbas eílá hum „ filho do mayor Principal dos Tocujuz , naçaõ igual- „ mente dilatada, o qual em nome de feu pay jurou „ vaíTallagem a Sua Mageílade com os mefmos Nhein- „ gaíbas , e debaixo das mefmas condições , e he hoje „ o medianeiro , affim da dita vaíTallagem , como de to- „ das as outras praticas neceííarias a fe introduzir a Fé ,,'na dita nação. E fe eíles efpias da gentilidade , que ,, traze- 1 f ."li 478 Annaes Hijíoricos Anno ióói. „ trazemos entre nós depois de ouvirem o cafo atrocif- „ íimo do Maranhão ? taô alheyo da reverencia , e ref- „ peito , que os Gentios tem concebido fe deve aos Sa- „ cerdotes , e às Leys do Rey , naõ virem na Republi- „ ca do Pará humas demonílraçôes igualmente extraor- „ dinarias , pela parte da dita reverencia , obediência , e „ obfervancia , que novas levaráõ às fuás terras ? Que „ credito fe dará já mais aos Pregadores da Fé ? Que „ cafo faraõ das palavras do Rey ; nem do juramento „ dos feus Miniftros \ E finalmente fechada por eíla via „ a porta do Evangelho , quem já mais a poderá abrir ? „ De tudo o referido , que he patente , e notório , af- „ fim como fe vê o grande fruto da Fé , que neílas gen- „ tilidades íè vay colhendo , e o grande augmento a „ que pode crefcer , e dilatarfe brevemente a Chriftan- „ dade, continuando , e conflrmando-fe entre os índios v a opinião , e credito , em que eílaÔ , de fe lhes haver „ de guardar o promettido nas Leys de Sua Mageftade; „ affim fe conhece claramente também a total , e irre- „ mediavel ruina , que fe feguirá , naô fó à chrifta.nda- „ de , e fé das ditas nações y ainda mal confirmadas nel- „ Ia i mas ao mefmo Eftado , e a todos feus intereífes , „ fe com a noticia defte cafo fe acabarem de defconflar, „ e defenganar os índios , de que por nenhuma via fe tf lhes guarda , nem ha de guardar , o que por tantas ve- „ zes , e tantos modos fe lhes tem jurado , e prometti- „ do ; fendo certo , que os índios gentios , que eílaõ n nos Certões , naô hao de querer fahir delles j e que n muitos dos já bautizados , que tem fahido , fe hao de „ voltar para as fuás terras ; e que os que vivem nas „ mais vifinhas a eíla Cidade , e fuás Capitanias , hao „ de juílirlcar a guerra , e continuar com mais irritada ,, vingança as hoílilidades , e damnos , que antes fem e£ „ ta nova occafiaõ faziaõ , que faô confequencias de „ grandiífimo pezo ; e em que muito fe deve reparar , além V M do EJladodo Maranhão , Liv. XIV- 479 „ além de fe impedir de prefente , e para o futuro a §lU Armo „ vaçaÕ de tantos milhares de almas , (que na balança j, do juizo chriftaõ deve pezar mais que tudo ) e a paz ? „ o comercio , e o focego domeílico ; porque naõ ha- „ verá morador , que eíleja feguro em ília cafa , ou fa~ fi zenda , e ainda fe eílorvará o refgate das peças taõ „ defejado, e importante ao maneyo de todo o Eftado , p, e fe feguiráõ outros infinitos damnos temporaes , e e£- „ pirituaes , que fao manifeftos \ pelo que da parte de- ,, Deos, e do Sangue dejefu Chrifto, derramado por „ eftas almas , e da parte de Sua Mageílade , cuja conf- ,-, ciência eftá obrigada à confervaçaõ delias , e pela qual ,, encommendou adita confervaçaõ aos Religiofos da „ Companhia , e da parte dos ditos índios, Gentios , e ,, Chriftãos , como Procurador , e Curador , que he de fi todos , e da parte da mefma Republica , e de todo o* „Eít.ado, requere elle dito Padre António Vieira , e- „ mais Religiofos, a VoíTas Mercês , que com os olhos „ poílos fomente em Deos , e em féu ferviço , e na con- ,,ta eftreitiffima , que VoíTas Mercês lhe haõ de dar „ muito cedo, e com os corações muito. limpos de qual- „ quer defeito , ou refpeito particular , confiderem to- ,j das , e cada huma das coufas , que nefte papel fe lhes : ,, reprefentaÕ , e acudaõ logo ao remédio de tantos , e „ taõ irreparáveis damnos , com o zelo , promptidaõ , „ e efficacia , que pede a qualidade delles , lembrando „ a VoíTas Mercês , que efte cafo éftá ainda em fegre- „ do, e fe naõ tem divulgado , nem chegado à noticia „ de peíToa alguma , com que fera fácil difpor todas as „ coufas, e preveniílas como for mais conveniente, re- „ movendo todos , e quaefquer impedimentos , que de „ algum modo poífaõ obílar à paz, e quietação da Re- „ publica , e à inteira obfervancia, e refpeito das Leys „ de Sua Mageftade , pois a terra , e o povo he peque- >? no , e fao muito conhecidas as peíToas , os animes f ff e os 480 Annms Hijloricos Anno 1661. „ e os íntereíTes de cada huma , havendo muitas por ou- „ tra parte de grande zelo , valor, e prudência , de que „ VoíTas Mercês fe podem ajudar para qualquer execu- „ çaõ neceflaria a efte efFeito. E porque he certo , que „os moradores do Maranhão tem procurado, procu- „ raô , e haõ de procurar fazer complices do mefmo de- „ Mk® aos do Pará , mandando a eííe efFeito canoas , e „ pefíbas , que occultamente os corrompaõ , e perfua- „ daõ j importa, ( eafíim o requerem a Voíías Mercês) „ que em quanto durar a oecaílaõ defte perigo , man- „ dem Voíías Mercês impedir com toda a vigilância a. „ communicaçaô , e paífagem das Capitanias do Mara- nhão para eftas , affim como fe faz com os lugares „ apertados , para que por meyo da dita communicaçaô ,, fe naõ poíTa pegar o contagio. Proteftando a VoíTas „. Mercês , que qualquer falta , defcuido , ou diffimula- „ çao , que nefte cafo houveíTe , fe attribuiriajuftamen- „ te aos mayores ; cujo confentimento foy fempre nef- „ te Eílado a caufa de todas as inquietações , que nelle „ tem havido, como VoíTas Mercês tem vifto , e a Sua „ Mageftade he muito prefente. Efpera o dito Padre „ António Vieira , e mais Religiofos , do zelo , e chri£ „ tandade de VoíTas Mercês , e da grande authoridade, „ que tem com o povo deftas Capitanias , e da obedien- „ cia , e ©bfervancia, com que o mefmo povo fe íinalou „ fempre em refpeitar , e venerar as ordens de Sua Ma- w geftade, que nefta oecaílaõ fe conheça , e em toda „ efta Republica , fua grande chriftandade, e lealdade „ de modo , que o efcandalo do Maranhão fe reftaure „ na opinião dos índios , e do Mundo pelo exemplo do „ Pará, e tenha S. Mageftade muito , que agradecer , e „ premiar neftes vaíTallos , e Deos Noííb Senhor mayo- „ res occafioes de lhes fazer mercês. Aliás da parte de „ Deos , e de Sua Mageftade , proteftaõ por todos os „ damnos , e ruínas irreparáveis , temporaes , v q eípiri- tuaes :> do Ejlado do Maranhão, Liv. XIV. 48 1 ;, tuaes , que do contrario fe feguirem. Ultimamente Anno 1661Í „ pedem , e requerem a VoíTas Mercês façaõ VoíTas „ Mercês conftar de todo efte cafo , requerimento , e ,, proteílo ao Senhor Capitão mór Marçal Nunes da „ Cofta , por fer negocio publico , e de taõ grande im- „ portancia 5 e de tudo o conteúdo nefte papel , e nos „ mais que oíFerecem , lhes mandaráõ VoíTas Mercês „ paíTar certidão , e traslados authenticos , para que „ confte de affim o haverem requerido , e proteftado. „ Cidade de Belém, 21 de Junho de 1661. ^ António „ Vieira. 1045 Attenderaõ muito os Officiaes do Senado da Camera à reprefentaça6 do Padre António Vieira 5 po- rem mais zelofos do focego publico nas melancólicas confequencias daquella commoçaõ , do que fentidos delia : e depois de darem dentro do termo de dous dias todas as providencias , que lhes parecerão neceíTarias para a prefervaçaõ das dejfordens do povo , refponderaõ taõ cheyos de inteireza , como fe vê da fua mefma Car- ta. 1046 „ Vimos , e lemos o requerimento de VoíTa ,-, Paternidade feito em feu nome , e de todos os Padres „ fubditos de VoíTa Paternidade, com a confíderaçaõ , „ que cafo de tanta importância pede , principalmente „ nas caufas allegadas , com o zelo que VoíTa Paterni- „ dade moftra no ferviço de Deos , e bem das almas def- „ ta gentilidade , coufa que nós defejamos muito fe con- „ figa por muitas razões , e particularmente por duas : „ a primeira pelo grande fruto , que fe pode confeguir „ no ferviço de Deos , para o bem das almas da gentili- „ dade deites Certões : fegunda para guardarmos , e ob- „ fervarmos as Leys de Sua Mageftade , paíTadas em fa- „ vor das meímas Chriftandades , com as quaes nos abra- „ çamos nefte Tribunal , fazendo avifos por Carta nof- „ fa a Sua Mageftade ? que Deos guarde , que foy no Ppp „na« 4^2 Annaes Hiftoricos rm .y>. Auno 1661. „ navio de Agoftinho Duarte , na qual fizemos prefen- te a Sua Mageftade o como eftavamos fatisfeitos da „ doutrina de VoíTas Paternidades , e do cuidado com ,., que procedem no efpiritual das almas 5 e no mefmo „ navio fizemos queixa a Sua Mageftade do procedi- fi mento, com que VoíTa Paternidade , e todos feus ^fubditos procedem no governo temporal dos índios , ,$ com a jurifdicçaô taõ violenta , que tem pofto efta Ga- w .:pitaníanomaismiferavel eftado, que fe pode confi- „ derar .-,.. tudo procedido , de que os moradores , e po- „ voadores delia naô faõ fenhores de refgatar hum fó jjefcravo, pelas caufas que defte Senado temos feito „ queixa a Sua Mageftade, e nellas lhe pedimos mande ,, por hum Miniílro defuitcrcflado.ua Corte perguntar „ teílemunhas , que nos faça juftiça , e nos dê Juiz en- „ tre nós , e Voífa Paternidade \ e fem embargo de tu- „ do , vendo, e confiderando com o mayor zelo pofíí- „ vel do ferviço deDeos , e de Sua Mageftade , e ten- „ do refpeitoao que o Governador D. Pedro de Mello „ avifa a VoíTa Paternidade , que para nós naõ era ne- „ ceflario , pois fempre nofla tençaõ foy , e he , com os „ corações , vida, e fazenda , tratar do ferviço de Deos, „ e de Sua Mageftade , na obfervancia das fuás Leys 5 „ para o qual efFeito eftamos preíles para aquietar , pe- „ lo melhor modo poflivel , o povo defta Capitania j e „para o confeguirmos , temos pedido, e requerido ao „ Capitão mor Marçal Nunes da Cofta nos ajude , e de j, favor da fua parte , para que tudo fe faça fem altera- „ çaõ , e fique bem fervido Deos NoíTo Senhor , e Sua ^Mageftade , e feus Vafíallos quietos , e focegados. „Em Camera. Belém, 25 de Junho de 1661. E eu „ Manoel Ribeiro Porto, Efcrivaó da Camera, o efcre- „ vi. m Bernardino de Carvalho, a Manoel Alvares „ da Cunha, 3 Gafpar da Rocha Portocarreiro. Ç ,, Braz da Silva. S3 Manoel Braz. He I (. do E/lado do Maranhão , Liv.XIV. 48 5 1047 He fem duvida , que os moradores de Belém Anno i66u do Pará , menos orgulhofos , que os de S. Luiz do Ma- ranhão , naõ defejavaõ , que o geral fentimento dos po- vos do Eftado, no prefente fyítema , paíTaíTe ao defati- no da fua commoçaÕ j mas como até alli fe naõ acha* vaõ nella comprehendidos , fe naõ defagradavaõ daquel- la deíbrdem ainda os mais prudentes , olhando para ella> como trocedor para as fuás fortunas , na fervidaõ dos ín- dios : mas antes lembrando-fe do poder grande, que lha embaraçava no confiante zelo do Padre António Viei- ra , que capitulava a fua paixão fó como intereíTe parti- cular na mefma ferventia , parece fe alegravaõ da conf- ternaçaõ cm que eftavaô vendo efte Religiofo , quando também fentiaõ como fieis Catholicos a facrilega maõ }' com que na Cidade de S. Luiz fe havia procedido contra os feus Companheiros : porém os Miniílros do Senado da Camera , na contradição deites mefmos -afFe&os , at- tendendo fó à utilidade publica , e ferviço doPrincipe , diílribuiraõ todas as providencias , que julgarão precifas para a confervaçaõ da Capitania no focego dos povos. 1048 Com razaõ entendia aquelle Tribunal, que nas diligencias do zelofo cuidado , com que procedia , defempenhava bem as obrigações do feu minifterio $ e querendo também , que efta mefma noticia lhe grangea£ fe mais crefcida vangloria na fatisfaçaõ do íèu Governa- dor D. Pedro de Mello , lha participou dentro de pou- cos dias , naõ fó fegurando-lhe , que continuaria nas mefmas attenções já com os alvoroços do venturofo fru- to , que lhe promettia a fidelidade daquelles moradoresj mas eílranhando muito aos da Cidade de S. Luiz os bár- baros exceífos da fua loucura , quando efperavaÕ todos da clemência da Rainha Regente , cabalmente informa- da por feus Procuradores , o prompto remédio , de que neceííitavaõ as afflicçoes do Eílado. 1 049 Naõ tinha ainda recebido eíla Carta o Gover- Ppp ii nador ? 484 Annaes Hiítoricos Anuo 1661. nador , quando efcreveo huma aomefmo Senado com as noticias das alterações do Maranhão , que até aquelle tempo lhe naõ havia communicado mais que pelos avi- fos do Padre António Vieira j e aíFeando-lhe com ex- prefsÕes muy vivas o fatal defacordo daquella commo- çaÕ , encarregava a todos os Miniílros o defempenho das obrigações , em que efpecialmente os conftituía o lugar , que occupavaõ , que fegurado bem no focego do povo , feria confufaõ para o da Cidade de S. Luiz com grande gloria fua. 1050 PaíTava ainda muito mais a diante D. Pedro de Mello nas ponderações deíle mefmo difcurfo com outros documentos taõ cheyos de honra , como de po- litica j porque moftrava nelles, que nos movimentos do Maranhão procederia a Corte, ou a benignidade, atten- dendo fó às afrlicçÕes do povo , ou com afpereza , como juíliííima demonítraçaõ do feu defatino , que nas utilida- des da primeira fe achava o Pará igualmente comprehen- dido , e no fentimento da fegunda fó o Maranhão ; fi- cando, também eíle , em ambos os cafos , fó com a inju- ria de huma tal defordem , que na repetição de todas as memorias , aflim prefentes , como futuras , feria o feu efcandalo o mayor elogio para os moradores da Cidade de Belém. 105 1 Porém eíle Fidalgo nao fatisfeito ainda de nu- mas demonílrações taõ cheyas de zelo , paíTado pouco tempo , tornou a repetillas 5 e para empenhar mais os mefmos moradores , para o focego publico , nas certas efperanças dos feus particulares intereíTes , da demiífaõ , que já tinhaõ feito os Miííionarios da Companhia de Je- fus do poder temporal , que exercitavaõ no governo dos índios , também lhes promettia a confirmação com toda afegurança, pelas antecipadas informações, que havia dado à Corte íbbre a mefma matéria , com outras • circunftancias muito favoráveis para a Capitania , e pa- ar ; doEjlado do Maranhão, Liv.XIV. 485 ra todo o Eílado , que lhes dizia faberiaõ bem do feu Anno i6ói. CommiíTario , o Vereador Manoel Cordeiro Jardim , que fe recolhia àquella Cidade , inteiramente deferido nas fuás pretenções , e por conta das mefmas noticias mais efcandalizado da obftinaçaÔ barbara dos íediciofos. 1052 Em 7 de Julho chegou à Cidade de Belém o tal Vereador, e no mefmo dia entregou no Senado a Carta de D. Pedro de Mello j mas os feus Companhei- ros , que nos defpachos da fua commiíTaõ naõ vira5 o da fupplica para a entrada dos Certões do grande rio das Amazonas ao refgate de efcravos , para o ferviço da Capitania , o arguiraõ logo , de que fendo o capitulo mais eífencial das fuás inftrucções , menos zelofo da uti- lidade publica , o defattendera ; pois ainda que moftra- va bem o Governador , que naõ tinha nefta conceífaô a mais leve duvida , a deixava em tudo dependente do livre arbítrio do Padre António Vieira , fó certificando- Ihes , que como fe achava daquellas partes o tal Religio< fo 7 goftofa , e promptamente concorreria para o feu empenho ; porque fabia elle , que o reconhecia muito juftificado. 1055 Sentio bem a força deíle argumento Manoel Cordeiro 5 e valendo-fe fó para rebatello da natural fra- queza da fua memoria , quiz perfuadir os mefmos Com- panheiros , a que entendia elle , que equivocadamente lhe tinha ficado aquelle defpacho na maõ do General com os mais papeis , que lhe pertenciaõ ; mas que dan- do-lhe tempo , iria bufcallos à fua cufta , para que me- lhor fe juftifícaífe a verdade do feu procedimento , já que parecia fe duvidava delle com grande injuria fua , quando os ferviços , que lhe devia aquella Republica na negociação , de que o havia encarregado , fó mere- ciao honras , como bem fe moftrava das que lhe fazia o feu Governador na mefma Carta , com que o arguiaó ; e ainda que recebida mal eíla fatisfaçaõ , o mandarão pre- 486 ' ' Annaes lliftoricos Armo i$6i. prezo para fua cafa , até que appareceíTem todos os pa- peis , que lhe pediaÕ , o abfolveraõ da tal obrigação dentro de poucos dias, reftituindo-o ao exercido do feu, minifterio , para as affiítencias de mayores cuidados na commoçaÕ do povo. 1054 O Governador D. Pedro de Mello avifou a Corte , dos movimentos do Maranhão , por huma cara- vela , quefahio da bania da Cidade de S.Luiz em 1% de Julho j e o Senado da Camera fe naõ defcuidou de defculpar os mefmos defatinos com as encarecidas op- prefsões dos povos na falta de fervos , encarregando a diligencia das reprefentações , com o titulo de Procura* dor, a Jorge de S. Payo de Carvalho, hum daquelies Repúblicos de mais adividade , ou de mayor orgulho j más ao mefmo tempo apurarão também os, fedicioíbs todas as fuás intelligencias , para fazer reos de tao feyo delido os moradores de Belém do Pará , feguindo a dia- bólica politica ( naõ pouco pretendida em femelhantes cafos ) de que crefcendo o numero dos complices nel- le, como naturalmente , ou faria horror, ou daria cuida- do o feu jufto caftigo , quando em lugar deíle naõ lo- graíTem o premio das fuás efperanças , naõ lhes poderia faltar o perdão , além de outras ventagens j e ainda que o principal corpo da Nobreza defenganava bem as fuás inftancias , lhes naõ fahiraõ infruduofas nas defordens do povo , como logo veremos. ANNAES ANN AES ISTORIG DO ESTADO DO MARANHÃO. LIVRO XV. SUMMARIO. OM as noticias das alter/ições do Maranhão vacila a obediência dos moradofes do Pará ; e arrebatados de tamanha deforcjftp 9 nafifò afe- guem dentro de poucos dias , mas fazem tam- lem apprehenfao do grande Padre António Vieira 7 e o remetem para a Cidade de S. Luiz. Reclamaçad judi- cial de D. Pedro de Mello. A ejeolta do povo de Belém do Pará entrega prezo ao de S. Luiz do Maranhão o Pa- dre ^António Vieira. Intenta refgatallo o Governador para o depqfito dofeu Collegio , onde já fe achavao os mais Companheiros 5 mas todas asjuas diligencias faô infru ãuofas. Faz também muitas o mefmo prezo para redu- zir o povo a partidos ; mas com igual fortuna. Eflranha o Governador ao Senado da Camera de Beíem do Pará o ■■ 438 Annaes Hiíloricos Ânno 1661. procedimento dos feus moradores ; mas ponderando hem o prefente fyjiema , fe accommoda~contas.fitisfaç^es do mef* mo Tribunal, Chegai noticias aò Maranhad de ejlar no- meado para a fuccejfao daquelle Governo Ruy Vaz de Si- queira. Novas ' dej ordens dos moradores do Pará, e os efeitos delias. "Entra na Cidade de S. Luiz Ruy Vaz de Siqueira , efocegaíamente recebe o governo das mãos do feu antecefor D. Pedro de Mello, que fe recolhe logo a Portugal. Elogio do novo Governador. Procura o Mar- quez de Marialva a confervaçab 1 dos Miffíonarios da Com- panhia dejefusjia Capitania do Paráj mas' o? Minijlros do Senado da Camera da Cidade de Êelem o fatisfazem fó com attençfies. Praticao também todas , e a mefma matéria , com Ruy Vaz de Siqueira j porém elle , que dominava já a principal cabeça dajediçaÕ dos povos na Jujeiçad' do da Cidade de S. Luiz , faz rejiituir os mefmos Miffíonarios ao exercício do feu mini/ierio j e publicando hum perdão geral , fegura bem o fie ego doÉJlado com grande gloria fua. ' r IO; 5 ACILAVA já a obediência dos moradores de Belém do Graõ Pará com a noticia dos movimentos da Cidade de S. Luiz do Maranhão , que fe ef- palharaõ logo entre elles j e procurando zelofos os Minif- tros da Camera o focego publico , os convocarão para a eleição de três peííbas nobres das que lhes pareceífem mais empenhadas nas fuás fortunas , para que unidas com o mefmo Senado , fe aíTentaífe nelle , o que fe julgaíTe mais conveniente aos communs interefles da Capitania , já que o fatal exemplo do Maranhão a ti- nha pervertido para comprehendella no feu defacordo , quando por inftantes efperavaõ todos o feguro remédio das do Ejlaâo do Maranhão , Liv. XV. 489 das Tuas afflicçôes na benignidade da Rainha Regente, Anno ió6f< que haviaõ já bufcado por feus Procuradores , como recurfo único da fidelidade $ mas reduzida à pratica ef- ta difpofiçaó em 1 5 de Julho , tinhaô continuado os meímos Senadores em tirar os votos até 17 j quando re- colhendo-fe neíle dia ao feu Tribunal , depois da Pro* ciífao do Anjo Cuílodio , fe commoveo o povo com hum tal defatino , que todas as fuás diligencias naÕ fo- ■raõ baílantes para íocegallo. 1056 Pedio entaõ com alteradas vozes, que fe lhe nomeaffe por feu Juiz a Diogo Pinto , no que confenti- raõ aquelles Miniílros forçados da defordem , para que rebatidos os primeiros Ímpetos da fúria popular , fe po- deífe tratar dos intereííès públicos , com a quietação > que era neceífaria : e conferido p cargo pelas mefmas geraes acclamações , logo que o eleito deu o juramen- to nas mãos do Ouvidor da Capitania António Coelho Gafco , ceifou o tumulto. 3 1057 Com razaô entendia o Senado da Camera j? que na nomeação de Juiz do Povo fegurava bem o fo- cego delle ; porém como no viciofo temperamento de{- te disforme corpo a commoçaõ de humores coftuma exafperarfe com os remédios brandos , aquelles mefmos que applicou o cuidado da mais prudente medicina à enfermidade da fua defordem , ferviraõ fomente de ag- gravalla; porque diífolvendo-fe de todo ajunta, que fe havia formado , paíTou elle logo , naõ fó ao facrilegio de fazer apprehenfaõ do grande Padre António Vieira, mas também com o mefmo bárbaro impulfo o remeteo para o Maranhão. 1058 Navegava elle para a Cidade de S.Luiz, fa- crilego defpojo do povo de Belém , quando o Gover- nador D. Pedro de Mello , fem noticia ainda deita no- vidade , politicamente receava , que produziffe algumas de confequencias muito melancólicas ( entre as cegas QSSÍ pa** 49o Annaes Hifloricos Annoióór. paixões detao precipitados movimentos) o taõ íincé- ro , como zelofo animo , com que em outro tempo ti- nha fiado ao mefmo Religiofo quinze , ou vinte folhas de papel aííinadas em branco , para que nas diftancias da Capitania do Pará , havendo accidente nas Aldeãs dos índios , que neceffitaíTe de remédio prompto , lho podeíTe applicar na diílribuiçaõ daquellas providencias, que lhe pareceíTe , que o feguravaõ , com razão confian- do o acerto delias de hum talento taõ grande : e deixan- do vencerfe efte Fidalgo dos honrados efcrupulos , com que difcorria em huma matéria taõ delicada , juftificou bem o feu procedimento pelo feguinte a&o de reclama- rão das meímas firmas , que mandou regiftar nos livros das Cameras de todo o Eftado , tirando também logo certidões authenticas , para fazello publico em toda a parte. 1059 „D. Pedro de Mello, do Confelho de Sua Mageftade , Governador Geral do Eftado do Mara- nhão , que elle tinha feito pleito , e homenagem ao dito Senhor , affim deitas Praças , como de obedecer a quaefquer ordens fuás , e dar à execução o Regi- mento , que fe lhe concedeo para boa determinação do Governo : e por quanto o dito Senhor com gran- des veras , como Chriftianiííimo , defejava augmentar a Fé , e dilatar por fuás terras o Evangelho fagrado , por meyo dos Padres da Companhia , lhe encarrega- va , que todas as vezes , ' que lhe foíTe pedido algum favor , foccorro para efcoltas , e auxilio para efta em- preza , e MiíTaõ , o déíTe 5 e fendo em tudo taõ ze- lofo , e leal a dar inteiro cumprimento , fiando das partes , e virtudes do Padre António Vieira , Vifita- dor Geral , o que lhe reprefentava fobre as Aldeãs , e Povoações , aííim para a obediência dos Brancos , co- mo dos índios , fiado no Regimento , e encargo , que jf lhe fazia Sua Mageílade, e querer taõ ajuílado feguir >; a von- do EJlado do Maranhão , Liv. XV. 491 „a vontade do dito Senhor. j partindo, e indo o dito Anno 1661, „ Padre para o Pará , diílante defta Cidade cento e cin- „ coenta e tantas léguas , lhe dera quinze £ ou vinte rn> „ mas em branco para obrar nas neceífidades , e naõ fal- „ tar em nada do ferviço Real , e de Deos : as quaes „ reclama entre todos os Miniftros dejuftiça , e Guer- j, ra , pedindo reftituiçaõ de todo o obrado , e que def- „ de aquelle tempo em diante fe fizer , e fízeíTe , naõ >, fendo por ordem íua , efcrita toda da íua letra , e íi- „ nal , ou feita pelo Secretario Carlos Corrêa da Silva* >, e firmada de final verdadeiro 5 proteftando a fé , e £ lealdade, que jurou, e obferva a ElRey noífo Se- f t nhor , e fua Coroa , e de nenhuma eoufa incorrer , „.nem lhe fer arguida , propoíta -,' e executada , fendo „ que do dito Padre fia , que naõ excederia 'em coufa „ alguma do ferviço de Deos , b de Sua Mageftade : „ porém para que a todo tempo confte , do que , fe aca- $> fo fucceder 1, o que naõ efpera , defde agora para en- fj taõ, e de entaõ para agora , declara, que he verdadet- ,, ro vaífallo , e defenfor do Eíladò , e que já mais cahio „ em penfamento contrario à obediência, e lealdade ju- „ rada , tomando a todos os prefentes , e aufentes , a i, quem a noticia vier , por teftemunhas y pedindo , que „ deita reclamação , reílituiçaÕ , e ratificação , lhe fe- ?, jaõ paffadas certidões , pois tudo dá por alheyo , neu- ?> tro , e vago , em qualquer modo de empenho , direi- í? to , crença , e verdade , e deíla firma , e do feu final. ? , Em S. Luiz do Maranhão , aos 25 do mez de Julho » de 1661. \âC D. Pedro de Mello. 1060 Nefta feníivel parte focegados já os honrados efcrupulos de D. Pedro de Mello com hum taÕ publico teílemunho da fidelidade do feu animo , fe reveílio de todo para atalhar ainda o fatal precipicio , a que cami- nhavaõ as prefentes defordens , quando vio muito a feu pezar , que arrebatadamente corriaõ para elle j porque Oqq ii che- 1 492 Annaes Hifloricos Atino 1Ó61. chegando prezo o Padre Superior António Vieira , das barbaras mãos de huma boa efcolta do povo do Pará , foy entregue ao da mefma Cidade de S. Luiz, que para fazer mais efcandalofo o feu procedimento na íediçaÕ, em que continuava , entre a perfeguiçaÕ dos Religiofos da Companhia dejeíus , efpecialmente aborrecia a ven* turofa communicaçaõ de hum homem tamanho com hum total defprezo das fuás heróicas virtudes. 1061 Sentio gravemente o Governador efte defa* cato , afíim por conta da facrilega offenfa ao fanto Sa- cerdócio em hum Religiofo de tanta diftinçaÕ no con- ceito do Mundo , como pela grande amifade, que lhe profeífava ; mas vendo-fe fem forças para as publicas de- monftraçoes dos mefmos fentimentos , muito a pezar da mais aguda dor , e da re&a juftiça , os diffimulou a fua prudência , delia também fervindo-fe nas vivas diligen- cias de o refgatar da efcravidaõ do povo para o retiro do feu Collegio , onde já fe achavaõ os mais Religio- fos , como depofitados pelo poder difpotico dos fedi- ciofos : porém nada bailou para penetrar a fua dureza T que defculpavaõ os menos contumazes com differentes motivos. 1062 Intentou com tudo o mefmo Padre António Vieira , do cárcere privado , em que o tinha poílo a vio- lência do povo , reduzillo a partidos muito favoráveis com a eloquência das fuás vozes j porém aquelle monf- tro barbaramente receando a efficacia delias , lhes fe- chou os ouvidqs : e metendo-o logo , com todos os mais Padres , em hum patacho , que fe achava furto na mef- ma bahia de S. Luiz , os fez fahir delia dentro de pou- cos dias para o rio de Lisboa , onde entrarão com feliz viagem. 1063 A Carta , que o Senado da Camera de Belém do Pará havia efcrito ao Governador com as protefta- ções da fidelidade da Capitania , dilatou-fe tanto no ca- minho , do EJlado do Maranhão , Liv. XV. 49 5 minho , que a recebeo elle na Cidade de S. Luiz , quan- Anno i&fa£ do chegava prezo pelo mefmo povo o Padre António Vieira ; mas reconvindo logo aquelles Miniílros com tamanho abíurdo , procurarão bem defcarregarfe nas, juíliflcações do feu procedimento , dando-lhe delle con- ta com a relação de todo o tumulto do dia 17 do mez de Julho : e continuando neftas zelofas exprefsões , lhe çommunicaraõ a noticia , de que os Miílionarios da Companhia , com as primeiras que tiveraõ do mefmo tumulto , defculpavelmente temerofos \ defampararaò< as fuás Aldeãs 5 porém que deites fícavaô já dous na- quella Cidade , hum refugiado no Convento dos Capu- chos de Santo António , outro na fazenda de hum mo- rador honrado ; e que ao grande perigo , que corria fem duvida a confervaçaõ das mefmas Aldeãs na deferçaõ dos Padres , tinha acudido aquelle Minifterio com o re- médio prompto de que neceííitavaÕ , empregando tam- bém as fuás attenções , nos que podia ainda produzir a defordem, que nao mereciaõ menos cuidado nas mal feguras forças da Capitania. 1064 Acommodou-fe D. Pedro de Mello à repof- ta da Camera 5 porém mais obrigado dos perigofos ter- mos a que fe achava reduzido na commoçaò do Eftado, do que fatisfeito do procedimento daquelles Miniftros , e repetindo as recommendaçoes do^focego publico, lhes moílrava bem o juílo fentimento, que lhe refultava, de que fe malograífem as antecipadas diligencias do feu grande zelo , quando todas ellas fe encaminhavaÕ fó aos próprios intereífes da Capitania. 1065 Via-fe eíle Fidalgo tratado como Governa- dor fomente no nome ; e ponderando com maduro con- felho , que as demonftrações da inteira juftiça , que nao podiaõ fuílentar fem forças nao ferviriaõ mais que do eílrago ultimo da fidelidade na defefperaçaô dqs fedicio- fos , naõ quiz arrifcar a pequena parte , que ^ainda con- fervava 494 ■— ■- Ânnaes Hifloricos Atino 1661} íbrvava na fua obediência entre as mefmas defordens , por atalhar fem duvida na diffimulaçaõ mayores defati- nos; acertada politica da fua boa capacidade , emfitua- çaõ tao cheya de perigos. 1066- Com a expulfao taõ efcandalofa dos Miííio- narios da Companhia, tinhaô ceiTado na Cidade de S.- Luiz as alterações publicas j mas confervando ainda os niefmos fentimerttos a obítinaçaõ daquelles moradores V Í6 efperavaõ com impaciência o Teu cabal focego no to- tal extermínio de hmis taes Religiofos , lançando fora de todo o Eftado os que ainda fe achavaò na Capitania do Grão Pará , ultimo fàcrilegio da paixão do feu ódio. ■ 1067 Nefte rnefmo tempo chegou do rio^ de Lif- boa huma caravela ao Maranhão , fem noticia ainda dos feus movimentos 5 mas já com efperanças da felicida- de das fuás pretenções na conceíTaÕ dos índios , além das mais alegres da nova aliança da Coroa de Portugal com a de Inglaterra , pelo matrimonio doRey Carlos- . II. com a- Sereriiflima Infanta a Senhora Dona Cathari- na -, mas entre os feílejos de huma occafiaõ de tantas, círcunftancias , para os intereíTes da Monarquia, nada fendo baftantè para a obediência dos amotinados , tra- tarão logo de fazer fahir aquella embarcação para a Ci- dade de Belém : e antecipando avifos ao Senado da Ca- mera , para que difpozeíTe a viagem dos Padres , que fuppunhaõ já em poder do povo, queriaõ que feguif- fem a mefma fortuna dos feus Companheiros , aífim na violência , como nos difcommodos do tranfporte j ulti- ma memoria na fertilidade das do prefente anno. Armo 1662. 1068 Logo nos princípios do feguinte de 1662 , chegou à Cidade de Belém , com as noticias de Portu- gal , em que também entrava a da fucceíTaõ do gover- no do Eftado na peíToa de Ruy Vaz de Siqueira , o Ou- vidor Geral Diogo de Soufa e Menezes , Bacharel de bom nome, acompanhado do procurador do Povo de do EJlado do Maranhão , Liv. XV. 49 í S. Luiz António Barradas de Mendoça, que levava os Anno 1662. aviíbs fobre a expulfao dos Padres ; e por mais que o Senado recebeo Cartas de António de Albuquerque Maranhão , feu Procurador na Corte de Lisboa , com a confirmação das mefmas noticias , naô fe dando ain- da aquelles moradores por fatisfeitos delias , fem a fepa- raçaõ dos Mifíionarios da Companhia de Jefus , apref- fadamente mandarão bufcar os que fe naô achavaõ na Cidade , para que todos juntos foíTem remetidos para Lisboa na caravela , que já os efperava. 1069 Prudentemente receofos dos infultos do po- vo , delamparando as fuás Aldeãs , fe tinhaÕ elles aco- lhido à Fortaleza do Curupá , onde favorecidos do feu Commandante Paulo Martins Garro , fe refiftiraô ao Procurador António Barradas , a quem fe encarregou efta execução, afMidos já dos Companheiros de Belém do Pará > que com o amparo de Manoel da Vide Sout- to-Mayor, morador poderofo damefma Cidade, ha- via5 defertado logo que fahio o Procurador 5 o qual defenganado de confeguir o fruto da fua diligencia , fe recolhia a dar conta delia ao feu Conílituinte , quando o Ouvidor Geral Diogo de Soufa , que paífou nefte tem- po ao mefmo Curupá com huma dependência do feu of- ficio , naõ fe pagando ainda da louvável acção de con- correr muito para a oppoílçaõ de hum tal defatino , quiz também caíligallo com eílranhavel zelo j porque fahin- do da Fortaleza com quatro canoas bem guarnecidas de Soldados , atacou as do Procurador : e rendidas com pouca reíiílencia , o carregou de ferros , e ao feu Efcrn vaô. 1 070 Rebentando todo de Soldado ? fe recolheo ef- te Miniílro à mefma Fortaleza com os defpojos da vi- toria , fem advertir o feu defacordo , que o arrebata- mento , com que procedia no prefente fyftema , irritan- do mais a obftinaçaó dos fediciofos ; faria crefcer muito o pe- 496 Annaes Hiftoricos Aiino i66z. o perigo das revoluções , como fuccedeo dentro de poucos dias j porque chegando todas eftas noticias à Ci- dade de Belém do Pará; por velozes correyos, foy taÕ geral a commoçaÕ do povo , que naõ bailando para fo- cegallo os zelofos officios do Senado da Camera , to- mou logo a temerária reíbluçaõ de ir tirar os prezos com a força das almas. 1 07 1 Neíla perigofa íituaçao fe achava a Cidade de Belém pelo defacordo do Ouvidor Geral , quando igno- rante ainda o mefmo Miniílro da Tua producçaõ , pal- iou ao fegundo de efcrever huma Carta ao Senado da Camera , com outra que chamava de diligencia , em que vaidofamente arrogando-fe o titulo de fupremo Mi- niílro da Juíliça em todo aquelle Eítado , mandava fuf- pender os Tribunaes delia , também intimando ao Juiz do Povo Diogo Pinto , e ao feu Procurador Manoel Lopes , a defiftencia dos feus officios com a commina- çaõ de graviííimas penas 5 e fem dar a mais leve fatisfa- çaõ do procedimento , que havia tido na prizaõ do Pro- curador António Barradas , encarregava a obediência deílas mefmas ordens com mayor império , que o que lhe permittia em tal conjunóhira ainda a mefma íbbera- nia , em que o collocava a fua vangloria. * 1072 Efcandalizou-fe , com razão , aquelle Tribu- nal deílas foberbas prefumpções 5 mas attendendo fó à utilidade publica , procurou de todo feguralla no foce- go do povo 7 rebatidos já os primeiros Ímpetos da fua fúria : e mandando chamar ao Juiz , e Procurador para reduzillos a demiíTaõ dos feus empregos, o confeguio com grande fortuna , fazendo ambos as mais rendidas proteííaçÕes da fua vaíTallagem ; porém o Ouvidor da Capitania António Coelho Gafco , Miniftro de letras, que fe achava também no mefmo Senado , vendo , que inteiramente fe cumpriaõ as ordens do Ouvidor Geral Diogo de Soufa , impugnou logo as da fufpenfao do cur- fo do EJlado do Maranha , LivJCV. A97 (o da Juíliça com o incontraítavel fundamento , de que Anno 1662. naõ era licita em Direito , e muito menos fem Decreto abfoluto do Príncipe Soberano , como fuperior às mefc masLeys; em cujos termos , convencidos de bárbaros os taes procedimentos , naõ podiaõ fer obedecidos 5 mas antes fim fe devia dar conta de todos ao Governador Geral do Eítado , que fó reconhecia por Miniftro fu- premo, como Lugar-Tenente do mefmo Soberano , fen- do fó poderofa a oppofiçaõ de dous Bacharéis para íli- hir eíta confííTaõ da boca de hum delles. 1 07 5 Deixou-fe penetrar o Senado da Camera def- tas doutrinas j e fervindo-fe de hum tal accidente a conf- ternaçaõ , em que fe achava o povo com as demifsões dofeujuiz, e Procurador, os acclamou de novo 5 o que baftou para que fícaíTem logo reílituidos ao exercí- cio dos mefmos empregos com grandes applaufos. 1074 Tomou- fe efta refoluçao em 23 de Fevereiro a vozes do povo , e em 4 de Março fe juntou o mefmo, com o feu Juiz, e Procurador , no Senado da Camera , onde reprefentou por boca do ultimo , que como fe ti- nha affentado , em que fe foíTe à Fortaleza do Curupá com aquellas forças , que bem feguraíTem na foltura dos f rezos a fatisfaçaõ da fua injuria , nomeava para Com- mandante deita expedição a Pedro da Coita Favella > para que os acertos da fua conhecida capacidade po- deflèm atalhar as defordens de hum povo gravemente offendido, já que naquella acçaõ fe encaminhava fó ao focego publico , como intereíTe próprio da Capitania. Era o eícolhido hum dos Vereadores do mefmo Sena- do ; e naõ fe podendo eíte refiítir à impetuofa eleição do tumulto , fe conformou com ella , o que também fez Pedro daCoíta, inculcando bem a grande repugnai cia , com que fe fujeitava. 1075 Na manha feguinte deu conta de tudo o mef- mo Tribunal a D. Pedro de Mello ; e Pedro da Coita , Rrr arman- 498 jínnaes Hiílorkós Aniio 166Í. armando em guerra as canoas , que lhe parecerão necef- farias para a jornada do Curupá , fahio da Cidade de Belém dentro de poucos dias : porém aíTiílido da gran- de fortuna , que quafi fempre o acompanhava em todas as acções , o favoreceo nefta com hum tal empenho , que o defobrigou do taõ arrifcado , em que o tinha pof- to a defordem do povo ; porque achando-fe fora da For- taleza a mayor parte dos Miííionarios , os recolheo lo- go a hum Conventinho , que entaõ alli havia da Ordem de NoíTa Senhora do Monte do Carmo , do qual trasla- dados a bordo das embarcações , fe fatisfez bem aquelle monílro da facrilega preza deftes Religiofos , em def- conto do feu Procurador , e EfcrivaÕ ; mas faltando ainda à mefma defordem , para encher de todo as fuás medidas , o virtuofo Padre Francifco Veliofo , que na- vegava com outro Companheiro o grande rio das Ama- zonas , em diligencias fantas do feu miniílerio , mandou fazer apprehenfaõ nelles pelo deílacamento de fete ca- noas : e fem que efperaíTe a fua uniaõ , ou os avifos do fucceíTo , quebrada já a primeira fúria , voltou as fuás proas , refpeitando de forte a immunidade da Fortaleza, ou a da fúa artilharia , que hia já laborando , que até oífendeo menos a do Sacerdócio nas exteriores atten- ções , com que foy tratado. 1076 Chegou Pedro da Cofta à Cidade de Belém do Pará ; e como o empenho de todo aquelle povo fe encaminhava fó à expulfaõ dos Padres , naõ fe feguran- do de os pôr em cuílodia no feu mefmo Collegio , os re- colheo logo com muito boa guarda na embarcação , que efperava por elles para fazerfe à vela $ o que fem duvida executaria na mefma hora , fe naõ foífe tal a obf- tinaçaõ dos fediciofos no aborrecimento dos Miííiona- rios , que nem quiz tolerar , que ficaíTem ainda na Ca- pitania os dous que faltavaõ. 1 077 Neíle mefmo tempo tinhao já chegado a Lif- boa do EJlado do Maranhão , Liv. XV- 499 boa as primeiras noticias das alterações do Maranhão , Anno 1662. que feguidas dos Miííionarios da Companhia dejefus, expulfados pelos fedicioíbs com o feu Superior Antó- nio Vieira , fe efcandalizou por hum tal modo o virtuo- ío animo da Rainha Regente , que ainda fendo tantas , e taõ perigorofas as opprefsões da guerra , ardendo em zelo fanto , mandou logo pôr promptos duzentos Sol- dados para o caftigo daquelle facrilegio . e o recom- mendou com a mais religiofa efficacia ao Governador Ruy Vaz de Siqueira 5 mas rebatido efte primeiro im- pulfo pelas politicas reflexões dos principaes Miniftros , fe deixou convencer a mefma Senhora dos fundamentos delias 5 porque de novo determinando , que levaíTe fó o Governador aquella equipagem , que fe entendeíTe lhe era preciía para a oppofiçaõ de qualquer pirata , fiou juílamente /das fuás acertadas difpofições a felicidade dos fucceííbs futuros. 1078 Em virtude deite prudente acordo fahio do rio de Lisboa Ruy Vaz de Siqueira no dia 8 de Feve- reiro com duas náos mercantes de pequeno lote , fem mais guarnição , que a de poucos Soldados a bordo da fua para a defenfa de ambas 5 e naufragando com mere- cida laílima a que o feguia , antes de entrar a barra de S.Luiz, aembocou elle taõ.affiftido das vigorofas for- ças do feu grande animo , que dando fundo na mefma bahia da Cidade em 25 do mez de Março , na manha feguinte defafogadamente recebeo o governo das mãos do feu anteceífor D. Pedro de Mello ; mas foy taõ atre- vido o arroj amento dos fediciofos , que achando-fe já no Senado da Camera para a formalidade da fua poífe , lha naõ quizeraõ confentir , fem que aflinaíTe hum ter- mo , de que naõ levava ordens algumas , que favorecef- íem os Religiofos da Companhia de Jefus , fobre a fua expulfaÕ; e que moftrando*as , fenaõ cumpririaõ s acer- tada reíignaçaõ defte Fidalgo , por mais que violenta , Rrr ii para 5 oo Jinnaes Hijloricos \f *■; JÈIi Anno 1662. para atalhar mayores defatinos na commoçaõ de hum povo taõ obftinadamente endurecido no feu bárbaro ódio, quando para haver de o reduzir à moderação de- vida , fe via fem mais armas , que as da fua muita capa- cidade. 1079 Perdeo muito o Eílado do Maranhão na do- cilidade do Governador D. Pedro de Mello 5 mas as ef- peranças do fucceíTor , ou os alvoroços da novidade ( que coílumaõ fazer mayores imprefsôes nos inconftan- tes génios Americanos ) enxugarão bem as lagrimas dos povos 5 e D. Pedro de Mello juftamente vaidofo de ha- ver confervado fó com as fuás reprefentações alguma parte do refpeito do Principe no perigofo eftado de tan- tos movimentos , fe recolheo logo a Portugal , acompa- nhado de feu filho primogénito D. António Jofeph de Mello , que de muy tenra idade lhe tinha affiílido na- quelle Governo com o poílo de Capitão de Infantaria. 1080 RuyVaz de Siqueira, Commendador de S. Vicente da Beira na Ordem de Chrifto , tinha fervido de Soldado por efpaço de fete annos , antes da Accla- maçaõ de Portugal 5 e continuando o mefmo exercicio na porfiada guerra , que fe lhe feguio , fe achou na Pra- ça de Elvas , quando o Marquez de Torrecuza , Gene- ral das Armas de Caftella , intenton atacalla -, occafiaõ em que grangeando , como em todas as mais , a que o conduzio o amor da Pátria , bem merecidos créditos para o feu valor , o premiou a Rainha Regente com o prefente emprego , de que também o fazia digno a qua- lidade da fua peíToa , que illuílravaô mais as muitas vir- tudes , de que fe ornava. 1 08 1 No dia feguinte ao da fua poífe recebeo Car- tas do Senado da Camera de Belém do Pará , efcritas ainda ao feu anteceífor, com os avifos dos novos movi- mentos a que provocara aquella Cidade o Ouvidor Ge- lai Diogo de Soufa na afpera prizaô do Procurador An- tónio do Eâado do Maranhão , Liv. XV. 5 ox tonio Barradas , e Efcrivaõ do Povo ; e procurando Io- Anno 1662; go Ruy Vaz de Siqueira a fatisfaçaõ delle para atalhar mayores defordens , convocou huma Junta no mefmo dia , onde declarou , que mandaria ir à íua prefença o Ouvidor Geral com todos os mais complices naquelle defacordo , para fe fazer a demonftraçaõ , que elle me- receíTe ; e que os MiíTionarios da Companhia , que íup- punha ainda refugiados no Curupá , feguiriaõ a mefma jornada : porém ajunta, que fe compunha do Tribu- nal da Camera , e principal Nobreza , comprehendido tudo na fediçaõ paliada. , louvando muito a primeira re- foluçaÒ \ impugnou a fegunda com o fundamento das, alterações , que ameaçava no aborrecimento daquelles moradores ; e o Governador , que com fabia politica fó encaminhava as fuás medidas à reconciliação dos mef- mos Miffionarios , cedendo virtuofamente à grande for- ça, que ainda fe lhe oppunha , diííimulou o animo , ex- pondo fó de novo , que os taes Religiofos fe recolhef- fem ao Pará debaixo da decente cuílodia do feu Capi- tão mor, onde também fe confervariaõ até o ultimo ex- pediente , que fe tomaffe naquella matéria com a appro-p vaçao de todo oEílado , a que aíTentindo ajunta, fem a mais leve contradição , ficou toda conforme. 1082 Como na companhia de Ruy Vaz de Siquei- ra tinha também hido com o defpacho de Capitão mor do Grão Pará Francifco de Seixas Pinto, pareceo ao mefmo Governador , que a elle tocava , como Com- mandante da Capitania, a prompta execução de todas as ordens , que lhe pertenceíTém ; e expedindo logo as que já fe achavaô por afíento da Junta , com as mais que entendeo eraõ convenientes ao focego publico , o fez continuar a fua viagem até a Cidade de Belém , on- de defembarcou com felicidade dentro de poucos dias , affiftido de quarenta Soldados. 1085 A efte mefmo tempo já Ruy Vaz de Siquei- ra 5°2 Annaes Hiftoricos m í Atina t66z. ra tinha avifado da fua fucceíTaõ no governo do Eílado ao Senado da Camera , com a copia também do aflento da Junta , íbbre os movimentos da mefma Cidade $ e prevenida ella , recebeo o Capitão mór com todo o íò- cego , e grande eílimaçaõ , que empenhava mais para as publicas demonílrações o geral defagrado do feu an- teceíTor Marçal Nunes da Coíla , que fe recolheo logo para Portugal. 1084 Em 16 de Abril entrou no governo da Capi- tania Francifco de Seixas Pinto , Cavalleiro da Ordem deGhriftoj e como o tinhaÕ graduado para eíle em- prego , além das boas partes de que fe compunha o feu merecimento, a diílinçaõ do feu ferviço , continuado por mais de vinte annos no Eílado do Braíil , e Reino de Angola , cada dia fe pagavaõ mais da fua fucceíTaõ aquelles moradores. 1085 Achou ainda os Miífionarios da Companhia a bordo da embarcação , em que os tinha pofto com vi- gilante guarda a femrazaõ do povo ; e temerofo eíle de alguma novidade, antes de lhe dar poíTe , lhefezaffinar termo de nao embaraçar com pretexto algum a fua ex- pulfaõ , à imitação também do procedimento , que te- ve o Maranhão com o Governador , de que eílava avi- fado pela mefma Camera. 1086 Feflejou muito a Capitania do Pará a fuccef- faõ do governo do Eílado j porque além das feguras noticias , que tinhaõ chegado aquelles moradores das excellentes partes de Ruy Vaz de Siqueira , ajudou também para os feus applaufos a mefma conjundura : e recebendo quaíi ao mefmo tempo duas Cartas fuás o Se- nado da Camera , de que formou conceito muito favo^ ravel aos intereífes das fuás pretenções , crefceraõ ain- da mais as venerações da fua peíToa. 1087 Com huma das Cartas do Governador entre- gou também outra no mefmo Tribunal o Capitão' mor Fran- do E fiado do Maranhão , Liv. XV. 5 o j Francifco de Seixas do grande Marquez de Marialva Anno 1662. D. António Luiz de Menezes , que naõ fe dando ainda por fatisfeito de haver fuflentado com a fua efpada a li- berdade de Portugal na gloriofa batalha das Linhas de Elvas , fazendo-nos para fempre feliz o dia 14 de Janei- ro de 1659 , quiz também com a penna atalhar o peri- go das fuás Conquiftas no fatal exemplo a que 'caminha? vaõ as doEftado do Maranhão , moftrando ao mefmo tempo o taõ catholico , como prudente zelo , que ref- plandecia entre as fuás virtudes , como bem fe conhece dos fuccintos termos da mefma Carta , que ambiciofa- mente me pareceo aqui trasladar para authorizar a mi- nha Hiíloria com a fociedade dos eferitos de homem ta- manho. 1088 „ O zelo , e amor , que devo ter a VoíTaS> „ Mercês , me obriga a dizerlhes o grande fentimento „ que houve nefta Corte , quando neila entrarão os Re- „ligiofos da Companhia dejefus, que andavaõ neíTa „ MiíTaÕ , expulfados deíTe Eftado \ ufando. os expulfa- „ dores da fua potencia , como fe foíTe Real 5 e he cer- „ to , que VoíTas Mercês nao viriaõ em confentimento „ de tamanho exceflb , antes procurariaõ atalhallo por „ todos os meyos , pois da fua prudência fe naô pôde „ efperar menos ; porque quando os ditos Religiofos ry deíTem algum efcandalo , e fe naõ empregaíTem no „ ferviço de Deos, com o zelo que coftumaÕ , fempre » VoíTas Mercês tinhaõ recurfo a Sua Mageftade, que >, lhes mandaria fazer juftiça , e razaõ , e eu no que a n tiveíTem feria feu Procurador 5 e affim fera convenien- te , e muito do ferviço de Deos , que VoíTas Mercês „ fe hajaõ com os Religiofos , que ahi ficarão , como „ pede o ferviço do dito Senhor ; porque deíla maneira „ feraõ ouvidas as queixas por Sua Mageftade, quando „ as tenhaõ , e Sua Mageftade mandará deferir a ellas : „ e eu com efta condição me obrigo a fer feu Procura- ,. dor \\ : r 504 Annâes Hiftoricos Armo i66í> „ dor de VoíTas Mercês , que Deos guarde muitos an- „ nos. Lisboa, 6 de Fevereiro de 1662. 53 Marquez de Marialva. V 1089 Efta breve Carta encheo dehuma juftiffima vangloria o Senado da Camera 5 mas entre algumas , querecebeo de Portugal na mefma monção , teve tam- bém outra de Jorge de S. Payo de Carvalho , que affif- tia na Corte com a incumbência de Procurador da Ca* pitanía do Maranhão, na qual condemnando a errada politica , com que aquelles povos haviaõ remetido pa- ra o Reino o Padre António Vieira , taô attendido dos primeiros Miniílros , encarecia o grande poder com que, efpecialménte favorecido de Pedro Fernandes Montei* ro , fe empenhava todo em desfigurar as queixas do Ef- tado : porém que repetidas com mais viva voz na pre- fença da Rainha Regente , já principiava a efcutallas com muitas efperanças de deferir a ellas $ e como alem do obílinado ódio daquelles moradores contra os Reli- giofos da Companhia , o fizeraõ crefcer eftas novidades; íèrviraõ de pretexto aos Miniftros da Camera para def- culpar com o Marquez de Marialva o máo fucceífo da fua diligencia na reducçaõ do povo à confervaçaô dos Miffionarios , fegurando-lhe , que empregarão nella to- dos os bons officios fó por lhe dar gofto , o que foube- raõ bem reprefentar com huma reporta cheya de refpei- tos. 1090 Do mefmo modo tinhaó já refpondido a Ruy Vaz de Siqueira com as mais politicas exprefsoes da fortuna do Eftado pela do feu governo ; e querendo in- culcalia muito efpecial nas eftimações da Capitania , também encareciam as demonftrações delia : que nunca faltaõ termos para perfuadillas muito verdadeiras na fe- cunda rhetorica da lifonja. 1091 Com tudo o Capitão mor Francifco de Sei- xas , que aflinou o termo de nao alterar , o que eílava dif- do Ejlaâo do Maranhão , Liv. XV- 505 difpoílo fobre a expulfaõ dos Padres , induftriofamente Anno 1661V tinha confeguido o confentimento , de que fe recolhe f 4 íòm a humacafa particular , onde adminiftraíTem com menos indecencia , e mais commodidade , as precifas funções do Teu miniílerio , em quanto tardava a fua via- gem , obrigando-fe elle à pontual entrega das fuás pef- foas ; porém o mefmo povo defconííado já de novas pro- porias para a fua total confervaçaõ , fufcitando os tu- multos , tornou a embarcar a mayor parte delles no dia 3 de Mayo, fem que baftaífem para poderem rebater os furiofos ímpetos da refoluçaÕ todas as diligencias do Se- nado da Camera , que ainda que feguia os mefmos fenti- mentos no ódio dos Padres , fe empenhava fempre no fo- cego publico da Capitania : e dando também conta de£> tas alterações^ao Governador, fe fabia fervir de bem e£* tudadas reprefentações para juíliíicar o feu procedimen- to em todos os fentidos. 1092 Nefte mefmo tempo fabia já na Fortaleza do Curupá o Ouvidor Geral Diogo de Soufa , que o Go- vernador o mandava ir à fua prefença com a boa efcolta dos quarenta Soldados , que acompanharão do Mara- nhão o Capitão mor Francifco de Seixas 5 e querendo pouparfe às defcompoíluras da violência , a que naõ po- dia refiílir , voluntariamente antecipou a mefma jorna- da , aííiílido também de Manoel da Vide Soutto-Mayor, feu focio nas prizoes do Procurador , e Efcrivaõ do Po- vo j mas como elle tinha recebido as certas noticias , de que aquelle Miniílro havia paíTado tanto mais a diante nas demonftraçoes da feveridade , que dos mefmos ho- mens , que prendera na companhia do Procurador, con- demnara quatro , fem verdadeira forma de juizo , à pena de açoutes , que aceleradamente executara em dous no mefmo Curupá, quando entrou na Cidade com Manoel da Vide , foy tal a commoçao , que para falvallos do ar- rebatamento da fua fúria , neceííitou bem o Capitão mor Francifco de Seixas de recolher a ambos na Fortaleza , Sss donde , ■ Atino 1662. 5o6 Atindes Hifloricos donde os tranfportou a S. Luiz do Maranhão com gran- de cautela j que a tanto obrigaõ as apaixonadas opera- ções de hum Miniílro imprudente, que naõ íabendo co- nhecer os tempos , mal pode diílinguillos. 1093 Muito levemente aviíbu também defta novi- dade o Senado daCamera a Ruy Vaz de Siqueira , car- regando fó o Ouvidor Geral Diogo de Soufa 5 e tendo- fe paiTado poucos dias , requereo o povo no mefmo Tri- bunal , que fe notiflcaíTe o Capitão mor para ratificar o termo , que aííinara de naõ embaraçar com pretexto al- gum a total expulfaÕ dos Religioíbs da Companhia ; porque a alteração deite negocio , ameaçava outras de melancólicas confequencias , reprefentaçaõ a que defe* riraõ aquelles Miniftros na mefma forma delia $ mas que- rendo ainda inculcar fó como attençao ao focego publi- co , o que na mayor parte era paixão própria. 1094 Encarecia o povo as .opprefsões , que tinha padecido com a falta de fervos , debaixo da difpotica ad- miniftraçaõ dos Miffionarios da Companhia de Jefus j e çondemnando abfolutamente as operações do feu fanto zelo , fó como próprias conveniências no ferviço dos ín- dios , accrefcentava outras diíFerentes, queixas do feu Superior António Vieira , que fe fazem incriveis no vir- tuofo comedimento deíle Religiofo j e fenaõ veja-fe no feguinte Capitulo , que he o feíTenta e nove da fua Vi- fita das Mifsões ( approvada como Regimento pelo feu Geral Joaõ Paulo Oliva) a reda intenção, com que procedia nas mefmas chamadas ambições, de que o ac- cufavaõ. i°95 tf Que naõ fe confintaõ em nenhumas Aldeãs „ índios , que pertençaÕ a outras , mas fejaõ logo reme- „ tidos à fua com a fegurança neceíTaria , e muito me- „ nos fe confintaõ efcravos Portuguezes , ou que fejaõ „ tidos por taes ; e quando os ditos efcravos digaõ, que „ faõ livres , fe lhes refponderá , que naõ fomos Juizes „ das fuás caufas j que fe quizerem requerer fuás liber- „ dades , do Eftado do Maranhão, Liv. XV- „ dades , o façaõ pelos meyos ordinários da juíliça ; mas Anno 1662, „ fe eíles , ou outros quaefquer índios nao forem das Al- „ deas , que temos a nofíb cargo , por nenhum modo nos ? , ponhamos a impugnar o feu cativeiro , nem a folicitar „ a fua liberdade , por íer eílahuma obra de caridade , „ de que fe feguem grandes efcandalos , e que impede „ mayores bens. 1096 Mas a obftinaçaõ do povo do Pará , desfigu- rando em tudo as louváveis acções de hum homem ta- manho , para de algum modo cohoneftar as fuás na vio- lência , em que continuava , fe fujeitava com toda a fub- miífaò , a que fe repartiíTem as MiísÕes do Eftado por todas as mais Religiões delle , e ainda do Reino, fendo neceíTario j porque exceptuando a da Companhia, fe ac- commodava a todas , dizendo, que era jufto, que tam- bém o trabalho daquella grande vinha fe dividiíTe por outros Operários , para caber a todos , fem dellgualda- de , efcandalofa fempre a Deos , e ao Mundo. 1097 Nefte mefmo fentido informarão também os Miniítros da Camera a Rainha Regente , defculpando em tudo os excefíbs do povo , ao mefmo tempo que exe- cutando o ultimo na expulfao dos Padres , logo que che- garão os que fe efperavao do Certaõ do grande rio das Amazonas , os fez fahir todos do daquella Cidade , fem attençaõ alguma às expreíTas ordens do Governador ? que mandava deter as duas embarcações , que fe acha- vaõ nelle , até que recebeíTem a feu bordo as Cartas para o Reino , que ficava expedindo 5 mas tendo ambas de- fembocado a barra já nos fins de Mayo , huma delias a tornou a entrar com huma agua aberta , que nao podiaÔ vencer as bombas. 1 098 Nefta embarcação , que arribou ao rio de Be- íem do Pará , hiaõ fete dos Religiofos exterminados j e vencida a dureza daquelle povo pelos bons officios do Capitão mor Francifco de Seixas , os recolheo elle a hu- ma cafa particular com toda a decência , em quanto fe Sss ii naõ 5o8 Annaes Hiftoricos ,] S Anno 1662. naõ punha prompta a mefma embarcação para feguir viagem j mas a fua defcarga ; que foy precifa para aquel- la obra, fazendo dilatalla até 18 do mez do Junho, che- gou neíle dia huma Carta do Governador , que domi- nando já as principaes forças do corpo do Eílado na re- ducçaõ da cabeça delle , íabia bem moftrar na livre ex- pedição de novas ordens , para a confervaçaõ dos mef- mos Miffionarios , que toda a moderação com que fe ti- nha havido na commoçaõ dos povos , fora prudente in- duílria para fujeitallos , efcolhendo antes repetidas quei- xas do valor opprimido , que das obrigações do feu mi- niílerio : porém ao mefmo tempo inculcando também a bondade do animo , fegurou melhor a rendida obediên- cia da Capitania com hum perdão geral , publicado já no Maranhão, que abfolvendo fem reílricçaõ alguma as culpas comettidas nas revoluções até aquella hora , comminava na reincidência delias graviíflmas penas, co- mo fe vê do feguinte traslado. , 1099 „ Ruy Vaz de Siqueira , Commendador da „ Ordem de Chriílo , da Villa de S. Vicente da Beira , e „ Governador Geral do Eílado do Maranhão , ÔCc. Fa- „ ço faber a todos os moradores deíle Eílado do Mara- ? , nhaõ , e em efpecial aos da Cidade de Belém , Capita- ? , nia do Pará, que pela Junta, que fez em 29 de Mayo „ deíle prefente anno , na fanta Cafa da Mifericordia , „ com o Senado da Camera , Prelados doEcclefiaílico , „ e Religiões , Nobreza , e Povo , fobre o aju {lamento „ das duvidas , que fe haviaõ movido com os Religiofos „ da Companhia de Jefus , de que refultou a expulfaÕ , ,,que no dito Eílado fe fez dos fobreditos Religiofos , „ havendo aceitado a propoíla , que lhe fiz fobre eíla y, matéria, todos uniformente refpondendo, que naõ ti- „ nhaõ duvida , a que os ditos Religiofos fe reftituiílem „ aos feus Collegios no efpiritual fomente : e pela infor- „ maçaõ , que tirey por ordem expreífa de S. Mageftade „ fobre a dita expulfaõ, me naõ conílar de particular de- „ linquente ? do EJlaâo do Maranhão , Liv. XV. $ 09 ■,, linquente , e fendo a culpa commua de todos, coftu- Anno 1662,. „ maõ os Reys ufar da fua clemência , e benignidade , „ fendo o arrependimento o mais equivalente caftigo : e „ confiderando aííim efta razão , como o bom animo , „ com que todos geralmente aceitarão os ditos Religio- „ fos , lhes prometti em nome de S. Mageftade perdão „ geral : ( como pela prefente o faço em nome do dito ,, Senhor ) Hey por bem , e me praz de perdoar a todos „ em geral, e a cada hum em particular, aííim defta Ci- „ dade , como do dito Eftado, e Capitania do Grão Pa- „ rá, pondo-fe eterno filencio fobre efte particular, pa- „ ra que em nenhum tempo fe poíTa já mais tratar delle, „ obrigando-me a reprefentallo aífim a S. Mageftade , e „ haver confirmação fua para bem , e quietação defte Ef- ,f tado , com declaração , que toda a peíToa de qualquer qualidade , que feja , aífim morador , como affiftente nefte Eftado , e da dita Capitania , que fobre efte par- ticular mover de novo alguma queftaò , inquietando ; „ ou perfuadindo , que fe altere o que eftá ordenado , e „ refoluto até a vinda dos taes Religiofos , com quem íe „ devem ajuftar as propoftas , que por parte dos mora- „ dores fe me fizeraô , fera caftigado como perturbador „ da Republica , com a demonftraçaõ que femelhante „ delido merece : e fendo Cidadão , fera condemnado „ em mil cruzados para a Infantaria , e cinco annos para „ os lugares de Africa , naÕ lhe valendo privilegio al- „ gum , que tenha de Milícia ; e fendo da fegunda con- „ diçaõ , levará três tratos de braço folto , e defterrado „ toda a vida do Eftado. E para que venha à noticia de „ todos , e efpecialmente aos moradores da Capitania „ do Pará , mando ao Capitão mor delia faça lançar efta ,, minha ordem nos lugares públicos , e fixar aonde for „ coftume. Dado em S. Luiz do Maranhão aos 2 de „ Junho de 1662. ^ Ruy Vaz de Siqueira. 1 1 00 O Capitão mor Francifco de Seixas recebeo a Carta do Governador com o perdão geral 5 e convocan- do » ff fy 5 io Annaes Hifloricos Anno 1662. do logo huma grande Junta na Igreja Matriz de NoíTa Senhora de Belém ( hoje Sé Epifcopal ) com a aííiftencia do Tribunal da Camera , Miniftros Seculares , e Eccle- fiafticos , Prelados das Religiões , e principal Nobreza 7 propoz o aíTento , que fe tinha tomado na Cidade de S. Luiz fbbre a matéria da commoçaó do Eftado , que aceitarão todos íèm a menor duvida , refignando-fe tan- to nas diípofições de Ruy de Vaz de Siqueira , que fe publicou o perdão geral com as devidas formalidades en- tre applaufos do povo. Agora vejaõ bem os Príncipes Soberanos , o quanto importa para os feus próprios inte- reíTes a efcolha de Miniftros de femelhantes qualidades ! 11 01 Quizeraô entaõ os moradores do Pará emen- dar de todo , com os novos acertos da fua politica con- formidade , os paíTados erros de tamanhas defordens j e para confeguillo , logo que teve fim aquella grande Jun- ta , foraÕ à cafa onde recolherão os Religiofos da Com- panhia de Jefus , que tinhaõ arribado , e como em triun- fo os reftituiraõ ao feu Collegio , empenhadamente per- fuadindo neítas demonftrações taõ cheyas de refpeito reverenciai , que era verdadeira reconciliação de taõ an- tigo ódio o fingimento delia , como bem defcobriraõ os fuccefíbs futuros. 1102 Com o perdão geral expedio também huma Provifaõ Ruy Vaz de Siqueira , que encarregava a ad- miniftraçaõ de todos os índios Aldeados da Capitania do Pará ao feu Capitão mor Francifco de Seixas , parece que entendendo , que efta nova forma abfolutamente fuíFocando os clamores do Eílado , fegurava os interef- fes delle : porém o Senado da Camera , que defde o tem- po da deferçaõ dos Miífionarios fe confervava na pacifi- ca poíTe do mefmo Governo, fim o entregou ao Capi- tão mor fem a menor difputa , mas naõ deixou com tu- do de fe moílrar fentido pelas utilidades , que ficava per- dendo , além da regalia. ANNAES . ANNAES HISTÓRICOS DO ESTADO DO MARANHÃO LIVRO XVI. SUMMARIO. ECORREM os povos do EJlado do Maranhão 4 a clemência do Príncipe para à confirmação do perdaú geral r concedido pelo Governador Ruy Vaz de Siqueira. Manda ejie ir a fita pre- fença os Procuradores do Pará , e por hum a Junta faz confervar em todo o Eflado os Miffionarios da Companhia dejefus com hum a geral aceitação. Paja ao Para com varias dependências dofeu minjjlerio ; efe recolhe breve* mente a Cidade de S. Luiz do Maranhão , onde he rece-* bido com grandes applaufos , fomentados também do feliz fuccejfo das negociações do Procurador da Capitania na Corte de Lisboa. Movem-fe algumas duvidas fobre as difpofiçoes da nova Ley ; e para conferillas ■, manda ir ou* tra vez o Governador a Cidade de S. Luiz os Procurado- res de Belém do Pará. O Senado da Camera faz hum a rrattée 512 Annaes Hiãoricos 011 ,|(" grande Junta fobre a aceitação damefma Ley , efe re- cebe inteiramente. Da conta dejle procedimento a Kuy Vaz de Siqueira , que lho eftranha com fever idade : mas pajfando de novo com ejie motivo a Cidade de Belém , fe accommoda prudentemente com as fatisjaçoes do mefmo Senado. Difpoem o cajligo dos bárbaros Tapuyas do Uru- lá , e fede ciar a Co mm andante damefma expedição. O fuccejfo delia. Depois dejejiejallo no Pará , volta para ajiia refidencia de S. Luiz ; eno mefmo dia da viagem fufpende o Capitão mór Francijco de Seixas do exercido da fua occupaçaft, encarregando a Capitania a Felicia- no Corrêa. Succede no emprego por^PatenteB.eal *An- tonio Pinto da Gaya. Novas alterações dos moradores de Belém fobre a Ley embargada , que produzem a defor- dem de fe publicar de poder abfoluto.. DemonJlraçÚes do Governador > e moderação com a publicação* da mefma Ley , exceptuadas todas ,as duvidas até a fua ultima (k- "fá- Aíiíioi662. 1105 f^^^^^ ^g| OCEGADO inteiramente o Eílado do Maranhão , recor- rerão os povos à benignidade do feu Príncipe para a confir- mação do perdaô geral, con- cedido pelo Governador ; po- rém o Senado da Camera de Belém do Pará o pretendeo para a Capitania com algu- mas ventagens : e perfuadindo bem , que os feus mora- dores fó fe commoveraõ depois de provocados pelos da Cidade de S. Luiz , accrefcentavaõ para o merecimen- to deita graça dilatados ferviços , como fe vê da fua mefma Carta , que me pareceo aqui copiar, por fcí hum breve epilogo, aííim dos movimentos daquellas Con- quiftas , como da fua origem. 1 104 „ Senhor. Proílrados aos Reaes pés de Vof- „ fa Mageílade os moradores deita Cidade de Belém , yy recor- do Ejtado do Maranhão > Liv. XVI. J 1 $ recorrem por nós a Voífa Mageílade humildemente , Armo 1662, , como fideliílimos Portuguezes , reconhecendo o ex- , ceifo , que cometterao na expulfaõ dos Religiofos , da Companhia de Jefus , Miffionarios de todo efte Ef- , tado por VoíTa Mageílade, de que foy occaíiaõ o ul- , timo extremo da miferia , e ruina em que fe viraÓ , , havendo tantas vezes clamado a VoíTa Mageílade , , com a reprefentaçaõ dos inconvenientes , que fe fe- , guiaô de terem os ditos Religiofos Miííionarios a ju- , rifdicçaÕ temporal dos índios : e vendo , que fe naõ , deferia a taõ duplicados clamores, que por intelligen- , cia de particulares intereíTes naÕ chegavaô aos ouvi- dos de VoíTa Mageílade , entendendo fer efte o mo- tivo de VoíTa Mageílade lhe nao mandar deferir , fe , refolveraõ na nova reprefentaçaõ 7 que fizeraÕ a Vof- , fa Mageílade pelo Procurador , que enviou todo o , Eílado a eíTa Corte ; e por outros particulares a que , fe remetteraÕ , com animo de que os ditos Religiofos , fe abíliveífem fomente da adminiílraçaõ dos índios , , até que VoíTa Mageílade houveíTe por feu ferviço re- , folver o mais conveniente ao bem commum de todo , o Eílado , certifícando-fe os ditos povos , de que a , tenção de VoíTa Mageílade nunca fora dar aos ditos , Religiofos a adminiílraçaõ temporal 5 pois nem por , Ley , nem por Regimento fe entende o contrario ? , como bem íè verifica nas Cartas, que o Padre An- , tonio Vieira , Miniílro fuperior das Mifsões , efcre- , via aoBifpo dojapaõ, em que lhe pedia alcançaíle , de VoíTa Mageílade a fobredita jurifdicçaõ fobre os , índios , por naõ eftar dependente das vontades dos , Governadores, e Capitães mores 5 reprefentando-lhe , mais nas ditas Cartas , que a peíToa , que tiveíTe a tal , jurifdicçaõ neíle Eílado , ficava fenhor delle fem du- , vida alguma 5 de que fe verifica, que fe os ditos Mi£ , fionarios tiveraõ a tal jurifdicçaõ, a naõ pedirão no- ■*. Ttt „ vãmente» 514 Aimaes Hiíloricos Anão 1662, „ vãmente. Eftas Cartas foraõ a principal occafiaõ da ;; alteração , que houve j e na occafiaõ em que fe repre- „ fentou tudo ao Padre António Vieira , tomou taÕ má ,i refoluçaô, que depois de vários debates , naõ fe ajuf- „ tou nunca , antes variando fempre nas refoluções , „ veyo a tomar a de que naõ queriaõ a adminiftraçaõ ef- „ piritual fem a temporal , de que fuccedeo levantarem- „ fe vozes , fem que fe faiba donde fahiraõ , que de „ todo expuífaífem os ditos B_eligiofos , como fe tinha „ feito no Maranhão , cabeça do Eftado 5 e por mais , ,í que os Officiaes da Camera , e homens bons deíle po- ? , vo tratarão de aquietallo , lhe naõ foy poffivel redu- „ zillo , mais que taõ fomente, a que o Padre António „ Vieira foíTe ao Maranhão , e ao que lá fe aíTentaífè „ com a Camera , e Povo , fe accommodava também „ elle j com que o dito Padre fe partio , ficando os mais „ Religiofos depoíitados em huma cafa com todo o ref- „ peito , até vir refoluçaô da Cidade de S. Luiz , que „ como foy a de embarcarem para eífe Reino o fobre- ? , dito Padre , e íeus Companheiros , ficou impoífibili- „ tado cá o remédio , fuccedendo as mais coufas , de „ que temos dado conta a Voíía Mageftade 5 e de co- „mo nao podemos nunca abrandar o povo , que irrita- „ do nao admittia razaõ alguma , unindo-fe todos com „ medo huns dos outros j porque os que entendiaõ erao „ de contrario parecer , os perfeguiaõ , e queriaõ ma- „ tar , como fuccedeo por vezes verem-fe alguns ho- „ mens em bem conhecidos perigos de perderem as vi- ,, das. Sendo efta a culpa, que cometterao no ferviço „ de VoíTa Mageftade , naõ eítando na maõ de cada „ hum dos moradores evitarfe femelhante tumulto , co- „ mo bem fe experimentou depois com a chegada do „ Capitão mor Francifco de Seixas Pinto a eíla Capita- 9y nía , que tomando poífe do governo delia , tratou lo- „ go com notável zelo de ver fe podia remediar eftes dam- ?? do Eflaâo do Maranhão \ Liv.XVL 5 1 j t, damnos : e naõ obílante , que o povo junto i antes Anno 1662, „ que tomafle a dita poíTe , lhe fez aííinar hum termo , de que no particular dos taes Religioíbs fe naÕ intro: „ meteria , nem obraria nada fobre eftarem embarca- „ dos para eíTe Reino , nem pretenderia por nenhuma i, via impedillos , nem defembarcallos o dito Capitão }> mor j no feguinte dia da poíTe convocou huma Jun- H ta , em que aííiílimos com todos os Cidadãos , Juiz , „ e Procurador do Povo, e mais gente delle, aonde pro- „ poz com tanta efficacia , e tao boas razoes o mal , que faziaÔ em terem os Religiofos embarcados , padecen- do tao grandes incommodos no navio , cuja partida naõ podia deixar de ter dilação , pedindo-lhe os dei- „ xaíTe trazer para terra para eftarem com mais comrao- „ do , como Sacerdotes , Miniftros de Deos , dando pa- ra iíTo razoes muito cabaes , a que nós o ajudámos 7 ,, que lhe foy concedido o que pedia 5 mas com condi-; çaõ , que ao tempo de partir o dito navio , naõ pre- tenderia por nenhum modo eftorvar o embarque dos f7 ditos Padres 5 porque do contrario fe feguiriaõ gran- „ des damnos nefte povo com muitas mortes , e inquie- tações , de que proteílavaõ fe lhe pediria conta a elle Capitão mor , por quanto a tinhaõ dado a VoíTa Ma- „ geftade de tudo o fuccedido 7 de que eíperavaõ remé- dio ; pois elle vindo da prefença de VoíTa Magefta- de naõ moftrava ordem alguma , em que VoíTa Ma* ^ geftade lhe mandaíTe tratar da matéria 5 a que deferio com muitas , e boas razões , que naÕ innovaria coufa „ alguma , vifto naõ ter ordem de VoíTa Mageftade , „ que a tella , a havia de executar , ou perder a vida.' „ Foy ao navio onde eftavaõ os Religiofos , e os trou- ,, xe para a terra , metendo-os em huma cafa , que o 1, povo lhe nomeou 5 e paíTados alguns dias , em que fempre trabalhou para mover os ânimos dos homens > ), a que tornaíTern a receber os ditos Padres, reftituin- Ttt ii do-os I 11$ Annaes Hiftoricos X Ânno i66i. „ do-os ao feu Collegio , parecendo-lhe, que o poderia v confeguir , convocou outra Junta na Gafa da Camera, 77 aonde também affiftiraÕ os Cidadãos , Prelados dos ?7 Conventos , e todo o povo em 3 de Mayo , lendo 77 huma propoíla que fez , em que oferecia os meyos >, mais convenientes para fe reftituirem os ditos Padres: <„ mas o povo , que eftava todo junto , fem lhe admitti- „ rem razaõ, nem a quererem efcutar, começarão a dar Jy vozes , que os Religiofos fe embarcaífem logo , fa- „ zendo-nos , e ao dito Capitão mor proteftos para que „ naõ trataíTemos mais na matéria , como o rizemos , ? , por naõ dar occaíiaõ a novos motins , com que efte „ povo fe perdeífe , e os Padres fe embarcarão , fem o „ podermos impedir, em dous navios , que aqui efta- „ vaÕ , e indo até a barra , tornou a arribar hum delle-s-, „ por fazer muita agua , com fete Religiofos ; e para j, haver de fe concertar o dito navio, defembarcaraõ v os taes Padres. Nefte tempo chegou avifo do Mara- „ nhaõ do Governador Ruy Vaz de Siqueira 7 em co- p mo naquella Cidade , por meyo da fua diligencia , tor- , y naraÕ a receber os ditos Religiofos , e reílituillos ao „ feu Collegio no efpiritual fomente , encarregando-nos ,, o Governador , e o Capitão mor fizeíTem cá o mef- „ mo. Chegando eíle avifo em 18 de Junho paífado „ com hum perdão geral , que o dito Governador , em » nome de VoíTa Mageílade , dava a todo efte Eftado > „ o qual logo mandou publicar o CapitaÕ mor , orde- „ nando outra Junta na Igreja Matriz deíla Cidade , „, aonde , em prefença dos que coftumaÕ ir a ellas , fe „ leraõ as ordens do fobredito Governador , e as demos „ à execução com o Capitão mor , fazendo-fe termo de , 7 como fe aceitavaÕ os Padres na mefma conformida- „ de , que no Maranhão , cabeça do Eílado , e com as t, mefmas condições , as quaes ainda naõ fabemos. Sa- „ hindo da Junta , fomos com o Capitão mor à cafa on- „ de w do EJlaâo do Maranhão , Liv. XVI. 517 , de aíliftiaõ os taes Religiofos , e os levámos ao feu Anno i66u Collegio com todo o acatamento , e demonftrações de alegria , do que damos inteira informação a VoíTa Mageftade , efperando da fua Real grandeza fe firva de mandar confíderar, que reconhecendo-fe eftes mo- radores arrependidos j lhe fica fendo devido o perdão, que da piedade , e clemência de VoíTa Mageftade ef« perao j e que já em nome de VoíTa Mageftade lhe pro- metteo , e mandou o novo Governador Ruy Vaz de Siqueira, inteirado da verdade defte negocio ; e os moradores defta Capitania faõ mais dignos delle , por- que nao obraõ nada fenaõ a exemplo do Maranhão , cabeça do Eftado , e de quem foraô perfuadidos -, e ameaçados , fe naÔ fizeíTem o mefmo , que lá fe refol- via. De mais , Senhor , que os fobreditos Religiofos nefta Capitania , elles mefmos fe aufentaraõ , e def- ampararaó o feu Collegio , definquietando os índios , vaíTallos de VoíTa Mageftade , das fuás Aldeãs , dei- xando-as quaíl defpejadas ; fem eftes moradores os conftrangerem em coufa alguma , os quaes nao po- dem duvidar , de que VoíTa Mageftade ufe com elles da fua coftumada grandeza ; pois eftes vaíTallos a fa- , bem também merecer , como fe tem vifto neftas par- , tes , onde tem extendido o Império de VoíTa Magef- >■ tade , e feito conhecer , e venerar o feu nome a tan- , tas nações de Gentio , como também lançado por tan- , tas vezes os Hollandezes defta Cofta , e defalojan- , do-os do Cabo do Norte à cufta do feu fangue , e fa- , zenda , fem nenhum difpendio da de VoíTa Magefta- , de , fendo efta huma fronteira de inimigos , affim de > naturaes, como de eftrangeiros , e fazendo publicar, , e adorar o nome de Deos a tanta gente , o que fem as > fuás armas fora impoííive! , além de outros merecimen- , tos , como he no accrefcentamento da Fazenda de , VoíTa Mageftade , que he certo , que efta Capitania < „he " JI Annaes Hifloricos Anão 1662. „he o principal íuftento doEílado, por fer de mayor „ rendimento , que a do Maranhão , fendo mais antiga, „ e de mais gente , acudindo-fe defta Capitania à do „ Maranhão com a mayor parte do ordenado doGover- „ nador , Ouvidor Geral , Provedor mor , e Vigário , „ fendo tudo bem contra a razaõ, e com muito má cor- „ refpondencia , como agora experimentamos , pois „ mandando-fe duas Tropas aoCertaõ, naô fó daõ o „ mayor proveito delias à gente daquella Capitania , „ mas também a honra , mandando delia os Cabos , e „ fazendo ir eftes moradores fujeitos a elles , fendo que „ aqui os ha melhores , e mais experimentados ; e que „ viílo fer eíla vinha noíTa ; pois nós a plantamos , pare- „ ce , que era juílo lhe comeíTemos o fruto , e nao elles „ à noíTa cuíla ,.•;' porque daqui vao as canoas , os man- „ timentos , os guias , as linguas j e fendo todo o traba- „ lho , e difpendio noíTo , fe deraõ ao povo do Mara- „ nhaõ quatrocentas peças , e a eíle fomente cem , def- ,, igualdade , que naô he. foffrivel , nem a de nos nao „ darem huma Tropa à parte para ir por nofía ordem , „ tudo ifto nafcido dos homens do Maranhão 7 que co- „ mo lá tem o Governador , o informaõ como querem , 97 que a elle naõ o culpamos , que vem deíTe Reino fem „ conhecimento das coufas defte Eílado , e lhe fazem „ crer convém fe faça aílim , fendo tanto contra a ra- „ zaõ , que fe o informarão na verdade , temos conhe- „ eido tanto zelo do ferviço de Vofla Mageílade nefte „ Fidalgo , e tanta igualdade na juíliça , que a ter boas „ informações , tudo fizera com acerto 5 mas da gran- ja deza de VoíTa Mageílade efperamos o remédio, que „ fera muito fácil , quando VoíTa Mageílade fe queira „ fervir de nos mandar dar Tropas a parte , que vaõ da- ,, qui mefmo ordenadas pelo Capitão mor com a Came- „ ra , para que aífim eíles miferaveis vaíTallos fe poííao • „ augmentar , e acerefeentar o rendimento da Fazenda de tt do EJlado do Maranhão , Liv. XVI. 519 de VoiTa Mageílade ? animando-fe a novos defcobri- Armo 166^ mentos neíle novo Mundo , com que o Império de VoiTa Mageílade feja mais dilatado. Para o que pe- dimos a VoiTa Mageílade nos faça mercê de engran- decer eíla Cidade , e Capitão mor 7 que já he digna de lograr grandes accrefcentamentos , mandando tam- bém VoiTa Mageílade dar Regimento ao Capitão mor com poder para obrar per íi , íem efperar reíolu- çao do Maranhão , que por eíla falta perecem muitas coufas. Affim , Senhor , que fe VoiTa Mageílade nao acudir com Regimento a eíla Praça , fe perderá ; e , com elle a engrandece VoiTa Mageílade , mandando , , que os Capitães mofes tenhaõ jurifdicçaõ, e poíTaò , prover os Officios , e Capitanias , que vagarem , fe , quer por tempo de féis mezes , ou ao menqs em quan- , to nao vay aviíb ao Maranhão ; e fe VoiTa Mageíla- , de fe quizer fervir de accrefcentar eíle poílo a titulo , de Capitão , e Governador > ficando fempre fujeito , ao Maranhão , como he o rio de Janeiro,, Parnambu- , co 7 e Parahiba no Eílado do Braíil , fera grandiffima , mercê , que VoiTa Mageílade fará a eíla Republica , , e Vaífallos ; e para iílo fe eíFeituar , he muy digna a , peíToa do Capitão mor prefente , cujo zelo , diligen- , cia , e cuidado no ferviço de VoiTa Mageílade , e , bem commum do povo , o fazem merecedor deíla , honra. Guarde Deos a Real PeiToa de VoiTa Magef- , tade, como todos osfeus VaíTàllos defejamos. Be- , lem do Pará , em Camera aos 26 de Julho de 1662. 1 1 05 Ruy Vaz de Siqueira procedia já com taõ fe- guro animo , que moílrava bem a natural valentia deJ- Je ; porque tendo páiTado havia poucos dias a primeira ordem ao Pará , para a confervaçao dos Miííionarios da Companhia dejefus, nao coníiderando na fua obediên- cia , nem a menor duvida , expedio fegunda ao Senado da Camera , para que nomeaíTc dous Cidadãos dos mais capa» !'ílí. Anuo 1662 $20 Annaes Hiftoricos . capazes da Capitania , que como feus Procuradores fe encaminhaífem logo à fua prefença , onde aíliftiriaõ a huma grande Junta, que determinava convocar para fe regularem com melhores medidas as dependências de to- do o Eftado , efpecialmente nos principaes motivos da fua commoçaõ j e os Miniílros daquelle Tribunal com razaõ fatisfeitos deílas zelofas providencias , encarrega- rão da commiffaô aos Capitães reformados Braz da Sil- veira , e Sebaíliaõ Peílana de Vafconcellos , fogeitos ambos muito beneméritos deita confiança , por ferem dos mais bem inftruidos nos negócios politicos , que ref- peitavaô os intereífes públicos. ■1 1 06 Chegarão elles com feliz viagem à Cidade de S. Luiz , e Governador , que naõ queria dilatar a ex- pectação do Eftado , entrou logo na Junta, a que havia chamado os feus Procuradores , de que refultou por uni- forme acordo , depois de larga conferencia , o feguinte termo , que me pareceo támbem trasladar pelas formaes palavras , com que eílá regiftado nos livros da Camera de Belém do Pará. 1 107 „ E acabado o dito requerimento , refpondeo f , o Senhor Governador , que bem certificados deviaô „ eftar todos Os moradores defte Eftado dos augmentos, „ que lhe defejava , aííim pelo ferviço , que determina- „ va fazer ao feu Rey, e Senhor , pelas fuás efpeciaes „ recommendações , como pelo bem univerfal del'es „ moradores ; e que pelas informações , que havia tira- „ do pelas duvidas , que houvera com os Religiofos da „ Companhia , fuppofto , que eftava remediado o excef- „ fo , que nefte negocio fe comettera , entendia , que S. „ Mageftade , que Deos guarde, lhe mandava deferir , „ e por ora lhe parecia fe naô innovaífe coufa alguma , „ por quanto fe haviaõ remetido papeis baftantes , para „ que Sua Mageftade , e feus Miniílros entende/Tem , ? , como as informações particulares , que fe lhe tinhaõ i „ dado do miado do Maranhão , LivXVL 521 M dado fobre a adminiftraçaõ dos índios , encontra- Anuo 1661* „ vaõ o bem commum delles moradores , e a experien- „ cia tinha moftrado era em íua ruina ; e que o Padre „ António Vieira , Yifitador defta MiíTaõ , que fora en- „ via do defta Cidade , eftava na Corte , e de prefente „ feria chegado a ella o Governador D. Pedro de Mel- „ Jo , em cujo tempo tinhaõ fuccedido as alterações , e „ expulfaõ dos mefmos Religiofos, e que a ambos con- ,, vinha pleitear lá o negocio , como principaes contra- „ di&ores , que fora5 nelle $. e affim , que era de parecer, „ que efperaíTem refoluçaõ do Reino j e que quando „ efta naõ fofle conforme ao merecimento defte nego* iy cio , entaõ fe poderia replicar com melhores funda- ,-., mentos : que por ora eftariaÕ os Religiofos excluidos „ da jurifdicçaõ temporal, e affim, que naõ era necef- „ fario mais , que pedirlhes algum ado neíle particular , „ quando elles o quizeíTem fazer até refoluçaõ de Sua „ Mageftade ; e acabando o dito Senhor Governador >, o feu parecer, diíTe, que votaíTe cada hum livremen* ?, te o que entendeíTe , e que elle fe conformaria como „ que foíTe mais útil a todos 5 e affim os Officiaes da Ca- „ mera , como os Procuradores da Cidade de Belém ; „ com todas as mais peíToas , que fe achavao na dita „ Junta , uniformemente foraÕ do mefmo parecer. Ou- „ tro fim fe aíTentou na mefma Junta , que fendo cafo , » que Sua Mageftade , que Deos guarde , mandaíTe re- „ folver efte negocio , e nelle fe houvefte de replicar n em alguma parte ao dito Senhor , viriaõ para efte ef- 9 , feito os mefmos Procuradores da Cidade de Belém, 9} a cima nomeados , a efta cabeça do Eftado , vifto ef- „ tarem já eleitos ; e de como affim fe refolveo na dita „ Junta , foy mandado pelo dito Senhor Governador lan- „.çar efte aftento nos livros da Camera , em que elle dito „ Senhor affinou com os Officiaes delia , e mais peíToas » nomeadas. Uuu Con- 522 Annaes Hifioricos AnriQi66z. iioS Concluído já efte negocio com a felicidade r que fica referida no aíTento delle , devida toda às acer- tadas direcções do Governador Ruy Vaz de Siqueira , lhefízeraõ os Procuradores da Cidade, e Capitania do, Graõ Pará reprefentâções varias , pertencentes ao go- verno politico , a que deferio com tanto zelo da juíliça, como attençaõà utilidade publica , moílrando bem nef- tas refoluçoes , como em todas as mais .., o feu grande ta- lento j e como nas noticias do prefente anno , taõ abun* dante delias , foy eíla a ultima em todo aquelle Eílado , paíTarey às que fe continuaô na ordem com que efcre- vo. . ., . Anno 1663. 1 109 Na fucceífaõ do anno de 1665 fe confervava o Eílado do Maranhão no mefmo focego , em que o ti- nhaôpofto as acertadas providencias do feu Governa* dor } e ainda que huma cruel epidemia , que vagava por elle havia muitos mezes , affligia os ânimos dos feus mo- radores , como todos os golpes defte fatal flagelo fó def- carregavâo fobre os pobres índios , ( ordinário fucceííb em femelhantes cafos pelas difpofições da fua natureza) eoníòlavaõ a magoa de tamanha perda com a efperança de refarcilla com duplicados juros na geral conceíTaó dos feus refgates > além dos defcimentos , de que lhes deixa- va o uíb mais livre para os intereíTes do ferviço com- muma nova forma de adminiftraçaõ , que já tratavaõ como confirmada , regulando-fe pelas promeíTas dos feus Procuradores na Corte de Lisboa, que esforçava também Ruy Vaz de Siqueira. 11 10 A capacidade defte Fidalgo foube bem ata-r lhar o fatal precipício , a que caminhava aquelle Eílado na geral commoçaõ de todos os povos 5 e para fomen- tar as mefmas efperanças , de que fe alimentava o feq focego , lhes antecipou a poíTe delias na expedição de varias Mifsões, efcoltadas de Tropas para as fegura- rem no miniílerio de defcimentos , e refgates de índios dos . do EJlaâo do Maranhão , Liv. XVI. S 2 í dos vaftos CertÕes das Amazonas , e caudalofos rios , Anno i6£^,> que lhe tributaõ as fuás aguas. 1 1 u Por hum deites rios , chamado Urubu , que quer dizer corvo ( nome , que tomou de ferem affiftidas as fuás prayas de infinito numero deitas fúnebres aves) entrou huma das Tropas, que commandava o Sarmento mor António Arnau Villella , dando calor a huma das Mifsões , de que era Dire&or o Padre Frey Raimundo, Xeligiofo Mercenário , de conhecido preítimo , para tao fanto emprego 3 e os Principaes das nações Caboque- nas , e Guanevenas , Tapuyas bellicofos \ bufcando lo- go ambos , empenhadamente os perfuadiraÕ com as de- monftrações de mayor amifade , a que fe encaminhaf- fem para as fuás terras , que naÔ eftavaõ longe , já com os feguros de que achariaõ nellas abundância de efcra- vos 5 e que dos naturaes também defceriaõ algumas AI- deas , para a viílnhança das muitas , quefabiao fegura- v^ vao bem a fua fortuna na noífa fujeiçaõ. 1 1 1 2 As liberaes promeíías , de que fe valiaõ eítes bárbaros , eraõ muy poderofas para os intereífes de An- tónio Arnau , e o Padre Frey Raimundo ; e deixando vencerfe com pouca repugnância da repetição delias r guiados ambos dos mefmos Tapuyas , defembarcarao nas primeiras terras do feu domínio com tal fatisfaçaô da finceridade do feu animo , que António Arnau fó pa- ra moítrar a boa difcipíina , levantou logo huma trin- cheira de páo a pique, junto do mefmo porto , que tam- bém cobrindo as embarcações , que tinha nelle , fegura- va a fua retirada: porém eítes abortos da racionalidade, que fó difcorrem com mais que inítindo nos defatinos da fua aleivofia , para melhor diííimularem , a que conf- pirava contra a innocencia de tao incautos hofpedes 9 pedirão com inítancias ao Sargento mor alguns Solda- dos , que os ajudaífem na conducçaÕ de huns efcravos feus, de que lhe queriao fazer orTerta, em fieis primícias Uuu ii da 524 Annaes Hifloricos - ■ ■ Anno 1663. da fua amifade 5 e como as ambiciofas recommendações da mefma promeíTa concorriaô muito para tirar as duvi- das , nenhuma houve para o confeguirem. 1 115 Dez Soldados , com mayor numero de ín- dios, dos de melhor nome , facriflcou António Arnau ao idolo da fuá cegueira 5 e caminhando todos na com- panhia daquelles bárbaros já como arraftados do fatal deftino do leu Commandante , affim que entrou a noite, fe viraô infultados de huma grande embofcada , nao fó antecipadamente prevenida pelos mefmos traidores , mas também reforçada por elles. Morrerão logo qua- tro Soldados com alguns dos índios , e todos os mais maniatados ferviraõ entaõ de primeiro defpojo à fua aleivofia , depois fem duvida à brutalidade da fua gu- la 5 porque nunca mais houve noticia certa deftes infe- líces. \. I . 11 14 Lifongeados do feliz fuccefTo de huma trai- ção taô abominável , intentarão fegunda ; porque fa- bendo bem, que naõ haveria teílemunhas , que os con- demnaíTem para o caftigo da primeira, unidos já todos na mefma madrugada , tornarão a bufcar o Sargento mor com a nova ficção de levar atados alguns dos Com- panheiros com titulo de efcravos 5 e aíTeverando , que a efcolta que lhes dera , tinha paííado mais a diante, pa- ra affiílir à conducçaÕ de outros , que neceííitavaõ de mais fegura guarda , por fer mayor o numero. Antó- nio Arnau , preoccupado todo dos fataes influxos das mefmas efperanças , fem mais exame , nem militar cau- tela , lhes fez patente a fua cahiífára , de que aprovei- tando-fe o aleivofo animo daquellas feras racionaes, o cercarão logo , como demonílraçaõ de fieis alvoroços ; ecom os mefmos páos, que levavao nas mãos , que chamaõ de jucár , (que quer dizer matar ) ordinárias ar- mas de muita parte das nações Tapuyas , lhe defcarre- garaõ pelas cofias repetidos golpes na cabeça, de que cahio morto. Com do EJiado do Maranhão , Liv. XV X 5 2 j 1 1 1 5 Com iguaes circunílancias o acompanhou na Anno 1663., mefma deígraça o Alferes Francifco de Miranda > com mais alguns Soldados , e índios amigos ; e falvando-fe ío de toda a noíTa gente , a que com paíTos apreíTados bufcou as canoas , que eftavaô no porto , logrou tam- bém efta fortuna o Padre Frey Raimundo com o feu Companheiro 5 mas ambos mal feridos. 1 1 16 Ficarão efles brutos fenhores do campo ; mas permittio a alta Providencia, que cantaíTem fó nelle o bárbaro triunfo da fua aleivofia ; porque fabendo 7 que o Alferes Joaó Rodrigues Palheta fe achava na Aldeã de Saracá , ( a que dá nome hum efpaçofo lago , de que bebe todas as fuás aguas o mefmo rio Urubu ) o bufca- vaõ também , como nova vi&ima da fua fereza , com o grande poder de quarenta e cinco canoas , quando já in- formado do fucceflb j fe lhe oppoz com cinco , acompa- nhado fó de dezoito Soldados : e naõ fe querendo aind$ aproveitar das ventagens da terra , os atacou no mar taõ valerofamente , e com tanta fortuna , que vingou bem a fatalidade de António Arnau , degollando a ma- yor parte delles. n 17. João Rodrigues Palheta era natural da Vilk de Serpa , huma das da Provincia do Alentejo , e filho de Manoel Martins , que affim como a Pátria (por fe- rem ambos pays de taÕ honrado filho ) merece bem as recommendações da poíleridade, que também fe deviao de juftiça aos mais Companheiros na gloria do triunfo , fe nas memorias delle fícaíTe a dos feus nomes : laítimo- ío filencio , de que fe queixaõ todas as Hiflorias nas ac- ções mais illuílres da naçaõ Portugueza ! 1 1 1 8 Feflejou a noticia defta occafiaõ o Governa- dor Ruy Vaz de Siqueira com as demonftrações , quç ella merecia ; mas como ao mefmo tempo teve também a da aleivofia daquelles bárbaros Tapuyas , naó fe dan- do ainda por fatisfeito de taÕ juíla vingança , psra po- -■; •. der m . m 526 Annaes & jlnno 1663. der tomalla pelas largas medidas do feu ardente zelo , e valerofo animo , paíTou à Cidade de Belém do Pará , aonde chegou em 7 de Setembro ; e defembarcando no porto da Alfandega, o recebeo o Senado da Camera de baixo de hum Pallio , recitando logo hum dos feus Mi- niftros huma difcreta Arenga , cheya de elogios das fuaís virtudes, e das felicidades , que ellas promettiaõ a to- do aquelle Eftado na continuação do feu governo 5 ale- gres efperanças , que fe tratavaõ já como feguras expe- riências no conceito dos povos , pelas que todos elles ti- nha6 tirado no fucceffivo curfo de dezafete mezes. 1 1 19 Com as finaes claufulas deita Oraçaõ , a que fe feguirao multiplicados vivas da multidão da plebe, caminhou Ruy Vaz acompanhado de toda a Nobreza até a Cafa do Senado , onde fe repetio o a&o da poíTe j delleà Igreja Matriz deNoífa Senhora de Belém, na qual fe entoou o coílumado Hymno em acçaõ de gra- ças j e ultimamente ao Palácio da fua refidencia , pelo meyo fempre de duas alas de Infantaria , que bordavaô o tranfito : fendo o primeiro Governador, que foy re- cebido no Pará com a formalidade deíla oftentaçaõ , que fe praticou dalli em diante com todos os mais , que lhe fuccederaõ. 1 120 Efte General , logo que focegou o anno paf- fado as revoluções do Maranhão , entregou a adminif- traçaõ de todas as Aldeãs dos índios do Pará ao feu Ca- pitão mor Francifco de Seixas , como já fica referido ; porém informado , de que por intereíTes particulares fe unia elle com algum exceííb aos dos moradores , deu ef- ta incumbência ao Sargento mor Manoel Guedes Ara- nha , fogeito benemérito de mayores empregos : e fem outra noticia, que fe faça digna das fadigas da Hiíloria, teve fim efte anno em huma , e outra Capitania. Anno 1664. 1 121 Entrou a nova fucceífaõ de 1664 , e no prin- cipio delle fe achava ainda Ruy Vaz de Siqueira na Ci- dade / do EJlaâo do Maranhão , Liv. XVI . 527 dade de Belém do Pará ; mas encontrando invenciveis Anno.1664., obítaculos , para a pratica do feu projeóto , no caíligo dos índios do Urubu , o refervou para melhor opportu- nidade j para a qual dando logo as antecipadas provi- dencias , que lhe parecerão neceíTarias , além de outras muitas no governo militar , e politico da Capitania , fe recolheo à fua reíídencia do Maranhão no mez de Ja- neiro , depois de viíitar a Povoação do Cayté , ( tranf- ferida já para eíle lítio a do Gurupy ) que lhe ficava no caminho. 1 1 22 Com profpera viagem chegou à Cidade de S. Luiz em 10 de Fevereiro 5 e ainda que achou aquelles moradores cheyos de alvoroços pelas felicidades novas, que tinhaõ recebido em navios do Reino , crefceo mui- to o gofto para as feítejarem com demoníirações mais afFeduoíàs nareílituiçaô da fua companhia , por lhes fa- zer já huma feníível falta 5 fatisfaçaõ juílamente mereci- da da íuavidade do feu governo. 1125 No anno de 1662 continuava as aííiflencias de Lisboa Jorge de S. Payo , Procurador do Maranhão, com grande trabalho nas negociações, pelo poder conf- tante , que fe lhes oppunha na authoridade do Padre António Vieira 5 mas melhorou-as muito de fortuna hum forte accidente , que ameaçou logo no principio a faude publica de todo o Reino j porque fuggerido El- Rey D. AíFonfo , de que a larga Regência da Sereniííi- ma Rainha fua mãy fe lhe fazia já injuriofa nos crefci^ dos,annos da fua idade, arrebatadamente quiz tomar as rédeas do governo , que com menos efcandalo , e mais formalidade , lhe entregou aquella Heroína , fem a menor duvida em 25 de Junho domefmo anno j e co- mo nos vários extermínios para fora da Corte , que fe feguiraõ à mudança delia , entrou o do Padre António Vieira , bem aceito à Rainha , tomarão logo muy diíFe- rentç femblante as pretençoes doEítado ; porém com tudo n ._< 528 Annaes Hifioricos m Anno 1664. tudo dilatando-fe ainda as refoluções ultimas até os dias 12 de Setembro , e 18 de Outubro do anno paífado na entrada do prefente mez de Fevereiro , chegou com el- las o mefmo Jorge de S. Payo à Cidsde de S. Luiz, on« de as recebeo o Governador nas Provifões feguintes. 1 1 24 „ Eu EIRey . Faço faber aos que efta minha fr ProvifaÕ virem , que tendo refpeito ao que me repre* }J Tentou o Governador do Maranhão Ruy Vaz de Si- „ queira , em razaõ das inquietações , e motins , que „ houve entre aquelles moradores ; e os Religiofos da „ Companhia , por caufa das vexações , que padeciaõ P j f fobre a forma em que adminiftravaõ os índios daquel* „ le Eftado , e os haverem tornado a receber , tanto que ceifou a caufa das fuás differenças , por cujo refpeito lhes concedeo perdaõ em meu nome o dito Governa- „ dor : Hey por bem , por defejar fazer mercê aquelles „ meus Vanallos , de confirmar o dito perdaõ , e que fe „ naõ falle mais , nem trate das culpas entre os morado- „ res do dito Eítado , e os ditos Religiofos. Pelo que „ mando ao dito meu Governador o faça affim cumprir, ,, &:c. Francifco da Silva a fez em Lisboa a 1 2 de Se- í, tembro de 1665 . ZZ O Secretario Manoel Barreto de ,, S. Payo a fez eícrever. tj p y 97 ■ : 1 1 25 „ Eu EIRey. Faço faber aos que eíla minha fi ProvifaÕ em forma de Ley virem , que por fe have- „ rem movido grandes duvidas entre os moradores do „ Maranhão , e os Religiofos da Companhia , fobre a ? , forma em que adminiftravaõ os índios daquelle Efta- „ do , em ordem à ProvifaÕ , que fe paífou a feu favor ,, no anno de 1655 , das quaes refultaraõ os tumultos , „ e exceífos paíTados 7 originado tudo das grandes ve- „ xações , que padeciaõ , por fe naõ praticar a Ley , que ,, fe tinha paíTado no anno de 1655 , em tanto que che- „ garaõ a fer expulfos os ditos Religiofos das fuás Igre- »jas, do EJlado do Maranhão , Ldv. XVI. 52$ '„ jas, e Mifsões 5 ao exercício das quaes he muito con- Anno 166$ „ veniente , que tornem a fer admittidos , vifto naõ ha- ,, ver caufa , que obrigue a privallos delias , antes muir y , tas , para que o feu fanto zelo feja alli negeíTario. E „ defejando eu atalhar taõ grandes inconvenientes , e „ que meus vaffallos logrem toda a paz, e quietação,' „ que he juílo : Hey por bem declarar , qiíe affim os di- » tos Religiofos da Companhia , como os de outra qual- >, quer Religião , naõ tenhaõ jurifdicçaõ alguma tempo^ „ ral fobre o governo dos índios ; e que a efpiritual a te- h nhaõ também os mais Religioíbs , que afljftem , e re- „ fidem naquelle Eftado , por fer jufto > que todos fejaõ „ Obreiros da vinha do Senhor : e que o Prelado Ordi- } , nario , com os das Religiões , poíTaõ efcolher os Re- ,, ligiofos delias , que mais fufficientes lhes parecerem,, „ encommendando-lhes as Paroquias, e a cura das al- ,, mas do Gentio daquellas Aldeãs j os quaes poderáõ „ fer removidos todas as vezes , que parecer conveni- ~„ ente : e que nenhuma Religião pofla ter Aldeãs de y, índios forros de adminiftraçaõ , os quaes no temporal ■„ poderáõ fer governados pelos feus Principaes , que „ houverem em cada Aldeã : e quando haja queixas del- „ les , caufadas dos mefmos índios , as poderáõ fazei: aos meus Governadores , e Miniftros dejuftiça da- quelle Eftado , como o fazem os mais vaífallos delle : j,eno particular das índias , em ordem a fe poderem „ fervir delias aquelles moradores , fe deve praticar ni£ „ fo o exemplo dos Órfãos defte Reino , e o que dif- „ põem as Ordenações 5 pois naõ fendo o rifco menor „ da honeftidade , que o das índias, naõ deve haver dif» >„ ferença no ferviço : e que a repartição dos índios, pa- „ ra fer ajudada como convém, fe figa a ordem com- „ mua ; de que as Cameras daquelle Eftado no princi- >, pio de cada anno elejaõ hum Repartidor , para faber ?? yy .i J\.xx n OS '¥ 53o Annaes Hiflorkos 1664. „ os índios ; que cada morador ha de miíler 5 e o Paro- „ cocara apontar aquélles , que devem fervir y obfer- „ vando-fe no pagamento delles , o que difpoem o Re» „ gimento-dí&s Governadores no capitulo quarenta e oi* v to j e que elejaô hum Religiofo da Religião a que „ tocar por turno , a quemencommendem , que com o ,, Cabo da efCõka > que fera fempre nomeado pelas Ca- >; meras , fa^a às entradas no Certaô ao refgate , quan- % do as mefmãs Gameras as requererem , e forem necef- , r farias 5 com tanto que o dito Religiofo , nem para íi, „ nem para a fua Religião poífa trazer efcravos , nem »í fejaô feus , nem da Religião por efpaço de hum anno, j r òs que em cada entrada fe refgatarem 5 e fazendo-o , >, fícaráô perdidos os taes efcravos , ametade para o de* „ nunciante , e a outra paira a minha Fazenda •: e o Gabo J; daefcolta, Governadores , e Capitães mores, mais ,, Miniftros , e Officiaes do dito Eftado , ferao adverti? $, dos , que em nenhuma maneira mandem fazer os ditos „ reígates para íí , fobpena de mais de fe lhe dar em cuU 7f panas fuás Reíidencias, fe proceder contra elles com w todo o rigor da juftiça.E com eílas declarações , ç •„ claufulas: Hey outro fim por bem , que fe guarde a „ ultima Ley do anno de 655 , e o Regimento dos Go? n vernadores í e que os ditos Religiofos da Companhia „ poífaô continuar naquella MiífaÕ , na forma que fica >, referido, excepto o Padre António Vieira , por nao „ convir ao meu ferviço , que torne àquelle Eftado. Pe» „Io que mando aos Governadores , e Capitães mores, „ Officiaes das Cameras , mais Miniftros , Officiaes , e „ peífoas de todo o Eftado do Maranhão , de qualquer „ qualidade , e condição que fejaõ , que todos em ge* „ ral , e cada hum em particular cumpra 6 , e guardem , y efta Provifa6 muito inteiramente , como nella fe con- „tém, fem duvida, nem interpretação alguma ; poi> ,,que do Eftado do Maranhão r Liv.XVl. J31 „ que aííim o hey por ferviço de Deos ; e meu , confer- Anno 1664, „ vaçaõ daquelles meus vaífallos, bem, e augmento da- „ quelle Eftado ; e efta quero , que tenha força de Ley,- „ e fe regiftará nos livros das Cameras do dito Eftado 5 „ e na5 paíTará pela Chancellaria , e valerá como Carta^ „ , fem embargo da Ordenação do livro fegundo , titulo „ trinta e nove , e quarenta , que o contrario difpoem* „ Francifco da Silva a fez em Lisboa a 12 de Setembro „ de 66} . jg O Secretario Manoel Barreto de Sampayo „ a fez efcrever. "R F Y < ■ ■ 11 26 „ Hey por bem declarar, que as Igrejas , e „ Paroquias , que os Religiofos da Companhia de Jefus „ fundarão no Maranhão , com fua defpeza , ou.com „ fua induftria , de que eftavaõ de poíTe , quando foraõ „ expulfos daqueíle Eftado , fe lhes reftituaõ , e as pof. „ faõ poífuir : e pela aprefentaçaõ , que nas ditas Igre* „ j as poíTo fazer, como Meílre que fou da Ordem de „ Chrifto , o hey affim por bem , pela fatisfaçaõ que te* „ nho do feu bom procedimento , e do zelo que tem do „ ferviço de Deos, e do bem das almas daquella genti- „ lidade j e com eíla declaração fe cumpra a dita Pro- „ vifao , taõ inteiramente , como nella.fe contém 5 e af* „ íim efta Poftilla , que valerá como Carta , íem embar- „ go da Ordenação do livro fegundo , titulo trinta e no- „ ve , e quarenta em contrario. António Serrão a fez „ em Lisboa a 1 8 de Outubro de 665 . % O Secretario „ Manoel Barreto de Sampayo a fez efcrever. REY. 11 27 Como a mudança do governo do Reino fe moftrou logo favorável às dependências do Maranhão , fe feftejou naquelle Eftado com demonftrações de gran- de alegria j mas naõ fendo ainda de todo completa a dos Xxx ii mo? ,* 532 Annaes Hiãoricos " Annó 1664. moradores de S. Luiz na graça defta ultima Provifa 5 em forma de Ley , fe fufpendeo a publicação delia até no* vas reprefentações, com x> fundamento , de quedifFeria da tenção do Principe era muitos dos feus pontos j o que esforçava mais o Governador , fentindo-fe offendi- do , aflim nos intereíTes , como nas regalias do Minifte- rio ., por lhe naõ permittir a mefma Ley a nomeação dos Gabos das Tropas de refgates , e lhe prohibir as utilida- des , de que fe tinhaõ aproveitado os feus anteceíTores j e o Senado da Camera , -que fe vio aíMido de fuperiores influencias, determinou logo , que nomeaífe eíle dous Cidadãos dos de melhor nome 5 e o Vigário Geral dous Religiofos , para que juntos todos com o Governador P podeífem regular aquellas novas fupplicas : porém va- riando nefta refoluçao o mefmo Tribunal , reprefentou a Ruy Vaz de Siqueira , que para fe ajudarem as ultimas medidas com mais feguro acordo , fe deviao chamar os Procuradores de Belém do Pará , por fallar a Ley nas Gameras do Eftado , além do aíTento , que fe havia to* mado fobre a mefma matéria no auno de 662 , prevenin- do-fe já as prefentes duvidas. - 11 28 Deferio Ruy Vaz ao requerimento , expe- dindo logo para a Cidade de Belém as ordens neceíFarias com a confirmação do perdão geral ,. e a copia também da mefma ProvifaÕ em que fe duvidava , para que infor- mados os Procuradores dos inconvenientes , que fe of- fereciaÕ nella , podeífem ir melhor inílruidos nos interef* fes da Capitania j mas os feus moradores entendendo , que os naõ encontravaõ em coufa alguma as difpofiçÕes daquella nova Ley , a naõ avaliarão por inferior fortu- na , à que recebiaÕ no perdão abfoluto das fuás defor- dens : com tudo o Senado naõ fe atrevendo a replicar ao Governador, interpoz fó a reprefentaçaõ de alguns embaraços à prompta expedição dos feus Procuradores, - que- do E/lado do Maranhão , Liv. XVI. querendo-fe valer nos efpaços do tempo do benefício Anno 1664, delle. 11 29 PaíTados poucos dias , fez o Senado huma grande Junta com a aífiítencia de todos os Prelados das Religiões, Capitão mor, Ouvidor , Provedor da Fa- zenda Real, e amayor parte da Nobreza ; e prefen- tando a copia da mefraa Provifaõ , em forma de Ley , para fe ponderarem os prejuizos , que podiaõ feguirfe da fua inteira aceitação , uniformemente fe aíTentou , que em nada feoppunha à utilidade publica da Capitania : mas antes na fua obfervancia fó fe fegurava, em cujos termos naõ fe devendo replicar ficava ceifando a neceííi- dade de fe mandarem Procuradores à Cidade de S.Luiz. 1150 A eíle aífento fe feguio huma larga propoíla do Procurador daquelle Tribunal , em nome do povo ■> que inílantemente requeria a publicação damefmaLey, declarando também , que naõ confentia nas replicas del- ia j mas antes defde logo as proteílava , para que em nenhum tempo prejudicaííem à Capitania, quando a do Maranhão quizeíTe praticallas ; pois fe moftrava bem , que fó o fazia por fortes fuggeftões de particulares inte- reíTes , defattendendo os públicos : e que no cafo de que naquella Ley , depois de obedecida , defcobriíTe o tempo alguma "circunftancia menos favorável , rlavaõ todos da benignidade do feu Príncipe, que a reformaíTe fem a menor duvida. 113 1 Deíle procedimento fe pagarão tanto os MU niílros da Gamera , que o pozeraÕ logo na noticia do Governador ; mas elíe , que empenhado nas primeiras medidas, tratou também por defobediencia a fepara- çaõ daquelle povo , efcreveo ao Senado a feguinte Car- ta , que naõ fó moftra bem a inteireza defte Fidalgo nas reprefentações do feu minifterio , mas ao mefmo tempo a elegância do eílylo. Naõ Annaes Hiftoricos ir- ■ ' ' 4- 4wu> 1664. 1 1 5 2 ,, Naõ convém nefta occaíiaõ fazer duvidofa „ a fua obediência de VoíTas Mercês , pelo que pode „ refultar de difcredito à minha abonaçaõ , de que Voí- „ fas Mercês tem experimentado muy difFerentes eífei- „ tos , do que eu agora vejo nefta fua repofta , em cum- „ primento da minha ordem , que por mal entendida , „ creyo fe naõ daria à execução j e affim me declararey „ agora melhor. Ordeney a VoíTas Mercês mandaíTem p a efta cabeça de Eftado Procuradores , para fe ver , e 9> coníiderar a nova Provifaõ , em forma de Ley , que „ Sua Mageílade , que Deos guarde , foy fervido en- „ viarme , como a executor que fou das fuás ordens , e „ mandados 5 e nefta cabeça de Eftado fe deve averi- „ guar , fe convém , ou naõ executarfe , e a forma em „ que fe deve fazer > quando affim convenha j que fe a „ fobredita Provifaõ viera tao corrente , como VoíTas „ Mercês a devem coníiderar , e eu affim o tivera en- jfr tendido , e que convinha a VoíTas Mercês pelo que lhes toca , naõ fora neceíTario attender aos requeri- mentos de VoíTas Mercês , dando a fobredita Provi- faõ à fua devida execução , com referva do que po- „ dia menofcabar a authoridade do lugar, em que Sua if Mageílade foy fervido occuparme , de que darey con. „ ta ao dito Senhor. Haõ lhes mandey a VoíTas Mer- „ cês, que fízeíTem Junta, convocando os Prelados das „ Religiões ; porque no meu Regimento me ordena S. „ Mageílade os cafos em que devo fazellas , que fómen- „ te à minha peíToa tocaõ. O requerimento , que Vof- 9} fas Mercês fazem por Carta , devem mandar fazer por „ feu Procurador 5 que para que VoíTas Mercês o inf- truiíTem no que havia de requerer , lhes mandey eíTa copia da Provifaõ , e naõ para que VoíTas Mercês a propozeíTem em Junta ; affim que efpero façaõ Vof- „ fas Mercês o que lhes tenho ordenado, fem mais re- „ plica, 99 99 ?; 99 9) 9? m ão Ejlaâodo Maranhão, Liv. XVI. 5 ] f. 'aplica , que vou apreílando os navios para partirem Anno 1664» „ breviííimamente : e quando VoíTas Mercês naõ man- „ dem com toda a brevidade , fe tomará aqui a reíòlu- „ çaõ , que mais convier , e delia ferey eu o portador , iy indo-a dar à execução neffa Capitania peíToalmente. „Deos guarde a VoíTas Mercês. S. Luiz do Mara- i, nhaõ, 17 de Mayo de 1664. ~ Ruy Vaz de Siqueira; 1 1 3 3 Naõ fe atreveo o Senado da Camera a novas inílancias j e nomeando logo por Procuradores da Ca- pitania a Feliciano Corrêa , e a Pedro da Cofia Favel- la , fem a menor oppoíiçaõ do povo , ( já menos altera- do, ou mais temeroíb) os avifou defta eleição às fuás fazendas , em que fe achavaô havia muitos dias j mas o primeiro naõ fazendo cafo da tal nomeação, c o fegun- > 1664, ta Favella ; que fahio do rio de Belém do Pará em 6 de Setembro com huma Armada de trinta e quatro canoas, que guarneçiaõ quatro Companhias de Infantaria , go- vernadas pelos Capitães Francifco Paes , Joaô Duarte Franco , Francifco da Fonfeca e Gouvea , e Francifco de Valladares Soutto-Mayor 7 fazendo efte ultimo o of- fício também de Ajudante de Tenente General, e o primeiro de Sargento mor , a que affifliaõ por Ajudan- tes Manoel Coelho , António Corrêa Lobo, Manoel Coutinho, e António Mariço , e quinhentos índios , que obedeciaõ aos Principaes das fuás nações 5 e depois de alguns dias de favorável navegação , tomou terra na grande Aldeã dos Tapajós , a que dá o nome hum dos foberbos rios >■ que defembocao no das Amazonas, co* mo já fica referido. 1 1 5 5 Aqui fe deteve Pedro da Cofia até 24 de Ou- tubro na proveitoía recondução de muitos Principaes da fujeiçaõ do Eftado , que atemorizados dos bellicofos Gaboquenas , e Guanevenas , a que naõ podiaõ fazer oppofiçaõ por falta de forças , fe refugiarão com todos os vaíTallos no centro dos Gertões dos feus próprios do- mínios : e bufcando agora menos a guerra , que os amea- çava , do que a fua vingança , a feguravaõ no valerofo braço de Pedro da Cofta, que fe fez à vela naquelle mefmo dia na derrota do primeiro porto dos inimigos , em que entrou ditofamente em 25 de Novembro. 11 5 6 Defembarcou logo as fuás Tropas 5 e fepa- rando delias as que lhe parecerão neceíTarias para a de- fenfa das embarcações , que fegurou bem com huma trincheira fobre o meímo porto , com todas as mais fe poz em marcha , na qual o deixarey penetrando deíle- midamente os afperos CertÕes daquelíes bárbaros , por pertencer ao anno feguinte a relação defte fucceíTo na ordem das memorias. O , do EJlado do Maranhão , Liv. XVI '. J 3 7 1 1 3 7 O guerreiro efpirito do Governador , que naõ Anno 1664* focegava na expedição das fuás providencias para o caf- tigo dos índios aleivofos , fem que demais perto inte- reífaíle nelle a mefma pefloa , logo que defpedio o feu Tenente General , fe empregou todo na formatura de novos esforços ; e feguido dos mayores do Eftado , de- pois de vencidos os fortes embaraços , que fe lhe oppu- nhaÕ , fahio da Cidade de Belém pelos princípios de No- vembro na direitura da Fortaleza 7W/7/Í comedidas. Sue cede no lugar defeu Capitão mor Paulo Martins Garro. Chegao ao Maranhão as ale- gres noticias da paz de Portugal com as da mudança do governo do Reino , pela renuncia , ou depofiçao 1 de EIRey D. Ajfonfo. Pajfa o Governador ao Pará f e com a de- mora de poucos mezes volta ao Maranhão 1 . Reprefen- taçúes dos moradores de Belém bem attendidas do Go- vernador. Petulância do Tribunal da Camera de Belém do Pará , que reprehende o Governador com a devida fe- ver idade. Sentimento dos mefmos Minijlros , principal* mente pela repulfa dos de S. Luiz do Maranhão. De- monjlrações do Governador , que arrebatadamente paja a Cidade de Belém.- Sue cede no governo do Ejlado Pedra Cefar de Menezes. Ofeu elogio. Paffa ao Pará , onde he recebido com grandes applaufos \ mas com pouca de- mora volta ào Maranhão. Recebe noticias de Portugal de vários armamentos de Principes da Europa-, e dif- põem o Ejlado para a oppojiçaó delles. Com novas noti- cias fe defvanece ejle cuidado ; e entra Pedro Cefar no do dejeobrimento do celebrado rio dos Tocantins , expedição , quefe lhe malogra. Novas inquietações do Senado da Ca- mera de Belém do Pará , e o cajligo delias. Succede no emprego de Capitab 1 mor da Capitania Marçal Nunes da Çojla. Nova expedição para o defcobrimento do rio dos Tocantins , também mal fuc cedida. Conjuração dos mo* r adores do Pará para a prizao 1 do Governador • , e o fuc* cejfo delia. Succede no governo do Ejlado Ignacio Coe- lho da Silva. Ofeu elogio. Pajfa para a Cidade de Be- lém , e Pedro Cefar para Lisboa , onde acaba a vida com breve duração 1 . ■ Gran- do Eílaâo do Maranhão , LivJCVIL $ 4 5 1150 RÁNDES perturbações pa- Anuo 1667, deceo fem duvida no Teu go* verno Dom Pedro de Mello 3 mas o feu fucceífor Ruy Vaz de Siqueira naõ vivia também muito focegado 5 porque ainda que no Maranhão , com o ref- peito da prefença , confervava fegura a fua authorida- de, na Capitania do Pará naõ íuftentava a mefma pelas longas diftancias , que felheinterpunhaõ : e quando já com a publicação da Ley difputada fe achavaõ reduzi- dos aquelles moradores à moderação devida , lhe fucce- deo no governo do Eílado António de Albuquerque Coelho de Carvalho , Commendador da Ordem de Chrifto, das Commendas de Santa Maria da Villa de Cea, e S. Martinho das Moutas , e Donatário das Vil- las, e Capitanias do Camutá , e Cumá , chamada vul- garmente Tapuy tapera. 1151 Tinha fervido à fua cufta de Capitão de hu* ma Companhia de Infantaria , que levantou também com o feu próprio cabedal na Província da Beira , go- vernando as Armas D. Álvaro de Abranches j e as oc- cafiões, que teve nefte poílo , adiantarão tanto o feu merecimento , que depois já de haver governado a Co- marca da Cidade da Guarda por tempo de três annos , foy promovido ao governo geral do Maranhão, de que tomou poíTe na Cidade de S. Luiz em 22 de Junho: Era filho legitimo de Francifco Coelho de Carvalho , primeiro Governador geral do Eftado , onde fe guar- davaõ, com as fuás cinzas, as memorias das fuás ac- ções^ , dando-Ihes já veneração bem merecida a con- fufaõ do ódio , que intentou desluftrallas : e fendo gran- des as efperanças , que conceberão os moradores de S. Luiz do governo do filho , feguravaõ todas na herança Zzz do m - 546 Annaes Hlítorlcos Anno 1667. do pay , como fe foíTem vinculo em toda a íucceífaõ. 11 52 Compunha-fe a peíToa de António de Albu- cuerque de muitos predicados , dos que fazem perfeito hum Governador ; porém a natural afpereza do modo os deixava todos com menos exercício , do que neceíli- tava a boa harmonia do governo , para fegurar a utili- dade publica : e entendendo também , que nas mais rui- dofas demonftraçoes das fuás inteirezas eftabeleceria com mayor firmeza as attençoes dos povos , fe aprovei- tou logo daquella ta5 commua , como errada politica , de eílranhar as acções do feu anteceíTor , quando na imi- tação da mayor parte delias lograria melhor as fuás me- didas. Mas impaciente Ruy Vaz de Siqueira , de que fentindo muitas ofFenfas no refpeito naõ podeíTe pedir a fatisfaçaõ , que ellas mereciaõ , abbreviou a fua viagem; e acompanhando-o até fora da barra de S. Luiz do Ma- ranhão hum Ajudante do mefmo General , defafogou o animo no modo poffivel , dizendo-lhe porelle, que fe Deos o pozeíTe na Corte de Lisboa , nella o efperava , encontro , que feria fem duvida de melancólicas confe- quencias no valor de ambos, fe a reclajuftiça de fupe- riores ordens o naõ embaraçara. .. 1155:» Levava António de Albuquerque a refoluçao r das difputadas duvidas , que fe tinhaÕ movido no Ma- ranhão fobre a Ley do anno de 1664; porém ratifica- da, fe alterava fó nella, que na repartição dos índios das Aldeãs naõ intervieíTem os feus Miffionarios , como fe ordenava ; e que os Repartidores , que as Cameras haviaõ de eleger no principio do anno , também inde- pendentes de outra qualquer approvaçaõ , feriaõ fempre os Juizes Ordinários; novas declarações , com que fe mandava , que fe executaíTe dalli em diante o que efta- va difpofto , fem outra alguma replica , nem interpreta- çaÕ. 1 1 54 A inteira obfervancia deíla nova Ley ( que, foy do E/lado do Maranhão ,Liv XV II. H7 % a ultima, que fe expedio para o Eíkdo do Mara- Anno 1667 nhao no governo de EIRey D. Affonfo ) fe encarrega- gava muito ao Governador com largas promeíTas das Reaes attenções ) fe acabaíTe elle de pôr em ordem aquelJa matéria > que fe difputava havia tantos annos : porémAntonio de Albuquerque avifando logo das de- clarações o Senado da Camera de Belém do Pará , ac- crefcentou a ellas as que lhe parecerão convenientes f como fe vê da fua mefma Carta. ii 55 „ SuaMageftade, que Deos guarde, emhu- „ ma Carta firmada pela fua Real maô de 29 de Abril >5 do prefente anno , me ordena , que faça pôr em or- „ dem , o que foy fervido refolver acerca do cativeiro r ,, e ufo dos índios defte Eftado ; declarando , que no „ quejocava à replica feita pelo Procurador do Mara- „ nhaõ , fobre a dita matéria, naõ havia que alterar no » que ultimamente eílava difpofto ; e fomente , que no „ que toca à repartição dos índios , ha por bem, que yi no que ordenava , que intervieíTem os Párocos , naõ „ intervenhaó^ nem fe recorra a elles ; mas que o Re- „ partidor feja o Juiz mais velho em cada anno ; e que „ com efta nova declaração , faria eu que fe executaíTe „ o que tem mandado , fem outra replica , por aííim fer „ ferviço de Deos , e feu : e que me agradecerá por fua „ Real grandeza o acabar eu de pôr em ordem efia ma- „ teria , que fe difputa ha tantos annos. VoíTas Mer- & cès o hajaõ aflim entendido ; e que o que fó pertence „ ao Senado da Camera he , que o Juiz mais velho em „ cada anno , no principio delle , fera Repartidor dos „ índios \ jporém com tal declaração, que daqui até Ja- „ neiro naõ haverá repartição alguma pelo Juiz , fenoõ „ por quem eu ordenar , tendo juntamente entendido , „ que a minha jurifdicçaõ fempre fica fuperior , aííim pa- „ ra mandar dar à execução a repartição dos índios fei- >, ta pelo Juiz, como também havendo alguma queixa Zzz ii „ dos 54* Annaes Hifloricos 1667. „ dos moradores fe recorrerá fempre a mim, ou quem , meu poder tiver , para deferir como parecer juítiça - r , porque de outra forte naõ poderá deixar nunca de ha- „ ver defordens , e tumultos ; e aos Governadores Ge- " raesdo Eftado fica fempre tocando a execução de to- fy das as ordens, como também lhe toca o proceder con- ?; tra os índios, e igualmente valerfe de todos elles t „ quando lhe parecer importante ao ferviço de Sua Ma- „ geílade. Eíla he a forma , que fe ha de feguir , e o „ eílylo que convém fe guarde, fem duvida , nem con- „ troverfia alguma: e ordeno a VoíTas Mercês , que af- n fim o cumpraõ , e guardem ; porque do contrario fe „ feguirá grande prejuízo a todos. Deos guarde a Vof- „ fas Mercês. S. Luiz do Maranhão , 5 de Agofto de ,,1667. ^ António de Albuquerque Coelho de Car- „ valho. 1 1 5 6 A noticia da fucceíTaõ de António de Albu- querque no governo do Eftado , tinha já chegado ao Pará por António Pacheco de Madureira, primeiro exe- cutor das fuás ordens naquella Cidade ; e o Senado da Camera , que formou logo delias hum maduro conceito das ílias afperezas , naõ fe atreveo a replicar aos addita- mentos da refoluçaô , de que o avifava ; naô fey fe mais cançado , do que temerofo das revoluções da Capita- nia. 1 1 57 Com a felicidade do fucceftb entendeo o Go- vernador , que já o temiaõ : e como elle no terror dos ânimos daquelles moradores queria fegurar a fua obedi- ência , tratou de confirmallos no primeiro difcurfo 5 por- que informado com muita ligeireza , de que o Capitão mor António Pinto fe achava pronunciado à prizaõ da juíliça, pelaquerella que havia dado delle nojuizo da Auditoria hum Luiz Nogueira , lhe mandou logo le- vantar a homenagem , que tinha feito pela Capitania . e fubílituío no feu lugar a Manoel Guedes Aranha : como do Eflado do Maranhão , Liv.XVII. 5 42 como fe huma queixa particular baftaíTe a tao fevera de- Anno i66y. monftraçaõ , principalmente quando para ella fe expref- favaõ os cafos no mefmo Regimento dos Governado- res. 1158 Na Cidade de S. Luiz foy encarregado Ma- noel Guedes do governo da Capitania do Pará em 3 de Setembro 5 mas entrando nelle no feu ultimo dia , fe lhe nomeou novo fucceííor em 20 de Outubro , fem que a Patente deíle , que veyo a ter eíFeito no feguinte an- no , nem outra alguma noticia ? dê o menor motivo para a tal novidade , quando ella accufa huma grave culpa no fuccedido , ou outra nao menor no arrebata- mento da fua fuccefíaÕ : e como efta he a ultima me- moria do prefente anno , paílàrey já ao que fe continua. 1 159 Entrou o novo anno de 1668 , . e nos princi- Anno 1668. pios delle todas as efperanças dos moradores de S. Luiz, pela fucceíTaõ do Governador António de Albuquer-* que , fe achavao já como malogradas j porque ainda que lhe reconheciaõ eíTenciaes virtudes para o exerei- cio do mefmo miniílerio , fazia emmudecer todas as con- fifsões o defabrimento do feu modo , que viílo também no cryftallino efpelho da fuavidade do feu anteceíTor Ruy Vaz de Siqueira , fe lhes reprefentava muito mais horrorofo. n 6 o EraÕ grandes fem duvida , pelos mefmos mo- tivos , as defconfolações da Capitania do Maranhão ; porém muito mayores as do Graõ Pará com tantas dif- tancias de permeyo 5 porque quando lhes valiaõ eftas , para doerfe menos dos feus defagrados, como tinhaÕ as Aldeãs dos índios , os penetrava mais a fenfivel falta , que já experimentavas no ferviço deíles , por difpor de todos o mefmo General com poder mais difpotico , que o que lhe permittiao as refoluçÔes ultimas da Corte fo- bre a mefma matéria , quando a fua inteira execução lhe havia fido a elle taô efpecialmente recommendada. Quei- ti, I. m 1 ? Anno 1668. 5ío •:, Annaes HiHoricos 1161 QueixavaÕ-fe também , de que as varias Tro- pas , que tinha expedido para os vaílos Certões dos grandes rios das Amazonas , e Tocantins , levando o titulo de Defcimentos , eraõ de reígates , contra a dif- pofiçaõ da ultima Ley , que expreífamente declarava , que a nomeação dos Cabos delias pertencia fó aos Se- nados das Cameras 5 e que fendo muitos os intereíTes das taes expedições nos refgates dos índios , naõ era5 menos na extracção do cravo , fervindo-fe de todos com total defprezo da mefma Ley a utilidade particu- lar , fem attençaõ à publica ; mas com tudo aquelles moradores fabendo reduzir a íua grande dor aos fagra- dos limites da fidelidade , lhe buícaraõ fó o licito remé- dio de communicalla à mefma caufa delia com termos taõ politicos , que pondo toda a culpa nos Cabos das Tropas , fe percebia bem aonde encaminhavaõ a prin- cipal parte do geral íentimento da Capitania. 1 162 Procedeo o Senado com eíla louvável mode- ração 5 mas excedeo-a logo chamando ao mefmo Tribu- nal os Principaes de muitas Aldeãs , para lhes declarar a nova forma de repartição dos índios feus vaíTallos , que intimou também na prefença de todos a António de Carvalho , filho natural do Governador , para que advertiíTe , que naquella mefma diílribuiçao entravaõ as Aldeãs da Capitania do Camutá , que elle governa- va , como Lugar-Tenente do feu Donatário : porém António de Albuquerque , que fentio tanto as queixas , por mais que rebuçadas , como as difpoíições do Sena- do da Camera , reprehendendo tudo ainda com mayor afpereza , que a coftumada , accrefcentou nella , que António de Carvalho devia fer tratado como feu filho , e também como fua de juro , e herdade a Capitania do Camutá. 1163 Com eíla Carta entrou na Cidade de Belém do Pará no primeiro de Abril Paulo Martins Garro , e fendo ' do Ejiado do Maranhão, Liv.XVII. 5 5 í fendo o nomeado pela Patente de 20 de Outubro do Armo 1668, anno paíTado para Capitão mor da Capitania , tomou poíTe delia no meímo dia da íba chegada , fem que tam- bém fe poíia averiguar qual fofle o motivo de taõ lon- ga demora , quando a períiiade cheya de myfterios o acelerado procedimento dofeumefmo defpacho j mas o certo he , que arrependido delle o Governador , fó quiz agora , que tiveíTe eíFeíto ; porque deíconrlando da paciência daquelles moradores , lhe pareceo fem du* vida , que na confidencia do novo Commandante fe fe- gurava bem dos feus juílos receyos. 1 1 64 Paífado pouco tempo chegarão ao Eftado do Maranhão as alegres noticias da paz de Portugal com as da mudança do governo do Reino, pela renuncia, ou depofiçaõ de EIRey D. AíFohfo y e quando os inte- reíTes daquelles moradores tinhaó devido ao Minifterio deíle infeliz Principe attençoes muito efpeciaes , conce- bendo já mayores efperanças da fua fucceíTaõ , naõ fó a naõ fentiraõ , mas entrou também com parte naõ pe- quena nos applaufos da paz, natural inconftancia no apaixonado procedimento do Mundo politico. E165 Eímerou-fe o Senado da Camera de Belém do Pará nas demonílrações publicas 5 mas no meyo del- ias , diííimulando mal as afperezas do Governador , en* caminhou logo as queixas de todas aos Reaes ouvidos do feu novo Principe ; he certo com tudo , que mais encarecidas da paixão dos ânimos , que a tanto arraftaõ ordinariamente as imprudências dos primeiros Minif- tros : porém António de Albuquerque fem a menor no- ticia , de que os clamores da Capitania paífavaõ a Lif boa , chegou à Cidade de Belém nos principies de Ou- tubro ; e como era a primeira vez , que apparecia àquel- les moradores , revertidos elles da mefma deílra politi- ca , o receberão com grandes applaufos. 11 66 Entrou logo na diftribuiçaÕ de algumas pro- videncias P . V,k'. Vi iíil • ■ ' : 5Í2 jbmaes Hifioricos Anno 1668; videncias , que lhe parecerão neceíTarias a utilidade pu- blica 5 e expedindo pela mefma conta huma grande Tropa de refgates à ordem de Pedro da Coíla Favella 7 que já tinha fido Tenente General do feu anteceflbr , fe recolheo à fua refidencia de S. Luiz do Maranhão nos fins de Dezembro , também diííímulando o vivo fenti- mento , com que havia paíTado à Capitania do Pará. Anno 1669. 1 167 Succedeo o anno de 1669 5 mas os novos Mi- niílros do Senado da Camera daquella Capital , que também feguiaó a mefma paixa6 dos feus anteceíTores no defagrado do Governador, para mortificallo nos par- ticulares intereíTes , inculcando-fe fó zelofos dos públi- cos na defenfa dos índios , lhe reprefentaraõ a notória injuftiça , com que padecia a íua liberdade pelas info- lencias de algumas efcoltas , que andavaõ no rio das Amazonas : e ponderando bem as Fataes confequencias das mefmas tyrannias , inítantemente lhe requeriaó o caftigo delias \ já com a propofta de que o melhor cami- nho para fegurallo , achavaõ fó que era o da expedição de huma nova Tropa , que retirafle todas. 1 168 Ouvio elle com toda a attençaõ eíle requeri- mento 5 mas por mais que entendeo o principal fim , a que fe encaminhava , lembrando fó ao mefmo Senado o efficaz empenho ", com que fe haviaõ encarregado a Pe- dro da Coíla Favella os refgates dos povos , o avifou também , que nomeando-lhe para Commandante da Tropa , que pedia três dos moradores da Capitania , que reconheceífe por mais capazes , elegeria hum delles $ e ainda que a eleição era fó daquelle Tribunal , como nao fe atreveo a difputalla , propoz logo a Balthafar de Sei- xas Coutinho , a D. Gafpar de Contreiras , e a Braz de Soufa 5 dos quaes o General efcolhendo o ultimo 7 lhe paífou as ordens , !>|t \\m JJ6 Annaes Hijíoricos Ánno 1670, da Praça , lhe encarregou a diligencia de trazer prezo do Camutá o tal delinquente , tendo fó com elie a in> banidade de efcreverlhe huma Carta , em que lhe dizia ,■ que quizeíTe pouparfe às defcompofturas da violência , fazendo fem cila amefma jornada, para refponder na* quelle Tribunal aos graviffimos crimes , de que o accu- fava o feu Procurador em nome do povo. 1 176 Chegou ao Camutá o Sargento mor Salvador Gomes , e intentou refiftirfe António de Carvalho , fia- do com razão no refpeito do pay ; mas o Sargento mor attendendo-o menos , que a obrigação, em que fe tinha poílo , venceo com a força a fua repugnância , condu- zindo-o, a pezar de toda, até à Cidade de Belém do Pa- rá , onde appareceo no Tribunal da Camera , que repre- fentando o grande Miniílerio do Senado Romano , lhe fez todos os cargos , de que o arguíaô j e refpondendo o reo com a confííTaõ da mayor parte delles , os dei- xou ainda mais efcandalofos na declaração , de que tudo obrava por ordem de feu pay ,0 que fe faz incrível : mas aquelles Miniílros, afíiftidos já da principal Nobre- za , formarão aíTento da fua confiíTaô , que affinaraõ to- dos com o próprio reo j e continuando nas mefmas in- Êeirezas , avifaraõ deftas a António de Albuquerque com tal fatisfaçaõ , que ainda accrefcentavaõ , que tomariaò logo naqueíla matéria a refoluçaõ ultima , que lhes pa- receíTe mais conveniente ao focego do povo ; procedi- mento , que devia approvar, quando lhes dava exemplo na feveridade com que caíligava deli&os menos feyos : como fe elles lhe foíTem também focios na fua authori- dade. 1177 Era pouco fofTrido o Governador ; mas me- recendo bem todas as aíperezas do natural a defatten- çaõ daquelles homens , diffimulou com tudo o feu fen- timento , querendo fegurar com a própria peífoa as de« monílrações delle : e temendo-as já omefmo Senado, naõ do miado do Maranhão , Liv.XVIL 5 í | naõ paíTou a diante \ nas que prevenia para o caíligo de Anno 1670. António de Carvalho: ultimamente refol vendo fe e(- peraífe a repoíta da Carta, a qual naõ confeguindo a fua diligencia , tornou a repetir a de procuralla , mas com igual fortuna. 1178 Sem outra novidade , fuccedeo o anno de 1671 -, porém António de Albuquerque , que fó efpe- Anno 167 1. rava , que no fim do paíTado o tiveíTe também a admi- niílraçaõ dos feus offeníbres , para lhes pedir a fatisfa- çaõ , que já lhe preparava a fua juíla ira , arrebatada^ mente navegou logo para a Cidade de Belém , onde en- trou de noite taõ diííimulado no rebuço das íbmbras , que íe naõ percebeo a fua chegada 5 mas naõ lhe baila- rão todas eftas cautelas para poder lograr asófuas medi- das à mefma proporção , que as tinha tomado 5 porque os mais culpados , que conheciaõ bem o feu afpero gé- nio , accufados da confciencia própria , de forte prevê- 1 niraÕ eíle forte accidente , que fe livifaraõ delle entra-* nhando-fe nos vaílos CertÕes do grande rio das Amazo-* nas : e ainda que com o mefmo precipitado impulfo fe« guio peífoalmente o alcance de alguns até a Fortaleza do Curupá , viagem de oito dias , a diligencia com que* fe feguraraõ , fez inúteis as fuás. 1179 Sufpendeo entaõ os acelerados paífos daco-? lera ; e voltando logo para a Cidade de Belém /fe reco- lheo à de S. Luiz nos principies de Mayo , fem mais outra alguma demonflraçaõ publica , tendo já expedido duas grandes Tropas ; huma de refgates para o rio das Amazonas à ordem de Hilário de Soufa de Azevedo, e outra para o rio dos Tocantins de guerra , e defeimen* tos de gentio forro ., paira fornecimento das Aldeãs /que encarregou ao Sargento mor Francifco de Valladares Soutto-Mayor , Commandantes ambos de conhecida capacidade: mas porque os fucceíTos deftas expedições naõ trazem novidade ,, que mereça memoria , a naõ fa- rey ÍJI Annaes Hiftoricos ■ .. ■ Anno i6yu rey delles , como também o tenho praticado em outros femelhantes. 1 1 80 Poucos dias havia , que tinha chegado à Ci- dade de S. Luiz António de Albuquerque , quando em 9 de Junho entrou na bahia daquella Capital o feu fuc- ceííbr no governo do Eílado Pedro Cefar de Menezes , Fidalgo taõ illuftre pelo feu nafcimento , que até o de- feito da illegitimidade , com huma fingulariflima excep- ção da cornmua regra fervia fó de lhe accrefcentar o explendor do fangue. 1 1 8 1 Era elle fem duvida dos mais efclarecidos pe- la fua afcendencia j mas naõ o era menos a fua peíToa pelas acções próprias , efpecialmente na formidável guerra daAcclamaçaõ de Portugal, pelo largo efpaço de quatorze annos com os póftos de Capitão de Infan- taria , de Cavallos Ligeiros , e de Couraças , deCom- miíTario Geral da Cavallaria , e de Meftre de Campo da Guarnição da Praça de Campo-Mayor, em que ain- da fe achava quando pafíbu ao prefente emprego*: e co- mo todas eftas informações promettiaõ ao Maranhão já como feguras grandes felicidades , fizerao crefcer mui- to os alvoroços daquelles moradores. 11 82 Levava Pedro Cefar verdadeiras noticias da pouca attençaõ , com que o Governador António de Albuquerque havia tratado ao feu anteceííbr Ruy Vaz de Siqueira, a quem profeíTava huma amifade muy an- tiga , contraída nos primeiros annos da fua mocidade, e fegurada com mais eftreitos vínculos no concurfo da guerra ; e tomando muito por fua conta a fatisfaçaõ deftas ofFenfas , que por difFerentes títulos julgava co* mo próprias , a logrou fem duvida com a melhor politi- ca , fendo a mais pezada para as afperezas do natural de António de Albuquerque ; porque foraõ taes as vene- rações , com que o cortejou , e fez cortejar, que eftra- nhando-as elle já como exceffivas, publicamente lhe ref- pondeo , • ão Eftado âo Maranhão ,Liv.XVII. $59 pondeo, (jfle daquelía forte fe devia fempre proceder Anno 1671. com os anteceíTores 5 e na reprehenfaÕ da fua mefma culpa , faltando-lhe de todo a prudência para diííimular o fentimento delia , fe foy meter a bordo da embarca- ção , em que paflbu para Portugal muitos dias antes do deílinado para a viagem. ii 83 Tomou as rédeas do governo o novo Gene- ral , e principiando logo a encher bem nas acertadas dif- poíiçòes da fua muita capacidade , e agrado do modo ? as expedações da Capitania , cada inftante foavaÕ mais as vozes das acclamações delia. 1 1 84 Sem outra memoria , que merecidamente po£ fa demandalla , entrou o novo anno de 1672 ; e defem- Anno 1672. baraçado Pedro Cefar das dependências da Capitania do Maranhão , paflbu a Cidade de Belém do Pará , onde foy recebido no dia 1 5 de Fevereiro com as folemnida- des coílumadas : mas ainda que a fama do feu illuftre nome , e o defagrado do feu anteceíTor empenharão mais os feftivos applaufos daquelles moradores , gozan- do-fe então delles menos de três mezes , voltou para a Cidade de S. Luiz nos princípios de Mayo. 1 1 85 No íitio das Salinas , dous dias de viagem da mefma Cidade de Belém f recebeo Pedro Cefar Cartas de Portugal com os avifos , de que preveniíTe a defen- fa do Eftado para a oppofíçaõ de Tropas inimigas ; por^ que os armamentos de diíFerentes Príncipes da Europa , fem fe averiguarem os projeótos delles , davao muito cuidado , quando as Conquiílas daquelía Monarquia eraÕ as invejas de todo o Mundo : porém eíle Fidalgo , que nos mais fortes accidentes fe fervia fempre do defa- fogo natural do feu grande efpirito , expedindo logo pa- ra o Pará com eftas noticias todas as ordens , que lhe pa- recerão neceífarias , continuou a fua jornada até a Cida- de de S. Luiz , onde lhe cuílou pouco a difpor os âni- mos para a refiftencia de qualquer invafao 5 porque aífif- tidos : .,;!'; $6o Annaes Hiíloricos Ánno 1672. tidos todos das influencias do feu meímo*valor ; que fazia ainda muito mais efficazes a concebida fé da fua militar difciplina , naõ havia perigo ; que lhes meteíTe medo. 1 1 86 Na Cidade de Belém do Pará fe armarão tam- bém com deílemido animo os íeus moradores para a de- Anno 1673. fenfa da Capitania ; mas fuccedendo o anno de 1675 , entre os mefmos eítrondos militares , emmudeceraõ to- dos com os novos avifos , que chegarão do Reino : e O Governador entrando no cuidado de outras expedi- ções , lhes deu logo principio na do defcobrimento do famofo rio dos Tocantins , donde já bufcavaõ a fua pro- tecção muitas das nações daquelle Gentilifmo , tyran- namente perfeguidas das Tropas de S. Paulo. . 1187 Por feu primeiro Commandante nomeou na Cidade de S. Luiz ao Capitão Francifco da Mota Fal- cão , que paíTou ao Pará dentro de poucos dias j e foc- corrida a fua a&ividade das promptas providencias do Capitão mor António Pinto , fahio daquelle rio nos úl- timos de Março com hum armamento de naõ pequena força , fe naõ achaíTe mais oppoíiçaõ,, que a dos Ta- puyas nòíTos inimigos ; mas pondo as fuás proas no mef- mo rio , que bufcava , e fubindo por elle com muito trabalho, tomou porto em huma grande praya, onde achou varias embarcações encalhadas em terra , fabri- cadas todas de páos molles , que fervindo fó para tranf- portar gente, as teve logo por apreftos mais que de Gentios j no que brevemente fe confirmou bem com as noticias , que lhe foraõ chegando , de que infultava aquelles Certões com huma Tropa de Pauliftas o Mef- tre de Campo Pafcoal Paes de Araújo , ainda depois de ter já reduzido a injurio cativeiro a naçaõ dos índios Guarajuz. 1 1 8 8 Com eda informação fez logo.aviíb a Pafcoal Paes , de que fe achava naquelle fio por ordem do Go- vernador do Eflaâo do Maranhão , Liv.XVII. 5 6 1 vernador Geral do Ettado do Maranhão , a quem lo per- Anno i(>7%, tencia a jurifviicçaõ delle > e que a naçaõ dos índios Guarajuz, opprimida pelas fuás armas com o procedi- mento mais eícàndalofo , era a que primeiro lhe recom- mendavaõ as inítrucçoes catholicas do mefmo General, por fer a mais affli&a das que haviaõ bufcado a fua pro- tecção , já com os ameaços do inhumano golpe , que ef- tava fentindo ; mas que quando tivefle, que dizer fe- bre aquella matéria , lhe pedia muito quizeíTe bufear fi- tio , que lhe pareceíTe accommodado para a tratarem ambos r como vaíTallos de hum mefmo Príncipe , que fabiaó todos o quanto fe orTendia de infultos taõ atro- zes. 1 1 89 O Medre de Campo fe defagradou tanto do recado , que lhe refpondeo com defabrimento $ mas a prudência de Francifco da Mota naõ fe querendo dar por entendida delle , repetio ainda as mefmas inftancias por huma cortez Carta , a que o Paulifta fatisfez tam? bem fó de palavra pelo primeiro eftylo \ acerefeentan- do mais , que com elle naõ tinha , que tratar em maté- ria alguma : e quando houveííe quem fe quizeíTe oppor à invafaõ dos Tapuyas , a fuftentaria com o poder das armas , para o que entrou logo a fortificarfe com boas trincheiras. 1190 Bem defejou Francifco da Mota verfe com elle de mais perto , para poder examinar fe a muita bra* veza das palavras inteiramente refpondia ao valor das obras 5 porém achando , que lhe prohibia ofeu Regi* mento efta demonftraçaõ , quiz fegurar antes a fua obe- diência , como Commandante de hum Corpo de Tro- pas , do que como Soldado particular o defafogo da fua juíla cólera ; e por naõ paflar a mayores empenhos , em que perigaífe a mefma obfervancia , fe retirou para O Pará , fem mais outro fruto do feu grande trabalho, qué p de hum defeimento de índios belíicoíos / que volun- Bbbb tariamente '">lÍÍ: 5 62 Annaes Hifloricos Anno 1673. tariamente fe fujeitaraõ à vaíTallagem Portugueza. 1191 Com abbreviada navegação chegou à Cida- de de Belém , onde fe achava já o Governador defde o dia 15 do mez de Junho 5 porém dando-lhe conta de to- dos os fucceíTos defta expedição , ainda que elie naÕ ío inftigado dos naturaes impulíòs do feu guerreiro efpiri- to , mas também do zelo mais catholico , tomou logo ajuftadas medidas para cumprir com tudo na repetição da mefma entrada , fe vio obrigado a difFerilla para o fe- guinte anno , por falta de monçaõ , que lhe facilitaífe a fubida do rio. 1 1 92 Na chegada de Pedro Cefar ao Pará . recebe- rão Carta os Miniftros da Camera dos da de S. Luiz do Maranhão , com os avifos de que reconhecendo-fe o gravifíimo damno , que fe feguia aos povos da falta de obfervancia da Ley de 1663 , embargada entaÕ porin- telligencias apaixonadas , ( como elles diziaõ ) e depois da declaração de 1667 , também defattendida da negli- gencia dos íeus anteceífores , requererão o cumprimen- to delia aô Governador , que lho na5 duvidara , quan- do fabiaõ o quanto o fentira , pela jurifdicçaÕ , que lhe coarctava na repartição dos índios forros j o que tudo pontualmente lhes communicavao , como fieis compa- nheiros , para fe aproveitarem do mefmo beneficio ; e como aquelles moradores tinhaô fido fempre os mais empenhados na inteira pratica da referida Ley, pelos mayores intereíTes , que confideravao nella , o Senado da Camera prefentando logo a Pedro Cefar a fua copia authentica , elie lhe poz o cumpra-fe , como no Mara- nhão ao original. 1195 Cheyos dos mais alegres alvoroços todos os Miniftrosdàquelle Tribunal , pela felicidade do fuccef> fo , o cómmunicàraÕ logo ao povo , que o feftejou com geraes applaufos; pOíém o Senado, que fenaõ dava por feguro fem a publicação da mefma Ley , a difpu- nha ! âo Eflado âo Maranhão ,Liv.XVII. 11$ ! ; nha já arrebatadamente , quando oppondo-felhe o feu Anno 167J. Procurador Francifco de Sarges , aífíílido de muitos Ci- dadãos dos de melhor nome , com o fundamento , de que a pratica delia , fem as declarações , que ainda fe efperavaõ , ficava fendo de grave prejuízo aos interef- fes da Capitania , lhe fez fufpender a refoluçaõ muito a pezar do orgulhoíb empenho , com que a tinha tomado.. 11 94 Com razão parecia ao Governador , que efte aíTento do Tribunal da Camera, que inteiramente fe de- via às induftriofas negociações da fua prudência, deixa- va tudo focegado ; e refinando mais a mefma politica , fe naõ quiz dar também por entendido de tamanha def- ordem , por fe defobrigar das demonítrações publicas da feveridade , que juítamente merecia : mas o cego orgu- lho daquelles Miniílros , que inculcando bem , que fe reíignava como convencido , fe aecendeo muito mais com os embaraços , que fe lhe oppozeraõ , fabendo re-? duzir à fua devoção o Procurador , com a mayor parte dos apaixonados na contradição delia , folemnemente re-j clamarão todos a mefma impugnação no breviíTimo ter- mo de três dias , fujeitando-fe já às fuggeftoes dos mal intencionados 5 e receando elles novas inconítancias , fe aproveitarão da opportunidade da occafiao , convo- cando logo , de poder abfoluto , huma grande Junta \ de que refultou a publicação , fem outra authoridade. 1195 Sentio Pedro Cefar o efcandalofo modo def- te procedimento 5 e entendendo bem , que já neceííita^ ya de demonílraçaõ publica na attençao do cara&er , achando-fe furta naquelle rio huma pequena embarca-*' çao , que fazia viagem para o de Lisboa , arrebatada- mente mandou meter nella o Juiz mais velho do Senado Manoel Cordeiro Jardim , com o Vereador Alexandre da Cunha , ambos principaes complices no mefmo defa* cato y que eftranhou tanto a exemplar juíliça do Prínci- pe Regente , como fe moftra da fua Real Carta ? que Bbbb ii me y 64 Annaes Hiftoricos » }j Atino 1673. me pareceo trasladar aqui, para documento da fidelida- de no orgulho dos povos. 1196 „ Officiaes da Camera da Cidade do Pará. „ Eu o Príncipe vos envio muito faudar. Recebeo-fe }7 a voíTa Carta de 21 de Julho defte prefente anno , em 7 , que dais conta de fe vos ter deferido a alguns negó- cios deíTa Camera , que propoz o Procurador delia Paulo Martins Garro : e porque o de mayor impor- tância he íbbre o Gentio deíTe Eflado, cuja ultima re- foluçaõ minha , fobre a Ley , naõ eílava ainda publi- „ cada , e a quizeíleis dar à execução , fazendo para if- „ ío Junta , e chamando os Prelados dos Conventos , „ e Vigário Geral, fem ordem do Governador do Eíta- „ do , ou Capitão mor deíTa Praça j e quererdes de vof- „ ío motu próprio publicar a Ley , de que já foraõ re- t r prehendidos voflbs anteceíTores 5 e pelo Prelado do „ Collegio da Companhia naõ ir à mefma Junta, diíTef- >, tes algumas palavras contra eíles Religiofos j e tam- >, bem por naõ dares cumprimento ao papel aflinado 7, por toda a Nobreza , e Povo , como tinheis ajuítado „ com o Governador Pedro Cefar , fobre as propoftas „ da jurifdicçaõ dos índios do Curupá , e da naçaõ dos „ Ingahibas , que eílaô fem fe aldearem , e de tereis ti- 7, rado das mefmas Aldeãs os Gentios , fem a forma cof- „ tumada , de que tudo me fez avifo o Governador do „ Eílado , e vós deites particulares me naõ dais conta 7, da caufa , que tivefTeis para o fazer , me pareceo por „ ora eftranharvos efte procedimento , e que a elle deis ? , a fatisfaçaõ , que convém 5 que naõ fendo ajudado „ com a Ley , Regimentos , e ordens minhas , além de ?> me haver por mal fervido de vós , mandarey proceder „ contra os que forem culpados neftes excefios , como ?, as minhas Leys difpoem : pois fois obrigados a naõ „ executardes ordem alguma , fem dares conta aoGo- „ vernador , e obedecerlhe como a voííb fuperior 5 e „ poílo }> >y âo Eâado do Maranhão , Liv.XVIL 5 6 J „ poílo que as Leys fobre os Gentios concedem às Ca- Anno 1673, „ meras deífe Eílado poífaÕ eleger Repartidor , e Ca^ „ bos das efcoltas , naõ he para que as Cameras fem au- thoridade do Governador façaõ eílas eleições , e man- dem Tropas ao Certaô , nem Junta, em que chamem „ os Prelados fobre eíle particular , o que deveis ter en- „ tendido. Ao Governador do Eílado efcrevo , que fe „aLeynaõeftá publicada, afaça logo publicar neífa ,, Cidade , e na de S. Luiz do Maranhão : e em virtude „ delia íe procederá daqui em diante, em quanto eu naõ ,5 mandar o contrario 5 e vós fereis advertidos , que dos „ índios do Curupá , e Ingahibas , vos naõ pertence a „ repartição 5 e nos pagamentos dos que affirtem ao fer- „ viço dos moradores deíTa Capitania , conforme a Ley „ difpoem , fe lhe fatisfaça ; porque fe me tem feito al- gumas queixas. Lisboa, 21 de Novembro de 1675. PRÍNCIPE. 1 197 Nos princípios já do novo anno de 1674, re* Armo 1674. cebeo o Senado eíla fevera Carta do Príncipe Regente 5 e esforçando-fe ainda a defculpar o feu procedimento no mefmo Miniílerio , todas as fuás reprefentaçÕes fo- raõ defattendidas : mas o Governador fatisfeito bem def- ta demonílraçaõ , com a que tinha feito no primeiro caf- tigo , deu todos os complices por reconciliados 3 natural acordo da generoíidade do feu animo. 1 1 9 8 Parlados alguns mezes , entrou naquella Ca-* pitai da Capitania Marçal Nunes da Cofia com o em- prego de Capitão mor delia , que havia já fervido doze annos antes com pouca aceitação dos feus moradores ; mas fem a menor duvida o meterão depoífe em 30 de Julho. 1 199 Levava Regimento , que lhe declarava a ju- rifdicçaõ do feu miniílerio ; mas fendo o primeiro , que fe paífou aos Capitães mores , teve pouco exercido com gran« »' $66 Annaes Hiftoricos ! ^ Anuo 1674» grande fentimento das afperezas de Marçal Nunes ; por- que fó podendo praticallo na aufenxia dos Governado- res , que faziaõ até aquelle tempo a fua refidencia na Cidade de S* Luiz do Maranhão , a tinha mudado Pe- dro Cefar para aquella de Belém do Pará. 1 200 Nefte mefmo tempo empenhava já efte Fidal- go a fua actividade na nova expedição dos Tocantins , também para o caítigo do Meftre de Campo dos Pau- liftas Pafcoal Paes , jurlamente oíFendido da barbarida- de do feu procedimento , affim no cativeiro dos índios Guarajuz, como nas arrogâncias , com que havia trata- do o Capitão Francifco da Mota j mas quando regula- va as ultimas medidas para poder entrar na pratica del- ias , lha impoffibilitou a chegada de António Rapoíb iTavares, Clérigo do habito de S. Pedro , que indo de Lisboa encarregado do defcobrimento do mefmo rio, todas as efperanças da fua jornada affiançava fó nas in- felligencias do mefmo PauMa. ,;.-;■ 1201 Segurava elle nefta expedição importantiííí- ixios thefouros ; e o conhecido zelo de Pedro Cefar que- rendo concorrer para a felicidade do feu defcobrimento, lhe encarregou logo a Tropa de guerra , que tinha já prompta, também na obfervancia das ordens, que leva- va j mas dilatando-felhe a monçaô para fubir o rio até os dias últimos do prefente anno , entaÕ fe fez à vela do de Belém do Graõ Pará taõ elevado nas reprefenta- ções da fua fantaíia , que fazia já as mais foberbas orien- tações de tamanha fortuna : fatal engano da cegueira dos homens na ambição das riquezas \ Ânnoi675. 1202 Na mova fucceflaõ de 1675 continuava An- tónio Rapofo a mefma viagem dos Tocantins , tratan- do-a ainda pela mais venturofa ; porém paífava já a im- paciência o feu grande cuidado na trabalhofa navega- ção da fubida do rio , quando tomando porto nas terras dos índios Guarajuz ( primeiro apontamento do roteiro do do E/lado do Maranhw , Liv.XVIL 5&7 > do Meílre de Campo Fafcoal Paes ) principiou logo a Armo 167$, penetrar as fuás afperezas cheyo de alvoroço j mas co- mo as fuás efperanças fe fundavaõ fó na communicaçao daquelle Paulilla , muito a feu pezar as chorou todas malogradas dentro de poucos dias com as informações da lua morte 5 e fem mais fruto de tantas fadigas , que o defengano , que aflas lhe foy cuílofo , voltou para a Cidade de Belém , donde brevemente fe recolheo a Por- tugal , convencendo bem com as experiências das pre- fentes defgraças , as paíTadas invejas da fua expedição. 1205 He o rio dos Tocantins hum dos mais cele- brados da Capitania doGraô Pará, menos pela abun- dância das fuás aguas , ( que reftitue ao Oceano na gran- de bahia de Marapatá , diftante trinta léguas da mefma Cidade de Belém ) que pelas efperanças de riquiííimas minas , que fegura nas fuás cabeceiras a continuada tra- dição de dirferentes memorias, authorizadamente repe* tidas pelo Padre Manoel Rodrigues , da Companhia dè Jefus , no feu Maraiíon , y Amazonas : porém quando para o defcobrimento deílas preciofidades , tem fido tan- tas as expedições , como os Governadores , ou a froxi- daõ dos feus Commandantes , ou as difpofições da alta Providencia as occultaõ ainda à ambição dós homens 5 mas fe feguirmos as reflexões politicas de alguns con- templativos , antes fera fortuna , que infelicidade. 1204 Os feus vaílos Certões faõ habitados todos de numerofa gentilidade , e alguma bellicoía , os ares muy benignos 5 e entre os muitos rios , quê defembó-i cao nelle , até onde fe acha defcoberto , hé o mais de- cantado o de Arary , chamado dàSaude"poi antonoma- íia , por ferem as fuás aguas taõ medicináes , que naõ íô curao diferentes queixas , mas também as prefervaõ S a varia multidão de aves , e feras he como ordinária em toda a dilatada Regiaõ da America , principalmente Lufitana. Seis ■ ■K-m 568 Annaes Hijloricos Anuo 1675. Armo 1676. 1 20 j Seis gráos ao Sul da Linha entra também nef- te celebre rio o grande de Araguaya , que defcobrio Bernardo Pereira de Berredo até a altura de doze gráos e vinte e dous minutos , no tempo que era Governador defte Eílado : e fe o CapitaÕ de Infantaria Diogo Pin- to da Gaya , Commandante deita expedição , fe naô ernbaraçaíTe no feu ultimo exame , lograria fem duvi- da no dos Tocantins o principal projeão das fuás inf- micções ; mas o certo he, que taò repetidas infelicida^ des perfuadem myílerio. 1206 As expedações de todo o Eílado do Mara- nhão eftavaõ occupadas na jornada de António Rapo- fo 5 e malograda ella , parece que efte fentimento fez emmudecer todas as memorias até o fim do anno. 1207 Seguio-fe afucceíTaõ de 1676 , ena entrada delia chegarão à Cidade de Belém do Pará , por ordem da Corte , cincoenta cafaes com duzentas trinta e qua- tro peíToas de hum , e outro fexo , conduzidas da Ilha doFayal, huma das dos Açores , onde haviao perdido a commodidade das fuás cafas na Freguefia da Feiteira, laítimofamente confumida da voracidade de hum vol- caõ , que defatado em dilúvios de fogo , fe naõ bufcaf- íè , como logo bufcou ( guiado fem duvida da alta Pro- videncia ) na precipitada oppoíiçaõ do Oceano o feu ultimo eftrago , feria o mais fatal de toda aquella terra dentro de poucas horas. 1 2og Os moradores do Pará , generofamente com- paffivos , diftribuiraÔ toda aquella gente pelas fuás ca- fas , onde viveo com fufficiente commodidade , até que a teve própria ; para o que em 22 do mez de Ja- neiro lhe repartirão chãos com baftante largueza no íi- tio da Campina, (hoje bem povoado ) por ordem , e aíMencia do Senado da Camera , que mandou também ao Arrumador os pozeíTe logo em forma de rua , a que fe deu o nome de S. Vicente , por fer efte o feu dia j c du- do Ejla do do Maranhão, LivJCVII. j 69 durando ainda a efterilidade dé noticias, fe naõ acha ou- tra no prefente anno , que mereça memoria. 1209 Na íucceífaÕ de 1677 fe confervava o Go- Anno 1677. vernador na Cidade de Belém do Pará j e fendo o pri- meiro , que mudou para ella a fua reíidencia , como fica dito, era tal o modo , de que fe compunhaõ as rnefmas inteirezas , com que procedia , que depois da reconci- liação deftes moradores nojufto fentimento das defor- dcns paíTadas , fe naÕ ouvia já em todo o Eílado mais que as merecidas acclamaçoes do feu illuílre nome ; mas ■como nada baila para completamente fegurallas na na- tural variedade das paixões dos ânimos , influídos al- guns das- fuggeftões malignas dos mal intencionados y experimentou bem os efFeitos delias , como veremos, logo. 12 10 Contavaõ-fe já os penúltimos dias do mez de Agofto , quando o Padre Francifco Vellofo , da Com- panhia de Jefus , com virtuoíò zelo informou Pedro Ce- far , de que para a prizaô da fua peíToa eftava formada na mefma Cidade de Belém huma conjuração , que com- pondo-fe de alguma parte da Nobreza , e Povo , davaõ calor a tudo muitos Religiofós, e Ecclefiafticos , co- mo fuccede commummente neílas diabólicas aíTem- bleas : e para que o defprezo de huma noticia tao im- portante a naõ fízeífe inútil com merecida magoa , naõ fó accrefcentou o mefmo Padre , que o dia deftinadd para a execução daquelle fatal golpe era a vefpera de S. Raimundo Nonnato , ( na occaíiaõ de huma Comedia , ■que fe reprefentava à portaria do Convento de NoíTa Senhora das Mercês j para a qual fabia fe achava con- vidado elle Governador pelos feus mefrnos Religiofós ) mas também para de todo reduzir o deílemido animo deílç Fidalgo , lhe fegurou logo , que aquelles avifos lhos communicara hum dos confederados , já defcon-, fiado de alguns dos Companheiros. Cccc Cha- 57o jínnaes Hiâoricos Araio 1677, 1 2 n Chamava-fe eíle António Pacheco de Madu- reira , que tendo occupado vários poílos , andava ho- miziado pelos graves crimes , que havia comettido nos Certões do rio das Amazonas , fendo Commandante dç huma grande Tropa de refgates ; e como antecipando- fe ao Governador as verdadeiras informações do feu procedimento , o mandou recolher para caftigallo , naõ fó fugio à execução da fua juíliça , mas também para melhor fe fegurar delia , apurava o veneno da fua pai- xão na abominável pratica de hum tal attentado. 121 2 Ouvio Pedro Cefar com focegado animo ef- tas informações ; e ainda que o grande coração , de que fe compunha a fua peííba, fazia pouco cafo do fatal pe- rigo , que o ameaçava , attendendo com tudo ao que corria o refpeito do Principe na oíFenfa do cara&er, fem toque de caixa , mandou incorporar toda a Infanta- ria na Fortaleza da Cidade , aonde paíTou logo , acom- panhado já da principal parte da Nobreza , e do Ouvi- dor Geral do Eílado Thomé de Almeida de Oliveira. 12 15 Procurou recatar eíle primeiro movimento da noticia dos conjurados 5 mas como eraõ muitos , e a terra pequena , naõ pode confeguillo : e já fem rebu- ço , fabendo que alguns , com hum Joaõ dos Santos , official de Carpinteiro ( nomeado por elles Juiz do Po- vo ) tinhaõ fugido para o Convento de NoíTa das Mer- cês , os mandou prender pelo Ouvidor Geral , efcolta- do de huma Companhia de Infantaria. 1214 Ainduftria dos Frades livrou defte perigo o Juiz do Povo 5 felicidade, que por entaõ naõ teve Mat- theus de Carvalho de Siqueira , a&ual Vereador da Ca- mera : mas como o Miniftro lhe tomou fó a palavra de prezo , por entender feria dos menos culpados , faltan- do a ella , fe eícondeo no mefmo Convento , também favorecido dos feus Religiofos. 1 2 1 5 Continuando o Ouvidor Geral na fua diligen- cia , âoEJlaâo do Maranhão ',Liv.XVII. 57Í cia, eiicontrou o Padre António Lameira da Franca, Aníio 1677» Vigário da Matriz , com feu irmaõ Francifco Lameira , cunhados ambos do refugiado Mattheus de Carvalho 5 c fendo dos complices , nao fó reprehenderaô o proce- dimento do Ouvidor com atrevidas vozes , mas também o Vigário , eftragando de todo a modeília Sacerdotal , empunhou huma faca para o mefmo Miniílro: porém elle fufpendendo bem aquella acçaÕ com a de huma pif- tolla , que lhe poz nos peitos , prendeo os dous irmãos , fem o menor perigo da fua peíToa, nem recear o das cenfuras da Igreja , por levar commiíTaõ do Vigário Geral Domingos Antunes Thomás , para fazer appre- henfaõ em todos , e quaefquer Eccleíiafticos , que fe entendeíTe eraô comprehendidos na conjuração j e con- duzindo eftes para a Fortaleza , achou já nella o Viga* rio Geral, aífiílindo ao Governador. 1 2 1 6 Logo que o Ouvidor Geral fe apartou do Convento das Mercês , fahiraõ delle por huma porta falfa, que cabe para o rio, Mattheus de Carvalho , e o Juiz do Povo , com hum feu fobrinho , que fe chama* va Francifco dos Santos , também dos conjurados 5 e a bordo todos de huma canoinha fe retiravao como fegu* ros , quando fendo vifta da Fortaleza , os feguio em ou* tra Manoel Guedes Aranha : mas chegando já a porlhe aproa em cima para poder entralla (junto dofitio de Vai de Cães, fazenda dos mefmos Religiofos feus fa- vorecedores) os três fugitivos fe lançarão à agua, e tomando terra , fe embrenharão nos matos , fem darem mais tempo a Manoel Guedes , que para difpararlhes huma fó efpingarda , que ferio ainda alguns dos remei- ros , que os acompanhavao na mefma fortuna. 12 17 Nefte mefmo tempo tinha accrefcentado o numero dos prezos o Padre Bartholomeu Galvão da Rocha, ehum Tangerino do habito de Chrifto , que fe chamava N. AfFohfo 5 o qual declarou , que fora con- Cccc ii vidado m Annaes Hi/loricos 4^01677. vidado a cafa do eleito Juiz do Povo , onde achara Si* maõ da Coita de Soufa , Cavalleiro da Ordem de.San- tiago , e o mefmo Glerigo Bartholomeu Galvão , com outras peflbas , que elle naõ conhecera , por ter ainda pouca affiílencia daquella Cidade : porém que entre to* dos vendo também hum negro , a que davaõ o nome de António de França , deixara logo a tal aíTemblea , to- talmente ignorante das negociações , que nella fe trata- vaõ. 1 2 1 8 As informações deitas noticias fentio mais Pe- dro Cefar , pelo que tocava a Simaõ da Coita , por ha- ver fido feu Criado, e Secretario do feu Governo ; mas como fazendo maduras reflexões neites mefmos princi- pios , achou também nelles hum dos mais ordinários pa- ra a ingratidão do feu procedimento , tratou de confo- larfe : e averiguando logo que a confiífaÕ do Tangeri- no era em tudo muito verdadeira, o abfolveo da culpa , que fe lhe arguia. 1219 Dadas eítas primeiras providencias , com to- das as mais que lhe parecerão neceíTarias ao focego pu- blico , em que fe gaitou todo aquelle dia , na noite del- le fe recolheo o Governador ao Palácio da fua reíiden- cia , aííiftido ainda de todas as peíToas , que o acompa- nhavaÕ na Fortaleza : e continuando nas mefmas atten- çÕes , as inculcavaõ fempre fó como cortejo , fendo também guarda , a qual Pedro Cefar prudentemente diffimulava com bem conhecida mortificação do feu grande animo , deíprezador fem duvida de mayores pe- rigos. 1220 PaíTados poucos dias foy também prezo na Fortaleza Hilário de Soufa de Azevedo , peííba das prU meiras da Capitania , que eílando fervindo anualmen- te de Juiz Ordinário , fe achava fora da Cidade na oc- cafiaõ deites movimentos 5 e depois de algum tempo de prizaõ , com fentinella à viíta , fahio delia com a obri- gação do E/lado do Maranhão , Liv.XVH- Vli gaçaõ de ir bufcar a Simão da Coíla , a quem profeíTa- Armo tá va huma boa amifade , e favorecia no retiro do Mara? jó da Ilha de Joannes , onde affiílindo voluntariamente deílerrado por defgoftofo do governo , fe fabia já fe tranfportava muitas vezes com grande recato à mefma 1 Cidade a fomentar as juntas da conjuração , que eraô todas no&urnas : como fe baílaíTe a capa das fombras para o rebuço de tamanha maldade. • 1 221 Para fegurar a fatisfaçaõ deita promeíTa , ów a rcflituiçaõ da ília pefíba à mefma Fortaleza , deixou nella Hilário de Souía a dous filhos que tinha ; mas re- colhendo-fe fem furtir efFeito a fua diligencia , como já fe fuppunha do feu muito brio , fe repetio logo pelo Ca- pitão João Rodrigues Palheta , que naõ fó trouxe pre- zo o delinquente , mas com elle a Simão Pedrofo ? por encontrallo na fua própria cafa : e entregando ambos na mefma Fortaleza , carregados de ferros , fe foltaraõ os filhos de Hilário de Soufa , que ainda alli fe achavaõ em reféns do pay , que eílava tolerado fora da prizaõ , de que também ficou defobrigado , por fe reconhecer a fua innocencia. - 1222 Todos os mais prezos , aílim Eccleíiaílicos ," como Seculares , fe remeterão para a Fortaleza do Cu- rupá , donde brevemente fe mandou recolher à Cidade de Belém o Padre Bartholomeu Galvão , que com Si- mão da Cofia foy exterminado para Portugal dentro de poucos mezes , e naõ muito depois António Pacheco de Madureira , fendo eítes últimos , na opinião mais bem affentada , os principaes authores da conjuração. 1225 Fizeraõ-fe exactas diligencias para a prizaõ dos mais delinquentes , em que também entrou a de vá- rios bandos , que promettendo abfoluto perdão a toda a peífoa , que os delataífe , ainda que foíTe comprehen- dida na mefma culpa , ou outra femelhante ; accrefcen- tamentos de poílos , e outros prémios diffèrentes aos que [ ■ " . '' . ift! 574 Annaes Hiftoricos Anno 1677. que as naõ tiveíTem , comminavaõ graviííimás penas a quem os amparaíTe : porém nada bailou para íe coníe- guir o que fe pretendia. 1224 No exemplar terror defta feveridade , ta6 cheya dejuftiça, teve rim o anno paíTado , e principio Anno 1678. ainda a nova fucceíTaõ de 1678 5 mas quando a recti- dão dos procedimentos , além de efcarmentar todos os criminoíòs , confternava também os mal intencionados com grande utilidade do focego publico , laftimofamen- te íe malograrão todas na breve mutação de theatro y porque chegando a Cidade de S. Luiz do Maranhão Ignacio Coelho da Silva com o emprego de General do Eftado, tomou folemne poífe do governo delle no dia 17 do mez de Fevereiro. 1225 Tinha elle fervido pelo largo efpaço de 27 annos, que principiarão no de 1649 j e contando-fe nel- les os mais fanguinolentos da difputada guerra da Ac- clamaçaõ de Portugal , fe diílinguio de forte o feu pro- cedimento nas occafiões de mayor honra, que depois de occupar 7 além de vários poftos , o de Capitão de hu- ma Companhia de Couraças , que naÕ fuppunha pouco naquelle tempo, fe finalou mais o feu valor na glorio- fa batalha de Montes-Claros , tomando os timbales da Príncipe de Parma , General da Cavallaria Caftelhana j militar inftrumento , que entaõ naõ fendo permittido ( como fuecede hoje a qualquer Regimento de Caval- laria) mais que aos fupremos Generaes , e Príncipes, ou a quem os ganhava na mefma guerra , por eíle hon- rofo titulo , que fó elle gozava no exercito , os trouxe fempre na fua Companhia. 1226 Depois da reforma geral das Tropas Portu- guezas , pela paz celebrada com a Coroa Caftelhana , paíTou ao emprego de Capitão mor da Capitania da Pa- rahiba , huma das do Eftado do Brafil , que exercitou por tempo de quatro annos , e com tantos créditos pa- ra do Eftado do Maranhão, Liv.XVIL 575 ra a fua fama , que além do foro de Fidalgo , também Anno 1678. lhe grangearaõ" o prefente defpactio. 1227 Como a Capitania do Maranhão , depois de fentir quatro annos as afperezas do Governador Antó- nio de Albuquerque , tinha gozado perto de fete da do- cilidade de Pedro Cefar , naó recebeo agora o feu fuc- ceíTor com mais outros applaufos , que os que coftuma produzir a lifonja entre os alvoroços da mefma novida- de : parece também , que já pronofticando a melanco- lia daquelles moradores , que refponderia o feu gover- no ao menos agradável , pelas ordinárias alternativas da chamada fortuna : porém elle inteiramente fatisfeito das demonítrações publicas , deu goílofo principio ao exer- cício do feu minifterio. 1228 Occupou-fe algum tempo com zelofo cuida- do no ordinário expediente do governo da Capitania do Maranhão ; mas fendo-lhe precifo paflar à do Pará , pa- ra fazer nella a fua reíídencia , por efpeciaes ordens , que levava da Corte , nomeou para a fubílituiçaõ da fua falta , com a Patente de CapitaÕ mor , a Vital Maciel Parente , filho natural de Bento Maciel , Governador , que havia fido do mefmo Eílado , que fabendo fó imi- tar o pay nas primeiras acções , defmentia bem com a nobreza do feu procedimento todos os defeitos , que Te lhe arguíaõ na pureza do fangue : e feguindo-fe a efta todas as mais difpofições , que julgou neceíTarias , par- tio para a Cidade de Belém , onde tomando porto em 20 de Julho , no mefmo dia recebeo de novo a poíTe do governo das mãos do feu anteceífor. 1229 Tinha já noticias muito antecipadas Ignacio Coelho , de que Pedro Cefar levava mal a fua fuccef- faô pela grande differença das peíToas 5 porém diffimu- lando efta fenfivel dor , o tratou fempre com as atten- çoes mais cheyas de refpeitos , em quanto naô paííòu para Portugal 5 e fendo nefta parte mais que em todas as • ! , j fHf.',jJ|«V Annaes Hifiorlcos Anno 1678. as outras dominante a paixão do Teu animo , pareceo a politica como milagrofa. 1230 Continuava ainda o conhecimento judicial da deteftavel culpa da conjuração, mas já com muita fro« xidaõ no caftigo delia ; ecomo o tempo ordinariamen- te cura tudo com a mudança de governos, pela que qua* íi fempre fe experimenta com grave prejuízo dos inte- refles públicos no apaixonado procedimento dos mais dos fucceflbres , logo que Pedro Cefar fe embarcou pa- ra o Reino, fe reílituiraô àcommodidade das fuás ca- ías com todo o íòcego os meímos delinquentes , que poucos mezes antes tinha apartado delias o temor da juítiça , fem mais demonftraçaõ , que a do geral efcan» dalo do feu fatal defprezo. Foy breve a duração defte Fidalgo depois de chegar a Lisboa ; porque entrou nef- ta Corte tao opprimido já das perigo fas queixas, que padecia na faude , que fem beijar a maó ao feu Prínci- pe , acabou a vida 5 deixando porém bem eftampada a fua memoria nos immortaes bronzes da pofteridade : e como eíla he a ultima noticia do prefente anno , o fera também deite decimo fetimo Livro. ANNAES :MM {{ : JP 577 ANNAE.S HISTORIC DO ESTADO DO MARANHÃO- LIVRO XVIII. C~f SUMMARIO, IXPEDIÇAO do Governador Ignâcío Coelho para o cajiigo dos Taramambezes Tapuyas de corjo j e o fuccejb delia. Chega a Cidade dé S. Luiz do Maranhão D. Gregório dos Anjos p primeiro Bifpo do EJiado. Pajaa de Belém > onde he re- cebido com grandes applanfos. Défconfolaçao de todo o EJiado pela falta de fervo s , e nomeação de Procurador para Portugal Jobre a me/ma matéria. Sentimento ge- ral dos moradores do Maranhão pelas afperezas do Go- vernador, e virtudes , de que fe compunha ofeu mereci- mento. Succede no governo Francifco de Sá de Mene* zes. O Jeu elogio. Leva ordens da Corte para a intro* ducçao de hum Ejianco geral y que ejlabeleceo logo no Ma- ranhão. PaJJa ao Pará já com alguns clamores defte no- Dddd võ \\ 578 Annaes Hijloricos Anno 1679. vo Ejlanco f e o ajfenta também na Cidade de Be! em. Queixas de todo o E/lado pela contravenção das condições delle-y porem as do Pará muito comedidas. Manoel Be- ckman obferpando bem a conjuntura , je aproveita delia com fâgacidade , até que já difpojias as juas medidas , as reduz a pratica na commoçad do povo. Além de outros infultòs y comette também o das depojições do Governador Francifco de Sá , e Capitão mor Balthafar Fernandes. Incita os moradores do Fará a mefma d ef ordem , que elles reprehendem. Com ejla noticia mo/ira y que quer pajjar ao Maranhão Francifco de Sá , o que lhe -embaraçou os mefmos moradores. Difpoem a reducçao dos amotinados pelos bons ofícios de ^António de ^Albuquerque , mas com pouca fortuna 5 e mandando a Hilário de Soufa na mefma diligencia , naÒ he mais venturofa. Expedição de Procu- rador para Portugal por infâncias dós jediciofos. O Be- chman defconfajá dafua conf anciã j mas bem informa' do Francifco de Sá de hum accidente tao favorável , fe nao ferve delle. 1251 jfílÊlílSIliSilIlil RA guerreiro o efpirito do Governador Ignacio Coelho, e para poder exercitallo , deu principio ao anno de 1679, í com a expedição de aperta- das ordens ao Capitão mor do Maranhão Vital Maciel ( feguidas também de alguma Infantaria da guarnição da Praça do Pará ) para o caíligo dos Taramambezes , gentio de corfo 5 porém taõ inclinado à vivenda das prayas , que nunca fahe delias. 1232 Sendo todos os índios Americanos grandes nadadores , faõ os Taramambezes entre todos elles os mais infignes } porque fem outra embarcação , que a dos feus próprios braços , e quando muito hum pequeno remo } do EJlado do Maranhão , Liv.XVIII. 5 79 remo , além de atraveflarem muitas léguas de agua , íe Anilo 1679. confervaõ também de baixo delia por largos efpaços li- vres de receyo j e aproveitando-fe naquelle tempo dei- ta habilidade os documentos bárbaros da fua fereza , íe. algum navio , dos que navegavaõ para o Maranhão , dava fundo na Coita ( como fe faz fempre preciíò para montar melhor a coroa grande, baixo muy perigofo) empenhavaõ todas as diligencias no íilencio da noite, por lhe picar a amarra , para que bufcando , como buf- caVa logo , o feu fatal naufrágio nas mefmas viíinhan- ças da fua vivenda , naõ fó fe ferviíTe a fua ambição nef- ta infame vitoria dos defpojos da carga , mas também das vidas innocentes dos pobres naufragantes , a bruta- lidade da fua gula. 1235 Na fua viagem fe tinha vifto ameaçado defte mefmo perigo o Governador Ignacio Coelho j e ainda que pagarão alguns daquelles bárbaros a ferocidade do feu procedimento nas bocas de canhões de artilharia f como o delido era univerfal , querendo juílamente , que tambcm o foíTe a feveridade do caítigo , o determinou para toda a nação nos eftragos da guerra , que julgava naõ menos neceíTaria para atalhar a communicaçaõ de alguns navios eftrangeiros , que bufcavaõ os mefmos i; Tapuyas pelos interefTes de muito âmbar , e preciofas madeiras , em que entrava o celebre violete , de que ha- via abundância naquelle tempo , muito nas viímhanças damefma Cofia. 1254 Nomeou Commandante deita expedição ao mefmo Vital Maciel, que fahio da bahia de S. Luiz nos primeiros de Abril com cento e cincoenta^Soldados , e quinhentos índios, a bordo tudo de trinta canoas, e hum barco grande , que fervido dos ventos , fe adian- tou muito às mais embarcações no rio da Titoya 5 más faltando em terra quatro das peíToas da fua equipagem , fem a cautela , que era neceíTaria na viímhança de tan- Ddddii tos jS<* Annaes Hiflorievs Armo 1679. tòs inimigos , lhes cuílou as vidas eíle Teu defcuido $ e os Companheiros , que nas ventajofas forças do mar , e também nas do numero recearão a mefma deígraça , atropelladamente fe retirarão delia , abandonando com o íèu bote y em que tinhaÕ ido os quatro infelices até a fatexa , que largarão por maõ. 125 f Sentio eíle accidente o Capitão mor Vital Maciel} porém depois de trabalhar no mar com a fúria dos ventos , e na marcha da terra com a paíTagem de muitos rios , bufcou os Taramambezes na fua própria habitação com novos eítimulos para a juíla vingança , a que fe encaminhava : e encontrando-fe logo huma partida fua com outra deites bárbaros , por mais que intentarão a difputa das forças , feguradas nas venta- gens do numero 5 os que naÔ pagarão o feu arrojamen- to com o preço das vidas , communicando ao principal corpo o terror , que levavaô , produzio também nelle os mefmos eífeitos y porque todos precipitadamente procurarão a fua falvaçaõ por baixo da agua , como ca- minho fó em que naÔ poderiaõ achar oppofiçaõ : mas Vital Maciel , que na prevenção das fuás canoas pre- meditou bem o mefmo projeclo , os atacou de forte no feguinte dia por mar , e por terra , que padecerão eílas racionaes feras o mais fatal deftroço , fem diílinçaô de idade , nem ainda de fexo $ que como as Leys ultimas prohibiaò abfolutamente todo o género de cativeiro, apurado de todo o foffiimento do Real Minifterio nas taÕ repetidas , como efcandalofas relaxações , das que os permittiaô em cafos finalados , faltava a ambiça5 daquelles defpojos para deter a cólera dos noíTos Sol- dados. 1236 Como com ocaíligo defles bárbaros ficâraõ fem emprego por aquella parte as armas vitoriofas ■, o . Commandante delias feguio as inftruccoes do feu Gene- ral no defcobrimento do famofo rio do Paraguafu , que dizem do Eâado do Maranhão , Liv.XVUI> 5 -8 1 dizem fer braço do de S. Franciíco j porém navegan- Anno 1679. do-o perto de dous mezes ( ordinariamente pelo rumo do Sul ) fem poder defcobrir o Teu nafcimento , defiftio da empreza , naõ fó importunado dos contínuos clamo- res de todos os Soldados, mas por julgalla inútil no prin* cipal proje&o j porque querendo reduzir as muitas na^ ções do íeu gentilifmo à communicaçaõ do grémio da Igreja pelo mey o da paz , naõ pode confeguiilo a íua- vidade das fuás proporias : e valendo-fe já da violência da guerra para o defcimento dos mefmos Tapuyas , a deferçaÕ delles para as afperezas daquelles Certões , que conheciaõ como morada própria , defenganou de todo as fuás efperanças. 1237 Cheyo de gloria militar fe recolheo a Cidade de S. Luiz o Capitão mor Vital Maciel , e no mez de Julho entrou também naquella Capital o primeiro Bifpo do Eítado D. Gregório dos Anjos ,. Cónego Secular da Congregação deS. JoaÕ Evangelifta , Religiofo de tan? tas virtudes , que havia muito tempo o tinhaõ já habili- tado para taõ fanto emprego 5 e occupando bem no ex- ercício delle as attenções daquelles moradores , eflerili- zou todas as mais memorias até o fim do prefente anno. 1238 Na nova fucceíTaõ de 1 6 80 reíidia ainda na Anno 1680, Cidade de S. Luiz o feu digno Paílor D. Gregório dos Anjos 5 mas entendendo elle , que tinha dado já a efte rebanho o paílo neceíTario no abundantiílimo da fua doutrina , parlou a apafcentar o do GraÕ Pará , que fe naõ achava menos neceffitado delle j e fazendo a fua entrada publica na Cidade de NoíTa Senhora de Belém p ultimo dia do mez de Julho , conheceo bem a verdadei- ra fatisfaçaõ daquellas ovelhas, nos taõ feftivos , como •geraes applaufos , com que foy recebido. 1239 Sem outra noticia , que fe faça digna das fa- digas da hiftoria , teve principio , e fim o anno paífa- doj ena fucceíTaõ defte prefente dei 681, naõ acho Anno 168 u - ■ ■ tam- m Annaes Hijloricos Annoi68a. Àíino 1681, também outra , que a da geral defconfolaçaõ dos mora- dores doGraÕPará, fobre huma nova repartição dos índios forros , que ratificava ao mefmo tempo a abfo- luta prohibiçâô de todo o género de cativeiros , de que refultou a expedição de hum Procurador para Portu- gal } importante emprego , em que foy nomeado j pelas acclamações de todo o povo , o Capitão Francifco da Mota Falcão, huma das peíToas da principal nobreza da Capitania , e que nos mais honrofos cargos delia ti- nha moítrado bem a fua boa capacidade. 1 240 Nos primeiros mezes do novo anno de 1682 governava ainda o Eftado do Maranhão Ignacio Coe* lho da Silva 5 mas já com geral defagrado daquelles mo- radores , por ferem taes as afperezas do feu natural, que naô admittia differentes imprefsões às que lhe fuggeria o próprio difcurfo , por mais que muitas vezes lhe far hiíTem erradas ao principio por falta de experiências , e quafi fempre por invenciveis defconfianças : com tudo era taÔ incançavel o feu zelo na utilidade publica , que até às obras defta qualidade coftumava affiftir com a fua peíToa, e para ellas com todo o foccorro , que fe lhe pe- dia ; e por eíle modo , dando-lhes calor para fazer cref* cellas , incitava também os moradores mais abaftados a todas aquellas particulares , que podiao ennobrecer a Povoaça6 , o que lograva commummente com grande gloria fua. 1 241 Com o mefmo exemplo , e generofidade re- edificou todos aquelles Templos , que padeciaõ alguma ruina , repartindo também à mayor parte delles impor- tantes efmolas ; louvável exercicio , em que acabou o feu governo : e na verdade he laílima , que quando por eílas , e outras muitas virtudes merecia bem as accla- mações de todo o Eftado , lhe grangeaíTem nelle as fuás imprudências hum univerfal ódio. 1242 Succedeo-lhe no mefmo miniílerio Francifco de do Eftaâo âo Maranhão , Liv.XVIH- 5 8 5 de Sá de Menezes , que chegando à Cidade de S. Luiz Armo í68i« no dia 25 do mez de Mayo , em o de 27 entrou na pof- íe do governo com as coílumadas formalidades 5 fazen- do porém muito mais crefcidos os feftivos applaufos do íèu nome o já aborrecido do íèu anteceíTor , que fe verá aíTás vingado do natural orgulho daquelles moradores , quando defde Lisboa eíliver também vendo ofeujufto caíligo pela efcandalofa defobediencia ao mefmo fuccef- for , em que agora empregava tantas acclamaç ões a fua lifonja , fuggerida do ódio. 1243 Tinha concorrido Francifco de Sá com exem- plar valor na gloriofa difputa da liberdade Portugueza , e em huma das fuás muitas occafiões fe diítinguio de for- te , que achando-fe fó no combate de féis Gaílelhanos , em que também entrava hum Capitão de Cavallos , que fe chamava D. Affbnfo de Abarca , depois de matar ef- te à efpada , ficou de todos vitoriofo já com três feri* das. 1 244 Deíles empregos militares paíTou ao politico de Secretario da Embaixada ao infolente Oliviero Cro^ muel , como Protector de Inglaterra , aííiítindo a Fran- cifco de Mello (depois Conde da Ponte, e Marquez de Sande ) nas trabalhofas negociações dos Parlamen- tados $ e como fe tinha boa opinião das fuás letras nõ Direito Civil , em que era formado , recolhendo-fe a Portugal , oceupou o lugar de Vereador da Camera de Lisboa, moílrando bem em todos , que fe fazia digno, do que novamente fe lhe encarregava no prefente Go- verno. 3 245 Havia concebido o Minifterio de Portugal } que os intereíTes do Maranhão fe naõ podiaõ adiantar > fem que as fuás drogas fe encaminhaíTem a huma fó maÕ , que fizeífe crefcer a reputação delias $ e para fe» gurar a felicidade defte projedo , ajudou hum aíTento com Pedro Alvares Caldas ? e outros negociantes de groP .it; ; II Annaes Hijióricos / ,- âmo íúêàè groíTos cabedaes peio longo termo de vinte annos , que naõ jo eftancava todas, as do Paiz , mas também as fa- zendas ; do Reino»; de qualquer qualidade , e negros de toda a;Çoíla de Africa , que paíTaíTem a elle , ficando lomeinepermittida a navegação de todo o comercio aos freios neíta Companhia , de que era caixa, e admi- njítrador hum Pafcoal Pereira Janfem , que além de fer homem de muita intelligencia no trato mercantil , fe ti- njia criado no mefmoEftado do Maranhão. ;. 1246 Eíle geral Eftanco eftabeleceo o Governador «ia; Cidade de S.Luiz , fem contradição dos feus mora- dores f porque influídos todos nos alvoroços de tantas novidades, naõ tiveraõ lugar para as ponderações dos graviííimos damnos . que lhes ameaçava a pratica delle Bp ambiciofo procedimento de huma tal Companhia j é ^/embaraçado deila dependência , tratou d eílramente 4e divertir os ânimos na variedade deprojedosé ., 1247 Foy ©primeiro o de alargar mais a Povoação do Itapicurú , ( rio dos principaes da Capitania , menos tia abundância das fuás aguas, que na fertilidade das .fuás terras ) e paíTando também a examinar com os feus rnefmos olhos as utilidades ., que promettiaÕ , depois de achallas verdadeiras , cuidou defegurallas com huma <3afa forte da invocação do Santo Chriílp da ferra de Se- .mide, que promptamente feá levantar de boa fachina na diftancia de doze léguas da boca do rio , onde já ha- via hum pequeno Forte , que ainda fecon ferva j defen* fas , que baftavaõ para a fegurança dos feus moradores na oppoííçaõ do gentio de corfo , fe a inconílancia dos mefmos authores deíla novidade a naõ deixara ferh exer- cício. , , 1 248 Satisfeito Francifco de Sá da boa fortuna com que tinha lançado as primeiras pedras no grande edifício do feu governo , fe recolheo logo à Cidade de S. Luiz , onde ouvio já baftantes queixas do novo contrato \ por : rèl- dóEpdodoMáMikaÔ,Ltv.XVni. %% refponder mal a qualidade dás fazendas aos altos preços Anão i68i, porque hiap .taxadas ; mas para furrocallas , fe foube va- ler da muita deftreza , que havia aprendido nos negó- cios políticos da mayor; -importância : e deixando efte bem accommodado com a afíiílencia de quatro mezes > paflou ao Pará , depois ; de encarregar a Capitania do Maranhão/; com -.a Patente de Capitão mór, ao Sar- mento mor do Eftado Balthafar Fernandes, íj 1249 Em 20 de Outubro fez a fua entrada na Cida* de de Noflà Senhora de Belém 5 e eftes moradores bem prevenidos já dàsfuas? providencias > para ; a feliz poíle das grandes efperanças , que lhes fez conceber do novo projeflo, empregarão todas as attènçdes nos alvoroços/ çoni que o receberão >. olhando para elle como feu ve» dadeiro redemptor , nas calamidades que encareciãô * com exprefsões mais Vivas , que os do Maranha^ , por ferem no Para mais endurecidos os coraçSes no aborre- cimento do feu anteceflor , por terem fentido de mais perto as afperezas do féu natural, 1250 Como nefta Cidade haviaÕ de fer mais aviafc tadas as negociações da nova Companhia , por ferem mais os géneros, e de muito mayor eftimaçáo , houve algumas duvidas no arbítrio dos preços desvarias fazen- das , que naõ hiaÔ taxadas ; mas ajudadas todas pelas intelligencias do Governador nó breve termo de oito dias, fe publicou folemnementé o Alvará doEítanco^ afíinado pela maS Real em 12 domez de Fevereiro , e fedeu principio à pratica delle , fem oppohçao que a embaraçaffe: porém o certo he , que já fujeitando-fe aquelles moradores a taÕ pezado jugo , mais f>ela rendi- da obediência da fua vaíTallagem , que por falta de ver- dadeiro conhecimento da fatal ruina , que os ameaçava , difcorrendo bem , que aíTentos femelhantes erao qííaíi fempre os mais abomináveis a todas as Províncias , co» mo inimigos mal diffimulados da utilidade publica. 6 Eeee Com onnA Mn&£ Mffifieòs &ta$p 1683. Anno Anno 1684. xopi25i Com tudo íem alterieaftV que Ib-ficmcííê Co- mo perigofà , entrai* o novo asmo, de 1 683 q£ mas já fe ouviaõ os clamores dos povos j>da eícándafofa contrai vèuçaõ das Condições do aíTento j porque :.ai ambreaõ cios Contratadores , para melhoifíe&chér às -fuás medidas, niiõ vendia género pela ^pauba*^. preços, que fenaõ arhaiTe fabricado i com graviflimo^damno^ dps compra- dores , e de quinhentosLuegrosIdáíCòftatle africa , pela taka àjuâada de cem mií reis cada>cábeça9%ie haviaô promfittido meter todos os anno» km huma^, ftí outra^Ca- pltanía >; caminhado jáparam; fegundo , ;, nenhumr avulto cios inter efes 4 aríiculavaõ elles eftas meímas queixas com tal- comede mento , que fo efperavãõ o remédio de todas , no que lhes applicaíFé a piedade do Príncipe cabalmente infor- mado i oqtíe naõ fuccedia nos orgulhofos ânimos do Maranhão, como verebios no feguinte amip-5 porque m duraça5 defte prefente fe na6 encontra outra algu- ma memoria, que poiTa merecelía nas recommendaçòes da pofteridade. - 1252 Manova fucceffaÕ dé 1684 governava ainda Balthafar Fernandes a Capitania do Maranhão y porém CúM árido mais* na confervaçaõ daquelíe emprego, que riadefempenho das obrigações , que lho podia fó fegu- rar fem oíFenfa da honra ; porque informado com toda a inteireza das perigofas praticas dos mal intencionados, querendo inculcar como myíleriofa diífimulaçaõ o fof- frimento delias , apreíTadamente caminhava para a ruí- na publica ; parece , que ignorante , de que in volvia a própria , quando também inaõ défconhecia ò natural or* gulho dos mefmos authores. 1253 ísfa dilatada règiaõ da America he já como fegunda natureza o abominável vicio da ocioildade; po- . .. j f rem do Eflado do Maranhão , Liv.XVIII. 587 rém tem eíle na Capitania do Maranhão mais profun- Ànno 1684. das raizes 5 porque os feus moradores , naõ fó alimen- tando-fe , mas muita parte delles veftindo-fe também (principalmente naquelle tempo ) da fertilidade do mef- mo Paiz, com tao pouco trabalho, como defpeza , por mais que defejaõ , com nimia ambição , a abundância de cabedaes , naõ he à cuíta das fuás fadigas : como fe fem ellas fe poífa confeguir tamanha fortuna , naõ fen- do por milagres da alta Providencia. 1254 Mas como a occupaçaõ da mercancia he das menos penofas , a exereiaõ muitos na Cidade de S. Luiz antes do novo Eftanco j e fendo nelle igualmente pre- judicado pelo mefmo principio o efcandalofo procedi- mento de alguns Eccleíiafticos , eraõ" as fuás vozes as que accendiaõ mais o ardente fogo da commoçaÕ dos ânimos , que por outra parte fopravao também as Re* ligiões contra a da Companhia de Jefus j porque invè- jofas , ou efcandalizadas , de que fe lhe entregaíTe toda a adminiftraçaõ dos índios forros , privando-as delia > quando fe naõ julgavaõ menos merecedoras de tao fan* to emprego , o capitnlavaÕ nos taes Religiofos , como induílriofa negociação dos feus intereíTes , que calum- niando do mefmo modo , na abfoluta prohibiçao de to- do o género de cativeiros , lhes cuílaVa pouco a perfua- dir tudo à femrazaÕ do povo , onde já parecia herança o aborrecimento deftes bons Miííionarios , principalmen- te depois do facrilegio da fua expulfao pelas revoluções do anno de ió6i. 1255 No perigofo eftado defta commoçao fe acha* va a Cidade de S. Luiz , fem que para atalhar o certo precipício, a que hiao correndo os feus moradores, def- pertaffe ainda o Capitão mor Balthafar Fernandes do feu fatal letargo : e infenflvél também Fráncifco de Sá aos continuos clamores deíles mefmos avifos , fe lifon- geava na Capitania do Pará da cega fantaíia , de que as Eeeeii bem . ' .'f m Annaes Hiftoricos Anno 1684. bem fingidas difpofições da fua jornada para o Mara- nhão fobrariaõ fem duvida para fegurar o focego pu^ blico , juftamente medrofos os feus perturbadores do pezado caftigo , que os ameaçava , antes de poderem reduzir a pratica o bárbaro proje&o das fuás medidas : como fe também eftas , de que elle fe namorava tanto na oecaíiaõ prefente , fe na5 trataíTem já por ordinária força da fua politica nas largas experiências de perto de dous annos. 1256 Obfervava bem todos os accidentes Manoel de Beckman , natural de Lisboa , hum dos moradores da principal nobreza da Cidade de S* Luiz, e dos da fua primeira eftimaçaõ pela capacidade 5 porque aíTás defgoftofo pelos cabedaes , que tinha perdido , por op* prefsões menos juílificadas do paífado governo , e pou- co fatisfeito do prefente , efperava nelle melhorar de for* tuna pelo caminho precipitado da commoçaõ dos po- vos , que também defejavaõ facudir o jugo dos Miííio- narios da Companhia , como infupportavel aos feus in- tereíTes no ferviço dos índios , de que o Beckman ne- ceífitava mais para animar a fabrica de hum engenho de aíTucar , que confervava ainda no rio Mearym com cur- tiffimos meyos 5 mas fegurando-lhe eftas difpofições a felicidade do projecto , fe naÕ deixava perfuadir de to- do a fua grande fagacidade ; porque duvidando da conf- tancia dos ânimos depois de declarados , com razaô re- ceava , que foíFem prevenidos do precifo. cuidado dos principaes Miniftros do focego publico \ até que adver* tidos de feguros exames, que aquelle filencio, que che- gava a tratar como myfteriofo, era fó verdadeira infen* íibilidade , fe refolveo a dar os primeiros paíTos , convi* dando diflimuladamente para o divertimento do feu en- genho do rio Mearym alguns dos moradores , de que tinha melhores experiências a fua amifade , ou o feu or* gulho. Pofto do Eftado do Maranhão , LivXVIIL 589 1257 Poílo no Mearym com os feus convidados , Armo 1684. depois de divertillos com huma boamefa, fobre ella introduzio a pratica da fatal mina , que ameaçava a to* dos , naõ fó a violência do prefente contrato , mas a que já choravaõ no abfoluto domínio dos Miffionarios da Companhia de Jefus , com a adminiftraçaõ dos ín- dios forros: e difcorrendo entaõ no efficaz remédio, que podia atalhalla , tratava como único a nomeação de hum intelligente Procurador , que bem reprefentaf- fe diante do feu Príncipe o mefmo perigo ; mas que co- mo fuppunba , que a efla expedição fe opporia fem du- vida o Governador , como prejudicado na abolição do Eftanco , neftes termos parecia precifo , que fe lhe ne-> gaíTea obediência j porque o cativeiro , em que vivia já .a fua liberdade , efcandalofamente deímentia os pri^ vilegios deila. p 1258 Naõ neceííitava o Beckman de empenhar mui- to a eficácia das fuás exprefsoes para reduzir aquelles ouvintes , porque todos achou do mefmo fentimento , em quanto às queixas publicas j mas pezando-fe mais as dernonííraçÕes delias no propoílo eftrago da fidelida- de , encontrava ainda algumas duvidas , menos nos ef- cru pulos da confciencia , e honra , que nos defmayos do valor pelos receyos do caíligo. 1259 Conhecerão bem as agudezas das fuás refle- xões a qualidade do accidente , e applicando-lhe logo aquelle remédio , que lhe pareceo de mais a&ividade 9 empenhou toda a do feu orgulho para convencerlhes os mefmos reparos 5 mas elles confeíTando o tinhao confe- guido as poeerofas forças das fuás razoes , fe fouberao ainda acautelar do principal perigo , cedendo-lhe o fu- premo lugar nas difpoíições dos movimentos , como attençaÕ devida à capacidade dafuapelToaj que raras vezes a cobardia deixa de fer menos lifongeira* 1260 Bem lhes percebeo elle a verdade dos ânimos 5 !«/j xmi mas 59° jlnnaes HidoricôS Anno 1684. mas como já fe tinha introduzido naqúelle diabólico ma- gifterio , pouco duvidou na fua aceitação .- e affiííido ainda dos mefmos confidentes, communicou a outros arefoluçaÕ , que havia tomado j porém com tal caute- la , que meteo os avifos em queijos de vacas, de que abundava a mefma fazenda ; até que fatisfeito das ope- rações da íua induftria , pairou à Cidade de S. Luiz pa- ra lhes dar mais alma com a fua prefença. 1261 Ajudou muito as negociações defte projeclo a paixão cega de hum Religiofo, que defattendendo por todos os princípios as obrigações do feu eílado , pregou na Cathedral a primeira Dominga da Quarefma $ com exprefsões taõ vivas no ódio do Eftanco > que até chegou a proferir , que fendo fem duvida a principal origem das enfermidades , que padeeiao todos aquelles povos , naõ deviaõ elles efperar milagres para o feu re- médio , quando o tinhaõ nas fuás próprias mãos 5 e ac- crefcentou outros termos taõ fortes , que ao mefmo tempo , que perfuadia huma foblevaçaÕ , parecia tam- bém que fe offerecia já a governalla na frente das ban- deiras. 1262 O Capitão mor Balthafar Fernandes ouvio muito bem eftas fediciofas exhortaçoes , e da mefrrla forte os feus grandes applaufos na mayor parte do audi- tório j mas fem acçaõ alguma para as demonftrações da feveridade , fendo já taõ precifas , fe recolheo a fua cafa com todo o focego. 1265 Zelo fo do publico o advertio logo Francifcxr Teixeira de Moraes, Provedor da Fazenda Real da Ca- pitania, de que podia ainda prevenir as triftes confé- quencias daquelía novidade com taõ pouco trabalho, como perigo , e grande gloria fua \ porque encarregan- do aos Miniílros da Camera o principal cuidado do feu minifterio na quietação do povo , ao mefmo tempo ef- palhando por elle diííimuladamente feguras efpias , e de i noite 'I I A' ão EJlado ivMWctnM^ Iuiv.XVIII. $9? noite também alguma^ rondas. de Soldados , bafariaS MU\q ró8£ fem duvida eftasproyidencias, para atar as mãos aosCmal intencionados , com razão temerofos ; 4a confufaõ da plebe entre os eftfondas militares j po.npç naõ faben- do a barbaridade da/ua difcipljna diítinguir : o golpeado ameaço delle as ; mais; das vezes , ^produzia , forcas ; ; co* mo fe eftava vendo em femelhantes eafos,ifto dilatado mappa das Hiftorias feMundo:, oque noMaranhMfè devia $rter* pmlcvw> efperança dèíle^ermoidifcucíí fò , mas jáiço.mo fucceíTo , quando -nas inconítaricias dos feus moradores, accrefoentada&muko com' a falta de meyos nos torpes exercícios da fuaociofidade , fe moítrava impoífivel aquella unia£, que, era neceíforia para. renhirem às vozes do feu Príncipe, quanto mais às armas entre a confternaçaÕ do medoido cafti ço. i 1264 Nada bailou porem para fa^errr^fufcitar o defuntOianimo doGapitao mor $ eo Beqtaan » que m tendia bem . ao beneficio, das conjuncT:uraSí,o£ei aprovei* tou deftay naõ fó para esforçaiNodOs QSiíeu8:;fèquaz&s^ mas para accrefcèntar o numero deli es > òHque tudojol grou com felicidade. : etendojá qrefcjdo, filiais de fofa fenta no breve termo de quatro dias , tomou logo as ul- timas medidas das fuás idéas , decretando a veípera da prociífaõ dos PaíTòs para as pôr em publiçoO 1 265 Na noite defte dia 24 do mez de Feverçiro> te no mefmò afto , era que a devoção da verdadeira crença conduzia; a Imagem donoífo Redpmptor com a Cruz às coitas do Templodo Carmo para o da Mifericordia , quiz o Beckman fegurar melhor no concurfo do povo a commoçaÕ delle ; porém com tudo defconfiando ainda da fua conftan cia nas vifmhanças do perigo , fe fervio fó da occaíiaÕ para o Convocar por fi , e feus fequazes , a íitio folitario , mas pouco apartado da Povoação a comminando logo a pena da morte aos que revelaíTem efte !''■ '1' l, , f$2 Mnms ; HiflMm '. 4JÒ01684. efie fegredo ; e para que os ameaça* va^ quando já o fuppunhaõ commovido 5 outros por eonfidentesdamefma cómmoçáb ^muitos íèm mais eiflpenho ^que ó do feu prOpri o orgulho > e naõ poucos também arrebatados fó^ehuma tal novidade ^acudi- rão todos âos^nganbíbs brados do feu fatal deftino. : 1267 Obfervouèido a louca complacência do fe» condutor j e feparando logo de todí> o concurfo aflim os-colligados , como áquellas peíFoas , que ávultavaõ mais no coiiceífco do povo ^ para fe conferirem com me- nos cc4ifufoo:$S feus chamados intèreíTes , cedeo o pri- wfèito lugar rómeíma Afíèmblea , com as proteft ações , de queo riàõ,merecia , procurando inculcar , como mo- deftia a mais ^irfuofa , O que fó era vicio da íua diabó- lica hypõcriífa $ mas grangeando eíla univerfaes ap pkufos dá lifonja, moftrou fe encarregava daquelle mi- nifterio , generofamente convencido da mefma accía- maçaõ. -^ - & & n 1268 Ocetipou entaõ como cadeira da fua prcíi- dencia o portal da Glàufura daquelles Tantos Religio- fosf ( paraqàe na6 houvêíTe circunftancia neíle detef- táVel procedimento , que naõ concorreíTe para o efcan- dalo ) e já alguns efpertos do rumor do concurfo obfer* vavaõmedroíbs as confequencias delle , íem que rom- peíTem ofilencío; até que attento o mais profundo às vozes defte oráculo da infidelidade , depois de ponderar com as exprefsões mais apaixonadas os perigofos males , que padeciaõ todos y naõ fó perfuadio , que eraõ pro- ducçaõ única da opprefsaõ do Eftanco > e violento do- mínio 1 1 i do Eflado do Maranhão ; Liv.XVIH. 5 9 j minio dos Miílionarios da Companhia dejefus na ádmi- Anrio 1684. niílraçaõ dos índios forros , mas também que para o íeu remédio já naô achava outro mais que o da extinção da- quellas mefmas caufas 5 pois por mais que entendera ha- via poucos dias, que bailaria para a fua cura r o que lhes applicafle a lábia medicina das promptas providen- cias do feu piedofo Príncipe cabalmente informado por feus .Procuradores , conhecia já que chegaria tarde 5 porque aggravada a enfermidade com novos accidentes, lhes ameaçava a todos os inftantes o ultimo da vida com mais injuria da fua paciência , do que credito da fideli- dade , quando também eíla fe poderia juftificar depois dó fuceíTo com menos trabalho 7 do que gloria ; e çon- cluío dizendo , que fechadas logo as portas do Éílanço, -e abertas as dos Religiofos da Companhia , para lançai- los fora de todo o Eftado , fe governariaÕ as feguintes acções pelos doutos diclames das próprias experiências > que quaíi fempre erao os mais feguros. 1269 A mayor parte da A ffemblea publicou bem a fua approvaçaõ nas vozes dos applaufos 5 e preten- dendo bum dos mefmos Miniílros atalhar o abfurdo da ■expulfaõ dos Padres com as mais catholieas ponderar •ções de hum tal facrilegio , ardendo em ira o Prefidenr te , lhe declarou logo : Que fe Jazia aquelle ferviço •com m úteis efperanças de adiantar por elle os inter ejes próprios , lhe cujlaria a vida , como a qualquer outro , que fegitjffetámbem 'os mefmos penj amentos. 1270 Com efte accidente fe alteravaÕ já todos os humores daquelle corpo r quando os focegou Thomás Beckman , irmaô fegundo do mefmo Prefidente -.,-. na6 menos òrgulhofo , porém mais confiderado ; mas reba- tida at primeira fúria da commoçaõ dos ânimos , fe dif- folvia a Junta fem a precipitada refoluçaõ , que a tinha convocado , quando hum dos companheiros , que fe chamava: Manoel Serrão de. Caílro., natural de huma Ff ff das i 594 Annaes Hiãoricos Anno 1684. das Ilhas dos Açores , parece que movido das fuperio- res forças de impulíb diabólico , notificou a todos com a efpada na maõ , ou a fua morte , ou a fua conftancia naquelle defatino , com o fundamento , de que nao fe podendo já occultar o delido delle , ameaçava muito mayor perigo o arrependimento ,.que a obílinaçaÕ ; e o Beckman, que fe foube fervir da mefma novidade , re- fufcitando o feu maligno efpirito na confufao de todo o tumulto , o conduzio ao feu precipício. 1271 Já nas viíinhanças do quarto de Alva , arre- batadamente fahio pela brecha , por onde. tinha entrado, o monftruofo corpo daquella defordem ; mas com tao fracas forças para a oppofiçaõ de qualquer accidente , que encontrando-fe logo com poucos moradores , que haviaÕ fido menos cuidadofos na fua uniaô , fuppon- do-os Soldados , ficarão quafi todos fem acçaÕ de viven- rtes ; e os que confervaraõ algum acordo , voltavaõ já as coftas ameaçados fó do temor do caíligo 5 parece que difpondo a alta Providencia efta mefma occafiaÕ para fazer mais efcandalofa a infenfibilidade do Capitão mor Balthafar Fernandes : porém refufcitados pelo promp* to milagre do próprio defengano , então envergonhan- do-fe do mefmo fucceífo , tirarão delle duplicados esfor- ços para a fua ruina na fatalidade a que caminhavaõ. 1 272 Com o mefmo impulfo entrarão todos a Ci- dade 5 e cada hum guiado dos bárbaros di&ames da fua cegueira , bufcava fó como inimigas dos intereífes pú- blicos todas aquellas cafas , que por nao feguirem tama- nho defatino 7 tratava como taes a paixão do feu ódio pelos encontros particulares t foraÕ menos as mortes , do que os infultos de outra natureza; mas com todos elles naõ fatisfeito ainda o feu Cgmmandante , os con- duzio ao ultimo no total eftrago da fidelidade ; porque crefcidas já as forças do povo com as que de novo fe lhe juntarão, arrebatadas da mefma commoçaÕ , buf- cou do Eflado do Maranhão , LivXVIIL $ 9 $ cou feguramente o Capitão mor Balthafar Fernandes. Anno 1684. 1275 As vozes do tumulto Ihé tinhaõ já antecipa^ do os avifos delle 5 mas querendo atalhar com a expedi- ção das íuas;ordens o precipício a que caminhava, nao achou Officiaes para diftribuillas $ e bufcando os Solda- dos da fua guarda^ para a defenfa da peííba > lhe íucce- deo o mefmo ; porque medroíbs huns do fuperior par- tido da commoçao , e íbbornados outros , ou dos inte- reíTes, que lhes fegurava na extinção do Eftanco, e fer^ viço dos índios, ou das allianças dos revoltofos , he ver- dade, que os nao feguiaõ , porém na5 fe atreviao a lhes fazer oppofiçaõ. 12 74 - Vio logo a fua cafa occupada toda do mef- mp tumulto 5 e defenganado dos remédios humanos ; pretendeo eleger os que lhe propunha a defefperaçaõ , oppondo-fe fó elle à multidão dos amotinados para fal- vaÀ a honra nos defprezos da vida ; mas advertindo bem, que fe o defacordo da fua primeira infenfibilidade a ti- nha infamado , a deixaria ainda mais injuriofa a temeri- dade defte defatino , fe fujeitou à fua fortuna. 1275 Socegado entaõ o rumor à voz do Beckman * já muito adiantado na veneração dos fediciofos , diíTô elíe a Balthafar Fernandes : Que fe dèjje por prezo na fua mejma cafa , já que tinha fido o fomentador daquella de/ordem , no culpável defprezo com que havia tratado os fundamentos delia , nati fô defattendendò as falias provU dencias para defvanecellos com a attençad devida aos cla- mores do povo , mas também faltando-lhe a rejolucdo pa- ra fiffoc ar ejles logo nos feus princípios com o poder do cargo. 1276 Reconhecia já o Capitão mor a efcandálofa culpa da fua froxidaô ; mas fez-felhe ainda muito mais fenílvel nas cenfuras da honra , quando a vio accufada por aquelle mefmo , que fe fervia delia para a ruina pu- blica : e neíla parte de todo convencido , refpondeo fó : - Ffrtii h$ ■'. 59 6 Anriaes Hifloricos wM Anno 1684. às queixas do povo com as exprefsões muy vivas do grande amor , e zelo com que o governava , prezando- fe menos da diftinçaõ de feu fuperior no mefmo exercí- cio da fua authoridade , que das igualdades de compa* nheiro , como bem lhe moftravaõ as fuás experiências naquelias mefmas opprefsões , que encarecia tanto o feu defatino : porém que viífem todos , que os precipi- tavam as lifongeiras efperanças das fuás fortunas , pois fó achariaõ muito verdadeiras as promeíFas delias no re- verente culto da fidelidade , por fer em todo o tempo huma das valias mais poderofas para fe confeguir a at- tençaô dos Soberanos , principalmente Portuguezes ; porque tratando fempre todos os feus vaíTallós fó como filhos , ouviaõ como próprias as rendidas fupplicas das fuás afílicções. 1277 Hia dizendo mais o Capitão mor 5 porém o Beckman temerofo ainda da liberdade da fua Jingua pe- lo arrojamento com que reprehendia hum delido taõ abominável , lhe fuffocou as vozes , entregando-o a fua mulher com a obrigação de fiel carcereira. 1 27 8 Quiz elle refiftirfe pedindo ao Beckman , que antes lhe déíTe a morte , porque lhe feria menos fenfi- vel , que huma tal injuria ; mas furdo aos feus clamo- res , o deixou prezo em fua cafa : como fe efta homena- gem podeífe embaraçarlhe o livre exercido da fuperior authoridade do feu minifterio , fe a commoçaõ do povo naô foíTe taõ geral , que até aquelles mefmos , que con- fervavaô no coração a devida obediência , fe naõ equi- voca (Tem nas acções exteriores com os amotinados , for- çados do feu medo. 1279 PaíTou logo o Beckman à Praça , fitio do Pa- lácio dos Governadores , onde affiíle fempre a Guarda principal ; porém achando o Capitão delia fó com cin- co Soldados, lhe entregarão as armas fem a menor oppo- fiçaõ j exemplo que feguiraõ os que oceupavaõ os mais poftos . âoEJladoâõ Maranhão, Liv.XVllI. 5 '97 portos : e rendidos já todos, em que também entravaõ Anno 1684» os Armazéns de guerra, guarnecerão tudo os fediciofos» 1280 Na igualdade das noites com os dias he todo o anno no Maranhão hum Equinócio continuado 5 mas liaviaõ fido taõ arrebatados os movimentos deíla com- moçaõ , que tardava ainda a luz da Aurora , quando o Beckman dominava já toda a Cidade : e unindo-fe en- tão com huma grande parte dos feus Companheiros rio adro da Sé , que também fica na mefma Praça , depois de encarecer com humas exprefsões de grandes appara- tos todas as acções daquella defordem , tratou de tomar nella as ultimas medidas para melhor fegurar as do feu orgulho ; porque formou logo huma Junta , a que cha- mou dos Três Eirados , por fe compor efcandalofamen- te do Ecclefiaílico nas peífoas do Vigário Geral Igna- cio da Fonfeca e Silva , e Fr. Ignacio da AíTumpçaÕ , Religiofo Carmelita ( que no mefmo Eílado havia já fervido o honro fo cargo de Vigário Provincial da fua Ordem ) do da Nobreza por elle feu author , e Eugénio Ribeiro Maranhão 5 e do do povo pelos feus dous Mi£ teres Francifco Dias Deiró , e Belchior Gonçalves. 1281 Formado efle corpo , o convocou logo a ca- fa mais vifinha da mefma Cathedral , onde fe publica- rão por refoluçaõ fua as depoíições do Governador Ge- ral do Eílado Francifco de Sá de Menezes , e Capitão mor Balthafar Fernandes com a expulfao dos Religiofos da Companhia de Jefus , e abolição do Eftanco ; e de- vendo tudo geraes acclamações à cegueira do povo , a continuou elle nomeando a gritos por feus efpeciaes Procuradores os dous Deputados da Nobreza Manoel Beckman , e Eugénio Ribeiro. 1282 Já nefte tempo tinha amanhecido o dia 25 de Fevereiro, e os Miniftros daCamera efperavaõ juntos no mefmo Tribunal a reíbluçaõ dos Três Eftados , que declarada logo pelos dous Deputados Procuradores com • yt* $o8 Annaes Hijloricos Armo 1684. com a da prizao publica -do Capitão mor , (de que já tinhaõ feito apprehenfaõ ) e as do Juiz dos Órfãos Ma- noel de Campello de Andrade , e António de Soufa Soeiro, Cidadãos ambos da Capitania 7 e de muita hon- ra , foy approvado tudo com grandes applaufos. 1285 ÈntaÕ o Bekcman preguntando ao povo feu conftituinte ( que ainda eílava junto à porta do Senado) aonde queria , que fe leva íTe prezo Balthafar Fernan- des, feu Capitão mor , que havia fido , lhe refpondeo ,' que à cadea publica: e.afFeando-lhe efte defacato com .t prudentes diícurfos o Juiz dos Órfãos, e António de Soufa , ( ignorantes ambos de que a fua fentença paíTa- va a extermínio de todo oEítado) os três fe virão in- fultados daquella multida6 taõ perigofamente , que fe a piedade , ou a fina politica do meímo Beckman os naõ amparaífe , perderiaô as vidas : porém focegou tudo , mandando ao primeiro para o palácio dos Governado* fes com fentinelia à vifta , ( prizao de que paífou no mefmo dia para a antecedente da fua cafa ) e aos dous Cidadãos para a enxovia , com a culpa também de te- rem fomentado a aceitação do Eílanco. ' 1284 Já menos alterado aquelle tumulto , paífou o Beckman ao Collegio da Companhia, onde em publica forma fez -notificar aos feus Religiofos, naõ fó o exter- minio de todo o Eftado , mas também a fua reclufaò no mefmo Collegio com a feparaçaõ de todo o povo até a occafiaõ do feu tranfporte, para que a efficacia das fuás praticas naõ produziíTe novas revoluções de confequen- cias muito mais* perigofas j epor mais que o Prelado, depois de ponderar com louvável modeftia tamanho fa- crilegio , oífereceo ainda parajiaver de atalhallo venta- jofos partidos , os defprezou todos a obítinaçaõ barba- ra dos fediciofos. 1285 Intentarão logo infultar a cafa do Eílanco com a vil ambição de fe aproveitarem das fuás fazen- das 5 do Eftado do Maranhão , làvXVIIL í 9 9 das j porém convencidos dos fortes argumentos dos Armo 1684* bem intencionados , ou menos orgulhoíbs , facilmente cederão deíle defatino , contentando-fe fó com lhe fe- char as portas : e unindo-fe outra vez no adro da Sé , entrarão na Igreja guiados do Clero, que efcandalofa- mente entoou nella o fagrado Hymno de acçaõ de gra- das pela felicidade de tantas infolencias , para que naõ houveíTe defacato ? que nefte fe naõ viíTe. 1286 Neftes, e outros abfurdos da mefma quali- dade fe confumio o dia , que a devoção catholica ti- nha fó dedicado para as fieis memorias da noíTa redemp^ çaõ na ProciíTaõ dos Pa^Tos , que aprefíadamente deu para ella a fineza extrejtàofa de hum verdadeiro Deos , reveítido de homem ; e na manha feguinte , incorpora- da ajunta dos Três Eftados , refolveo também , que fe nomeaíTem três fujeitos nobres dos de mais conhecida capacidade , para que adjuntos aos Miniftros da Came- ra , fe encarregaífem todos do governo da Capitania até novas ordens da Corte de Lisboa , depois de infor- mada por feus Procuradores ; mas que aos dous do po- vo feria fempre permittida a peífoal afíiftencia no expe- diente do mefmo governo , para reprefentarem os inte- reíTes do feu conílituinte , que fe attenderiaõ como prin- cipaes pontos da utilidade publica. 1287 Para efte emprego elegeO a Junta , com ap- provação de todo o povo , a Joaõ de Soufa de Caítro P Cavalleiro da Ordem de Chrifto , e Provedor dos De- funtos , e Aufentes 5 a Manoel Coutinho de Freitas, e a Thomás Beckman ; e por naõ ter cabal fatisfaçaõ da fufficiencia de Valério Ribeiro , EfcrivaÕ do Sena- do , fubílituío em feu lugar a Manoel Martins da Cof- ta: mas ainda que tomarão todos juramento nas mãos do Ouvidor da Capitania Francifco de Almeida , os três Adjuntos proteftaraõ também , que fe fujeitavaÕ a tal occupaçaÕ obrigados do povo. Depôs óoo Annaes Hijloricos Armo 1684. 1288 Depoz logo o Tribunal da Camera todos os Officiaes da Infantaria daqueíla Guarnição , e na íua falta nomeou outros dos fediciofos , que tomando pofle das fuás Companhias . fem a menor duvida guarnecerão mais feguramente os poftos da Cidade. 1289 No feguinte dia extendeo Manoel Beckman as fuás medidas , com a voz do Senado , até o da Cida- de de Belém do Pará 5 e felicitando a uniaô da Capita- nia com os intereíTes , que fuggeria bem nos mefmos fundamentos do defatino bárbaro de tamanha defor- dem , encarregou eíla commifíaô a alguns dos Compa- nheiros , que conhecia por de mayor orgulho : porém elles arribando à bahia , de que tinhao fahido , fe efeu- faraõ delia, temerofosjá do infeliz fucceífo , que lhes ameaçava. 1290 NaÕ faltou com tudo hum máo Religiofo? <[ue fubftituiffe o mefmo lugar por voluntária oíFerta 5 mas chegando à Cidade de Bélem efte diabólico emiíTa- rio em habito de apoftata $ para fazer o íêu procedimen- to mais abominável , ainda que os Miniftros da Came- ra regiftaraõ todos os papeis , que receberão delle , os -levarão logo ao Governador : e lidos fielmente na fua prefença , proteftarao entaÔ com exprefs6es muy vivas a fidelidade de todo aquelle povo, o íferecendo-o tam- bém para o caftigo do do Maranhão , fe o feu antecipa- do arrependimento lhe naõ grangeaífe o benigno perdão de huma culpa taô feya : acçaô taõ eftimavel , que a agradeceo Francifco de Sá com as demonftrações de mayor honra. 1 29 1 Declarou também logo efte General aos mef- mos Miniftros a refoluçao de acudir em peíToa a Cidade de S. Luiz ; porém elles, ou por entenderem que eíla fe- paraçaõ lhes feria damnofa , ou que o feu projedo fe en- caminhava fó a huma apparente fatisfaça6 publica fem empenho do animo, flzeraõ todo para diíTuadillo : e no bre- do Eâado do Maranhão, Liv.XVHL 601 breve termo de quatro dias , esforçando mais a fua li- Anno iCZ-\. fonja , lhe reprefentaraõ hum largo papel íbbre a mef- ma matéria em nome do povo. 1292 Encareciaõ bem neíla propoíla os naturaes temores , de que feguindo neceíTariamente a fua peíToa todas as forças da Capitania , com a Nobreza delia , fi- caria fem duvida muito mais perigofa , que a do Mara- nhão pela vifinhança das nações eftrangeiras , quando fe entendia , que para a reducçaõ dos fediciofos pode- ria bailar hum Commifíario feu dos de mayor refpeito daquella Cidade j e para darem fundamento mais folido ao mefmo difcurfo , nomeavao logo a António de Al- buquerque Coelho de Carvalho , que aíHm por neto , filho, e fobrinho de Governadores daquel e Eftado , co- mo também pelas virtudes próprias , fe fazia digno de toda a confiança. 1 295 Defejava fem duvida Francifco de Sá aquillo mefmo que lhe rogavaô ; porque fiando pouco do povo do Pará , na feparaçaÕ da fua Companhia , defattendia já as proteílações de fideLdade , que encarecia tanto o Senado da Camera j e também ponderando com menos ceílifogo , que melancolia , o perigofo empenho a que fa- crifícava a fua peíToa no defatino dos amotinados , que- ria fegurar a juftificaçao do feu procedimento nefta mef- ma defeza , de que lançando maÕ fem muita repugnân- cia , involveo na defgraça da Capitania do Maranhão a das opiniões , em que deixava a fua. 1 294 No primeiro de Abril recebeo elle mais for- maes noticias das revoluções , por cartas que teve do Capitão mor de Tapuytapera Henrique Lopes da Ga- ma , e Senado da Camera da mefma Villa , com as in- formações da fua repulfa às acYivas inftancias dos fedi- ciofos j e que continuando na conílancia de animo to- do aquelle povo ? daria fempre as mais feguras provas da fidelidade , que profeíTava : mas he fem duvida , que Gggg * abo» 'i 6 02 Annaes Hifloricos <:' : I Anno 1684. abominando a ília governança como facrilegio a depo- íiçaõ do General, e a do Capitão mor Balthafar Fer- nandes , approvou a expulfaõ do Eílanco , e no exter- mínio dos Religiofos da Companhia de Jeílis procedeo fó com huma politica neutralidade 5 porque fem inter- por o feu certo juízo , ao mefmo tempo que encarecia as muitas virtudes dos Teus Miííionarios no pado efpi- ritual das Aldeãs dos índios , fe lembrava também do fentimento publico pelo poder difpotico , que exercita- ' vaÕ no ferviço delles. 1295 NaÕ faltou aeítas reflexões o bom juízo do Governador 5 mas também fazendo-as na perigofa íi- tuaçaõ do Eílado , tendo já efcolhido a pefíba de Antó- nio de Albuquerque para a reducçaõ dos moradores da Cidade de S. Luiz , tratou ío de o defpedir logo com as inílrucções, que julgou neceífarias, e cartas muito hon- rofas para a mefma Capitania de Tapuytapera , de que feu pay era Donatário : e o Senado de Belém do Pará querendo dar ainda mais claros teftemunhos da fidelida- de do feu animo , refpondeo à barbara propoíla do do Maranhão com humas exprefsões taõ cheyas de zelo, que para credito da fua memoria , me pareceo fazella defta mefma Carta pela feguinte copia. 1296 „ Recebemos a Carta, que VoíTas Mercês „ nos enviarão por via do Senhor Bifpo , a quem veyo „ remetido o Padre Frey Luiz Peftana 5 e fe o que ella „ continha , e a inílrucçaõ junta fe naô divulgara logo „ por efta Cidade por peíToas da cafa do dito Prelado , „ e pelo mefmo Religiofo , de tal forte encobríramos „ eftas novas , que primeiro chegariaõ as da quietação „ deíTe povo , do que fe publicaíTem as do feu levanta- „ mento , fundado em duas caufas , a que VoíTas Mer- „ cês podiaõ facilmente bufcar remédio , recorrendo ao „ Senhor Francifco de Sá de Menezes , que como Go- vernador , e Capitão General deite Eílado , reprefen- ., tando ?> 11 do E/lado do Maranhão ; Liv. XVIII. 6 o 5 f> tando nelle a Real pefíba de Sua Alteza , lhe occorre Asno 1684. „ de obrigação , como de faóto , procurar o augmento „ de Voífas Mercês ; e affim fe defvelava no cuidado „ de os fegurar dos Tapuyas deíTe rio Itapicurú , para ,, fer povoado deíTes moradores , o que a VoíTas Mer- „ cês deve fer bem prefente ; e affim lhe deviaõ VoíTas x „ Mercês reprefentar as razões , e juftas queixas", que „ tiveífèm contra o Eílanco , e elle fe havia de confor- „ mar com o que lhe pediíTem , mandando , fe neceíTa- „ rio foíTe , fechar as portas do dito Eílanco , antes , „ ou depois de qualquer navio , que vieíTe do Reino j ,, porque o mefmo Senhor nos dizia , que o dito contra- ; , to eftava em fi quebrado, por terem faltado os AíTen- „ tiftas às condições delle , e que affim o havia efcrito $, a Sua Alteza , queixando-fe de todas eílas faltas 5 e y , he certo , que a ninguém foy de mayor prejuízo., do „ que ao dito Senhor Governador , pois com efie cef- „ faraó as conveniências delle : e Pafcoal Pereira nos „ aprefentou hum papel, de que mandamos a VoíTas „ Mercês a copia , fobre o que pedimos parecer a toda j> a Nobreza defta Cidade dando-lhe tempo para bem o „ coníiderarem , e com feus pareceres , e refoluçaõ nof- „ fa mandaremos os traslados a VoíTas Mercês , fendo- „ do-lhes neceíTarios ; porque nefte negocio , como em )y todos, folicitamos fó o ferviço do Príncipe, e remédio ? , mais conveniente para o augmento deíle feu Eftado , ? , o que tudo fe ha de obrar com muita quietação , qne „ fem ella naõ ha liberdade , que affim fe lhe poíTa cha- „ mar , moftrando-nos todos muy zelofos da obedien- v cia , que fe deve a hum Principe taõ cuidadofo nas „ noíTas melhoras : e também fe VoíTas Mercês recor- ,, reraõ ao Senhor Governador fobre o negocio dos Pa- „ dres da Companhia , o achariaõ com bom animo pa- „ ra tudo o que foíTe juflo , e fallaria com o Superior „ fobre as matérias , que íizeíTem a bem de VoíTas Mer- Gggg ii „ cês \ . ■ 6 oi Annaes Hiftoricos Anno 1684. „ cês 5 e quando o dito Padre , e -feus fubditos fe naõ „ quizeíTem conformar com a razaÕ ? e utilidade publU „ ca , em tal cafo feria mais defculpavel qualquer ex- „ ceifo : porém no levantamento deíTe povo naõ acha- „ mos defculpa , por fer muito contra o que nós fíava- „ mos da fua fidelidade , e refolverfe a negar a obedien- ?; cia ao Senhor General , que he o mefmo que a Sua „ Alteza 7 pois nos eftá governando em feu lugar , e „ neíle cafo folicitarem VoíTas Mercês a noíTa uniaõ , „ he exceííb j porque eílamos de taõ difFerente parecer, s, que antes perderemos as fazendas , e as vidas ? que fe- ,/guirmos taô temerárias refoluções , faltando com a „ obediência de leaes vaíTallos ao nofíb Príncipe natu- „ ral ; e por naõ arrifcarmos a quem reprefenta a fua „ peíToa , lhe requeremos , que naõ paíTe por ora a eíTa „ Capitania , e defta banda o tem VoíTas Mercês para „ perdoar qualquer exceííb , o que lhes feguramos fiel- „ mente da noíTa parte , eiperando que na primeira oc- „ cafiaõ VoíTas Mercês nos mandem novas do feu ver- „ dadeiro arrependimento , com muitas também do feu „ ferviço , para que unidos por efte modo , nos achem „ muito promptos. Deos guarde a VoíTas Mercês mui- ,, tos annos. Belém do Pará , em Camera , 8 de Abril „ de 1684. 3 E eu Manoel Coelho de Távora , Ef- „ crivaõ da Camera , que o efcrevi. 55 Francifco „ Aranha de Pinho. ZZ Pedro Mendes Thomás. s* „ António Ferreira Ribeiro, à Bernardo Monteiro. „ S Manoel da Cofia, p Gonçalo Soares. 1297 Já neíle tempo aquelles moradores do Mara- nhão , que no fentimento dos corações feguiaÕ fó os da fidelidade , fe communicavaõ algumas vezes ; porém com taes cautelas , defculpavelmente temerofos , que até fe recatavaÕ das próprias familias. Reprehendiao • huns a froxidaõ do Governador , tendo por infallivel : Quefe apparccejje em 'I apuy tapera com a Infantaria da Fraga do Ejtadodo Maranhão , LivSKVIIL 6 o j Pr^fl do Para, e arrebatadamente pajfajfe a Cidade de Anno 1684. S. Luiz , bqjiava a confufad , fempre natural nas defor- dens do povo, para fujeit alio f em o rigor das armas, mais que fomente na principal cabeça da commoçao , por- que faltando ella nao haveria outra , que quizejfe arrif- carfe ao mefmo perigo , quando já via f obre fi a efpada da jujiiça , e taè cheya de f angu e , o que parecia nad podia intentarfefem temeridade , perdida a conjunSíura com o lapfo dos dias 5 porque fazendo delle os amotinados hum ■ forte argumento , de que erao temidos , ainda os indife- rentes buf cariai logo a fua uniad , nao fò como medrofos das insolências , que os ameaçava^ , mas como partido mui- to mais poderofo. 1298 Porém os mais attentos à confervaçaõ pró- pria fe oppunhao fortemente a eíla opinião , infaman- do-a já de precipitada , com os fundamentos : De que Jendo fem duvida a mais fegura , fe o Governador fc apro- veitajfe delia nos primeiros avijos da commoçati dos âni- mos , depois de declarados ,fó merecia o nome de loucura, quando a debilidade das forças do Pará , nao fervi tido mais que para o defprezo dos fedido fos , os deixaria muito mais cbjlinados , fe ejlragado de todo o refpeito do Príncipe na prizao , ou morte dofeu Lugar-T enente , o mefmo horror da culpa também os nao levaffe ao de f atino ultimo da de- fefperaçaò , como prudentemente fe devia temer ; acere f centando mais , que ainda no cafo , de que a felicidade do fucceffo refpondeffe bem as fuás efperanças , defembainha- dajá a efpada da ira , feria a vitoria muito mais cujlofa aos inter ejfes públicos , que a revolução , quando a dejuniao dos amotinados , que feguravajá ajua inconjiancia , bafa- ria fò para reduzillos. 1299 Ajudada com outros argumentos , prevalecia fempre efta opinião , fe naõ como fegura , por menos arrifeada na confternaçaÕ daquelles homens 5 mas o Be- ckman , que confervava ainda o primeiro lugar na.au- thoridade ih •nm- 1 i¥-. u I' ' 6o6 Annaes Hiflorwos Armo 1684. thoridade do governo j conhecendo já que a multiplici- dade dos pareceres na intervenção do povo , naõ fer- vindo mais que para a confufaõ , lhe ameaçava a ultima ruina na divifa5 dos ânimos , tratou de reftringillo ao Tribunal da Gamera J que dominava com poder abfo- luto» 1300 Entre os depoílos ( a que também íízeraô nu- mero com os pretextos corados os dous Juizes Ordi- nários do meímo Tribunal) fe percebeo logo alguma alteração 5 mas prevalecendo a refpeitada aftucia do Prefidente , fe apagarão eílas lavaredas : ficou porém o fogo efcondido nas cinzas , moftrando a luz clara , que fe o foprafíe a generofa refoluçao do primeiro dif- curfo dos bem intencionados , coiifumiria em menos de hum dia toda a matéria , de que fe alimentava a hor* rorofa maquina da difcordia : com tudo já o Beckman principiava a verfe menos idolatrado da cegueira do po- vo 5 e apaixonadamente difcorrendo , que as froxidões do culto feriaõ producçaõ de occultas influencias dos Religiofos da Companhia de jefus , tratou de fo cegar efta defconflançana execução da barbara fentença do feu extermínio , que fez ainda mais efcandaloía na ef- colha do dia , porque foy o de Ramos. 1 3 o 1 No Domingo pois defta folemne fefta fahiraõ os Padres pela porta do carro do feu Collegio com pal- mas todos reclinadas nos hombros , que inculcando bem o myfterio do dia , eraõ infignias próprias do cruel mar- tyrio , a que os condemnava a femrazaõ do ódio ; e ef- coltados do povo , obílinadamente endurecido nelle , foraô logo metidos a bordo de dous barcos , que fa- zendo-fe à vela com a guarnição de poucos Soldados ( naõ para a defenfa , mas para a fegurança das fuás peífoas ) tomou hum Parnambuco com feliz viagem , que alguns dos Padres continuarão até Portugal nefte mefmo anno. Correo do E/lado do Maranhão, LivJCVIII. 6 07 \ 1502 Correo porém o outro muy differente fortu- Armo 1684, na 5 porque foy logo infeliz preza de piratas , que de* j pois de roubarem a pobreza Tanta dos Religioíos , os lançarão dentro de poucos dias na mefma coíla do Ma- ranhão ; donde conduzidos à Cidade de S. Luiz pela noticia dos feus moradores , amontoarão eíles novos íacrilegios no cárcere privado da fua reclufaõ $ pois naô lhes querendo permittir a dos feus cubículos , os fe- charão a todos em hum a cafa particular com vigilante guarda: e ainda temerofos da fua virtuofa communi- caçaõ , os paíTarao breviííimamente para a Cidade de Belém. 1305 Nefte mefmo tempo chegou António de Al* buquerque a Tapuytapera , onde foy recebido com grandes applaufos , olhando para elle as efperanças daquelles moradores já como redemptor do focego publico dos feus vifmhosj porque ainda que na com- moçaõ , e defobediencia os naô tinhaõ íeguido , os communicavaõ com a mefma amifade , e lhes defeja- vao toda a boa fortuna , como igualmente compre- hendidos nos intereíTes delia ; o que moftraraÕ bem nos mefmos feguros , que também lhes deraõ de nunca con- correr para ojufto caíligo da fua defordem , fem que precedeíTe refoluçaõ do Príncipe , depois de informa- do. 1304 António de Albuquerque avifou logo da fua chegada os Governadores de $. Luiz, elhespedio li- cença para lhes ir communicar negócios importantes , e de grandes ventagens aos intereífes públicos da Ca- pitania 5 mas aquelles Miniftros, que pela repoíla, que receberão do Senado da Camera de Belém do Pará vi* raõ claramente todas as inftrucçóes da fua embaixada, a naõ admittirao , defeulpando a efeufa com a mefma defordem , em que fe achava o povo : porém elle , que queria tirar dos mefmos defenganos algumas efperanças de > 11 ■ <■ ' 1 hm 6o8 Annaes Hiíloricos MM. : Anno 1684. de introduzir as praticas da fua commhTao , fe deteve ainda em Tapuytapera , entretido também com huma larga Carta dos Governadores , taõ cheya de refpeitos à íua peíToa , como de apaixonadas juítificações do de- fatino 7 em que continuavaõ. 1 3 05 Naõ faltarão zelofos do íbcego publico , que defejaíTem bem a commnnicaçaõ de António de Albu- querque j porém o Beckman introduzio de forte nas defconfianças de todo o povo as da fua propoíla , que ficou vitoriofo com grande complacência do feu fatal orgulho: mas já a efte tempo neceífitava de todas as induftrias para entreter os ânimos da mayor parte dos fediciofos 5 porque enfermando huns no trabalho das guardas com o defcoílume do exercido , e fentindo outros o defamparo das fuás lavouras , fe os mais obs- tinados fenaõ arrependiaÕ das revoluções , aborreciaõ todos os efFeitos delias. 1306 Via o Beckman crefcer o numero dos def- contentes , e conhecendo bem o evidente rifco, a que o conduzia a divifaÕ dos ânimos , naõ havia aílucia de que fe naõ valeíTe para fortalecellos , humas vezes poKconta da vangloria , lembrando-lhes a todos as glo- riofas acções de feus pays , e avós na expulfaõ dos Francezes , e Hollandezes $ e outras fegurando-íhes com a verboíidade , de que naõ era pobre , que no prefente cafo fó os defmayos do valor poderiaõ fer a fua ruina $ porque informado o Príncipe da fua conf- tancia em taõ judas queixas, naõ teria Miniftro taõ inimigo dos íntereíTes da Monarquia , que deixaíTe de lhe aconfelhar a fatisfaçao delias. 1307 Com tudo já experimentava perigofas faltas no refpeito publico , quando foy foccorrido de hum novo acci dente com grande fortuna ; porque entran- do naquella bahia hum navio do Eftanco com muitas fazendas , e duzentos negros de Guiné , ainda fem no- ticia do Efiado do Maranhão , Liv.XVHL 609 ticia da commoçao do povo , alvoraçado efte com os Anno 1684. intereíTes , que fe lhe promettiao na repartição de to- da a carga, como boa preza dos contratadores, que fe reputavaó por inimigos , ratificou a fua obflinaçaô já menos difcurfivo , do que ambiciofo ; mas por mais que quiz o Beckman lifongear a ília cubica com a injuria poíTe das fuás efperanças , vencido ainda do parecer oppoílo dos menos orgulhoíbs , fe entregou tudo aos Adminiftradores do contrato com ordem fó, que fem que precedeífe a dos Governadores , nada fe venderia: e chegando logo outra embarcação de in- ferior lote , também dos AíTentiílas , fe praticou o mefmo com a fua carga , que era dos mefmos géne- ros. 150S Naõ tardou muito a permiíTao da venda , com a repartição dos negros de Guiné, na forma do contrato j mas os Governadores dando a entender nel- la a mais reóta juíliça diítributiva , concebeo o po- vo do feu procedimento conceito taõ contrario , que para o focegar , já pouco menos que commovido ,. ne- ceííitou bem o Beckman de toda a fua induílria , re- veftida de zelo : porém acabando de conhecer as fro- xidões da fua authoridade nas particulares attençoes dos fediciofos ; porque defenganada a fua cegueira , feguiaò quaíi todos o mefmo defatino fó como for- çados da defefperaçaõ , em que os tinha poíto a do perdão delle. 1309 ParTados poucos mezes, fem outra novida- de, chegou do Pará ao Maranhão, nos últimos dias de Agoílo , Hilário de Soufa de Azevedo com o Sar- gento mor do Eftado Miguel Bello da Cofta , Ca- valleiro do habito de Chriílo , fucceíTor de Balthafaf Fernandes no mefmo emprego , e já com licença dos Governadores entrarão ambos na Cidade , onde o pri- Hhhh meiro : ■. ,! ', 1 m IN 6io Annaes Hifioricos Annoi684. meiro experimentou logo todas as attenções juíliífi- mamente merecidas» 1 3 1 o Levava também a commiíTaô de introdu* air as praticas do focego publico , a que deu princi- pio muy diffimulado pela cabeça dos fediciofos, brin- dando ao Beckman com o foborno de quatro mil cru- zados , e promeíTas largas de occupaçôes honrofas , depois de fegurarlhe o perdão geral da Capitania com perpetuo íilencio nas culpas comettidas até aquella hora ; porém elle na mefma infâmia do feu procedi- mento querendo inculcar a natural elevação de efpi- rito , regeitou todas as offertas com fumma conílan- cia , proteftando com tudo , para rebuçar a infidelida- de , que fujeitaria a fua obediência fem a menor du- vida às ordens do feu Príncipe , a quem já recorria por feus Procuradores : e por naõ dar ciúmes aos mais Companheiros , defpedio logo a Hilário de Soufa , que fe foy confolar com António de Albuquerque , deti- do ainda em Tapuytapera , donde ambos fe recolhe- rão ao Pará, ficando livremente na Cidade de S. Luiz o Sargento mor Miguel Bello da Coíla. 13 11 Publicou-fe logo todo o tratado de Hilário de Soufa com a répulfa do Beckman , que encarecen- do huns como generoíidade do feu animo , e conf- tancia delle ,- avaliarão outros fó como intereíTes ma- yores nas barbaras idéas da fua fantafia, e naõ pou- . cos também como obftinaçaõ louca do feu fatal or- gulho: porém todos os complices na defatinada com- moçaò do povo, fe conformarão bem com a refolu- çaõ ; porque accufados da confciencia própria, de£ conflavaó já de todas as promeíTas ; entendendo fem duvida , quando fe regulavaõ pela enormidade do der lido, que o Governador na6 podia cumprillas. 13 12 Por inítancias do povo fe tratou entaõ da expe; do EJlado âo Marcúúao , Liv. XVIII. 61 1 expedição de Procurador à Corte de Lisboa 5 empre- Anno i68k go conferido havia muitos mezes a Thomás Beck- man , que fahio com efFeito daquella bahia nos pri- meiros de Outubro : e ainda que o irma5 tinha dila- tado a fua partida , a apreííou agora com toda a effi- cacia, por atalhar as defconfíanças , que já fe conce- biao do feu procedimento pelos meímos princípios. 151 5 Já nefte tempo a Infantaria da guarnição da Fraca que fe achava aggregada às Companhias dos fediciofos , fe havia reunido debaixo do cominan- do do Sargento mór Miguel Bello da Coita , fó com a fujeiçaõ ao do mefmo povo 5 porque rendido efte do trabalho das guardas , e já também mais ambicio- ío dos intereíTes certos das fuás lavouras, que dos du- vidoíos , que lhe fegurava o Beckman nos felices fuc- celios das negociações de Portugal \ {tz que confen- tiíie netta feparaçao com hum total defprezo da fua repugnância. 15 14 Bem conhecia elle , que eíta nova forma feria fem duvida a fua ruina 5 mas como também via, que os mefmos Adjuntos no governo ■ que fe empe- nhavao nella em lifonja do povo, aborrecia*) já a fua authondade , por naÕ perdella toda , cedeo à violên- cia , que lhe nzeraÕ ; e aquelles moradores , que re- catadamente confervavaÔ ainda a veneração da Ma- geftade , o forao confirmando nas fuás melancólicas profecias ; porque já com mais forças para a oppo- liçao do feu orgulho , difcorriaÒ nelle com muita li- berdade. 13 15 Todos os Lavradores , com, a partida do Procurador, fe retirarão logo às fuás fazendas , dei- xando o Beckman taÔ defarmado , que naÔ havia af- tucia , de que fe naÔ valeífe para Mentar o refpei- to do povo 5 mas já taÔ abatido , que fe o Gover- Hhhh ii nador í;»l rMÍ % I 6l2 Antiaes Hiflorlcos Atino 1684. nador fe foubeíTe fervir de liuma tal conjuntura , bailaria fem duvida fó a fua peííba para o caíligo dos amotinados ; porém continuando o reílo deíle an- uo na defattençaõ dos zelofos avifos , que fe lhe fí- zeraõ , condemnou muito mais o feu defacordo com a fenfivel perda do beneficio publico j que lhe offe- recia o tempo* ANNAES 6ij >.. & A N N A c T Cl tt T i3 JL \^ JX X DO ESTADO LIVRO JQX. SUMMÁRIO. c ONTINUA Francifco de Sá na errada polU Uca dafua inacção , e o Beclman , mie já defi confiava dosfediciofos , fe aproveita delia para commoveílos , mas com pouca fortuna. Succe- de no governo do E/fado Gomes Freire de ^Andrade , e depois de varias providencias , defemharca na Cidade de S. Luiz f em oppo/içaõ dos amotinados , que intentarão fa- zella. Elogio dejle Fidalgo. Varias prizoes dos fedido* fos y a que fe Jegue a dofeu Procurador Thomás Beck- man» Entra na Cidade de S. Luiz o Governador Fran- cifco de Sá de Menezes , e com poucos dias de dilação fe recolhe ao Fará , donde pajfa logo para Lishoa. Prizao do Bechnan , e ofeujujlo cajli^o com o dos mais princi- paes complices na commoçao' do povo de S. Luiz. Re« conhecida \ «'■/ 6i4 Annaes Hiítoricos conhecida a obediência da Capitania do Maranh ao , man- da Gomes Freire rejiituir ao feu Collegio os Religiofos da Companhia de Jejus. Chama a Cidade de S. Luiz Procuradores do Pará j e depois de muitas- conferencias , declara por extinâlo o contrato do EJianco. Encarrega o governo da Capitania do Maranhão 1 aBalthafar de Sei- xas Coutinho j e pajfa ao Pará , onde he recebido com grandes applaufos. Sue cede no governo do Ejlado Artur de Sá de Menezes. O feu elogio. Pajfa ao Pará , onde he recebido de Gomes Freire com toda a attençaÚ. Em» barca Gomes Freire para Portugal com geral fentimen- to do Ejlado do Maranhão. PaJJa o Governador a Cida- de de S. Luiz 1 e com pouca demora volta ao Pará. Mor- re na Cidade de S. Luiz o primeiro Bifpo do Ejlado D. Gregório dos ^Anjos. Succede no governo geral Antó- nio de Albuquerque. O feu elogio. Pajfa a Cidade de S. Luiz , onde nomea por Capitai mor do GraÚ Pará a Hilário de Soufa de Azevedo. Volta para a Cidade de Belém ; e o feu antecejfor Artur de Sáfahe daquelle rio para o de Lisboa. Faz o Governador repetidas jornadas de huma Capitania para outra ; e ultimamente na do GraÒ Pará forma huma grande armada de canoas , com a qual pajfa a examinar ofamofo rio das Amazonas. In- terpreza da Fortaleza do Macapá , e a fita breve refiau- raçav pelas providencias do Governador, Chega ao Ma- ranhão D. Fr.Timotheo do Sacramento com a dignida- de de Bifpo do Ejlado. As afperezas do feu natural , e os efeitos 9 que ellas produzirão 1 . SucceJJbs infelices nas Ca- pitanias do Maranhão , e Gral* Para. EM do Ffiado do MaranliaÕ , Liv. XIX 61 5 13 16 M a fucce/Taõ do anno de 1685 y ícguia ainda Francif- Anno 1685. co de Sá a errada politica da Tua inacção , pareeendo-lhe fempre que nao fazia pouco na confervaçaõ da Capitania doiPará ; mas o Beckman que conhecia bem o evidente rifco , em que o tinha pof- to a defuniaõ dos feus colligados /intentou de novo commovellos ; e o lograria com a ruina ultima do Ma- ranhão , fe o arrependimento de hum dos mefmos com- plices , já na noite da vefpera do dia decretado para taõ fatal golpe , nao avifaíTe ddk ao Sargento mor Miguei Bello da Cofta , que para a fua prompta of pofiçaõ dif- poz logo diflimuladamente toda a Infantaria da guarni- ção da Praça , que já lhe obedecia. 13 17 A fagacidade do Beckman, que com a pri- meira luz do dia vio prevenido aquelíe movimento , tratou de defmentillo com ruidofos clamores , de que tantos apreftos militares fe encaminhavao fó à injuria do povo na defconfíança , que fe fazia delle : mas quan- do fe valia de huma tal aftucia para provocallo , lhe fi- cou fervindo para a fua mayor coníternaçaõ 5 porque cortados do mefmo accidente todos os revoltofos , taõ apreíTadamente fe dividirão , medrofos dos exames dos bem intencionados , que emmudecidas logo todas as vozes , fe recolheo a fua cafa já menos cuidadofo das revoluções , que do perigo , que o ameaçava no cafti- go delias , por fazerem crefcer a fua confufaõ os avifos que teve por hum Sacerdote de boa authoridade , para guardar melhor a fua vida , fegurando-lhe , que fe buf- cava já para fe orferecer como facríficio ao focego pu- blico. B F 1318 Na nova commoçaõ dos fediciofoS , era fó o infen- ~> 6i6 jbmaes Hijíoricos Amo ió8 para que paíTaíTem para a de S. Luiz 5 reftabelecido o contrato do Eftanco no Teu primeiro eftado ; reílituido aos feus empregos todos os depoftos pelos fediciofos j e da mefma forte a fua liberdade com efpeciaes honras o Juiz dos Órfãos Manoel de Campello de Andrade, que achou ainda prezo , hia continuando nas acertadas dif* poGções da fua grande capacidade , em quanto o Syn- dicante fe occupava todo na judicial indagação das paf- fadas defordens para o exemplar caftigo delias. 1336 O Capitão mor Balthafar Fernandes tinha já falecido havia muitos mezes na mefma homenagem da fua cafa , em que o poz o povo 5 mas fua mulher rece- beo por elle huma honrofa Carta , affinada pela mao Real , que aíTentando bem na fidelidade do feu zelo, a defmerecia a froxidao do animo. 1537 O Beckman do retiro da Ilha , onde fe dete- ve os primeiros dias , pafTòu cuidadofo ao do feu enge- nho do rio Miary , que como terra firme , e muito mais fragofa , o deixava viver menos aíTuílado 5 mas o Go- vernador , que conftrangido das forças da Jufliça , no mere» 622 Annaes llijloricos Anuo 16%, merecimento da devaífa , já fazia empenho da fua pri* zaô ., com públicos bandos prometteo por ella dirTeren* tes prémios , em que também entrava a abfolviçaõ de todos os crimes , fem exceptuar o do mefmo motim , de que fe efíava conhecendo , com a çomminaçaô de gra* viffimas penas a quem occultaífe o tal delinquente , ou déffe ajuda para a fua fugi dai 1338 Havia na Cidade de S. Luiz hum Lazaro de Mello , moço de pouca honra ? ainda que contava a fe enforcou por defgraça , depois de alguns annos , em huma engenhoca de fazer aguardente , acabando a vi- da também de garrote , e muito mais violento , princi- palmente para as difpofições da immortalidade : fim fe* ria cafual accidente , porém as reflexões mais contem* plativas o perfuadem cheyo de myílerio* 1345 Reconhecida confiantemente a obediência da Capitania do Maranhão pelo focego delia , e já reílitui- dos ao feu Collegio os Religiofos da Companhia de Je* fus , convocou logo o Governador o Senado da Came- ra de Belém do Pará , para que junto com o da Cidade de S. Luiz , entendeíTe de ambos as conveniências , ou prejuízos , que haviaô defcoberto as reflexões do verda* deiro zelo na confervaçaõ , ou extincçaõ do Eílanco : e foraõ taõ folidos os fundamentos , que o impugnarão com innegaveis provas da fua infracção pela malicia dos Contratadores , que Gomes Freire , na forma das fuás inftrucções , o deu por removido ; de que fatisfeitos huns , e outros Miniftros , os do Pará fe recolherão ao feu domicilio , depois de outras diíFerentes reprefenta- ções naÕ menos venturofas na refta juitiça deíle Fidal- go. 1346 Succedeo o anno de 1686 j e continuando Armo 1 686, Gomes Freire no zelofo exercício do feu grande talen- to , naõ havia parte no Maranhão , em que fe naõ ou- viíTem as acclamações delle : porém tendo já melhora- do de forma o governo militar , e politico da Cidade de S. Luiz , o encarregou a Balthafar de Seixas Couti- nho , com a Patente de Capitão mor , para paífar ao GraõPará, aonde chegando no dia 18 de Julho , go* Kkkk 2011 ■■ W-fi 1 ■ Ó2Ó Annaes Hiíloricos Annoi686. zou bem nos applaufos daquelles moradores da multi- plicidade da fua mefma fama. 1347 Hiaelle já pouco fatisfeito do procedimento do Ouvidor Geral António de Andrade de Albuquer- que j e repetindo-felhe mais algumas queixas com evi- dentes provas , o depoz de todos os empregos que fer- via , com extermínio para a Povoação do Caeté , fubf- tituindo logo no feu lugar a António Ferreira Ribeiro f Cidadão da mefma Cidade de Belém ,. onde tinha occu- pado merecidamente os cargos mais honrofos , aííim po- líticos , como militares. 1 348 Sem outra novidade , que fe faça digna de ef- Anno 1687. pecial memoria , entrou o novo anno de 1687 $ e con- tinuava ainda no feu louvável exercício Gomes Freire de Andrade , quando no dia 26 de Março chegou à Ci- dade de S. Luiz o feu fucceíTor no governo do Eílado Artur de Sá de Menezes, Commendador das Commen- das de S. Fedro de Folgofinho da Ordem de Chriíto , e de Santa Maria da Meimoa da Ordem de Aviz. 1549 Tinha elle fervido dezafete annos em praças de Soldado , e Capitão de Infantaria do Terço de Se- tuval j e embarcando-fe em muitas Armadas , em que teve varias occafiões , acreditou em todas o feu proce- dimento com grande diftinçaõ. 1350 Levava ordem para naõ entrar no governo do Eílado , em quanto o feu anteceíTor fe naõ recolhef- fe a Portugal ; attençaõ merecida dos muitos ferviços , e capacidade de Gomes Freire : mas como diftinções de qualquer qualidade fe reprefentaõ fempre as mais odiofas , o foy tanto efta a Artur de Sá , que naõ o achando no Maranhão , e fabendo bem que. na Carta de crença para o Tribunal do Senado da Camera hia também a tal declaração , fingindo que lhe tinha ficado por defcuido a bordo do navio >, tomou folemne poíTe , fem que aquelles Miniílros lhe pozeílem duvida. Pre- âo Efladõ âo Maranhão , Liv. XIX. 62 7 1351 Preoccupado já da fua lifonja , difpenfou o Anno 1687. Senado neila formalidade , quando era precifa j mas recebida a Carta, e fazendo-fe publica , voluntariamen- te ie abfteve do governo o rneímo General , também envergonhado de haver defattendido as ordens do feu, Príncipe : e dando logo conta a Gomes Freire da íua chegada , lhe pedio canoas para paíTar ao Pará. 1552 Os Miniftros da Camera , que conhecerão bem a eílranhavel leveza do leu procedimento , fe def- culparaõ com Gomes Freire 5 mas empenhando as fa- ■tisrações mais attenciofas , foraõ mal recebidas 5 o que também fentio , e com demonftrações muito mais feve- ras , o Capitão mór Balthafar de Seixas P que governa- va a Capitania. 1555 Com eftes teftemunhos da regularidade da fua difciplina, expedio logo o Governador as embar- cações , que lhe parecerão neceíTarias para o tranfporte -de Artur de Sá } e chegando elle com feliz viagem à Cidade de NoíTa Senhora de Belém em 8 de Junho ,' exercitou de forte Gomes Freire , na diíTimulaçaô da íua juíta defconfiança , a grande prudência de que era dotado , que além de hofpedallo com magnificência no mefmo Palácio dos Governadores do Eftado , em qus refidia , o tratou fempre com tal íinceridade , princi- palmente na communicaçaõ dos negócios públicos , que depois de lhe dar huma copiofa relação de todas as me* morias , que tinha adquirido a fua boa intelligencia , na obfervancia também das ordens da Corte , no dia 14 de Julho lhe entregou o governo, 15 54 Para moftrar porém o feu refentimento , ain* da que politicamente rebuçado , o na5 acompanhou nefte folemne a£ro com a efcufa de afFeótadas fnoleftias na faude , indo fó efperallo por diíFerente caminho k porta do Senado ; e fahindo delle já recebida a poíTe , por mais que também quiz o Governador , que lhe foíTs Kkkk ii afôf* " .'.'V 62 8 Annaes Hifioricos Anuo 1687. aífiftindo debaixo do Pallio , como he coftume , naõ aceitou efte lugar , que fó lhe tocava , metendo-fe lo- go no do concurfo da Nobreza , que lhe precedia na or- dem da marcha 5 demonftrações todas , de que Artur de Sá, aííás magoado, íe naõ deu por queixofo, pare- , ce que tratando-as como bem merecidas. 1355 Tinha fido bufeado Gomes Freire para o íb- cego do Maranhão nas revoluções das fuás defordens 5 encargo ,-' que aceitou o feu grande efpirito já como fe- guro da felicidade do ílicceífo : e na jufta attençaõ def. ta acertada efeolha , levou mayor poder nas fuás inf- trucções particulares , que o que coftumaõ ter os Go- vernadores , com a declaração na mefma Patente , de que logo , que fízeíTe avifo , de que eílava cheya a fua commiíTaõ , fe lhe mandaria fucceíTor , que lhe foy com eífeito na prefente monção , com a honrofa Carta que fe contiuúa , que me pareceo também trasladar para mayor credito da fua memoria nos documentos públi- cos da pofteridade. 1356 „ Gomes Freire de Andrade Amigo. Eu El- „ Rey vos envio muito faudar. Vio-fe a voíTa Carta „ de 23 de Agofto defte anno , em que me dais conta „ do procedimento , que tiveftes com o Governador de „ Cayena , e do que elle vos refpondeo fobre a entrada, „ e comercio, que os vaíTallos de EIRey Chriftianiffi- „ mo procuraõ ter nas terras deíTe Eftado , que íicaõ „ para a parte do Norte : e mandando confiderar efte p> negocio com a attençaõ , que pede a qualidade delle , „ me pareceo dizervos , que o expediente , que tornai „ tes em mandar os Francezes prizioneiros ao feu Go- „ vernador , foy muito acertado , como o tem fido to- „ dos os do voííb governo 5 e porque os meyos mais „ efficazes de fe atalhar o intento dos Francezes , faõ ,7 os que conte'm a voífa Carta , procurareis de os dei- 9 , xar difpoftos de maneira , que Artur de Sá de Mene- ;; zes t do Ejíado do Maranhão , Liv. XIX. 629 „ zes , que vos vay fucceder , os polia confeguir > e Anno 1687. „ executar taõ promptamente , como lhe mando encar- n regar por outra Carta. Para as Fortalezas , que he „ hum dosmeyos que apontais , vos tinha já mandado „ paliar as ordens neceífàrias , com o primeiro avifo que „ deita matéria me fízeftes , dizendc-vos os erTeitos de „ que vos haveis de valer : e porque tinha íb approva- „ do huma das ditas Fortalezas , e no meyo tempo def- „ tes avifos podeis ter mudado de parecer , fobre o íltio „ em que fe deve fabricar , podereis eícolher de novo , .„ o que a experiência vos tiver moftrado fer mais con- „ veniente , fem embargo do que difpoem as ditas or« „ dens -, como também podereis mandar fazer naõ fó „huma, mas todas as que julgardes neceífàrias , tanto „ para dominar o Gentio da parte do Norte , o qual pro- „ curareis perfuadir com as dadivas , que os cofíumaõ ,., obrigar , como para impedir quaefquer nações , que „ entrem nas terras defta Coroa , fem as condições ne- ,, ceifarias com que o devem fazer. E entendendo eu f ,, que neíle principio de fe fabricarem as Fortalezas pó- „ de fer neceífaria no CertaÕ a affiílencia de alguma „ peíToa , que tenha authoridade para tudo o que im« „ portar à obra delias , e me tendes informado do zelo, „ e cuidado com que me ferve António de Albuquer- „ que Coelho , Capitão mor do Pará : Hey por bem „ de lhe encarregar , que logo que tiver ordem voífa , f) vá com o Engenheiro òqíÍq Eflado , e alguns práticos „ daquelle CertaÕ , íinalar , e difppr as ditas Fortalezas^ „ e vos valereis ao mefmo tempo dos Miíííonaríos Ca- „ puchos de Santo António , que tem as Mifsões do 9; Cabo do Norte , e dos Padres da Companhia de Je- , y fns , que forem mais a propofito a efte fim , avifan- „ do-os da minha parte do que devem fazer , para fe ,y confervar fem defconflança a fujeiçao dos índios das „ Aldeãs , e fe tratar , e ajuílar com fegurança a paz , „ e ami- , ii ■ 1'™ '.i: 1 '" 6]o Annaes Hiftoricos Armo 1687. 'y, e amifade do Gentio , que naõ eftiver domeílicado. „ O CommiiTario dos Padres Capuchos , que fe embar- ?; ca neftç navio ? he fujeito de quem o feu Provincial , ; confia muito : elle vay difpoílo a feguir tudo , o que ? , lhe advertireis fer neceííario , e conveniente a bem das „ Mifsoes , e meu ferviço 5 e aos Padres da Compa- „ nhia de Jeíus tenho ordenado , que façaõ huma nova „ iMiífaõ para o Cabo do Norte , e os achareis com a , 7 difpoílçaõ , que coíluma fempre adiantar o feu zelo 9 , nas matérias do ferviço de Deos NoíTo Senhor , e „ meu. E para que huns , e outros a façaõ fem compe- „ tencias de jurifdicçÕes , procurareis dividir as fuás re- „íidencias, e Mifsões , com a diílinçaõ que fejautil, „ para naõ terem duvida no que pertence a huns , e ou- „ tros para a confervaçaÕ do Gentio , e bem do Eílado 5 „ e com o cuidado deíles Miffionarios , podereis confe- „ guir , que os Miffionarios Francezes naõ adquiraõ a „ pratica dos Aruans 5 e que os índios naõ bufquem a „ communicaçaõ alheya , efquecidos da própria , e na- „ tural do meu domínio. O refgate dos Índios , que „ he o fegundo meyo , que contém a voíTa Carta , te- „ nho mandado confiderar novamente , à viíla das ra« „ zoes que accrefceraÕ pela voíla informação : e^quan- „ do vos naõ vá refoluçaÕ neíla matéria , hirá ao voilb „ fucceííòr, em qualquer embarcação , que depois àcf- „ ta partir. Fareis repor todos os índios nas Aldeãs , e „ Roças donde foraõ tirados , por caufa do levanta- „ mento da Cidade de S. Luiz , e me dareis conta de „ que affim o tendes executado , e do que vos parecer „ neíla matéria , para eu determinar o que mais conve- , y niente for ao meu ferviço. No tempo que vos deti- ,, verdes neíTe Eílado , que fera todo aqueíle , que vos „ for poíTivel , confervareis o governo delle ; e de todas ;> as voíTas noticias, e experiências > que tendes adqui- .„ rido ; deixareis huma relação difunda ao Governador, „que do EJlado do Maranhão , Liv. XIX. 6 3 1 „ que vos ha de ílicceder Artur de Sá de Menezes , ao Anno 1687, ,, qual communicareis Jogo , e dareis também depois ,, efta minha Carta , e todas as mais que vos forem nef- „ ta occaíiaõ ; e a elíe ordeno , que figa as difpofições, „ que tiveres ordenado , fem as alterar em coufa algu- „ ma até ordem minha em contrario. Efcrita em Lif- , ; boa a 2i de Dezembro de 1686. REI. 1357 PaíTados nove dias , que gaflou Gomes Frei* re nas difpofições da fua viagem , no de 25 do mefmo Julho fe fez à veia para Lisboa , deixando em todo o Eftado do Maranhão taõ vivas as memorias do feu gran- de governo , no limitado termo de dous annos , que aqueíles moradores para confolarem a fua faudade no modo poffivel , mandarão ir do Reino dous retratos feus , que venerados muitos tempos nos Tribunaes das Cameras das duas Cidades , ainda fe confervaÕ nos Pa- lácios dos Governadores ; e nos regiftos do Senado de Belém do Pará a Carta , que fe fegue. 1358 ,, Senhor. Se fora poífivel , ou fe fe dera ca- „ fo , em que tiveífemos alguma hora razaõ de queixa „ contra VoíTa Mageftade , fora na prefente occafiaõ , „ em que VoíTa Mageftade foy fervido mandar fuccef- „ for ao Governador , e Capitão General, que foy àt{- „ te Eftado Gomes Freire de Andrade , pela falta que „ ha de fazer a todo elle 5 porque he taõ grande o affe- ,, do , que lhe devemos , como o zelo com que tem fo- „ licitado o augmento defta Conquifta ; e ainda que o „ fentimento da fua aufencia feja commum a todo o Ef- „ tado , mais particularmente deve efta Cidade fentir a „ fua falta y pois aííiftindo nella hum fó anno, nos dei- „ xou o feu honeílo , e virtuofo procedimento taõ obri- „ gados , que dando-nos muitas occafiões de lhe viver- „ mos agradecidos , nao deu a efte povo a menor para „ o dei» 6]2 Annaes Hiftoricos Anno 1687. ;) o deixar queixofo ; razões , que nos movem a man- „ darmos ao noíTo Procurador , que nos envie o feu re- „ trato , para que nos noííos defcendentes fe perpetue „ o agradecimento ao zelo de taõ grande Heróe , e fe „ faiba , que aífim como eíla Republica fe queixa dos „ que efquecidos da Tua obrigação obraõ tanto contra „ o ferviço de Deos , e Leys de VoíTa Mageftade , com ,j tanto efcandalo deites povos 5 fabe também bufcar \ „ meyos , com que fazer publico o procedimento da- „ quelles , que com acerto obrarão, ajuílados ao que „ VoíTa Mageftade lhes ordena : confiamos em Deos , „ que a%n como o Governador Artur de Sá de Mene-> „ zes lhe fuccedeo no governo , lhe fucceda também „ nos acertos : de tudo devemos render a VoíTa Magef- „ tade as graças , que como Rey taõ pio , procura com „ tanta anciã as melhoras deftes feus vaílallos taõ obe- dientes. As Leys , que VoíTa Mageftade foy fervi- do enviar em companhia do Governador Artur de Sá „ de Menezes , para o bom governo , e direcção dos In- „ dios , afíim efpiritual , como temporal , aceitámos , e „ pozemos fobre as noíTas cabeças : porém como pa- „ ra inteiro cumprimento delias lhes faõ neceíTarias al- „ gumas partículas , pode VoíTa Mageftade inteirarfe „ delias pela informação do Governador Gomes Freire „ de Andrade , que como taõ defintereíTado , reprefen- „tará a VoíTa Mageftade o que for mais conveniente „ ao feu Real ferviço. Deos guarde a Real peíToa de „ VoíTa Mageftade , como todos os feus vaílallos ha- „ vemos mifter. Belém do Pará , em Camera , 1 8 de „ Julho de 1687. 1559 Com a feparaçaõ de Gomes Freire ficou Ar- tur de Sá independente no governo 5 e fuccedendo o Anno 1688. anno de 1688 , fem accidente algum que lhe défle cui- dado , paíTou ao Maranhão nos princípios de Março , deixando bem feguro o focego publico da Capitania do Grão 37 do E/lado do Maranhão ^Liv. XIX. 6$$ Graõ Pará nas acertadas difpofições do feu Capitão mor António de Albuquerque ; mas com pouca demo- ra na Cidade de S.Luiz, voltou à de Belém, aonde chegou nos últimos de Outubro , fendo eftas as únicas, memorias , que poflaõ merocella no prefente anno. 1560 Entrou a nova fucceífaõ de 1689, mas taõ Anno 1689, cfteril também de noticias , como a paflada : e conti- nuando do mefmo modo , naõ encontro outra em todo o Eftado , que íè faça digna das fadigas da Hiftoria até 12 de Março , que a do falecimento de D. Gregório dos Anjos , primeiro Bifpo daquellas Conquiílas , Pre- lado taõ cheyo de virtudes , como fe moftrou bem nos claros finaes da fua eterna predeílinaçaõ ; porque aca- bou a vida na Cidade de S. Luiz no mefmo dia do San- to do feu nome , o grande Pontífice , e Doutor da Igre- ja , a quem dedicou fempre efpecialiffimos fervores da fua devoção. 1 3 <5i Sentio até a alma eíle fatal golpe a Capitania do Maranhão ; e paíTando logo à do Pará as informa- ções delle , fe fez geral a dor em todo o Eítado $ de- monílrações fem duvida juftiííimamente merecidas do exemplar zelo , com que empregou fempre as robuítas forças do virtuofo efpirito no feu apoftolico miniílerio» 1 362 Ao Governador , que continuava a fua aífif- tencia na mefma Cidade de Belém , coube grande parte nefte fentimento ; mas para confolallo , fe foube refi- gnar na vontade Divina : e procurando fempre a imita- ção do feu anteceífor Gomes Freire de Andrade , co- mo bom difcipulo da fua difciplina , cada dia davaõ mais verdadeiras provas da docilidade do natural a mef- ma inteireza da fua juftiça , com huma fatisfaçaõ do Eftado, que também empenhando os agradecimentos , multiplicava todos os inftantes os elogios do feu nome. 1363 Sem outra memoria, que com razaõ fe nos recommende , entrou o novo anno de- 1.6 9.0. 3 mas con- Anno 1690. Llíl tinuando . ;; 634 Annaes Hiftoricos Anuo 1690. tinuando no mefmo íilencio até a chegada das embarca- ções , o rompeo a noticia de fer promovido o Capitão mor do Graõ Pará António de Albuquerque ao gover- no do Eftado : e fazendo-lhe delle folemne entrega Ar- tur de Sá de Menezes no dia 17 de Mayo , deixou efte Fidalgo todos aquelles moradores taõ merecidamente faudofos da fuavidade , com que difpunha fempre da fua obediência , que fe as efperanças do fuccefíbr , fe- guradas já nas experiências próprias , lhe naõ ferviíTem de defafogo , o encontraria com difficuldaxie a fua juíla magoa. 1 5 64 Nos primeiros anhos da fua mocidade , havia paflado António de Albuquerque ao Maranhão na com- panhia de feu pay , ( também do mefmo nome f e ap- pellidos ) que hia governar aquclle Eftado , do qual voltou para Portugal na mefma companhia j e tornan- do a elle na do Governador Ignacio Coelho da Silva , affiftia ainda naquellas Conquiftas com a dependência das Capitanias de Tapuytapera , e Camutá , de que feu pay era Donatário , quando recebeo a nomeação de Ca- pitão mor do Graõ Pará , como já fica referido 5 exercí- cio fem duvida, em que foube dar taõ evidentes provas da fua grande capacidade , que o habilitarão para o no- vo emprego. 1365 Dentro de pouco tempo pausou k Cidade de S. Luiz , onde nomeou na occupaçaõ de Capitão mor do Graõ Pará ( que fe achava vaga pela promoção da fua peífoa ) a Hilário de Soufa de Azevedo ; e toman- do efte a fua poíTe no dia 27 do mez de Agofto , achou geraes applaufos naquelles moradores , juftiffimamente merecidos : ultima memoria do prefente anno , que pof- fa demandalla. Anno 169 1. 1366 Na nova fucceífaõ de 169 1 fe detinha Antó- nio de Albuquerque no Maranhão , embaraçado com as dependências da Capitania j mas fendo -lhe precifo voltar do Eftado do Maranhão , Liv. XIX. 6 $ f voltar à do Pará , para a expedição dos navios do Rei- Armo 1691* no , chegou à Cidade de Belém no mez de Fevereiro : e achando ainda o feu anteceííor Artur de Sá efperando monção , fe aproveitou eile da mais favorável já nos úl- timos dias do feguinte Março , avivando mais as fauda* des da fua companhia a feparaçaõ delia* • 1367 Como o Governador , logo que nomeou O an* no paííado a Hilário de Souía no emprego de Capitão mór do Grão Pará , deu co*ita a Corte defta eleição f reconhecendo-a elle por acertada , a confirmou por Pa* tente Real , que fe regiftou no Senado da Camera em 4 de Junho ; e António de Albuquerque dentro de vin- te dias paíTou outra vez ao Maranhão, com razão fa- tisfeito do digno fubítituto , que lhe ficava na Capita- nia. . : 1568 Tinha de novo íuccedido no governo da Ilha de Cayena ( colónia de França , que confina com a do GraÓ Pará > como já fica referido ) Pedro de Ferrol > Official de muita diftinçaô , principalmente pela capaci« dade : e querendo logo aproveitarfe delia nas diligen- cias de alargar o dominio da fua Coroa , efcreveo a An* tonio de Albuquerque fobre a declaração dos limites de ambas , pretendendo que foíTe a fua verdadeira de- marcação o grande rio das Amazonas , já com o proje- cto , de que lhe pertencia toda a parte do Norte , e a Portugal fó a do Sul. . 1369 Na Cidade já de S. Luiz ouvío António de Albuquerque efta pretençaÔ de Monfieur de Ferrol 5 mas conhecendo bem os fundamentos frívolos com que queria authorizalla , lhe refpondeo ainda com a acerta- difíima politica , de que a decifaÔ delia , com a de ou< trás mais que também lhe propunha , tocava aos feus Príncipes depois de informados com a legalidade , que era precifa , e que a elle fó a confervaçao daquelle go* verno nomefmo eftado, em que fe lhe entregara , eo ). Llll ii ti- V 6]6 Annaes Hiftoricos Anno 1691. tiveraô fempre os feus anteceífores , que comprehen- dia fem a menor duvida huma , e outra banda do mef- mo rio das Amazonas com os feus vaftifíimos Certões. 1570 A muita força deíles argumentos fufpendeo o orgulho do Governador Monfieur de Ferrol , naõ fe atrevendo a paíTar a diante na perigofa pratica de retor- quillos com as razões da guerra , fundamentalmente te- merofo da forte oppoílçaõ , que já lhe ameaçava a conf- iante repofta de António de Albuquerque 1 porém dei- xando adormecer o feu vivo cuidado com o longo filen- cia de féis annos , tomou entaõ mais feguras medidas , ou menos arrifcadas , no ambiciofo projeâro das mefmas pertençòes , como veremos bem na ordem das memo* rias. 1 3 71 Sem novo accidente , em que perigaíTe a fau- Ann.01692. <íe publica, fuccedeo o anno de 1692 -> e o Governa- dor , que fe achava ainda na Cidade de S. Luiz , paífou à de Belém para as afliftencias da expedição dos navios do Reino 5 mas brevemente defobrigado delia , voltou outra vez para o Maranhão em 16 de Agofto , já como a efperar o feu fucceíTor : porém as duas Cameras , que reconheciaõ o feu grande zelo nos communs intereííes de todo o Eftado , pedirão a EIRey nefta mefma mon- ção a prorogaçaõ do feu governo por tempo mais lar- go: e fem outra memoria, que poífa merecella , teve principio, efim o prefente anno. Anno 1693. 1 37 2 Entrou a nova fucceíTaõ de 1695 ; e na mon- ção dos navios do Reino fe viraõ fatisfeitas as efperan- ças dos moradores do Maranhão ; porque fabendo a Corte , que na attençao das fuás mefmas fupplicas fe intereífava muito o Real ferviço , naõ fó reconduzio a António de Albuquerque no governo do Eftado ; mas para lhe dar mais evidentes provas , de que reconhecia o feu merecimento , acompanhou também efta mercê huma generofa ajuda de cuílo. Neíle do Eflado do Maranhão , Liv. XIX. 657 1373 Nefte mefmo armo , já nomez de Novem- Anno 1693. bro , chegarão aoEílado do Maranhão nove Religio- íbs da Província Capucha deNoíTa Senhora da Pieda- de com a vocação de Mifíionarios daquelle gentilifmo 5 porque ainda que a muita Cbriílandade do Senhor Rey D. Pedro II. havia mandado fabricar hum Hofpicio jun- to da Fortaleza do Curupá , para a commodidade de ftuma nova MiíTaõ de Capuchos da Arrábida , ou Car* melitas Defcalços > efcolheo agora os da Piedade : e naÒ achando eíles acabada a obra , Manoel Guedes Aranha > Capitão mor da mefma Fortaleza , que tinha nella nu- mas boas cafas , lhas deu liberalmente para fe recolhe- rem. 1574 Sem outra memoria , que juílamertte poíTa merecella , iuccedeo o anno de 1694 j e no dilatado Anno 1694. tranfito delle , naõ defcobre também a minha diligencia mais que a da falta de embarcações de Portugal , que era já taõ feníivel a todo aquelle Eílado , que até para o fanto Sacrifício da MiíTa fe naõ achava vinho. 1 37 £ Seguio-fe a fucceíTaõ de 1695 com quaíl igual Anno 1695** penúria , ainda que chegarão dous navios do rio de Lif- boa j porque como hiaõ mais a bufcar fretes , do que a levar os géneros , de que careciaõ aquelles moradores , pouco remediarão as neceííidades , que padeciaõ : e ao mefmo paíTo também continuando a eílerilidade de no- ticias , fe achaõ fem emprego as recommendaçoes das minhas memorias. 1376 Entrou o novo anno àe\6<)6) epaffando ô Anno 1696, Governador da Capitania do Maranhão para a do Graõ Pará com a refoluçao de examinar com os feus mefmos olhos os vários Certões do Cabo do Norte , e famofo rio das Amazonas , depois de lhe chegar na monçaõ do Reino todo o fornecimento , de que neceííitava aquelle Eílado , fahio da Cidade de Belém em 9 de Dezembro com huma grande Armada de canoas , que feguida logo do i'\V 658 Annaes Hijloricos do Capitão mor Hilário de Soufa com hum bom refor- ço , ficou encarregada a Capitania ao feu Sargento mói: Joíeph Velho de Azevedo. 1377 Entre os marciaes cílrondos defta expedição i Anno 1697. fuccedeo o anno de 1697 5 e depois de avançalla o Go- vernador pelo grande rio das Amazonas , fem occafiaô alguma , que fe faça digna de efpecial memoria , fe achava já de volta na Fortaleza do Curupá mal conví- lecido de huma doença ^iguda , que ameaçando-lhe o perigo de vida , lhe embaraçou os adiantamentos da fua jornada, quando padeceo outro novo accidente na fen- fivel perda do Capitão mór do GraÓ Pará , que faleceo na mefma Fortaleza de huma cruel maligna. » 1578 E (limava muito o Governador a Hilário de Soufa de Azevedo pelas fuás virtudes ; mas quando a fua falta com razaõ occupava todo o feu fentimento , o acometteo outro , para tirar fem duvida as ultimas pro- vas das forças do íèu animo j porque nos fins de Mayo recebeo a noticia , de que o Governador da Ilha de Cayena Moníieur de Ferrol ( já com o titulo de Mar- quez do feu mefmo appellido ) fiando fó do direito das armas o feliz fucceífo das fuás antigas pertenções , na extenfaõ de domínio havia invadido ( debaixo da paz , aleivofamente fegurada com a bandeira delia ) a Forta- leza do Cabo do Norte da invocação de Santo António de Macapá. 1379 Sendo Capitão mór do Graõ Pará tinha fun- dado efta Fortaleza António de Albuquerque no anno de 1688 fobre as ruinas da de Camaú, que feu tio Feli- ciano Coelho, de Carvalho havia demolido 110 de 1632 , depois de tomalla vaíerofamente aos Inglezes , como já fica referido : e como além das obrigações de General do Eftado concorria nelle huma circunftancia taõ ef- pecial para fazer crefcer o jufto fentimento de tamanha perda, chegando à fua prefença , acompanhado da guar nicaõ do EJlado do Maranhão, Liv. XIX. 6 3 9 niçaõ rendida , o Commandante delia Manoel Peftana Anno 1697. de Vafconcellos foy recebido com muito defagrado , por fe achar já com as verdadeiras informações, de que a entregara ao Marquez Ferrol fem difparar huma arma, antecipando-felhe o conhecimento da fua aíeivoíia» 1380 Por huma larga Carta defculpava o Franccz eíla invafaõ , com os falfos pretextos de fe achar fituada aquella Fortaleza dentro dos limites da Tua Colónia , co* mo muitas vezes tinha infinuado \ porém António de Albuquerque eftimulado de tao juíla vingança , difpon- do-a logo com militar efpirito , a encarregou a Francis co de Soufa FundaÕ , Official de bom nome , ainda que aííiftido fó do pequeno corpo de cento e feíTenta Solda-» - dos , e cento e cincoenta índios , todos frecheiros , e dos mais bellicofos. 1 5 8 1 Mas ao mefmo tempo para melhor fundar a inteireza do feu procedimento , afTeou o do Marquez Ferrol pela repofta da fua Carta , em que também lhe declarava , que fe continuando na aleivofia , com que havia occupado aquella Fortaleza de EIRey de Portu* gal , quizeíTe confervalla , lhe iria pedir peílòalmente a reílituiçaõ com as razões da guerra , que fendo as mais íiimmarias , eraõ quafi fempre as mais attendidas : e re- forçando dentro de poucos dias o deílacamento deFran- cifco de Soufa ? fe recolheo ao Pará para poder dar as promptas providencias , de que neceííitava para a mef- ma empreza. 1382 Francifco de Soufa , que era mais filho do va- lor , que da difciplina militar , marchou a toda a dili- gencia fobre Macapá ; e tomando huma Ilha , que lhe fica defronte , fe podou logo a tiro de canhão de arti- lharia , coberto da mefma pelo beneficio de denfos ar- voredos : porém com tal defordem , que fe os France- zes foubeííem obfervalla , feria furprendido dentro de poucas horas , fem que neceííitaíTem de mais forças , ' m M 640 Annaes Hijloricos •AÍH101697. que as da Tua mefma guarnição, que fe compunha fó de quarenta Soldados. 1383 Na enfeada da mefma Fortaleza vio huma canoinha de pefcar , que era o remédio único dos inimi- gos para qualquer avifo , e ainda o principal para a fua natural íubíiítencia 5 e querendo elle tirarlhes tudo pa- ra os reduzir a apertado bloqueyo , propoz efta acção aos reformados , que levava comílgo : mas quando ne- nhum fe refolveo a intentalla pelos perigos delia , a of- fereceo ao Soldado Miguel da Silva , que defprezando todos , prudentemente lhe refpondeo , que fe naõ tinha convidado , porque fó fabia obedecer. 1584 DiíTe-lhe entaô Francifco de Soufa , que ef- colheíTe todos os companheiros, que lhe pareceífem ne* ce/Tarios -, mas também declarando , que fó a fua vida arrifcaria naquella empreza. Entrou logo nella com hum arroj amento taô deftemido, que até pafíbu a te- merário j porque na luz mais clara daquelle mefmo dia fe lançou a nado , e fazendo preza na tal embarcação^ a conduzio para o alojamento por meyo de hum chu- veiro de balas , taô favorecida da fortuna a valentia do feu animo, que fervio fó aos Francezes todo aquelle fogo de deixar ainda muito mais ruidofos os applaufos da acçaÔ. 1385 Conheceo logo Francifco de Soufa a confter* naçaõ , em que fe achavaô os inimigos ; e lifongeado do favor da fortuna , a quiz pôr ainda em mayores em- penhos ; porque paíTando arrebatadamente à terra fir- me , pofíou a fua gente a tiro de piftola da mefma For- taleza , fó com a defenfa das fracas paredes de huma pe- quena cafa de olaria , que fe confervava para as fuás obras , e fem mais inílrumentos para a expugnaçaó , que as armas ordinárias de taô poucos Soldados. 1386 Tinha elle ordem do Governador , para que precedei!!; a toda a operação aremeíTa da Carta, que leva- do Eflado do Maranhão , Liv. XIX. 64. i levava para o Marquez Ferrol , que hia encaminhada Armo 1697, ao Commandante da mefma Fortaleza , por querer An- tónio de Albuquerque com militar politica juíliíicar mais eíle movimento ; mas culpavelmente defattenden- do a obrigação , em que fe achava , paíTou a tanto a barbaridade da fua difciplina , que recebendo hum pe- queno fòccorro, de que era Cabo Joaõ Moniz de Men- doça , Soldado valerofo, tratou fó do proje&o de ef- calar as muralhas. 1587 Neíla temerária refoluçaô difpoz a fua gente para hum aíTalto , que executou logo com cega obediên- cia j mas no principio delle perdendo dous Soldados man- dava tocar a recolher com igual defordem , quando Joaô Moniz, que tinha tomado huma das portas com valor deftemido , lhe diíTe com o mefmo , que já naõ era tem- po de deíiítir da empreza , em que os havia pofto o feu defatino ; porque a retirada ficava íendo muito mais pe- rigofa , principalmente para a opinião da honra , que fe devia preferir a tudo : e aííiftido também da paixão da fortuna eíle arrojamento taó formofo , fem outras novas provas, fe rendeo aquella guarnição com a mercê das vidas depois de perder onze , devendo-fe fem duvida a mayor parte da gloria deíle dia às militares reflexões ,■ e conílancia de animo de JoaÕ Moniz de Mendoça. 1588 Depois da expedição do Macapá, juftiffima- mente cuidadofo delia , navegou António de Albuquer- que a toda a diligencia para a Cidade de Belém ; e con- cluindo a fua viagem no dia 10 de Julho , entrou logo na difpofiçaõ dos mayores esforços, que p o de íTem ca- ber nos da Capitania , para fegurar com a aífiílencia da fua peífoa a felicidade do fucceífo 5 mas era tal a fua fortuna , que quando avifava a Portugal da invafaõ da- quella Fortaleza , recebeo a noticia da fua gloriofa ref- tauraçao , defy.e também deu conta pelos mefmos na- vios , e a guarnição rendida a mandou promptamente Mmmm ao I 642 Annaes Hifioricos A111101697. ao Marquez Ferrol, juítifícando bem o procedimento das armas Portuguezas na femrazaõ das fuás. 1389 Ficou guarnecida a Fortaleza dos feus vale- rofos reftauradores ; mas o grande cuidado do Gover- nador fe naó fatisfez fó defta forte defenfa ; porque pa- ra melhor feguralía , pelos naturaes meyos da boa difci- plina , encarregou logo a fua prompta reedificaçaô ao Sargento mor Jofeph Velho de Azevedo , que exerci- tava o mefmo poílo no minifterio de Engenheiro da Pra- ça de Belém: e fahindo delia dentro de poucos dias , deu cabal cumprimento às ordens , que levava ; ultima memoria militar na formalidade , com que efcrevo. 1590 Noanno de 1691 tinha fido eleito digniííimo Bifpo do Eftado do Maranhão o Meftre Fr. Francifco de Lima , Religiofo Carmelitano, de tantas letras , co- mo virtudes ; porém promovido para a Diocefi de Par- nambuco , fubítituío o feu lugar o Meítre Fr. Timo- theo do Sacramento , da fagrada Ordem do Eremita S. Paulo , também já nomeado para a Ilha de S. Thomé : e chegando à Cidade de S. Luiz nos penúltimos dias do mez de Mayo defte prefente anno , fez nella a fua en- trada publica em huma das Oitavas do Efpirito Santo. 1391 Quando o Governador fe recolheo à Cidade de Belém do Pará da fua jornada do grande rio das Ama- zonas , achou efta noticia ; e ainda que o Bifpo o naò informou delia y como eftava obrigado , lhe efcreveo lo- go ao Maranhão , e o mandou vifitar por hum Official de Guerra , dos da fua primeira eftimaçao , com as ex- prefsões mais refpeclivas ; porque naõ fe podendo du- vidar das attençÕes , que fe lhe deviao pelas preeminên- cias do feu alto caracter , as quiz fujeitar todas em ob- fequio da Igreja , para lhe poder dar as innegaveis pro- vas da fldeliffima devoção , que lhe profeífava. 1392 Pagados poucos mezes entroiT^fte Prelado em Viíita geral ; e procedendo nella com huma tal irregu- laridade , do EJiaâo do Maranhão , Liv. XIX. 643 laridade , que fem formar proceíTos , nem admittir de- Anno 1697. feza aos fecnlares , ainda culpados no primeiro lapíb de concubinato , os prendia na cadea publica , com con- demnaçoes pecuniárias as mais exorbitanres. Foraõ tantos os clamores dos povos , que chegando aos ouvi- dos do Governador , folicitou prudentemente por algu- mas politicas iníinuações o feu melhor remédio ; mas logo conhecendo , que a cuidadofa applicaçaõ delle ío lhe fervia de infentivo , por fe lhe repetirem as mcfmas queixas com exprefsões mais vivas , determinou entaõ , que fe bufcaííe nellas o natural recurfo , que fe lhes per- mittia pelas Leys do Reino. 1595 Com tudo na nova fucceíTao de 1698 efpera- Anno 1698* va ainda António de Albuquerque fe reduziíTe o Bifpo à moderação devida , virtuofamente convencido de tao juftos clamores j mas eíles repetindo- felhe com mayor íèntimento , fe achou obrigado a defpedir o Ouvidor Geral Mattheus Dias da Cofia para a Cidade de S< Luiz, entendendo com prudente difcurfo, que ou a fua grande capacidade remediaria tudo por meyos urbanos , ou fe foífem elles infru&uofos , pelos da juíliça , no re- curfo prompto do Tribunal da Coroa , de que também era Juiz, ficando fegurado por qualquer dos caminhos o focego dos povos. 1 5 94 Com efta dependência chegou ao Maranhão o Ouvidor Geral 5 e achando nas mefmas vexações as partes queixofas , depois do provimento , que já tinhaõ tido no Juízo da Coroa , efcreveo logo a requerimento do Procurador delia , primeira , fegunda , e terceira Car- ta ao Bifpo , pedindo-lhe ainda com as attençoes , que fe deviaÔ ao feu caracter , que quizeífe íbltar todos os criminofos do primeiro lapfo , ou IheremeteíTe os pro- ceífos das culpas , como difpunha o feu Regimento ; mas defattendidos taõ reverentes termos já com efcan- dalofa incivilidade , fe vio obrigado eíle Miniílro à Mmmm ii man- ! >.<■ • 644 Annaes Hiíloricos Anno 1698. mandar pôr na fua liberdade os prezos opprimidos. 1395 Inftou logo o Bifpo pela repofiçaÕ , commi- nando cenfuras ; e paflado o termo peremptório fem fer obedecido , declarou o Ouvidor Geral por excommun- gado , e incurfo também na Bulia da Cea : porém elle, que obfervando bem os apreíTados paíTos , com que ca- minhavaõ as impaciências daquelle Prelado , tinha já prevenido eíle mefmo accidente. Appellou a tempo da declaratória perante o Padre Fr. António do Calvá- rio , actual CommiíTario da Provinda Capucha de San» to António : e vendo o Bifpo , que efte jurídico diícur- ío fufpendia neceíTariamente os feus procedimentos , naÔ fó fe naô abfteve , mas provocado mais da paixão dominante das fuás afperezas , continuou com mayor precipício na reaggravaçaÕ das mefmas cenfuras até a de hum geral , e local interdição. 1 3 96 Pedio logo o Ouvidor Geral auxilio militar ao Capitão mor Joaõ Duarte Franco , que governava a Capitania , e poz o Bifpo em cerco 5 mas conhecendo bem , que para obrigallo à moderação devida lhe ficava inútil , porque os Soldados por refpeito reverenciai fe nao atreviaõ a opprimillo , paíTados dous dias o reduzio a entaipamento , pregando-lhe as portas. 1 3 yj Vendo-fe entaõ efte Prelado na confternaçao a que culpavelmente fe tinha conduzido , levantou as cenfuras , e logo o cerco o Ouvidor Geral , ajuftados ambos a que fe fubmetiaõ a decifaô da Corte : e reme- tendo para Portugal todos os documentos , que lhes pa- recerão neceífarios , fe reílituío tudo ao antigo focego. 1398 Satisfeito das fuás acções, por julgallas em tudo juftificadas , voltou o Ouvidor Geral Mattheus Dias da Cofta para a Cidade de Belém do Pará 7 onde frequentou , como coftumava , affim os Sacramentos da Penitencia , e Euchariftia , como a affiftencia do culto Divino j e enfermando perigofamente , naô fó fe con- feíTou do Eftado do Maranhão , Liv. XIX. 64 5 feíTou a hum Religiofo da Província da Piedade de vir- Ànno 1698* tuoía vida , mas também recebendo o Senhor por Via- tico da maõ do Vigário da Matriz , lhe declarou na- quelle mefmo adto , que íbbre as controverfias , que ti- nha tido no Maranhão com o Bifpo do Eftado , efpera- va reíbluçaõ do Reino muito a feu favor $ porém fe fe julgaífe , que obrara com exceíTo , fendo neçeíTaria fa- tisfaçaõ particular, ou publica, a déíTe em feu nome, como feu Pároco que era ; o que também recommen- dou ao feu Gonfeífor com a mefma efficacia , accref» centando nella , que para a pena pecuniária , quando fe lhe impozeíTe , hypothecava toda a fua fazenda. 1 599 No dia feguinte tomou o Sacramento da Un- ção da maõ do Coadjutor da mefma Matriz 5 e efpiran- do com as mais catholicas demonftrações de hum verda- deiro arrependimento, duvidarão algumas peííbas (fen- do huma delias o mefmo Vigário , que lhe tinha levado o Viatico) fe juftamente felhe podia dar ecclefiaflica fepuítura : mas convencidos todos os reparo? , acom- panharão o feu cadáver à Igreja de Noífa Senhora do Monte do Carmo os feus Religiofos , os de NoíTa Se- nhora das Mercês , e o Coadjutor com mais alguns Clé- rigos ; e armado Cavalieiro da Ordem de Chrifto , era que era profeíTo , foy fepultado em 5 de Setembro com as folemnidades , de que ufa a Igreja em femelhantes a&os , deixando na memoria daquelles moradores hu- ma viva faudade. 1400 Sem outra novidade , que fe nos recommen- de , fe feguio o anno de 1699 , e natural fucceíTaõ dos Anno 1699» dias a repetição de fatalidades cm todo o Eftado do Ma- ranhão ; porque na Capitania de S. Luiz foy tal a falíl- dade dos Cahicahizes , Tapuyas de corfo , com outras naçõas da fua alliança , que confervando huma conti- nuada correfpondencia com os fenhores de hum enge- nho de aífucar , fituado nas terras do rio Mony , entra- ..' « mt a rao ■ 646 Annaes Hijloricos Anno 1698. raõ hum dia , dos do mez de Março , na mefma fazenda com a coílumada familiaridade ; mas taõ traidoramente prevenidos para as ultimas provas da brutalidade do feu animo , que ao mefmo tempo , que abraçavaõ alguns a taõ fieis amigos , outros pelas efpaldas lhes defcarrega- raõ taõ pezados golpes nas cabeças , que naõ neceííita- raõ da repetição para o triunfo bárbaro da fua aleivoíía : e paíTando efta muito mais a diante, naõ fó infultaraõ a innocente vida de huma filha fua , que eílava ainda nas mantilhas , mas com ella também as de mais de no- venta peflbas , que fendo muita parte do feu próprio fangue , mais irracionaes do que as mefmas feras , lhes naõ valeo eíTe privilegio. 1401 A infelicidade, que chorou o Pará foy tam- bém pouco menos feníivel 5 porque navegando da Ci- dade de S. Luiz para a de Belém Joaõ de Vellafco Mo- lina ; que levava do Reino o emprego de Capitão mor da Capitania , naufragou nos baixos da fua mefma bar- ra: e ainda que venturofamente falvou a vida com mui- tas mais peííbas , fe perderão as de vinte e fete , além do navio com t,oda a fua carga 5 porém Joaõ de Vellaf- co , que chegou à prefença do General do Eftado na ultima pobreza , foccorrido logo da generofidade do feu animo , entrou na poíTe da fua occupaçaõ , e exer- cício delia em 20 de Julho. ANNAES Ó47 9&9L &3m -gsv sjm -<%* \m wm ANN AES HISTÓRICOS DO ESTADO DO MARANHÃO- LIVRO XX. SUMMARIO. HEGA a decifao das contendas do Bifpo , e II entra elle em novos excejos , de que fe feguem grandes perturbações a todo o Ffiado. Impa- ciente , pajfa a Portugal , e o Governador da Cidade de Belém , onde já fe achava , par a adeS. Luiz.y Çhega-lhe licença para pajjar ao Reino ; e ofeu Lugar- Tenente Fernão Carrilho je encarrega do governo do E fi- tado. RefoluçaTo ultima fobre as controverfias do Bifpo D. Fr. Timotheo do Sacramento. Succede no governo geral D. Manoel Rolim de Moura. Ofeu elogio. Suf- pende o Ouvidor Geral Miguel Monteiro Bravo de todos os cargos , que fervia ; e a razaÕ dejle procedimento. Re- cebe avifos da declaração de Portugal contra as Coroas de Cajlella , e França 3 e difpoem o E/lado para a oppoft- qtío ' 1 U ■ *WÊk 648 Annaes Hifioricos çdo das fuás armas. Chega-lhe ordem da Rainha da GraÚ Bretanha , que o depõem do governo , encarregando-o ao Çapitaó(^orjoaè de Vellafco Molina. Paffa ao Mara- nhao D. Manoel Ro/im , e o Capitão mor JoaÓ de Vel- lafco , com os avifos de f alfas novidades , faz a mefma jornada dentro de poucos mezes. Chega a Cidade de S. Luiz ; e fuggerido dos mal intencionados ? executa Ioga diferentes defordens. Sue cede no governo doEJladoo Senhor de Ranças Chri/iovaÕ da Cofia Freire. Ofeu elo- gio: Paffa com ofeu anteceffbr D. Manoel Rolim para a Cidade de Belém , onde he recebido com grandes ap- plaufos. Recolhe-je para Portugal D. Manoel Rolim. Entra o Governador na execução de varias ordens com grande fentimento dos moradores do Pará. Parte para a Cidade de S. Luiz , e dentro de féis mezes torna a voltar para a de Belém. Recebe avifos de vários armamentos dePrincipes da Europa, efe prepara para a oppojiçaõ. Chega-lhe a noticia da paz de Portugal ; e menos cuida- dofo na defenfa doEjlado 7 forma huma grande Tropa pa- ra o cajligo do Gentio de corfo. O fucceffo delia. Paffa da Cidade S. Luiz par a a de Belém , e torna a voltar pa- ra o Maranhão 1 . Chega a Cidade de S. Luiz com afa- grada dignidade de Bifpo do Ejlado D. Fr. Jofeph Del- garte. Paffa ao Para , onde he recebido com univerfaes acclamaqúes. Faz a mefma jornada o Governador. Sue* cede no governo geral Bernardo Pereira de Berredo. Anno 1699. I 4 02 ESTADO do Maranhão de- pois de fentir nefte prefente anno as infelicidades , que R- caõ referidas no Livro ante- cedente , teve novos motivos para as fuás defconfolações ^ com achegada da refoluçaõ das contendas do Bifpo com o defunto Ouvidor Geral Mattheus i do Eftado âo Maranhão \ Liv. XX . 649 Mattheus Dias daCoíla 5 e como o golpe penetrava Annolé^. até a alma , na mortificação das confciencias, foy a doe, mais a&iva. 1403 Declarava EIRey àquelle Prelado o defpra* zer , que tinha recebido de humas taes noticias , por lhe conftar delias : Que prendera na cadea publica as pejoas leigas fem lhes guardar o direito natural jj pedindo para omefmo efeito auxilio de braço fecui r ar , que com igual de/ordem lhe for a concedido , no aue nWo Jo obrara com notória violência contra os j eus vajallos /mas também ufurpando a authoridade Regia. Que para amontoar os. feus excejfos , havendo recorrido as partes aggravadas av Juízo da Coroa , como pela Ley lhes era permittido , ne- gara os autos , que urbanamente Je lhe pedirão , quando nao devia , nem podi afazei lo , pois os davad todos os Jui- zes Ecclefiajiicos , para que examinada a verdade deUes % fe adminijlrar jujliça ; embaraçando por ejle me$o as dif- p oficies daquelle Tribunal, ereóío nos feus Reinos para defenfa natural dos vajallos nas vexações dos Ecclefiajii- cos , e ainda para recurfo dejles , dando aquelle feu menos jujljficado procedimento occafao também a outros feme- lhantes , nos que tivera o Ouvidor Geral com ajuafagra* da dignidade : e porque fendo humas , e outras acções cheyas de erros , necejfitavao de remédio prompio , afim para o prejente , como para o futuro , lhe ejlranhav a mui- to o ter dado motivo a perturbações t ao efcandalofas , en- commendando-lhe , que dalli em diante Je abjiivejfe delias, nao excedendo ajurifdicçao dos /agrados Cânones , Con« cílios , e Concordatas j e que as peffoas , que ejlivejfem prezas y as mandaje logofoltar-, porque na fuaretençaa fe continuava a mefma força. \' 1404 Mas para moftrar ao meímo tempo , como Rey taõ Catholico, a inteireza da fua juftiça, ordenou também ao Governador : Que chamajfe logo a fua pre- fença o Ouvidor Geral , e mais Adjuntos , que tinhao con* Knnn eorrid® 6jo Annaes Wfloricos ÍÍ1MQ1699. corrido para aquellas defirdens , e os reprehendejfe feve- ramente dafua parte 7 declarando-lhes , cjue fe dava deU les por muito mal fervido 5 pois ainda no cafo deferem as cen furas menos jufiificadas r nunca fe podia proceder com tanta afpereza contra qualquerjimplez Sacerdote , quanto mais com hum Bifpo j agrado y porque as leys das tempo- ralidades naò permittiad tanto : em cujos termos , os mef- mos Minifiros incurfos nas, cen furas lhe fojem pedir abfol- vicdó com toda a humildade , e com a mefma aceitaffem to~ dos as fuás penitencias. 1405 Aviíbu de tudo aquelle grande Príncipe ao mefmo Prelado ; mas também declarando-lhe : Se hou- veje tao moderada , e prudentemente , que parecefe fò Pajlor y applicando as fuás ovelhas aquel la medicina ef- piritual f que para afaude lhesfoje necejaria , enaoas penas , quepodejem parecer cajligos para a vingança da paixão do animo , devendo fempre ter attençaú a dignida- de dos Magijirados 5 porque quanto foje mayor afua quei- xa, tanto mais louvável , e vir tuof a ficaria fendo afua temperança. 1406 A copia da Carta, que continha com eílas outras muitas catholicas advertências ? mandou também EIRey ao Governador, que fe achava ainda no Pará, donde partio com muita brevidade para o Maranhão : e fazendo-fe publica , como era preciíb para a geral fatif- façaõ do efcandalo , quando ficarão todos aquelles mo- radores verdadeiramente edificados da ília inteireza 5 o Bifpo , que pela pureza do eftado devia fer o mais enter- necido , foy ío o obftinado ; fervindo-lhe humas tao vir- tuofas difpoíições de fogo tao adivo , que fez rebentar logo a mina do feu ódio ; porque irritado elle , de que hum homem , a quem havia mandado publicar por ex« commungado lograíTe ecclefiaftica fepultura (que era tao entranhavel a fua paixão , que paflava além delia ) logo que recebeo a refoluçao de Portugal , attendendo fó rx do Ejlado do Maranhão , Liv. XX. 651 fó àquella parte , que comprehendia a validade das fuás Anno 1699. cenfuras , com diligencia a mais eftranhavel , expedio huma embarcação muito ligeira para a Cidade de Belém com huma Paftoral , que leu o Vigário da Matriz em 26 de Julho 7 na qual notificava ao Vigário Provincial , ao Prior , e mais Religiofos do Convento do Carmo : Que dentro de três dias ( que lhes afinava pelas três ca- nónicas admoejlaçoes ) fe abjliveffem da celebração dos Officios Divinos > fechando as portas da fua Igreja , por fe achar polluta com o corpo do Ouvidor Geral Mattheus Dias da Cojla , e as fitas ovelhas , que ndô entrqffem neU la t aliás procederia contra todos. 1407 Obedecerão os Religiofos , como humildes filhos da Igreja , fechando a fua antes do termo perem- ptório j mas recorrerão logo ao mefmo Prelado por hu- ma petição ; com as juíiificadiMimas razoes do feu pro- cedimento , requerendo-lhe , que em virtude delias os quizeíTe livrar da penofa defconfolaçaÔ daquelle inter-» diclo, ou fe lhes déíTe vifta do procedo da Paftoral f fufpenfa a fua execução j pois fe tinha nella proce- dido contra o direito natural pela notória falta de ci- tação. 140? Para a afMencia deite recurfo mandarão tam- bém procuração baflante ao Prior do feu Convento da Cidade de S. Luiz , que bufcou logo o Bifpo , mas ef« cufou-fe elle de lhe fallar : e repetindo a mefma diligen- cia fem melhorar de fruto , entregou a hum criado feu o tal requerimento , que depois de fe parlarem alguns dias , teve efte defpacho: ¥açaõ petição em forma > ©V* c no principio delle ? onde hia ; Keverendifimo Senhor f como era coftume , rifcou o adje&ivo^ 1409 Fez-felhe fegunda petição , em que fe moftra- : va y que a primeira eftava em forma ? e levava fó o fu- premo titulo de Senhor 5 porque como elle refervou ef- te , fundamentalmente fe entendeo lhe era mais agrada- Nnnn ii vel \ > 652 Anhaes Hifloricos I Anno 1699. vel ; mas experimentou a meíma fortuna nas defatten- çoes das Tuas afperezas. 141 o Conheceo entaõ o Prior do Carmo deites defpachos ta5 irregulares , que fó fe encaminhavaõ à vexação dos feus Religiofos j e recorrendo logo para livrallos delia ao Juízo da Coroa, comotaô competen- te no preíente cafo , fabido pelo Bifpo , mandou notifí- calío , para que no termo de três quartos de hora deíif- tiífe daquelle recurfo , aliás o declararia , e aos feus Conftituintes por incurfos em huma cenfura Papal j o que cumprio bem , pafíado o mefmo termo , com as ex- communhões de Clemente VIII. , de Martinho V. , e da Bulia da Cea. 1411 Vendo-fe o Prior naquella oppreíTaÕ , para fe livrar da manifefta força , que fe lhe fazia , acudio tam- bém ao Commifíario Provincial de Santo António dos Capuchos Fr. Manoel de S. Boaventura, ( fucceíTor já de Fr. António do Calvário ) que tinha tomado anteci- pada poíTe de íeu Juiz ConfervadOr na mefma Cathe- dral , perante o Vigário Geral , e mais alguns Clérigos com a devida folemnidade ? o qual mandou logo notifi- car o Bifpo,. para que defiftiííe daquellas vexações : e naô querendo obedecer com o pretexto de que era nul- . la a eleição para o minifterio de Confervador , proce- deo efle contra elle na forma de direito até a cenfura de interdi&o 5 de que irritado o Bifpo , declarou também o Confervador por excommungado , com o fundamento de que lhe perturbava a fua jurifdicçaõ Ordinária. 141 2 Foy queflaõ muito debatida, fe o Prior do Carmo do Maranhão , em nome dos feus Conftituintes do Pará , devia recorrer ao Juízo da Coroa no cafo pre- fente : fe o Bifpo podia publicar o Prior , e feus Conf- tituintes por excommungados , por terem bufcado aquel- le recurfo : fe.a eleição, e nomeação , que fez o Prior de feu Confervador na peííoa do Commiífario Provin- cial do Ffíado do Maranhão , Liv. XX. 6 f j ciai de Santo António, tinha fido valida : íe o Bifpo fí- Anno 1699. cou verdadeiramente excommungado pelo mefmo Juiz Confervador $ e fe as cenfuras , que o Bifpo fulminou contra ellc com o pretexto de lhe perturbar a íua jurif* dicçaô , erao , ou nao nullas. 1413 O Meftre Frey Jofeph de Lima , Religiofo verdadeiramente de tantas letras , como virtudes (que era naquelle Eílado o Vigário Provincial Carmelitano f , e como tal a primeira cabeça , a quem determinava de- gollar a efpada do Bifpo ) fez hum largo Papel fobre a mefma matéria , taõ abundante de doutiffima erudi* çaõ , como de elegância natural $ e por elle moílrou 9 com fundamentos folidos : Que o Prior dofeu Conven- to do Maranhão* , em nome dos feus Conjlitulntes do Pará * devia recorrer ao Juizo da Coroa no prefente cafo , por- (jue no Reino de Portugal era recurfo competente para os opprjmidos , ajfun Ecclefiajlicos , como Seculares 5 e que o Bifpo nao podia declarar ao Prior , efeus Conjlittiintes por excommun gados pela tal acçad 5 porque fendo feita ejia declaração 1 como incurfos nas excommunhfies de Cle- mente VIII. ; de Martinho V. , e da Bulia da Cea , com afundamento defe haver hufcado o mefmo recurfo , fendo- lhes efle licito nas fias opprefsoes , ajásjufijficadas , naò 1 podiao elles incorrer naquellas cenfuras. Que a eleição , e nomeação , que ofeu Prior fizera de Confervador no Com- mifario Provincial dos Religiofos Capuchos de Santo An- tónio , tinha Jido valida , conforme as Leys do Reino 7 por fer pejo a conjituida em dignidade , por quanto aquelles cargos nos taes Religiofos erao canonicamente conferidos. Que o Bifpo e/lava real, e verdadeiramente excommunga- do pelo Confervador 5 porque efle era Delegado do Papa 9 epor confequenciafvperior ao Bifpo , contra o qual podia legitimamente proceder nas matérias âafuajurifdicçad , defobedecendo , como fe mo/Irava 5 e que as cenfuras , que o Bifpo fulminara contra o Confervador , com o pretexto de 654 Annaes Hiíloricos de que lhe perturbava a júri f dicção Ordinária , erao todas nullas j porcjiie o Bifpo quando o declarou ejiava já ver- dadeiramente excommungado , e como tal in hábil para o exercido dejfa juri/dicçaÕ. 1414 Neftas mefrnas difputas entrou o novo armo Ânno 1700. de 1700 j e repetindo-fe os accidentes , fe obílinou de forte a paixão do Bifpo , que fem attender aos jurídicos procedimentos do CommiíTario Provincial dos Capu- chos de Santo António , como Goníervador Apoíloli- co, continuou no defprezo delles , na5 ío aggravando as cenfuras até a de interdicto contra o mefmo Confer- vador, e feus Religiofos , mas endurecendofe cada vez mais nas opprefsões , em que tinha os do Carmo ; e com contumácia taõ efcandalofa , que recebendo hu- ma Carta de EIRey , pela qual lhe recommendava , que fuípenfas logo todas as cenfuras definterdiclaíTe a Igreja do Carmo de Belém do Pará , ainda que chegou àquel- la Cidade em 25 do mez de Março , perfiftia na mefma vexação em 20 de Abril , quando os Religiofos com defculpavel impaciência a pozeraÕ patente no dia fe- guinte , afôftida já dos Officios Divinos. 141 5 Sobre a vaíla matéria deflas opprefsões tinha também feito outro douto Papel o Vigário Provincial Fr.Jofeph de Lima, que remetido pela fua modeftia à Univeríidade de Coimbra , havia já voltado naquelle tempo com huma approvaçaõ dos Doutores mais cele- bres das fuás Cadeiras, affim Juriftas, como Theolo- gos, eftranhando todos os irregulares procedimentos da paixão do Bifpo contra o defunto Mattheus Dias da Cofta j porque além da fua appellaçaõ anterior às cen- furas , que fufpendia todas , por fer interpoíí a antes de incorrer nellas , conílava bem : Que o mefmo Miniftro antes da fua morte publicamente fe fobmettera a obedi- ência da Igreja , efpirando naúfofacramentado , mas re- Jignado todo nafatisfaçati , de que lhefojfe devedor ) ter- mos do EJlaâo do Maranhão > Liv. XX. 6 $ y mos em que nao podia fer declarado , nem privado defe~ Anno 170Q, pultura Ecclefwjiica , e muito menos proceder o Bifpo eon* tra os Religiojos, que lha tinhao dado , pois para fe pro- ferirem excommunhoes ', ainda além da vida, erarequifi- to necejfario hum a final impenitencia 5 e como ella fe na"6 verificaje , mas antes o contrario , Jicavaõ fendo temerá- rias , e nullas todas as fulminadas : mayormente quando aquelle Prelado havia levantado as mefmas cenfuras na forma dafua concordata : e como até o tempo da morte do Miniflro nao tivejfe chegado refoluçao doKeinofobre a validade , nati podia proceder por ellas $ porque ainda que Je determinajje a contenda contra o mefmo defunto , devia o Bijpo proceder de novo , para o que naõ achava já fujei- to capaz , tendo falecido o Ouvidor Geral depois de abfoU vido : fem que podejfe ob/iar o fundamento , que tomava - de que o tal Minijirofe nao abfolvera no foro externo ; por quanto no artigo da morte b afiava yquájjjizejfe ( como ver- dadeiramente o havia feito) no facramental daPeniten* cia ; no que também uniformemente concordarão os mef* mos Doutores com a torrente deites. 1416 Aílentando pois neíles princípios tao fegu~ ros , mandou o Vigário Provincial Fr. Jofeph de Lima abrir a Tua Igreja ; porque fe por elles confiantemente femoftrava, que de nenhuma forte fe achava polluta, por infallivel confequencia naõ eftava interdicla : no que também fe conformou com a refoluçao de Portu- gal 5 a qual defattendeo o Bifpo com hum tal efeanda- lo , que em 25 do mefmo Abril mandou publicar nova Paftoral interdi&oria , fuftentando a primeira com huma paixão taÕ precipitada 7 que dava a entender nella , que EIRey fe naõ podia intrometter na decifaõ da caufa 5 porque fendo poíitivamente eípiritual ? lhe naõ compe- tia : nao fe lembrando já , de que a difpoíiçaõ do meA mo Principe , a que elle fe tinha fobmettido , era o uni* co fundamento da fua Paftoral interdi&oria de 26 de Ju- lho f «r 6$6 Annaes Hifioricos Mi\QijQQ % lho do anno parTado ; mas oMeftre Fr.Jofeph de Li- ma, que juftificou fempre por todos os caminhos os feus procedimentos, naô fe deixando fufFocar daquelle, buf- cou o feu recurfo competente na fuperior alçada : e pa- ra fegurar as confciencias de alguns efcrupulofos , fez humas doutiffimas annotações à Paítoral do Bifpo , que foraõ logo publicas. 1417 Impaciente entaõ eíle Prelado , de que tendo defembainhado a efpada da Igreja , feriao fó o ar , por falta de corpo, todos os golpes , que defcarregava , por mais que empenhava os mayores esforços para o pezo delles com menos zelo , do que ira 5 para fazer efta mais eílranhavei a todo o Mundo , tomou a arrebatada refo- luçaô de fe embarcar para Portugal , e a executou nos penúltimos dias do mez de Julho , nao fó deixando fem Paílor as fuás ovelhas , mas também com muitos emba- raços as confciencias fobre a validade das cenfuras , que de nenhuma forte quiz levantar, feguindo a cegueira da fua contumácia: porém o Vigário Provincial do Car- mo como já tinha aggravado delias , conftituío na Cor* te feu Procurador ao Padre Fr. Manoel da Efperança , feu digno anteceflbr no mefmo lugar , que fe recolhia k fua Província naquella monção. 141 8 Já nefle tempo fe achava no Pará o Gover- nador, defde o dia 15 do mez de Abril , pouco conva- lecido de huma perigofa enfermidade , que tinha pade- cido no Maranhão ; mas por mais que o Bifpo apaixo- nadamente procurou involvello na mal formada culpa da oppoíiçaõ dos feus procedimentos , fe foube eíle fempre juftirlcar com fegura politica ; porque depois da commiflaõ , que deu ao Ouvidor Geral Mattheus Dias da Cofta , ainda que fentia as vexações do Eftado , dei- xou o feu recurfo por conta da Juítiça , communicando o mefmo Prelado com as attençÕes , que fe lhe deviaõ. 1419 Segurou bem o focego publico a precipitada execu- doEftado do Maranhão, Liv.XX. 657 execução da viagem do Bifpo : e defembaraçado o Go- Anno 1700. vernador das dependências da Capitania , paflbu para a Cidade de S. Luiz em 50 de Dezembro com a trifte no- ticia , de que dando fundo fora daquella barra hum na- vio de Parnarnbuco com duzentos Soldados , caflean- do-lhe a ancora na mefma noite , chocara nos penhaf- cos da Ilha do Medo , ( que he a do Boqueirão , como já fica referido ) onde fe perdera laftimofamente com quarenta peíToas : ultima memoria do prefente anno. 1420 Na nova fucceífaô de 1701 tinha já pedido Anno 170 1. António de Albuquerque com vivas inftancias , ou fuo» ceíTor naquelle Governo , ou licença para paííar a Por- tugal , com o pretexto de bufear remédio nos ares pá- trios a algumas queixas , que padecia na faude : e El- Rey defattendendo a primeira fupplica , deferio à fe- gunda, por tempo limitado, com taõ honrofas demonf- trações da fua grandeza , como bem merecidas $ porque na mefma graça involveo a Commenda de Santo Ilde- fonfo de Vai de Telhas da Ordem de Chriíto , a Alcai- daria mor de Sines , o Senhorio de Couto de Útil , e o dos Fornos da Judiaria, e rua dos Cavalleiros da Vil- la de Setuval. 142 1 No Maranhão recebeo elle eftas Cartas do Reino nos principios de Abril , também com a noticia, de que tinhaõ ceifado condicionalmente as pertenções da França fobre as vaftas idéas do Marquez Ferrol , Gover- nador da Ilha de Cayena na difputada divifaõ dos noíTos limites , por hum Tratado provifional de 4 de Março do anno paífado , depois de convencida a mefma Coroa das innegaveis provas de dous eruditiílimos Papeis , do Conde da Ericeira D. Francifco Xavier de Menezes, e Gomes Freire de Andrade , que lê a minha grande vene- ração , ao meímo tempo que eferevo efta memoria : e paliando logo António de Albuquerque a Capitania do Pará para difpor a fua viagem , chegou a Cidade de Be- Oooo !em 65 Annaes Hijloricos Armo 1701. lem em 22 de Mayo. Intentou detello o Senado da Ca* mera com huma larga reprefentaçaõ da orfandade , em que deixava todos aquelles povos $ porém elle fabendo confolallos com as politicas promeíTas da fua breve ref- tituiçaõ ao mefmo Governo , partio para Lisboa em 2 1 de Julho com huma Carta para EIRey daquelles Mi* niílros , que nos curtos termos das fuás exprefsões , he dos honrofos elogios da fama do feu nome , como fe mofíra delia. 1422 Senhor. Ne/ia monçaÕ vay o Governador , e Capitai General dejle EJlado , ^António de Albuquerque Coelho de Carvalho , a curarfe a ejfe Reino com licença de Vojfa Magejlade , pejfoa que tem tantas noticias das coujas delle em todas as matérias , como zelo doferviço de Vojfa Magejlade , e bem commum dos povos , o (jue bem mojlrou em tantos annos de governo , fazendo em todos a Vojfa Magejlade grandes Jerviços ; è ajjim ejperamos continue neja Corte , informando a Vojfa Magejlade do que nelle padecem os feu s vajfallos 5 para que certificado Vojfa Magejlade dos nojfos males , lhe applique como pie* dojo pay os remédios , pelos meyos que o dito Governador , como tai pratico , faberà apontar 5 e ajjtm nos naÕJica mais que pedir. Deos guarde a Real pejfoa de Vojfa Ma- gejlade , como havemos mijler. Belém do Pará, em Ca- mera, 5 de Julho deiyoi. 1425 Os Miniílros da Corte, que favoreciao as dependências do Governador, para facilitar a fua licen- ça , lhe tinhao já difpoílo hum Lugar-Tenente 5 occu- paçaõ , com que havia paífado ao Maranhão no anno de 1699 o Tenente deMeftre de Campo General Fernão Carrilho , Soldado de fortuna 5 porém de tanta honra , que fe fazia merecedor defta : e em 30 de Junho , enten- dendo que António de Albuquerque teria já partido do rio de Belém para o de Lisboa , tomou polTe na Ca- mera da Cidade de S. Luiz do governo do Eílado , de que do E/lado do Maranhão , Liv. XX. 6 y 9 que EIRey também o encarregava por huma Carta fua. Armo 1701. 1424 Dentro de poucos mezes paíTou Fernaô Car- rilho à Cidade de Belém do Pará , onde achou a noti- cia das execrandas mortes dos Padres Fr. Jofeph de San- ta Maria , natural da Cidade de Lamego , e Fr. Marti- nho da Conceição, nafcido em Lisboa no bairro de Al- fama , Religiofos ambos da Provincia Capucha de San- to António, de exemplares virtudes , e aduaes Mifiio- narios dos bárbaros Tapuyas Aruans da Ilha de Joannes, feus cruéis aíTacinos j e formando logo huma Tropa de guerra para o caftigo de tamanha maldade , lhe nomeou por Commandante , com acertada efcolha , a Manoel Cordeiro Jordão , que fahio do rio do Pará no penúlti- mo dia do prefente anno , menos confiado nas peque- nas forças de fefTenta Soldados , e duzentos índios , que nas agigantadas do feu valor , fortalecido mais da jufti- ça da caufa. 1425 Succedeo o anno de 1702 ; e como a viagem Anno 1702* era de poucos dias , defembarcando com brevidade Ma* noel Cordeiro nas terras dos índios delinquentes , foraã tao pezados os primeiros golpes do feu jufto caftigo , que já em 21 do mez de Fevereiro chegou à Cidade de Belém huma embarcação com o defpojo de cincoenta delles , e os cadáveres dos dous MiíTionarios , que ten- do padecido no mez de Setembro do anno paííado , fe acharão fó com os hábitos podres , fem corrupção na carne-, nem tocada dos bichos , feras , ou aves de rapi- na , havendo de tudo multidão naquellas campinas def- habitadas. 1426 Obfervou-fe bem eíle prodígio ; e nas mere* cidas attençoes delle , foraÔ enterrados folemnemente na Capella mor da Igreja do feu Convento , com pia opinião de que eftavaõ logrando na Celeftial Corte da Bemaventurança a imperial coroa do mar ty rio : mas o Commandante Manoel Cordeiro parecendo -lhe ainda Oooo ii pou- 66o Annaes Hiftoricos Anuo 1702. pouca fatisfaçao , a que tinha tomado para culpa taS feya , continuou com a mefma fortuna nos fataes eftra- gos da fua expedição até o fim de Mayo , em que fe re- colheo ao Pará cheyo de juíla gloria. 1427 No anno de 1700 7 como já fica referido , fa- hio da Cidade de Belém o Bifpo do Eftado D. Fr. Ti- motheo do Sacramento -, mas chegando a Lisboa com feliz viagem , foy taô mal recebido da inteireza de El- Rey , aííim pela culpável deferçao da fua Diocefi, de'^ xando-a affliclia com tantas cenfuras apaixonadamente fulminadas, como também pela efcandalofa defatten- çaõ , com que tratou na períiftencia delias as fuás Reaes recommendaçoes, que deígoftofo efte Prelado , fe reti- rou a huma pobre quinta das viíinhanças da Villa de Se- tuval , onde notificado por Carta do Defembargador do Paço , para afliftir por fi , ou feu Procurador , ao a/Ten- to que fe tomava nelle , na conformidade das Leys do Reino, fobre as controveríias , largamente expendidas; e naõ apparecendo no termo peremptório , fe determi- nou a fua revelia , que tinhaõ fido juftifícados os proce- dimentos do Juízo da Coroa do Eftado do Maranhão. 1428 Deíla refoluçaÕ fe expedio logo Carta ao mef- mo Prelado para haver de cumprilla , levantando as ex* communhões , com a declaração , por editaes , de que erao todas nullas j e por elle inteiramente obedecida já com a devida conformidade , paííou o a/Tento ao Ma- ranhão , no qual foy celebrado com elogios públicos do grande talento do Vigário Provincial Frey Jofeph de Lima , que a eífe tempo fe achava já reftituido ao feu Convento de Lisboa , logrando , no laboriofo exer- cício de muitos , e honrofos empregos , as univerfaes eftimações , que lhe grangearaõ as fuás grandes virtu- des. i4 2 9 Com a felicidade defte fucceíTo feíle/ou tam- bém o Maranha6 , dentro de poucos dias , a da faceei- fao do EJlaâo do Maranhão , Liv. XX. 661 faõ do feu governo na peíToa de D. Manoel Rolim de Anno 1702. Moura , que tomou poíTe delle na Cidade de S. Luiz, cabeça do Eftado , em 8 de Julho com as coílumadas formalidades , e univerfaes applaufos da Capitania. 1430 Defempenhando bem as obrigações do feu il- luítre Tangue, tinha fervido efte Fidalgo em muitas Ar- madas , chamadas vulgarmente da Guarda Cofta , na oppoílçaõ dos bárbaros piratas Africanos , infeftadores delia , que no focego de huma taÕ longa paz , era fó a guerra , que inquietava o Reino ; mas bufcando depois já com o poílo de Capitão de Infantaria a formidável de EiRey de Maquinez no porfiado fitio da Praça de Ceu- ta, com o foccorro que pedio Caílella a Portugal no an- no de 1694 , ílgnalou mais as fuás acções na imitação heróica do feu Meftre de Campo Pedro Mafcarenhas, I. Conde de Sandomil , Varaô muito mayor , que a fua mefma fama : ( como moftrou bem a todo o Mundo neíla occafiao , e melhor depois delia nos grandes em- pregos, que occupou na guerra da Liga até o de Go- vernador das Armas da Província do Alentejo ) e in- fluindo D. Manoel Rolim pela informação deitas no- ticias plaufiveis efperanças nos moradores de S. Luiz , lhas verificava todas as horas a docilidade do naturaL no mefmo exercício do minifterio. 143 1 Defembaraçado das dependências do Mara- nhão , pafTou à Cidade de Belém do Pará , onde fez a fua entrada publica em 10 de Agofto com geraes ap- plaufos daquelles moradores , que empenhadamente multiplicavaõ as particulares efperanças década hum delles , por entenderem todos , que era o caminho mais feguro para adiantallas : ordinária farça do Mundo po- litico , de que fempre fe deixaõ enganar os que o nao conhecem pela fatal cegueira do amor próprio. 1432 Ainda entre as mefmas lifonjas , a que tam- bém arraíla a novidade nas fuccefsões de todos os Go- N yernos , . ' 66i Annaes Hiíloricos Anno 1703. vernos , fe feguio a do anno de 1705 5 mas logo nos prin- cípios alterou o animo de D. Manoel Rolim , o Ouvi- dor Geral , e Provedor da Fazenda Real Miguel Mon- teiro Bravo , primeiro Miniftro de letras da Capitania , depois da divifaõ defta judicatura $ porque movendo-fe diíFerentes duvidas fobre a remataçaõ de alguns contra- tos, o mandou ir àfua prefença para a decifaõ delias : e defobedecida eícandalofamente a fua ordem , ( quan- do também Tem efta, conforme as de EIRey, naõpo- diao fazerfe as taes remataçoes , que o mefmo Miniftro deu por celebradas ) o fufpendeo de todos os lugares , que fervia , fubftituindoos em peíToas capazes. 143 5 Sem outra memoria , que fe faça digna das re- commendações da pofteridade , teve fim o anno pafla- Anno 1704. do , e principio o prefente de 1704 $ porém com a che- gada dos navios do Reino, recebeo avifos o Governa- dor da declaração da guerra da Liga contra as Coroas de Caftella , e França : e dando logo promptas provi- dencias para a defenfa de todo o Eftado , fe vio bem af- fiftido dos moradores delle com as mais honrofas de- monftrações do feu valor , e fidelidade. Levou eíla no- ticia da Corte de Lisboa Mattheus de Carvalho de Si- queira , morador na Cidade de Belém , onde havia fer- vido diíFerentes empregos , affim politicos , como mili- tares , e fuccedia agora no de Capitão mor do Mara- nhão a Joaõ Duarte Franco, que na união do gover- no do Eftado era o primeiro da Capitania por Patente Real 5 mas ainda que Mattheus de Carvalho entrou no exercício da fua occupaçaô com lifongeiros vivas , con- folou muito mal as faudades , que deixou nella mereci-; damente o feu anteceflbr. 1434 Logo que em Janeiro do anno paíTado fufpen- deo o Governador ao Ouvidor Geral Miguel Monteiro Bravo de todos os cargos , que fervia na Capitania do Pará , fe retirou efte Miniftro para a Cidade de S. Luiz, donde do EJlaâô do Maranhão , Liv. XX. 66 3 donde voltando agora para a de Belém , ainda qite naò Aaao 1704. tinha chegado refoluçaõ da Corte fobre a mefma maté- ria , D. Manoel Rolim pela generofidade do feu animo ( ou por arrependido da generalidade do feu procedi- mento fendo a culpa efpeciflca , por pertencer fó ao mi* nifterio de Provedor da Fazenda Real ) o convidou com a inteira reftituiçaÕ dos mefmos lugares , que naõ quiz aceitar , ou por lhe parecer, que os teria mayores na fa- , tisfaçao da fua queixa , ou por aconfelhado dos eftimu* los delia : mas antes recolhendo-fe , quando chegou do Maranhão , no Colíegio da Companhia de Jefus , par- tindo brevemente huma embarcação para Portugal, dif* poz nella a lua viagem com tanto fegredo , que favo- recido do grande poder dos mefmos Padres , fe meteo a feu bordo contra as expreíTas ordens do Governador , e também do Governo 5 porque delle naõ pode fahir pef- foa alguma fem licença fua por efcrito. 1455 Sentio D, Manoel efta defattençaõ como of- fenfa ao caraóter $ mas fem fazer por ella demonftraçao alguma , expedidos os navios do Reino , partio no mef» mo dia para a Cidade de S. Luiz , aonde chegou com feliz fucceíTo na viagem : ultima memoria nas do pre* fente anno. 1456 Sem outra também que poíFa merecella , prin- cipiou a nova fucceífaõ de 1705 ; mas continuando o Anno 1705** feu natural curfo , entrou na bahia da mefma Capital hu- ma fumaça arribada da Cofta da Mina , que tendo fido preza de cinco náos Francezas , meterão a feu bordo no- ve Marinheiros , depois de faqueada , com ordem para que feguiífèm as fuás poppas : e quatro Portuguezes , que fó deixarão nella carregados de ferros , reflituidos com deílemida induftria à fua liberdade , atacara6 taò valerofamente os taes inimigos , que matando hum del- les , levarão os mais maneatados até o Maranhão $ via- gem , que bufcaraõ para melhor fe fegurarem na mudan- ça do rumo. Hon- ::> 664 Annaes Hifioricos Anno 1705. 1437 Honrou o General a eítes quatro homens corn as demonftrações , que mereciao $ e voltando para a Capitania do Pará , defembarcou em 22 de Julho na Ci- dade de Belém , aonde chegando brevemente embarca- ção do Reino , recebeo huma Carta da Rainha da Graõ Bretanha a Senhora Dona Catharina , ( como Governa- dora de Portugal na indifpofiçaõ de feu irmaõ o Senhor Rey D. Pedro ) que o depunha do governo do Eftado, com expreíTa ordem para que logo o entrega/Te ao Ca- pitão mor do mefmo Pará Joaõ de Vellafco Molina ; e efte teve outra da mefma Senhora 7 que lho encarrega- va , em quanto naõ mandava fucceííbr para elle : mas como a fufpenfaõ do Ouvidor Geral Miguel Monteiro Bravo naõ merecia tanta feveridade , com hum Gover- nador , que com razão tinha grangeado a aceitação dos povos , lhes foy a elles taô íenfivel , que todas as pef- íòas da fua primeira reprefentaçaõ aconfelharaõ a D. Manoel confervaífe o Governo até a pofitiva refoluçaõ de EIRey depois de informado : porém elle , que na re- íignaçaõ da fua obediência procurava moílrar , que lhe naõ faltava efta grande virtude , cumprio a ordem em 13 de Setembro com univerfal magoa daquelles mora- dores. 1438 No mefmo fentimento , que fe fez geral a to- AmoiyoC. do oEílado, entrou o anno de 17065 e D. Manoel Rolim , que fe achava ainda na Cidade de Belém do Pa- rá , partio para a de S. Luiz do Maranhão em 1 3 de Fe- vereiro , naõ fó com o projecto de paíTar por terra para a Bahia ,' para fegurar a fua viagem na companhia da- quella Frota , mas também com animo de efperar alli o novo Governo t já com a noticia de fe ter conferido ao Senhor de Pancas Chriítovaõ da Cofta Freire. 1439 O Capitão mórjoaõ de Vellafco teve tam- bém efta certeza , que lhe foy bem penofa 5 mas depois de alguns mezes fentio acciderite ? que o deixou ainda muito doEftadoâo Maranhão, Liv. XX. 66 $■ . muito mais conílernado $ porque recebeo apreíTados avi- Anno i7 o6 « fos do Maranhão , de que maquinava huma conjuração contra a fua peíToa , fomentada por D. Manoel Rolim para reftituirfe do governo do Eftado j e fem dar lugar a outras reflexões mais defafogadas J arrebatadamente paflbu à Cidade de S. Luiz , aonde chegou com breve viagem , acompanhado de António da Coda Coelho t Ouvidor Geral da Capitania do Pará , por fe perfuadiu eíle Miniílro , com igual defacordo , a que o Ouvidor Geral do Maranhão Manoel da Silva Pereira favorecia as mefmas novidades como cabeça delias. 1440 Suggerido tudo por informações mal inten- cionadas, fe deixou de forte preoccupar do íufto o Ca- pitão mor Joaô de Vellafco , influído também dos na- turaes ciúmes do governo , que fe naõ lembrou fará def- enganallos , de que fendo D. Manoel Rolim quem ge- nerofamente lho entregara , podendo aproveitarfe do convite dos povos , fe naõ fazia crivei , que elle o pre- tendeffe, quando tinha já fucceflbr nomeado, que fe o efperava a todos os inflames ; mas antes de todo fujei- tando-fe a fatalidade do mefmo defacordo pelas apaixo- nadas mitigações de novos incentivos, ordenou logo ao Ouvidor Geral António da Cofta Coelho, que devaíTa- mente conheceíTe da tal conjuração ; o que elle fez fem a menor duvida , quando as devia pôr pelas difpofições das Leys do Reino , que naõ permittem a formalidade deíle procedimento fóra dos cafos declarados nellas, naõ precedendo o mandato do Principe , que he fuperior a todas. 1441 Naõ era ignorante efte Miniílro ; mas tao apaixonado no prefente cafo , que naõ concorreo fó pa- ra eíla defordem ; porque approvou também , que o Ca- pitão mor , fem mais outra culpa formada, que a de mal fundadas prefumpções , fuggeridas do ódio , mandaífe meter na enxovia da cadea publica , carregadas de fer- Pppp ros , mi 666 Annaes Hifloricos Anno 1706. ros, a muitas peíToas das principaes da terra : e na For- taleza da fua barra com apertadas ordens ao mefmo Ou- vidor Geral da Capitania Manoel da Silva Pereira , naõ lhe valendo já na feveridade do feu voto , nem a immu- nidade da profifTaõ. 1442 Eraõ grandes eftes defatinos ; e parecendo já ao Capitão mor, que neceílitava de fejuftifícar para ref- ponder à eftreita conta , que fe lhe pediria , quiz inten- tar então o mayor de todos na prizaõ de Dom Manoel Rolim , para fazer o cafo muito mais feyo : porém eíle Fidalgo depois de andar vagando por differentes fuios da mefma Ilha , defendido fó do feu próprio refpeito , fe retirou com tudo, naõ querendo arrifcailo , ao Conven- to dc>s Religiofos de Santo António , por evitar tam- bém com prudente juizo as perturbações do focego dos povos , que neceíTariamente fe feguiriaõ de tamanho abfurdo. 1443 N"a aguda dor da repetição delles, teve fím Anno 1707. trabalhofo o anno paíTado, e principio ainda o de 17075 e o Capitão mor Joaõ de Vellafco taõ cegamente fe lil e fongeava da paixaõ do feu animo , que até fe deixava perfuadir das mefmas fuggeftões , que lha fomentavaõ , a que os arrebatados procedimentos , com que fe tinha havido , além de merecerem a univerfaí aceitação da Corte , lhe grangeariaÕ o relevante premio do governo do Eftado , que eílava já provido , difcorrendo em nova promoção para o Senhor de Pancas : mas como quafi fempre fahem erradas todas as medidas , que fe regulaõ fó pelas ordinárias defproporções da louca vaidade , fen-' tio elle as rnefmas experiências em o breve periodo de poucos dias ; porque no de 12 de Janeiro entrou na Ci- dade de S. Luiz com feliz viagem o mefmo General , que fe efperava nella • e para que efte golpe lhe ficaíTe fendo muito mais penetrante , pretendendo com bem fundado titulo entregarlhe o governo , o recebeo Chrif- tovaõ do miado do Maranhão, Liv. XX. 667 tovao da Cofia , entre as acclamações de todo o povo , Anno 1707. das mãos do feu anteceífor D. Manoel Rolim , como determinava a íua Patente ; no que parece , que quiz EIRey moítrar, que naõ approvara a depofiçao deite Fidalgo. l 1444 Quando EIRey D. Pedro tomou a género ia refuiuçaõ de fe pôr na Campanha contra os Exércitos de Callella , achava-fe Chriííovaõ da Coíla com o em- prego de Capitão de Cavallos das Ordenanças de Lif- boa j mas parecendo-lhe a efte Fidalgo , que ao mefmo tempo que o feu Príncipe fe facriflcava a tantos perigos, como difcommodos , para melhor fegurar no igual equi- librio das forças da Europa a confervaçao dos feus vaf- fallos , naô devia elle ficar gozando das delicias da Pá- tria no focego pacifico da íua cafa. Fez logo demiíTaò do pofto , que fervia 5 e aclarando praça de Soldado no Terço da Armada , illuílraraõ bem efta honrofa acçaô os merecidos créditos , com que fahio de todas. 1445 Na jufta acçaô defte ferviço foy provido de novo na occupaçaõ de Meftre de Campo da Infantaria Auxiliar do Termo de Lisboa ; mas conhecendo EIRey a defproporçaõ deíle defpacho, para o feu grande mere- cimento , lhe conferio o de Governador, e Capitão Ge- neral do Eílado do Maranhão por Decreto de 1 1 de De- zembro de 1705. 1446 O Capitão mor João de Vellafco , ao mefmo tempo que o anno parlado fahio da Cidade de Belém para a de S. Luiz , com os falfos avifos da fua chamada conjuração, teve opportunidade de encarecer os peri- gos delia no conceito da Corte , nao fó para moílrar o deflemido animo com que os bufcava , mas também pa- ra dar mayor preço ao ferviço , que efperava fazer na reftituiçaõ do focego publico. Porém ElPvey D, Pe- dro j que pezava fempre na mais fiel balança o procedi- mento dos feus vaíTallos , como reconhecia , que o de Ppppii D, > ' 668 Annaes Hijloncos Anno 1707. D. Manoel Rolim refpondia ao feu fangue , fó por fa- tisfazer à regularidade da juítiça, determinou, que fe devaíTaíTe daquellas novidades j eChriítovaõ da Coita , que examinou logo , que tinhaõ fido menos verdadeiras, ainda antes do feu conhecimento judicial , aliviou os prezos das pezadas cadeas , que arraítavao ; acção , que parecendo fó piedofa , foy taÕ juftificada , como depois moftrou a mefma devaíTa , naÕ refultando delia nem a mais leve culpa a algum dos vexados. 1447 PalTados poucos dias entrou hum navio na mefma bahia de S. Luiz com cem homens da Ilha da Madeira , parateclutas da Infantaria das guarnições do Eílado; e ajuftadas logo pelo Governador, com as mais dependências da Capitania , paífou à Cidade de Belém do Pará , aonde chegou com feliz fucceíTo em 9 de Abril. 1448 No mefmo dia deu a fua entrada com muito iguaes acclamações às com que havia fido feftejada no Maranhão ; e como o feu anteceflbr D. Manoel Ro- lim o acompanhou naquella viagem , por ter já mudado de refoluçaõ , na que difpoz primeiro pela Bahia , for- malizou mais a folemnidade deita função a affiítencia da fua peííba , principalmente no a&o da entrega , que fem- pre fe coftuma fazer em ambas as Cidades , como já fi- ca referido. 1449 Para a fucceflaõ de Joaõ de Vellafco Moli- na , na occupaçaõ de Capitão mór do Graõ Pará , que efpirou também com o encargo do governo do Eítado , nomeou EIRey a Pedro Mendes Thomás ; e em virtu- de da fua Patente o Governador ChriftovaÕ da Coita lhe tomou homenagem da Capitania , e o feu antecef- for lhe fez entrega delia em 14 de Abril. 145 Tinha fervido Pedro Mendes interpolada- mente na mefma Cidade até o lugar de Sargento mór ; e com tal diftinçaõ , affim neíte , como em outros difFe- rentes , doEfladoâo Maranhão, Liv. XX. 669 rentes , que fe lhe conferirão no dilatado efpaço de trin- Anuo 1707. ta e cinco annos , que depois de paíTar de Portugal pa- ra aquellc Eílado , naõ houve nelle Governador, que o naÕ achafle fempre primeiro para os empregos mais hon- rofos t affim políticos , como militares. 1451 Em 10 de Julho fe achava ainda D. Manoel Rolim na Cidade de Belém do Pará - 7 mas neíle dia fa- hio do rio delia para o de Lisboa , aonde chegou com profpera viagem , deixando aquelles moradores com ra- zão faudofos da fua companhia , e taõ fatisfeitos da ad- miniftraçaõ do feu governo , que os Miniílros da Came- ra , em nome do povo , o nomearão por feu Procurador para todas as fuás dependências na prefença de ElRey. 1452 Defembaraçado Chriítovaõ da Cofia da ex- pedição dos navios do Reino , entrou na execução de apertadas ordens , que levava fobre a liberdade do Gen- tio da terra, e taõ feveramente , que foraÕ tantos os cla- mores dos povos , que até chegarão a difcorrer com a mais profunda melancolia no continuado exercício da au» thoridade do Minifterio : porém aconfelhado das experi- ências próprias no geral fentimento deita primeira acçaõ taõ mal recebida , foube de forte conduzillas todas dalli em diante à utilidade publica , pelos caminhos menos ef- crupulofos , que grangeando huma cabal fatisfaçaõ pa- ra os apaixonados , confeguio também que defmentifc fem todos , por boca das mais honrofas acclamações , as fuás infauftas profecias, concebendo de novo as mais alegres efperanças das mayores fortunas nas acertadas diípofiçÕes do feu governo : e depois de expedir para os Certoes do famofo rio das Amazonas huma grande Tro- pa de refgates do Gentio delles , de que nomeou Com- mandante a Ignacio Corrêa de Oliveira , deixando já os moradores do Pará cheyos de faudades , partio para a Cidade de S. Luiz em 19 de Dezembro. ,- 1455 Pouco fe deteve no Maranhão o Senhor de P an- il 6jo Annaes Hiftoricos Atino 1708. Pancas ; porque na breve fucceíTaõ de 1708 , com a trif- te noticia da. fentida falta do Senhor Rey D. Pedro II. de gloriofa memoria , que havia pagado o natural tribu- to de todos os viventes em 9 de Dezembro de 1706 , e a feliciffima da Acclamaçaõ de Dom JoaÕ V. nof- íb Senhor , recebeo também novas ordens da Corte : e para a execução de algumas delias , que pertenciaõ ao Pará , fendo neceíTaria a aííiítencia da fua peíToa , voltou para a Cidade de Belém , aonde chegou em 8 de Junho. 1454 Sabia já o novo Monarca, que os Miffiona- .. rios Caftelhanos da Provincia de Quito exercitavaõ o feu minifterio na naçaõ dos Cambebas , que fendo fem duvida a mais populofa de todo o gentilifmo do famofo rio das Amazonas , ficava muito dentro dos vaftos do- mínios da fua Coroa , conforme a ultima demarcação dos limites de ambas , governada ainda a Portugueza pela Hefpanhola j e ordenando a ChriftovaÕ da Coita mandaíTe logo notificar aos taes Religiofos o feu prom- pto defpejo , encarregou elle eíla commiífaõ a Ignacio Corrêa de Oliveira , que com a Tropa de refgates , de que era Commandante , como já fica referido, fe acha- va a eífe tempo no grande rio dos Solimões , hum dos mais illuftres tributários do das Amazonas já nas viíl- nhanças dos mefmos Cambebas. 1455 Recebeo as ordens Ignacio Corrêa com a Pa- tente de Capitão 5 e vendo-fe elle na memoria do feu Governador fem os ordinários defpertadorés das pró- prias diligencias , monicionou a Tropa , que mandava muito à cuíta da fua fazenda , que difpendeo também com liberalidade no agazalho dos índios , que volunta- riamente quizeraõ feguillo como Auxiliares 5 porque entendendo com militar difcuríb o Senhor de Pancas , que o bom fucceíTo das negociações no prefente fyíle- ma de hurna guerra viva , em que fe achavaõ as duas Co- do EJlado do Maranhão , Liv. XX. 671 Coroas , fó fe feguraria debaixo das armas , lhe encarre- Anuo 1708. gava muito , que íoccorreíle as fuás Aldeãs vifinhas , que obedeciaõ ao governo do Eílado. 1456 Neíles apreftos militares gaílou algum tem- po Ignacio Corrêa ; mas recebendo repetidos avifos , de que informados da ília expedição os Caílelhanos , o efperava já hum corpo de duzentos , com avultado nu- mero de índios bellicoíbs , defprezando tudo com âef~ temido animo , encaminhou as fuás proas à principal Po- voação dos mefmos Cambebas , valerofamente profe- rindo y que fe o feu General o mandaíTe até dentro de Quito , acharia igual refoluçaõ na fua obediência , por fer a vida o menos, que arrifcava nos empenhos da hon- ra : porém como a fortuna coftuma quaíi fempre favo- recer aos que procedem por efte modo , defviando-o de todos os perigos , que o ameaçavao , o poz livre delles no mefmo fitio , que bufcava , onde notificou a fua com- miííaõ ao Padre Joaõ Bautifta Sana , que na aufencia do Padre Samuel Fritz fazia as vezes de Superior das Mifsôes de S. Paulo , S. Joaquim , e Santa Maria Ma- yor , Aldeãs todas dos Cambebas. 1457 Repetio também o mefmo a&o com os feus Miílionarios Pedro Boíarte , André Efcovo , e Mathias Lapfo ; ( todos da Companhia de Jefus da Província de Quito ) e continuando nas primeiras acções de género- fidade com aqueJles índios , os reduzio de forte à nova fujeiçaÕ , que proteílavao já a fua conftancia com as demonftrações mais voluntárias , de que juftamente fa- tisfeito , íe recolheo com todo o focego ao rio dos So- limÕes , depois de retirados os Miffionarios , por ferem mentirofas as parladas noticias da oppofiçaò dos Caíle- lhanos. 1458 Seguio-fe o anno de 1709 , e o Governador , Anno 1709, que no mez de Junho do paíTado fe havia já reftituido da Cidade de S. Luiz do Maranhão à de Belém do Grão Pará ; '.'M ÓJ2 Annaes Hiíloricos Anno 1709. Pará , teve nefta a noticia do feliz íuccefíò da diligencia do Capitão Ignacio Corrêa ; porém quando fe achava bem fatisfeito delia por conta também da fua eleição na efcolha do Cabo ) recebeo novo avifo em 3 o de Setem- bro, de que huma Tropa da Cidade de Quito , em vin- gança da evacuação dos feus Miffionarios , na5 fó tinha invadido os vaílos CertÕes do caudaloíb rio dos Soli- mões , mas reduzindo a cinzas as fuás Aldeãs ( miffiona- das todas pelos Religiofos de NoíTa Senhora do Monte do Carmo) fe recolhera ainda com quatro Portuguezes, dos quaes era hum o mefmo Capitão , que depois da jor- nada dos Cambebas continuava naquelle rio no licito refgate dos Tapuyas do Mato. 1459 Com razaõ irritado o Senhor de Pancas de ta- manho infulto , intentou tomar a merecida fatisfaçaô delle pelo feu mefmo braço , perfuadido mais dos arden- tes eftimulos da valentia do feu animo , que das obriga- ções do feu miniílerio ; porém já convencido das atten- ções forçofas , que lho recommendavaõ no meyo de hu- ma guerra formidavelmente difputada entre as mefmas Coroas , no breve termo de treze dias poz prompta hu- ma Armada debaflantes canoas, com a guarnição de cento e trinta Soldados , e crefcido numero de índios bellicofos : e nomeando logo por feu Commandante , com a Patente de Sargento mor, ajofeph Antunes da Fonfeca , fahio efte do rio de Belém em 14 de Outubro : ultima memoria do prefente anno. Anno 1710. 1460 Na nova fucceíTaõ de 1710 efperava já todos os dias GhriftovaÔ da Cofta os certos avifos do fucceíTo do feu armamento ; mas como o cuidado dos Governa- dores coíluma andar fempre diftribuido em difFerentes empregos , fe achou obrigado nos princípios de Mar- ço a fazer jornada para a Capitania do Maranhão , ain- da duvidofo das felicidades daquelía expedição , por mais que promettidas pela juíliça delia, Im- do Eftaâo âo Maranhão , Liv. XX. 6 71 1461 Impaciente com o mefmo cuidado chegou a Antio 171 o. Cidade de S. Luiz j mas dentro em poucos mezes o íb- cegaraÔ bem as alegres noticias ) que recebeo do Sar- gento mor Jofeph Antunes 5 porque paíTando elle às ter- ras dos Cambebas , que occupavaõ já os Caítelhanos , depois da invafaÕ das noífas Aldeãs dos Solimões , naõ íb lhes tomou logo a merecida fatisfaçaÕ com as razões da guerra , mas ainda fez quinze prizióneiros , como defpojo da vitoria ? que authorizava mais o Padre João BautiftaSana, da Companhia dejefus, Religiofo de tantas letras , como virtudes , que governava aquellas MífsÕes, como já deixo referido, 1462 Juítiffimamente fatisfeito da felicidade do fuc- cefib , fez nova viagem para o Pará ChriftovaÔ da Cof- ta , e em 1 5 de Julho chegou à Cidade de Belém j tam- bém com a noticia da recondução do feu governo por outro triennio -, porque attendendo EIRey , a que no louvável procedimento defte General Te utilizava muito o feu ferviço , deferio às reprefentações dos moradores daquelle Eítado , como intereíTe próprio, 1465 No emprego de Capitão mor da Capitania tinha fuccedido a Pedro Mendes Thomás JoaÕ de Bar- ros da Guerra já defde o dia 19 de Abril 3 e o Senhor de Pancas ', que neceííitava de voltar brevemente para o Maranhão i conhecendo logo a fua boa capacidade , fe aproveitou bem delia dentro de poucos mezes j porque em 29 de Dezembro paíTando outra vez para a Cidade de S. Luiz , lhe entregou o governo do Pará com huma grande fatisfaçaõ fua, 1464 Avançado já o mez de janeiro do novo anno de 171 1 , felizmente concluío elle a fua viagem ; mas Anno 171 r. recebendo logo apreífados avifos pela Bahia de Todos os Santos , de que apreftava França huma groíTa Ar- mada , que entendiaõ os melhores políticos era com o projecto da invafaõ da America Portugueza , ainda que Qqqq o cui- ■ 674 Annaes Hiftoricos Annoi7ii. o cuidado da guerra da Liga, em que fazia huma das p imeiras figuras a mefma Coroa , empenhava bem o feu zelofo efpirito na defenfa do Eftado ; esforçou mais com eda occaíiaõ a da Capitania : e encarregando- a de- pois das prevenções , que lhe parecerão neceíTarias , ao feu Capitão mórjofeph da Cunha de Eça, que tinha fuccedido a Mattheus de Carvalho de Siqueira em 16 de Outubro do anno paíTado, partio para o Pará na mef- ma diligencia. 1465 Favorecido da fortuna nefta navegação , che- gou à Cidade de Belém nos princípios de Julho j mas como os ânimos daquelles moradores , afíiftidos da boa difciplina do feu CapitaÕ mór JoaÕ de Barros da Guer- ra , eftavaõ bem difpoftos para a oppoíiçaõ de quaef- quer inimigos , neceífitou de poucas providencias para feguralla. 1466 Com tudo , como o zelo , e militar difcurfo do Governador olhavaÕ fempre com merecida defcon- íiança para as vifinhanças da Ilha de Cayena , receando alguma interpreza em qualquer dos Fortes do grande rio das Amazonas , e feus collateraes j ou a invafaõ das fuás Aldeãs, para a commoçaÕ aíTás perigofa dos índios do- mefticos , também lhe naõ devia pequeno cuidado hu- ma , e outra defenfa nos poucos meyos da Capita- nia j mas ajudado bem das poderofas forças da fua acti- vidade , foube acudir a tudo. 1467 Nefta taõ ruidofa íttuaçaõ fuccedeo o anno Anno 1712. de 17 12 5 mas continuando fem novos accidentes até o avançado mez de Novembro , parecendo já ao Senhor de Pancas , que merecia muito mayor cuidado a Capi- tania do Maranhão , por mais ameaçada dos primeiros golpes das armas inimigas ; para deixar inconftratavel a refiftencia delles com a aííiftencia da fua peíToa , par- tio para a Cidade de S. Luiz no dia 21 ; porque a fua zelofa actividade também fazia defprezar a taõ arrifca- da , do JEftaão âo Maranhão , Liv. XX. 675 da, como trabalhofa repetição de viagem taõ longa. Anuo 171a. 1468 Já nos últimos dias do prefente anno chegou ao Maranhão com a coítumada felicidade j e vendo-fe aíMidos aquelles moradores do feu grande efpirito , principiarão logo a defprezar os formidáveis ameaços da Armada Franceza. 1469 Seguio-fe a nova fucceíTaõ de 171 3 , e a ella Atino 1713. também a fatalidade da laftimofa morte de António da Cunha Souttomayor , que fervindo o emprego de Mes- tre de Campo da Conquifta da Capitania do Piauhy , os mefmos Tapuyas da fua obediência , com que fazia a guerra a todos os de corfo daquelle vaílifíimo Paiz, alei- vofamente lhe tirarão a vida , que tinha feito merecedo- ra de larga duração a finalada honra do feu procedi- mento. 1470 Sem outra memoria , que mereça bem efpe- ciaes recommendaçoes , apreíTadamente caminhou o prefente anno até a chegada dos navios do Reino 5 mas recebendo nelles o Senhor de Pancas as alegres noticias das negociações do CongreíTo de Utrecht para o ajufte do focego da Europa , já menos cuidadofo na defenfa do Eftado , paiíòu para a Cidade de NoíTa Senhora de Belém , onde defembarcou nos princípios de Agoílo. 1471 Ainda o novo anno de 17 14 achou no Pará o AmiOi7i4« Governador occupado todo nos intereífes públicos da Capitania ; mas defembaraçado deitas dependências , depois de nove mezes partio para a Cidade de S. Luiz no dia 19 de Outubro , afTiftido do Sargento mor Pedro da Cofta Rayol , provido no emprego de Capitão mor do Maranhão , em que fuccedeo a Jofeph da Cunha de Eça com o merecimento de muitos ferviços. 1472 Com a felicidade da viagem teve também Chriftovaõ da Coíla a de receber a ratificação do Tra- tado de Utrecht, concluído em 11 de Abril do anno paííado 5 e como comprehendia a renuncia de EIRey Qqqq ii Çhrií- K 6j6 Annaes Hiftoricos Anuo 1714. Cbriílianiííímo do direito , que queria ter na parte do Norte do grande rio das Amazonas 7 ceifarão para fem- pre as pretençôes injuílas daquella Monarquia ; porque ainda que pelo Tratado proviíional de 4 de Março de 1700 fe achavaõ amortecidas , como a deíiílencia tinha íído nelle fó condicional , e naõ abfoluta , como era pre- cifo nefte ajufte da paz , depois da formidável guerra da Liga , tornarão outra vez a refufcitallas os mefmos Francezes , para fazer melhor o feu partido. 1475 Entre os juítos applaufos de taõ alegre no- Anno 1715". va, fuccedeo o armo de 171 5; mas o Senhor de Pan- cas Chriftovaõ da Cofta livre já do cuidado da guerra da Europa , o empregou na do mefmo Paiz : e para dar mais evidentes provas , de que era tanto o zelo de que fe ennobrecia a fua actividade, como militar o feu gran- de efpirito , formando logo huma boa Tropa para o caftigo do Gentio de.corfo da nação bellicofa dos bar- baros , infeftadores da Capitania do Maranhão , fe de- clarou por feu Commandante. 1474 Como o General defía expedição o era do Eftado , fe adiantarão tanto as providencias para ella , que fahio da Cidade de S. Luiz dentro de poucos dias 5 mas deixando todos aquelles moradores cheyos de efpe- ranças , as malogrou com muita brevidade a inconílan- cia da guerra 5 porque fazendo hum deílacamento fobre os mefmos bárbaros , que encarregou ao Sargento mor Joaõ Nogueira de Soufa , quando eíle Cabo , cercada já a populofa Aldeã, a que fe reduzia o principal corpo da fua nação , valerofamente fe difpunha para a entrar àefcala, hum Soldado de baixo nafcimento, ou foííe por defcuido, ou por malicia, difparou huma arma: e avifados elles do eílrondo do tiro , fugirão quafi to- dos ao perigo , que os ameaçava , amparados também das fombras da noite com o conhecimento do terreno. 1475 Poucos foraõ os que naõ lograrão a mefma fortu- , do EJiado âo Maranhão ,Liv. XX. 677 fortuna , ainda depois de fentida já a íua deferçaõ j c Chriílovaõ da Coíia , que vio os feus Soldados fem ex- ercido , refervando-os para occafiaõ de mais honrofo emprego , fe recolheo com elles à Cidade de S. Luiz, 1476 Entrou o novo anno de 1716, e no dia 14 Anuo 17 16. de Fevereiro fe reftituío o Governador à Cidade de Be- lém do Pará , onde com a chegada dos navios do Rei- no foy promovido o Tenente General da Artilharia Jo- feph Velho de Azevedo ao emprego de Capitão mor da Capitania, de que tomou poífe em 11 de Junho, fuccedendo nelle a Joaõ de Barros da Guerra , que def- graçadamente tinha acabado a vida no rio da Madeira , hum dos que defembocaõ pela parte do Sul no das Ama- zonas , pela fatalidade de hum corpulento ramo de ce- dro , que lhe cahio em cima. 1477 Tinha fervido Jofeph Velho mais de vinte e oito annos efFe&ivos em praça de Soldado , Ajudante Engenheiro da Província de Traz os Montes , e de Sar- gento mor , e Tenente General da Artilharia da mefma Capitania do Pará 5 governo também de que havia fi- do encarregado por repetidas occafiões : e como aquel- les moradores fe achavaõ já com boas experiências da fua muita capacidade , deveo a todos eíle provimento as mais verdadeiras eílimações. 1478 Com razaÕ fatisfeito ChriftovaÕ da Cofia do benemérito fubílituto , com que fegurava o focego pu- blico da Capitania do Pará ; e naõ o eílando , de que o fuccefTò da guerra do Gentio bárbaro , de qup havia fi- do Commandante o anno pàíTado , refpondeífe taõ mal às fuás efperanças , procurou o defempenho delias com mayores esforços no prefente anno , levando da Cida- de de Belém para a de S. Luiz do Maranhão , além de huma Companhia de Infantaria , de que era Capitão Joaõ do Amaral , hum avultado corpo de índios fre- cheiros j e ainda que chegou àquella Capital com pou- ca % MÊ ■ |. 678 Annaes Hifloricos Annoiyió. ca faude , formou logo huma grande Tropa ? que en- carregou a Francifco Cavalcante de Albuquerque com a graduação de Sargento mor. 1479 Dentro de poucos dias fahio da Cidade de S. Luiz eíle Commandante na direitura do Itapicurú , rio da terra firme , para fazer a fua entrada pelo CertaÕ dei» le j mas entendendo o Governador , que a fua marcha naõ iria ainda muito avançada , lhe mandou ordem para retrocedella até a Cafa forte do Iguará , que fica na bo- ca da Capitania do Piauhy , com a noticia dos grandes eílragos , que tinhaõ feito nella ( principalmente em hum comboy de muita importância , que paíTava para a mefma Cidade de S. Luiz ) os Tapuyas de coifo de varias nações , que fendo em outro tempo da alliança do Eftado contra outros Gentios inimigos de todas , de , baixo da conduta do Meílre de Campo daquella Con- quifta António da Cunha Souttomayor , aleivofamente lhe tirarão a vida, como já deixo efcrito no lugar a que toca. 14S0 Tinha fido cabeça de huns , e outros infultos hum índio chamado Manoel com a antonomafia de La* dino , que nafcido no grémio Catholico , e devendo a fua educação aos Miffionarios da Companhia de Jefus , era o que fazia entre todos elles oílentações mais bar- baras da fua primeira natureza : e defejando o Gover- nador o feu jufto caíligo , o difpoz bem com a expedi- ção deftas novas ordens , que deu à execução Francifco Cavalcante com a devida pontualidade j porém pare- cendo ao mefmo General , que elle havia faltado mali- ciofamente na parte mais eífencial à verdadeira intelli- gencia delias , lhe defpachou fegunda , para que tanto que chegaíTe ao Iguará , obedeceífe ao novo Meílre de Campo da Capitania do Piauhy Bernardo de Carvalho de Aguiar , que então fe achava naquelle mefmo fitio ; e unido com elle Francifco Cavalcante , fe naõ logrou o prin« do E/lado do Maranhão , Liv. XX. 679 o principal projecto do Senhor de Pancas no merecido Anno 1716. eftrago do índio Manoel , cabeça dos infultos ; por fu- gir aos feus golpes os defcarregou na naçaõ Aranhy da mefma fereza dos Barbados > que deixou deftruida , fa- tisfazendo bem com os acertos defta fegunda acçaô os prefumidos erros da primeira. 148 1 Sem outra memoria , que com razaÕ poífa demandalía , fuccedeo o anno de 1717 5 mas caminhan- Anno 1717. do com omefmo filencio até o mez de Junho , em 4 deíle entrou na Cidade de S. Luiz do Maranhão com o grande emprego de Bifpo do Eftado D. Fr. Jofeph Del- garte , Religiofo da fagrada Ordem da Santilíima Trin- dade , ta6 conhecido em Portugal pelas fuás virtudes , como pela elegantiffima erudição das fuás doutrinas nos Púlpitos deile. 1482 Fez eíle Prelado a fua entrada publica naquel- la Diocefi no dia 12 do mefmo Junho ; e nas aíFeáuo- fas demonftraçoes defla celebridade ( que authorizou mais ChriftovaÔ da Cofta com a affiílencia da fua pef- foa ) feguraraõ bem todos aquelíes moradores , que re- cebiaõ novas almas no abundante pafto ? que lhes pro- mettia hum Paftor tao zelofo do fuftento delias. 1483 Aqui fe deteve todo' o tempo ,..>que lhe foy neceíTario para reduzir aquelíes povos à boa harmonia Ecclefiaftica ? que em graviííimo damno das confcien- cias havia muitos annos fe achava confundida com a falta de Bifpo , ajudada muito das relaxadas influencias do meímo Paiz 5 e paífando também com o mefmo cui- dado para a Capitania do Graõ Pará , chegou à Cidade de Belém em 24 de Dezembro ,■ na qual encontrou nao fó igual aceitação à que tinha devido aos moradores' de S. Luiz , mas ainda muito mais empenhada nas liberaes orientações delia. 1484 Seguio-fe o anno de 1718 5 e em 21 do mez Ànnoi7i8. de Fevereiro fe recolheo Chriílovaô da Cofta à fua re- fidencia ': : j 68. Annaes Hiíioricos í Armo 1718» íidencia mais ordinária de Belém do Pará, única me* moria , que fe nos recommende até o dia 1 9 de Julho J que entrou no rio daquella Cidade , já fora da efperan- ça dos moradores delia , hum navio do Reino , de que era Capitão de Mar , e Guerra Francifco Lopes de Sou- fa , com a noticia de que conduzira a íeu bordo da Cor- te de Lisboa para a Cidade de S. Luiz do Maranhão , onde o deixara , o novo Governador, e Capitão Gene- ral do Eftado Bernardo Pereira de Berredo. 14S5 Tinha elle entrado na grande bahia daquella Capital em 14 de Junho , depois de huma trabalhofa viagem de feiTenta dias , fem mais companhia , que a que levava a bordo da fua mefma embarcação , por fer fó eíla a que havia fahido de Portugal para aquelle Ef- tado no prefente anno : e tendo -fe delia certa noticia «a Cidade de S. Luiz , pelos avifos que coftuma fazer huma vigia , que affifle fempre para o mefmo fim em hum íitio muito eminente , chamado de S. Marcos , que lhe fica fora da barra , fe lhe meteo a toda a diligencia pratico delia , pelo qual foube, que fenaõ achava no Maranhão o Senhor de Pancas. 1486 O mefmo Piloto, que tomou o governo do navio, o efcalou com os primeiros bordos na reftinga de hum banco de área , já embocando a entrada 5 mas Bernardo Pereira depois de fegurallo do perigo com a aííiítencia da fua peífoa , informado bem de naõ poder vencella por falta de aguas, fenaõ na maré do feguinte dia , faltou no efcaler com o novo CommifTàrio Geral da Ordem de NoíTa Senhora das Mercês Frey Miguel Ribeira ; e fem outra alguma comitiva defembarcou repentinamente no fitio do Convento deíles Religiofos, que fica fobre o mar , aonde logo concorreo a mayor parte da nobreza , e povo. 1487 Achava-fe a Cidade de S. Luiz do Maranhão perigofamente confternada pelas diabólicas fuggeftões dos V do Eftado do Maranhão , Liv. XX. 6 8 1 dos mal intencionados com nome de queixoíbs , de que Anno 1718. eraõ cabeças , com efcandalo o mais deteftavel , os Ba- charéis Vicente Leite Ripado, ejoaõ Mendes de Ara- gão , o primeiro Ouvidor Geral actual da Capitania , e o fegundo , que o havia fido da do GraÕ Pará, que de- çlarando-fe capitães inimigos de Chriftovaô da Cofta , foliei ta vaõ o defafogo do feu ódio na divifao dos âni- mos, a que dava também muito calor o natural orgu- lho do povo , que amigo quaíi fempre de novidades , aborrece a extenfaõ dos Governos , ainda quando faõ os mais empenhados na utilidade publica , como íuecedia no prefente , pelo largo efpaço de mais de onze annos 5 porque como as conveniências naõ abrangem a todos , ou por falta de igualdade diftributiva , ou de nafeimen- to para o verdadeiro exercicio delia , huns por fe coníí- derarem offendidos na primeira parte , aconfelhados fá do amor próprio , outros por aceu fados das íiias graves culpas , julgando-fe já livres do feu juílo caíligo nas mudanças do tempo ; e os mais também fó por feguil- las, como íacriflcio à inconftancia do Mundo, idolo fempre o mais devoto para o culto delle , como a tal in- ceníavaõ todos o novo fueceífor , procurando perfua- dirlhe na efficacia das fuás exprefoes , que eraõ mais efFeitos do natural aífedo , a que os inclinava o agrado da prefença , e antecipada fama do feu nome , que das dependências do minifteriOd 1488 Porém elle , que tinha feito huma verdades ra anatomia nas legitimas caufas daquella adulação , quando para melhor authorizalla fe empenbavao mais os mefmos lifongeiros nas diligencias da fua poífe , refpondia , que o Senhor de Pancas era , e feria fem- pre o Governador daquelle Eftado , em quanto qui- zeífe afMir nelle ; e aífim que fó cuidava de paífar logo ao Pará , para que entregando-lhe todas as or- dens , que levava , tiveífe as mais feguras iníkucçoes Rrrr " para 't \ 682 Annaes Hifioricos Anno.1718. para os acertos do governo na obediência das fuás» 1489 Juíliííimamente convencido da repetição das mefmas inftancias , recommendadas já da utilidade pu- blica , na expedição precifa de varias providencias , fe fujeitou com tudo Bernardo Pereira ao pretendido a&o, depois de quatro dias de repugnância vigorofa j porém bailarão eftas , e outras muitas attenções politicas > com que tratou o feu anteceíTor , naÕ fó para fazer emmu- decer todos os emulos do feu merecimento , mas tam- bém para que logo furTocadas as mal intencionadas fug- geftões , que dividirão os ânimos , fícaífem todos rèçH nidos para o geral focego da Capitania. 1490 Bem conheço , que nas fucceísões de todos os Governos he efte caminho o menos trilhado ; po- rém eu quizera , que os que fogem delle , accufaíTem fó o procedimento dos feus anteceííbres , regulando de for- te as fuás acções , que no acerto delias parecefle verda- deira doutrina , que tinhaÕ aprendido nos erros alheyos, o que naô he mais que malevolencia da emulação pró- pria j porque condemnando ordinariamente como deli- do grave qualquer defcuido , chegaõ também a desfi- gurar as acções mais honrofas, para fe defviarem da fua imitação, até com prejuízo da utilidade publica , e ef- candalofa injuria do feu mefmo credito nas reflexões po- liticas de mayor inteireza 5 pois he fem duvida , que quem fe emprega todo na vil ufurpaçaõ de eftranhas glorias , fe naõ acha capaz de adquirillas pelas illuílres negociações da heroicidade : mas fe os Príncipes caíli- gaíTem fempre efta enorme culpa com a feveridade que merece , além da virtuofa fatisfaçaõ de humas queixas taõjuftas, tiraria delia importantiflímos intereífes o feu Real íèrviço. 149^ Tenho chegado ? com o favor Divino P a ulti- ma deílinada baliza da minha carreira j porque como para continualla , ou havia de diffimular algumas ac- ções io 'Eftaão do Maranhão , Liv. XX 683 ções próprias com culpável íílencio ( a que em lugar do Anno 171 8. virtuoíb nome de modeília , fe daria íem duvida o abo- minável de hypocriíia ainda nos juizos mais defapaixo- nados ) ou fazer de todas relação muito exa&a , com o certo perigo de a ver condemnada como vangloria ( íe acafo naÕ paíTaíTe muito mais adiante a mordacidade da calumnia , infamando também a verdade delia , que hs a alma da hiíloria ) me vejo obrigado por todos os prin- cípios a fufpender já o grande trabalho defta Obra , a que fuavemente fó me fujeitaraõ os judos interefTes do ferviço do Príncipe , e utilidade publica , objectos no- bres dos meus largos eíludos nas bem merecidas recom- mendações de taÔ fieis memorias , que fubmetto em tu- do à correcção Catholica da Igreja Romana , como difcipulo o mais obfervante das fuás infalliveis doutri- nas. ■í." i-iii ÍLrrr u ÍNDICE 08; ÍNDICE DAS COUSAS MAIS NOTÁVEIS deite Livro» Os números mojlrao os parágrafos. A A Cará , rio caudalofo da Capitania do GraÕ Pará ,41. AcçaÕ heróica dos Portuguezes da rriefma Capitania , 658 até 738. D. AfonjoVl. Arrebatadamente toma O governo dos feus Reinos ^ iiaji A fua renuncia , ou depofiçaõ , 1 1 64. Agojlinho Corrêa. Reconhece o Forte do Itapicurú, e o occupa achando-o aban- donado dos Hollandezes , 898. Succe- de no governo do Eftado do Mara- nhão , por nomeaqaõ de André Vidal , 1009. O feu elogio , 1010. Succede- lhe no mefmo governo Dom Pedro de 'Mello, 101$. Agqflinho de Zarate. Hiftoiiador do Reino ^do Peru , 7 6. Aguarico, rio, chamado do Ouro, 708. Aires da Cunha.. Vay com numa Arma- da ao Maranhão, 4$. Perde-fe nos bai- xos da Ilha do Medo , e fe falva fó ai- ■ guma gente , que depois de algum tem- po torna a Portugal , 46. Varias noti- cias defta jornada , que fe convencem de menos verdadeiras ,48 até ji. Aires Pinçon , companheiro de Vicente Yanes Pínqon no defcobrimento do rio Maranhão ,, 2. Aires de Sou/a ChicWro. Subftitue o go- verno da Capitania do Pará , 47/ , 941 , £44. Suceede no mefmo governo , 654, 95 $, Torna a òccupallo, 745 , 5)85. Aldeãs de índios domefticos da Capitania do Graõ Pará , 740. Akivojia dos Francezes, 2Í7. D. Aleixo de Menez.es , Vice-Rèy de Por- 1 tugal , ?8i. Alexandre de Moura. He nomeado Com- mahdante de huma Armada para a Con- quiíla do Maranhão , ^82. Sahe do rio de Olinda de Parnambuco , e entra pe- la barra do Periá. Dá fundo na bahia de S. Jofeph , 384. Poderes que leva , 387. Faz-fe à vela , e entra na bahia do Maranhão. Defembarca na Ilha de S. Francifco , onde fe fortifica, 589. Oc- cupa a Fortaleza , e recebe as chaves das mãos do Senhor de la Ravardiere , 398. Nomea a Jeronymo de Albuquer- que Capitão mór da Conquifta do Ma- ranhão, e a Francifco Caldeira de Caf- tellobranco do defcobrimento do Graõ Pará , 402. Recolhe-fe a Parnambuco com o Senhor de la Ravardiere ,41o. AJonfo de Miranda , Governador da Pro- víncia .*>■ Í8ó índice víncia dos Quixos , intenta a entrada do f a mofo rio das Amazonas ; mas morre antes deita expedição, 52. Alotijo de Ovalle , Hiftoriador do Reino de Chile ,'$. Amaro de Couto. Morre na batalha deGua- xenduba, 3 07. Amazonas. Nome que deu Francifco de Orelhana ao rio Maranhão, 67. O Padre Ambrofw de Amiens. Morre na Fortaleza de S. Luiz. O feu elogio , 164, . Anára%on. Entra na Fortaleza de S. Filip- pe com hum bom foccorro. Tinha também fido Commandante da invafaõ da Ilha deS. Thomé. Faz huma fahi- da. O máo fucceífo delia , 847 até 850. •O Padre André de Anieda , da Companhia de Jefus. He nomeado para acompa- nhar a Pedro Teixeira ,695. PaíTa a Hefpanha com o Padre Chriftovaõ da Cunha , 750. D. André Furtado de Mendoça , Marquez de Canhete , Vice-Rey do Peru , 86. André Vidal de "Negreiros , primeiro Go- vernador , e CapitaÕ General do Eftado do Maranhão na reunião do governo geral. O feu elogio. Toma poftè do go- verno do Eftado. PaíTa ao Pará. Suas primeiras difpoficões , $58 até 1005. PaíTa ao Governo de Parnambuco por promoqaõ do Meftre de Campo Gene- ral Francifco Barreto ao Governo do Brafil, roo8. António de Albuquerque. Mal ferido na ba- talha de Guaxenduba ,30?. A diftinçaõ do fèu procedimento, 308. Succede no governo da Capitania do Maranhão , 44.8. Difpoem o caftigo dos Topinam- bazes , que encarrega a feu irmaõ Ma- thias de Albuquerque, 45 1. Vitoria que coníegue pelo valor do mefmo Com- mandante , 454. António de Albuquerque Coelho de Carvalho. Succede no governo do Eftado do Ma- ranhão , 1 E s o. O feu elogio , iiçi. Le- va a refolucaõ fobre as queixas do Efta- do na matéria dos índios , 1153. De- clarações que faz na mefma Ley , 1 1 ^ . Manda fuTpender do exercício de Capi- taÕ mór do Graõ Pará a António Pin- to da Gaya , u/7. As fuás afperezas , • 11 5 9. Sente as queixas dos moradores do Pará , 1162. DemonftracÕes que faz, 1178. Chegalhe fucceftbr , 1 180. António de Albuquerque. PaíTa à Capitania do Maranhão por ordem do Governa- dor , para focegar a fubíevacaõ de S. Luiz. Chega a Tapuytapera , Capitania de feu pay , 1305. Pede hcenqa aosfe- diciofos , para lhes communicar negó- cios importantes , mas naõ he admitti- do , 1304. Defenganado fe recolhe ao Pará , 1310. Succede no governo da Capitania , 1333. Succede no governo do Eftado , 1563. O feu elogio , 1 3 64. Repofta , que dá ao Governador de Cayena fobre os limites das Coroas , 1369. He reconduzido no governo do Eftado , i 372. PaíTa a examinar o gran- de rio das Amazonas, 1376. Noticia, que recebe na mefma viagem , e medi- das que toma, 1378 até 1389. A fua prudência nas lemrazões do Bifpo D. Timotheo, 1418. Defpachos, que re- cebe no mefmo governo, 1420. PaíTa com licença a Portugal , 1421. O feu novo elogio em huma Carta do Sena- do da Camera de Belém do Pará , 1422. S. António de Alcântara. Povoaqaõ Capi- tal da Capitania do Cumá , chamada vulgarmente Tapuytapera. He capaz furgidouro para todo o lote de embar- cações. Divide-fe da Cidade de S. Luiz com huma bahia de quatro léguas. Tem cincoenta de coita até a bahia de Toriguaíiu , 32. António Arnau Vilella. Vay por Comman- dante de huma Tropa ao rio Urubu , mi. O fucceflo que teve , 11 12 até 1115. António Cavalcante de Albuquerque. Subfti- tue o governo da Capitania do Graõ Pará , 600. Governa também a do Ma- ranhão , 644. António da Cojla. Soccorre o Tenente Ge- neral Pedro da Coita Favella com valor, e fortuna , 11 38. António da Cunha Souttomayor , Meftre de Campo doPiauhy. Morre aleivofamen- te às mãos dos Tapuyas , que lhe obe- deciaõ. O Teu elogio. António Dias Madeira. Vay reconhecer a liba do Maranhão com duas canoas ar- madas das coufas notáveis. madas em guerra , 8tfj>. Encaminha fe para a parte do Force de Itapicurú. Cautela de que ufa , 870. Faz prizionei- 10 hum Hollandez , 871. Noticias que lhe dá , e generofa refoluçaõ que toma, 872 , $ 7 ], Os effeitos delle , 874 até 8 7 S. Amónio âe Deos. He o primeiro Portu- guez , que faltou em terra no defcobri- memo do Gra5 Pará ,405. António Gritante. Morre namefmaocca- íiaõ , ^ojí D. António Luiz. de Menez.es, Marquez de Marialva. O feu elogio , 1087. Carta , que efcreveo ao Senado da Camera de Belém do Pará, 1088. ír. António da Merciana , da ProvinciV Capucha de Santo António. Chega à Cidade de Belém com mais três Rcli- giofos da fua Ordem , 445. Funda hum Hoipicio no fitio de Una , 444. António Moniz. Barreiros. Succede no go- verno da Capitania do Maranhão , 494» He nomeado Commandante pelos mo- radores de S.Luiz para a grande acçaõ de lançarem fora os Hollandezes. O feu elogio. Aceita o emprego , e inten- ta o primeiro golpe nos engenhos de aíTucar do rio Itapicurú. OraqaÕ mili- tar , com que communica eíle penfa- mento. Antecipadas prevenções para a mefma empreza. Forma para ella novo projeelo. A fua geral approvaçaõ. Ren- dimento do primeiro engenho. Logra no feu a mefma fortuna ; mas com ma- yor vitoria pela difputa delia. Rende os txcs que lhe reftaõ. Dií põem a interpre- za do Forte do Calvário. Pofta-fe debai- xo das fuás baterias. Entra o Forte. Va- lor com que o rende. Guarnece-o , e paíTa logo à Ilha com o grande projeclo- de interprender também a Fortaleza de S. Filippe. Avança huma partida de trinta Soldados, que encontrando qua- renta dos Hollandezes , os desbaratarão inteiramente. Muda de penfamento ,- vendo-fe já fentido , c fe aquartella fres léguas da Cidade ; mas rta diftancia de huma põem hum defiacamento. Tem avifos , de que os Hollandezes querem atacallo , e fe difpoem para a oppofi* eaõ. Feliz loçro delia com prande çlo- ria fua. Arma dos defpojos aos mora- dores , que novamente fe lhe unem. Difcurfos , que fe fazem para as medi- das das feguintes acções. Marcha fobre a Cidade. Defcobre a Povoação , e oc- cupa o Convento do Monte do Car- mo. Ganha outros poftos mais avan- çados , onde fe principia a fortificar. Adianta muito as fuás obras, e fe che- ga a portar cento e cíncoenta pafíbs da Fortaleza , donde fe naõ atrevem já a fazer fahidas os inimigos , 806 até 85 í. Morre de enfermidade. O feu elogio , 851. António de Oliveira. Diítingue-fé na exr pediçaÕ de Urubu , 1 1 3 9. António Pinto deGaya. Succede no gover- no da Capitania do Pará. O feu elogio, 1141. A fua fufpenlaÕ , 1157. António Rapofo , Meftre de Campo dos Pauliftas. Chega com huma Tropa à Fortaleza do CurUpá ,956. Occafiões , que já tinha tido , 957.. O Padre António Rapofo Tavares. Vay def- cobrir o rio dos Tocantins com as pro- meíías de ricas minas de ouro , 1201. O fucceífo deita expedição , 1202. António Teixeira de Mello. Subítitue ò go- verno das armas, 845. Intenta a efcala da Fortaleza de S. Filippe , que lhe naõ deixa praticar a contradição dos parece- res. Procura reduzillos , e perde na de- mora a opportunidade , 846. Procede com muita diftinçaõ em huma fahida , 850. Occupa o governo da guerra por morte de António Moniz , 852. Defti- tuido de munições de guerra , intenta | abandonar ò feu Quartel de S. Luiz do Maranhão , e retirarfe à terra firme. Regula a fua marcha j e a executa com militar ordem. Suppondo já que feria feguido dos inimigos, difpoem huma embofeada , 8$í. Felicidade com que a logra. Com os defpojos Hollandezes ar- ma melhor os feus Soldados. Sufpende a jornada de Tapuytapera , aonde con- duzia as fuás Tropas , é as pofta nò fi- tio de Moruapy , cobertas do Forte do Itapicurú , 854 até 858. Faz duas entra- das com igual fortuna ; mas dilatando- fe-lhe os fòccorros , paíià com effeito a Tapuytapera-, %6q. Perigoíb accidente de l! 688 índice de cue fe vê acomettido , 26i. Toma de S. Luiz , e intenta reduzir aquclle a refoluqaõ de paíTar ao Pará 5 mas tam- bém muda delia com grande gloria fua. Oraqaõ militar que faz aos feus Solda- dos. Os effeitos que produzio , e como fabe aproveitarfe delles. A felicidade do fucceflò. Propofta , que lhe faz o Commandante de huma Efquadra Hol- landeza , e a conílancia com que lhe ref- ponde. Muda de alojamento. Ouve difparar muita artilharia para a parte da barra , e manda examinar a occafiaõ d eít. a novidade, diligencia, que fe ma- logra. Faz hum deílacamento ,que me- te na Ilha do Maranhão. O fuccelTo delle. Mete na mefma Ilha outra par- tida com igual fortuna ,863 até 895. Manda reconhecer o Forte do Itapicu- rii, que acha abandonado , 8517, 898. Faz hum deftacamento , que mete na Ilha do Maranhão, aonde também paf- fa , e poíía as fuás Tropas, 8519. Con- tinua a guerra multiplicando as hoíiili- dades , $16. Recebe a noticia do fale- cimento do Governador Pedro de Al- buquerque ; e esforça mais a fua conf- tancia para a oppofiçaõ dos Hollande- zes , até que os obriga a defertár a Ilha, 917. Ghega-lhe logo efta noticia , e oc- cupa a Cidade de S. Luiz , 918. Avifa promptamente a Corte de Lisboa, 92$. O feu elogio, 92Í, 927. Fica gover- nando a Capitania , 928. António Telles da Silva , Governador do Eftado do Brafil. O feu elogio. Soc- corre o Maranhão com algumas muni- ções de guerra , 900. Púdre António Vieira , da Companhia dejefus. Chega à Cidade do Pará, 51730 Carta que leva, e o que produzio , 974, 57 y. Reprefentações, que faz à Corte, 1022. Repoíla que dá a huma Carta da Camera do Pará , 1030. Navega para a Cidade de S. Luiz , e avifo , que re- cebe do Governador com a noticia da fublevacaõ daquelles moradores, 1045. Volca do caminho para a Povoaqaõ do Gurupy, ibid. PaíTa ao Pará, ibid. Re- prefentaqaõ , que faz ao Senado da Ca- mera, 1044. He prezo pelos moradores da mefma Cidade , que o levaõ para a do Maranhão , 1057. Chega à Cidade povo 5 mas a fua barbara obftinacaõ o embarca para Lisboa, onde toma porto com feliz viagem, 1060, 1062. Capi- tulo da fua vifita das Mifsões, 1095. Araguaya. Rio da Capitania do GraÕ Pa- rá , 1205. Arary. Rio chamado da Saúde, que defem- boca no dos Tocantins , 1204. AraJJagy. Vifinha enfeada da Ilha do Ma- ranhão, 26 <. O Padre Archangelo de Pembroch, Commif- fario dos Capuchos Francezes. Acom- panha ao Senhor de la Ravardiere para a batalha de Guaxenduba , $46. Dá hum rico ornamento aos Portuguezés , Armada HoUanâs%a na Ilha de S. Luiz do Maranhão , 764. O Padre Arjenio de Pan\. Affifte ao Se- nhor de Racily na expediqaõ do Mara- nhão ,123. Artur de Sá de Meneses. Succede no go- verno do Eftado dó Maranhão , 1348. O feu elogio , 1349. Efpecial ordem que leva , e o mal que a cumpre na pri- meira acqaÕ, 1350 até 15^1. Paíla ao Pará , onde toma poíTe do governo , 1353. Chega-lhe fucceíTor , 1363. Paf- fa a Portugal , 1 3 66. Audiência Real de Quito. Avifa o Vice- Rey do Reino de Peru da expedição de Pedro Teixeira , é'87. Aunay , irmaõ do Senhor de Racily , o acompanha na vifita da Ilha do Mara- nhão , 1Í3. Auto jurídico para a declaração dos limites das Coroas de Portugal , e Caftella , pe- la parte do Reino do Peru, 705. Ah/a da Cidade de Pelem. NaÕ fe for- ma do rio das Amazonas , 41 . Palthafar Fernandes, Capitão mór do Ma- ranhão. Cuida pouco na confervacaõ da Capitania, 12^2. A fua froxidaõ , e a fua cegueira, 12^. Avifos que def- preza, 1263. Defperta do letargo ; mas já fora de tempo , 1274. Reconhece a culpa de fua froxidaõ , e procura eraen- dalla ;.V âas coufas notáveis. 689 dalla na liberdade, com quedifcorre, mas com pouca fortuna , i2j6 até 1278. Balthajar Rodrigues de Mello. Occupa o governo da Capitania do Graõ Pará , 4Ó7. Vay prezo para Portugal , 474, Balthajar de Seixas Coutinho , Capitão mói - da Capitania do Maranhão por nomea- ção do Governador Gomes Freire , 134.6. Sente a leveza com que entregou a Capitania ao Governador Artur de Sá, 1552. Balihafar de Soufa Pereira. Succede no governo da Capitania do Maranhão , íupprimido o do Eftado ,754. O feu elogio , 9Í0. As fuás primeiras acqões , e ó que produzirão , f6i até 964. Aca- ba o feu lugar com a reunião do gover- no do Eftado, 999. Barbados. Tapuyas de corfo da Capitania de S.Luiz do Maranhão, 1475 . Bartholomeu Barreiros de Ataíde. Vay def- cobíir o Lago Dourado por ordem do Governador Luiz de Magalhães ,95o. O fucceíTo da tua jornada , 515 2. Bartholomeu Carrafco. Fica ferido na bata- lha de Guaxenduba , ^07. Bartholomeu Ramires. Morre na mefma batalha , ibid. Belchior Rangel. Vay reconhecer a Ilha do Maranhão , 248. Volta com as no- ticias, e as dá também dafitio de Gua- xenduba, 251. Buíca ao Senhor dePratz para abordallo , e efte fe retira , 264. Vay em hum caravelaõ buícar os Fran- cezes de baixo da paz , e engano que experimenta, 266 , 267. Recolhe-fe a Guaxenduba , 268. He nomeado para huma naval expediqaõ ,281. O fuecef- ío delia, 282. Fica ferido na batalha de Guaxenduba, 308. Belém do Graõ Pará , Cidade Capitai def- ta Capitania, ^6. O Padre Benediãõ Amaâeo , da Compa- nhia dejefus. Afiifte a Alexandre de Moura na expediqaõ do Maranhão , 415. Bento Maciel Parente. Vay defcobrir o rio Pindaré , e o fuecefío defla expedi- qaõ, 41 5. He nomeado Adjunto no go- verno da Capitania do Maranhão, oc- cupacaõ, que naõ exercita, 449. Reedi- fica o Forte de S. Jofeph deltapery, ib. Chega ao Pará com hum corpo de Tropas vitoriolb já dosTopinambazes, 477. Intenta o governo da Capitania , que naõ confegue , 482. Volta ao Ma- ranhão, e funda hum Forte na boca do rio Itapicuui , 484. Succede no gover- no da Capitania do Para- O feu elogio, 480, 490. Faz hum armamento para o foccorro de Luiz Aranha de Vafcon- cellos , e fe declara por feu Comman- dante. Sahe da bahia de Belém do Pa- rá , 501 , 502. Vitorias que confegue , 505 até 509. Succede no governo geral do Eílado. O feu novo elogio , 672 , 6?]. Leva a decifaõ de todas as duvidas febre as adminiftrações dos índios for- ros , 676. Faz conhecer juridicamente da eleiqaõ do feu antecefTòr Jacome Raimundo de Noronha , que he julga- do por naõ Governador , 677» As fuás prevenções para a defenfa do Eftado na oppofiqaõ dos Flollandezes , 752. Def- attende a defenfa delle. He Donatário da Capitania do Cabo do Norte , para onde manda Infantaria He con- firmado Governador pelo novo Rey de Portugal D.Joaõ IV. , 756. Communi- ca logo a noticia da Acclamaqaõ à Ca- pitania do Graõ Pará, -j^j. Carta que efereve ao Capitão mór Francifco Cor- dovil , 75 8. Manda ordem ao Pará , pa- ra que pairem a Portugal os avifos da obediência do Eftado, 762. Recebe or- dem de EIRey D.Joaõ para naõ tratar como inimigos mais que fó a Mouros , e Caftelhanos. Defacordo com que a entende , 764. Chega-lhe a certeza de que fe difpunhaõ os Flollandezes para a fua invafaõ. EfFeitos que ella produzio, ibid. Demandaõ osmefmos inimigos a entrada da barra de S. Luiz , e o proce- dimento que teve com elies } 764. En- cerra-fe na Fortaleza de S. Filippe , 766. Queixa-íe a Joaõ Cornelles , Gomman- dante dos Hollandezes , do procedimen- to das fuás Armas , yáy. Sahe da For- taleza para conferir com os inimigos , e ajufta , que lhes daria para quartéis par- te da Cidade , ficando elle com o go- verno , 76$. Injuriofo defprezo da lua honra , j6<). Continua nas mefmas ac- ções com novas circunílancias para a Ssss fua «1 6p' índice fua infâmia , 772 até 774. Joa6 Cornel- ks o leva para Parnambuco. O Conde de Nazau o trata com defprezo , e man- da prezo para a Fortaleza do Rio Gran- de , onde morre dentro de poucos dias, 780. Elogio das fuás primeiras acções , ereprehenfaõ das ultimas ,781. Refle- xões politicas fobre o mefmo aflumpto, 782, 78;. Bernardo de Carvalho de Aguiar , Meítre de Campo da Capitania do Piauhy , 1480. Bernardo Ter eira de Benedo. Succede no governo do Eftado do Maranhão, 1484. Confternaqaõ em que acha â Capitania de S. Luiz , e os motivos delia , 1487. AttençÕes que pratica com o Teu ante cas. Succede no governo do Eirado do Maranhão , 144?. O feu elogio , 1444, 1445. Taifa à Cidade de Belém do Pará, 1447, As fuás primeiras acções , 1452. He reconduzido no governo do Eftado, 1462. Avilbs que recebe , eproviden» cias com que difpoem o Eftado para a fua defenfa , 1464 , 14o 6. Vay fazer a guerra ao gentio de coríò, e o fuecefib delia , 1475 , 1474. Faz nova expedição para o caítigo do mefmo gentio, e o íucceíTb delia, 1478 até 1480. Parta para a Cidade Belém , e chega à de S. Luiz o feu fucceííòr , 1484. Padre Chriftovad da Cunha , da Compa- nhia de Jefus. He nomeado para acom- panhar a Pedro Teixeira, 69 $. A fua ceffbr, 1488, 1485». Catholica politica relaqaõ deita viagem, com as correc com que difeorre , 1490. Razões por- que naõ efereve o feu governo , 149 1. Bijpo de S.Maló. Chega a Cancalle , porto, e Cidade de Normandia , 126.' Benze os Eftandartes de Franqa , e Armas do Senhor de Racily ; mas naõ faz o mef- mo aos navios , e a razaÕ porque, 127. ções delia, 695 até y\%. Paflà a Hefpa- c Aena. Colónia , e Ilha de Franqa , _ 15. Era conquifta Caftelhana , ibid. Caiiicahi\es. Tapuyas de corfo. A fua aleívoíia , 1409 Cayeté. Capitania do Porteiro mórjofeph de Mello de Soufa , 40. Camutâ. Capitania de Francifco de Albu- querque Coelho de Carvalho , ibid. Capuchos de Santo António. Saõ os primei- ros Religiofos Portuguezes , que fe eíta- beleceraõ no Maranhão, 401. Carlos V. , Emperador. Mandou levantar hum padraõ de mármore junto da boca do rio de Vicente Pinqon, para que fer- vifle de baliza às índias Caftelhanas , 14. Carlos de Lorena , Duque de Umena , } 5 5 . Carta do Marque^ de Marialva ao Senado ; da Camera de Belém do Pará, 1088. Catholicas demonflrações do agradecimen- to dos Portuguezes , depois da batalha de Guaxenduba , $52. Ceará. Vide Seara. Chrijlovaõ da Cofia Freire, Senhor de Pan- nha 750. Fr. Chrijlovaõ de Lisboa. Chega à Cidade de S. Luiz do Maranhão com o empre- go de primeiro Cuílodio da Ordem Ca- pucha de Santo António , e as ordens que leva, $19 até $22. Pafla com as mefmas à Cidade de Belém do Pará. Alterações da Capitania , e o motivo delias, 525) , 552 , $46 , $47. Prudente moderaqaõ defte Religiofo , que faz re* duzir tudo à fua antiga tranquillidade j e o feu elogio, 548 até 550. Padre Cláudio de Alvilte. Hiftoria da Milíaõ do Maranhão , 519. Faz huma larga relação, que intitula: Hiíloria de huma certa Perfonagem , que fe cha- mava defeendente do Ceo ; mas com noticias mal averiguadas, 102. Aflífte ao Senhor de Racily na expediqaõ do Maranhão , e Viflta da Ilha, 125 , 159. Acompanha-o na jornada de França , 177. Defembarca em Avie de Gracia com íeis Tapuyas do Maranhão , que iaõ recebidos com huma grande tolem- nidade , 180, 187. Noticias apócrifas da fua Hiftoria , e o fundamento delias, 187,388. Commoçav do povo de Belém do Pará , e ofocego delle , 579, 580. Conde deChinçon , Vice-Rey do Reino do Peai Expede varias ordens à Real Au- diência de Quito, 689. Conílancia do Prefidio de Nofíà Senhora do das coufas notáveis, 691 do Rofario , e triunfo , que conferue , . m- Covfiancia dos Francezes na batalha de Guaxendtiba , jqo. C8. Declarações na entrega da Fortaleza de S. Luiz, 395. Defcripçao da Capitania do Maranhão ,13. Defcripçao da Capitania do Graõ Pará, 36. Defcripçao da ferra de Ybiapaba, 100. Dejcripçaõ do rio das Amazonas , e a fua origem , 6yj até 740. Defcripçao ào rio dos Tocantins, 1203 até 1206. Dwgo Botelho da Vide. Deftroe os Topi- nambazesdo Graõ Pará, 457 , 438. Diogo de Campos Moreno , Sargento mór do Eftado do Brafil. PaíTa a Portugal , e íe reftitue ao mefmo Eítado , ioj , 104. Deixa o ferviço do Brafil , e volta a elle com o mefmo emprego, 194 , 15)5. Trabalha na expedição da Arma- da para a Conquifta do Maranhão, 203. Sahe com ella do rio do Recife de Par- nambuco , 2\C. Encorpora-{'e com Je ronymo de Albuquerque , e lhe pre- fenta huma Proviikõ de feu Adjunto , 225. o Periá Moftra que fe deve forti- , 247. Refoluçaõ que to- i n 2 > delia à fenta huma Provilkõ de feu Adjunto , 221 , 222- Difcurfos militares fobre novo projecto do mefmo Comman- dante ficar ma , 270. Iníla na fua execuqaõ , mas naõ paíTa a diante , 27 1 . Defcobre hu- ma conjuração , e a fuffoca , 279 , 280. Marcha fobre os inimigos 5 e perceben- do alguma confternaçaõ nos Soldados > os adverte da fua obrigação com pala- vras feveras, 294. Recebe huma Carta do Senhor dela Ravardiere para Jero- nymo de Albuquerque $ e lendo a , o perfuade a que naõ fufpenda o movi- mento , em que fe acha ,295. Ataca os Francezes ,2518. A íua diftinçaõ, 304. PaíTa à náo de Ravardiere , 328. Militar politica de que ufa , 331 PaíTa à Ilha do Maranhão , e Fortaleza de S. Luiz , onde comrr.uni- ca com o Padre Archangelo de Pem- broch, 357 até 36c. He hofpedado ma- gnificamente por Ravardiere , e volta a Guaxenduba, 361 , ^62, 363. Encarre- ga-fe da jornada de Hefpanha , e torna à Fortaleza de S. Luiz , 374. PaíTa a Portugal com o Capitão Mattheus Ma- Ihart , 37c . Chega a Lisboa, e fe pre- fenta ao Arcebifpo Vice-Rey. Volta a Parnambuco ,381. D. Diogo de Ca/iro , Conde de Bailo , Go- vernador de Portugal, 515. Diogo de Méndoça Furtado. Succede nd governo geral do Eftado do Brafil , 492. D. Diogo de Meneses- Succede no gover- no geral do Eftado do Brafil. O feu elo- gio. Informa-fe bem de toda a Cofta de Lefte , Oefte , que comprehende a do Maranhão ; e communica as mef- mas noticias ao Minifterio de Madrid , ioc). Recebe ordens do mefmo Minif- terio para a pratica das fuás medidas , que regula de todo, 110, 114, 115, 116, 120. D. Diogo da Situa , Conde de Portalegre , Governador do mefmo Reino ,51$. Diogo de Sordas. Intenta o exame do rio Maranhão , 42. Diogo de Soufa e Mene%es , Ouvidor Geral do í : 6$)2 índice do Eftado. Chega à Cidade de Belém , iod8. PaíTa à Fortaleza do Curupá , e prende o Procurador António Barradas, to6y- Manda fufpender o curfo dajuf- tica da Cidade de Belém , 1071. Che- ga à mefma Cidade ; e o perigo , que teve na commoçaõ do povO , 10512. Difcurjos políticos de alguns moradores de S. Luiz , íbbre o remédio da fublevaqaõ em que fe achavaõ , 1297 1 iifà Divijaõ do Eílado do Maranhão, 1$. Fr. Domingos de Brieba , e Fr. André de Toledo. Navegaõ o rio das Amazonas até a Cidade de Belém do Pará , da qual paíTaÕ à de S. Luiz do Maranhão, 66z } 66 3. Domingos da Cojia Machado. He nomea- do Adjunto no governo da Capitania do Maranhão , 445). Succede no mefmo governo ,471- A fua piedade , e gene- roíidade de animo , 48$ até 488. Domingos Machado. Succede no governo da Capitania do Pará , 980. Duarte de head , Capitão de hum navio mercante. L.eva a Lisboa a noticia da obediência do Eftado do Maranhão , 762. E ELogio daCafa de Guiza, 3^3. Eneakllados. Tapuyas bellicofos , e a origem defte nome , 705 , 706 , 707. EJlandarte de França. Arvorado na Ilha do Maranhão , e a injuftiqa deíle pro- cedimento , 169 até 172. He ofFerta da Rainha Regente Maria de Medíeis, 175, 174. Eugénio Ribeiro Maranhão. Hum dos De- putados da Nobreza na commoçaõ do povo de S. Luiz , 1280. He remettido prezo à mefma Cidade, 1325). Sahe da prizaõ com huma leve pena pecuniária, 134*. F F Elidam Coelho de Carvalho. Pa (Ta ao ^ Pará com os poderes de General do Eftado. Bufca os Hollandezes , e fe lhe retiraõ, 574. Sahe do rio da Cidade de Belém com huma Armada , e os feus Subalternos, 012*61$. Gloriofas acqoes do feu valor, e rendimento do Forte do Cumaú , 6\\ até 616'. Nova vitoria das fuás Armas , 61 j , 618. Intenta a mudança da Cidade de Belém do Pará , mas fem efíeito ; e porque razaõ \ 62] , 624- PaíTa a índias de Hefpanha , e to- ■ ma porto na Cidade de Caracas, 642. Feliciano Corrêa. Soccorre o Maranhão com algumas munições de guerra por ordem do Governador do Eftado do Brafil António Telles da Silva. He no- meado para a fubftituiqaõ do governo do Eftado pelo Governador Pedro de Albuquerque , que exercita pela fua morte com Adjunto , 5)20. Succede no governo da Capitania do Pará, 1169. Feliciano de Souja e Meneies. Succede no emprego de Capitão mór do Graõ Pa- rá, 67K. Morre na Cidade de Belém, 74$ • Fernad Carrilho. Lugar-Tenente no go- verno do Eftado do Maranhão fe encar- rega delle , 1423. PaíTa à Cidade de Be- lém do Pará. A fua primeira expedição, 1424. O fucce/To delia , 1425 , 142o. Chega-lhe fueceflor , 1429. Femaõ de Noronha. Ilha do Brafil ,138. A fua defcripcaÕ ,139. Fernão Sanches de Vargas ,66. A fua conftancia , 69. Fernando Alvares de Andrade , Thefou- reiro mór de Portugal , 44. D. Fernando de Gufmao. Acompanha a Pedro de Orfua , Sá. Confpira contra . elle, e lhe tira a vida , 88. Recebe ac- clãmacões, e titulo de Rey , ibid. Mo- tivo defta conjuraqaõ } e a fua morte , 85). S. Filippe. Fortaleza do Maranhão , 411. Filippe llh de Caftella. Manda reftituiv à fua liberdade todos os índios eferavos na expedição do Capitão mór Pedro Coelho , 104. Filippe IV de Caftella. Faz DoaqaÕ a Ben- to Maciel Parente da Capitania do Ca- bo do Norte, 67; , 674. Filippe , Rio , braço do das Amazonas , 558. Filippe Forcei , Capitão Hollandez , 530, 540. Francifco de Albuquerque Coelho de Carva- lho j > das coufas notáveis. 695 lho , Donatário da Capitania do Cumá , r I7 ' Francifco âe A%evedo. Subftitue o governo da Capitania do Pata, *Ç2. Morre bre- vemente no mefmo minifterio, 6 1480. Francifco Coelho de Carvalho. He nomea- do primeiro Governador Geral do Ma- ranhão , 5 1 j , 1 16. Pafla a Parnambu- co, $17, 518. Vitoria que confegué dos Hollandezes ,55$. Chega ao Seara, e toma poíTe do governo do Eftado , 55*, 558. Vifita o Graõ Pará , e volta ao Maranhão, J70 , 572. He nomeado Adjunto para o governo do Eftado, 9 14. E promovido ao mefmo Governo , 929. \ O feu elogio , 641 , 930, 93 1. Pafía à Cidade de Belém , 939. Sufpende o Ca- pitão mór Sebaíliaõ de Lucena, e man- da retirallo para o Curupy , 940. Sua morte , *4o , 941 , até 943. Francifco Cordovil Camacho. Succede no governo da Capitania do Pará a Pedro Teixeira, 7^4. Recebe a noticia da Ac- clamacaõ de Portugal , e leva o avifo do Governador ao Senado da Camera, 759. Com a noticia da invafaõ dos Hol- landezes fe difpoem para a fua oppofi- qaõ. Pede foccorros aos Capitães mo- res do Cabo do Norte , e Camutá. De- fenha logo varias fortificações > a que dá principio, 7S6. Segue a politica de dei- xar as difputas do Capitão mór Joaõ Velho do Valle por conta da Camera ; mas difpondo-fe fempre para a defenfa da Capitania ,793. Continua no mef- . mo fyftema , fuggerido também de ra- 2ões de fangue , 802. Morre confumi* do das fuás afflicçoes , e deixa nomeado 110 governo da Capitania o Senado da Camera. O feu elogio , ibid. Francifco Dias de Eiró, Mifter do Povo do Maranhão no feu levantamento ; 1280. Condemnaqaõ que teve , 1342. Francifco de Frias de Mefquita , Engenhei- ro mór do Eftado do Brafil ,212. O feu procedimento na batalha de Guaxendu- ba, ^04. Francifco de Lorena , Duque de Guiza , m : Francifoo Lopes âe Gumarâ , Hiftoriador do Pení, 81. Francifco de Miranda. Morre às mãos dos Tapuyas do rio Urubu , 1 1 1 5. Francifco da Mota Falcão. Vay defcobrir o celebrado rio dos Tocantins, 1187. O fuecefib defta expedição, 1188 até 1 iyo. PaíTa a Portugal por Procurador, 1239. Volta do Maranhão, 1320, 1321. Francifco de Oliveira , Capitão de hum na- vio mercante. Leva a Lisboa a noticia da Obediência do Eftado do Maranhão, 7*2. Francifco âe Orelhaha , Commandante de hum bergantim. Poem-fe com elle a caminho , e nega a obediência] ao íéu General , 64 , 65 . Deixa em hum defer- to a Fernaõ Sanches de Vargas , e con- tinua a fua viagem , **. Acha oppofi- çaõ até nas mulheres j e por efta razaõ lhes chama Amazonas , dando o mefmo nome ao rio Maranhão , eodo feu ap- pellido , 67. Melhora muito de fortuna TttÊ Com y. fm I-! !> — 694 índice j com índios mais tratáveis , e fabrica outro bergantim , 6j. Segue a fua via- gem , e atraveíía pelo mar do Norte até a Ilha Margarita , 68. Paíía a Hef- panha , e encarece as preciofidades do rio Maranhão , a que chamava já das Amazonas. Confegue o governo da fua Conquifta, e para ella três navios com boa equipagem , 79. Sahe do porto de S. Lucar , e troca as Ilhas Canárias , e as de Cabo- Verde, 80. Perde muita parte da fua gente na corrupção dos ares , ibid. Chega à boca do rio ; e naõ podendo fubir com duas lanchas , torna a retroceder até a fua boca , ibid. Na- vega pela cofta de Caracas até a Ilha de Margarita , onde dizem que morre , ib, O Padre Francijco Pinto. Aííiftido do Pa- dre Luiz Figueira , ambos da Compa- nhia dejefus, intenta reduzir ao gré- mio da Igreja os Tapuyas da ferra de Ybiapaba , 10$. Morre às mãos deftes bárbaros , e o feu Companheiro fe reti- ra para o Seara, 106 , 108. D. Francijco Piffano. Manda defcobrir o rio Maranhão por feu irmaÕ Gonqalo Piííàrro ,52,^. Íranc/Jco Racily , Senhor defte Lugar , e das Aumellas. He focio do Senhor de la Ravardiere para o eftabelecimen- to de huma Colónia no Maranhão , ião. Pretendem , que o acompanhem alguns Capuchos dos da Província de Pariz , o que louva muito a Rainha Regente, 121. Saõ nomeados para ef- ta MifiàÕ os Padres Ivo de Eureus Arfenio de Pariz, Ambrofio deAmiens, e Cláudio de Abeville, 125. Sahe do por- to de Cancalle 5 chega ao Maranhão , e volta a Franqa , 1 50 , 145), 177. Francijco de Sá de Meneies. Suceede no governo do Eftado doMaranhaõ, 1242. O fe lí elogio, 1245,1244. Por ordem da Corte eftabelece hum geral Eftanco no Maranhão , 1246". Deftreza de que . ufa para calar as queixas daquelles mo- radores, 1247. Chega à Cidade de Be- lém , onde também aíTenta o novo Ef- tanco, 1245)., 1250 Os perigofos erros da fua fantafia 7 1255. Declara que paí- ía ao Maranhão a caftigar os amotina- dos f 125)1. Propoíta que o faz mudar derefoluqaõ, e os motivos delia, 1292^ 125)5. Continua na errada politica da fua inacção, 15 \6. Chega a Tapuy ta- pera , e já com a noticia do feu fuccef- for paíTa à Cidade de S. Luiz , 1 5 52. Recolhe-fe ao Pará , 1555. Reítitue*fe a Portugal, 1554. Francifco de Seixas Finto. Suceede no em- prego de Capitão mór do Graõ Pará , 108}. O feu elogio , 1084. A primeira acçaõ do feu governo , 1098. Francijco de Soufa Fundaõ. Vay reftaurar a Fortaleza do Macapá , 1580. O fuc- ceífo defta expedição, 1 581 até 1587. Francijco Teixeira de Moraes. Adverte com zelo o Capitão mór Balthafar Fer- nandes, 126]. Avifa com o mefmo Go- vernador Gomes Freire de Andrade da nova commoçaÕ dos fediciofos da Ci- dade de S. Luiz, 1525. Efcreve apai- xonadamente do procedimento do Be- ckman , 1345» G G Gabriel Soares. Intenta pela parte do Brafil a entrada do rio Maranhão, que fe lhe malogra com huma grande perda, 95. Garciíajo de la Vega , o Ynca , Hifíoriador do Peru , 91. Fr. Ga/par de Carvajal. Acompanha o Ca- pitão Francifco de Orelhana, 66. Gajpar de Freitas de Macedo. He nomea- do para atacar hum navio Hollandez , ai. Valor com que o aborda, e triun- fo que confegue , 422 até 42o". Novas occafiões, em que fe difíingue , 440. Gajpar de Soufa. Suceede no governo ge- ral do Eftado do Brafil. O leu elogio , 188. Cartas que recebe de EIRey para a Conquifta do Maranhão , de que no- mea Commandante a Jeronymo de Al- buquerque , 189 até 1511. Chegaõ-Ihe noticias da Ilha do Maranhão por Mar- tim Soares Moreno, 205. Nomea o> Sargento mór Diogo de Campos por Adjunto de Jeronymo de Albuquerque, 207. Põem prompta huma Armada pa- ra a mefma Conquifta, que fahe do mar do Recife de Parnambuco, 21$ ,216. Gomes ,v das coufas notáveis. Gomes freire de Andrade. Succede no go- verno do Fitado do Maranhão. At fuás primeiras diipafiqões , 1520 até 1524. Defembarca no porto da Cidade de S. Luiz, 1525. O feu elogio, 1$ 26, 1527. Publica hum perdaõ geral ío com a ex- cepção dos principaes cabeças da fuble- vaçaõ da Cidade de 3. Luiz, 1 528. Ref- titue o povo a hum geral focego , 1555. Firma varias fentenças de morte com repugnância da fua piedade, (54^. Faz huma grande Junta, e o que refulta del- ia, 1445. Paíià ao Pará , e depõem de todos os empregos , que fervia o Ouvi- • dor Geral António de Andrade , 1 546-, i}47 Chega-lbe fucceíiòr no governo do Fitado , 1548. Asdefconfianqas que concebe delle, e a diffimulada fatisfaçao que toma , 1555, 1554. O feu novo elo- gio , J$55, 155^. A fua reftituicaõ á Portugal , e honrofa Carta que efcreve a EIRey o Senado da Camera , lobre os acertos do feu governo , 1557 , 1^58. Gonçalo Piçarro. He nomeado para aCon- quifta do Maranhão, empreza que acei- tando , parte para a Cidade de Quito , aonde chega com bom corpo de Tro- pas ,55- Sabe deita Cidade com tre- zentos e quarenta Soldados , e quatro mil índios ; e paíiãndo da Província dos Quixos , he acomettido de muitos Ta- puyas, que logo fe retiraõ, 54, 5 6. Tre- me a terra , e traga muitas habitações, $7. AtraveíTa a ferra nevada , e gelan- do-felhe muitos índios , larga todo o gado , e mais mantimentos que condu- 2Ía , por cuja falta paíià muitas rnife- rias , 57 , 58. Chega à Província de Zumaco , e deixa nella a mayor parte da fua gente , com ordem para que o váfegumdo, 59. Segue o rio Cuca , que toma o nome da Província , e me- tido já no das Amazonas , chega a hum canal prodigiofo , 60. Fabrica huma ponte fobre o mefmo canal , e paiTa por ella a outra banda \ ibid. Vay cami- nhando pela margem do rio com gran- de trabalho , 61. Deftroe hum bergan- tim , e algumas canoas , e mete a bor- do deitas embarcações todos os enfer- mos com a carga mais pezada , c de mayor eílímacaõ, 61 , 62. Informaqões de grandes riquezas ; 62. Faz adiantar o bergantim com cincoenta Soldados, de que nomea Commandante o Capitão Francifco de Orelhana , 64. Fabrica mais canoas , e algumas balças , e vay feguindo a fua jornada. Chega à junçaõ do rio Napo , onde efperava achar a Francifco de Orelhana , e encontra fó a Fernaõ Sanches de Vargas , que lhe dá a noticia da fua deferçaõ , 69. Sente efte accidente 5 mas continua a mefma marcha , até que toma a refoluçaõ de retA - ocedella , 70. Bufca novo caminho, e padece nelle mayores trabalhos, 71, 72. Chega aos limites de Quito fó com oitenta Companheiros , e avifa a Cida- de , que cheya de alvoroços lhe manda Deputados com hum grande refrefco j 75 ,74. Chega a Quito , onde he rece- bido com grandes applaufos , 75. Grão Paráé Rio , e a etymologia deíle nome , 7; Grão Pará. Capitania , \ 6. D. Gregório dos Anjos. Primeiro Bifpo do Eítado do Maranhão, 1237. A fua mor= te, e elogio , 13 do 7 i\6i. Gregório Fragojo de Albuquerque. Procede com muita diilinçaõ na batalha de Gua- xenduba, 304. He nomeado para a jor- nada de Pariz , e a fua cómmiíTaÕ, ibid. Chega à Fortaleza de S. Luiz , onde fé embarca para França com o Senhor dç Pratz,i7J. Guamá. Rio caudalofo -da Capitania do GraÕ Pará ,41. Gitapuló* { Noiíà Senhora de ) Santuário celebre nas vifinhanças da Cidade dé Quito , 684, Ó8f. Guntpy , hoje Cayeté. Capitania do Por- teiro mor Jofeph de Mello deSoufa^ 40. Enrique I/ 7 ". de Franças Manda exa« _ minar a Ilha do Maranhão , 112. Morre às traidoras mãos de Francifco de Ravelhac, 113. Henrique Afonjo , Cãpitaõ de Infantaria. Occupa a Fortaleza de S. Luiz , e fica nella de guarnição, 35». Henrique Lopes da Gama , Capítaõ mor- da i, "•' 6$6 índice da Capitania de Tapuytapera. Àvifa o Governador das revoluções do Mara- nhão , I25>4- Remete prezo à Cidade de S. Luiz a Eugénio Ribeiro Mara- nha5 , 1329. Henrique de Lorena , Duque de Guiza , Hilário de Souja de Azevedo- Vay \k Cida- de de S. Luiz com nova commiflàõ do Governador para oíbcego dos amotina- dos, 1509. OfuccelTo delia, 13 10. Suc- cede no governo da Capitania do Pará, ijój. Morre na Fortaleza do Curupá , 1377. i Hollanda. Ajufta tregoa de dez annos com o Embaixador de Portugal Trifiaõ de Mendoça, 841. Ilcllande^es, elngle%es. Invafores da Ilha de Cayena , onde fe eftabelecem os Francezes como primeiros povoadores, Hollande%e%. Intentaõ ainvafaõ do Prefidio do Seara com. duas nãos de força ,525. Succeffc que tiveraõ pelo valor daquel- la guarnição , ibid. Novo defembarque para a invafaÕ do mefmo Prefidio , mas com igual fortuna , $26. Occupaõ Par- nambuco, 595. Sente a mefma defgra- ça a Capitania do Seara ,; 671. Entra5 com huma Armada pela barra de S.Luiz do Maranhão, 764. Occupaõ o porto de NoíTa Senhora do Deftcrro , e fe pof- taÕ em terra, 765. A tyrannia deite procedimento , 767. Que fazem ainda mais abominável as confifsões do feu Commandante , ibid. Marchaõ para a . Cidade , 770. Sacrilégios bárbaros , que comettem , e como os defeulpa o feu Commandante ,771. JAcauna. Grande Principal do defin- ito do Seara, nj. 'Jacome Raimundo de Noronha. Provedor mór da Fazenda Real do Eílado do Ma- ranhão , 5 5 6. Succede no emprego de Capitão mór do Graõ Pará, 597. En- carrega-© o Governador da expugnaçaõ do Forte Filippe , e fahe do rio de Be- lém do Pará, £0©, íoi. Subalternos que leva , 602. Primeira accaõ da fua condueta , e vitoria completa que con- fegue , 602, 605 , 6of. Succede no go- verno do Eílado por eleição da Cidade de S. Luiz. O feu elogio , 644 , 64$. Naõ he reconhecido no Graõ Pará pe- lo Capitão mór Luiz do Rego , mas fim por todo o povo , 649 , 65 1. Intenta o defcobrimento do famofo rio das Ama- zonas , 6Ó4 Difcuríbs que forma fobre o mefmo projecto , e refoluçaõ que to- ma nelle, 66< , 666- Nomea Comman- dante deita expedição , e os feus Subal- ternos necefíarios , 667. He julgado naõ Governador, e remettido para Por- tugal , 677. Jacinto de Moraes Rego. Acompanha ao Governador Gomes Freire de Andrade de Lisboa para o Maranhão, 1520. 'Jandiroha. Arvore que cria humas frutas, de que fe faz azeite ,25. Janovaren. Aldeã da Ilha do Maranhão , em que fe celebraõ as primeiras cere- monias do Sacramento do Bautifmo , 160. Jaoues Vandickier , Capitão de hum navio Hollandez. Chega à barra de Belém do Pará. Propoíla que faz ao Capitão mór Francifco Cordovil. Retira-íe mais , e dá fundo no fitio do Moíqueiro , 794. yeronymo de Albuquerque. He nomeado Commandante da Conquiíla do Mara- nhão, 191. Sahe do Recife de Parnam- buco , e no parcel de Sericuoacoára le- vanta hum Forte da invocação deNof- fa Senhora do Rofario. Erradas noticias de Joaõ Laeth , 1^2. Manda examinar a Ilha do Maranhão , e depois de guar- necer o Forte , fe recolhe para Parnam- buco ,19?. He novamente, nomeado Capitão mór para a mefma Conquifta do Maranhão , 196. PafTa à Povoação da Parahiba já com algumas Tropas , 202. Confufaõ das fuás noticias , 104. Projecto que forma , 224. Defembarca com todos os Índios, e marcha por ter- ra até o Seara , aonde fe torna a incor- porar com a fua Armada , 227 , 22?. Toma o Prefidio das Tartarugas , 23^. Sahe delle depois de demolido , e põem as fuás proas no Periá , 240. Defem- barca na Ilha , 245. Muda de proje&o na * das coufas notáveis. 697 na fortificação , que fé defenhava ; e tor- nando a embarcar todas as luas Tropas, demanda o lítio de Guaxenduba , 246 , 25 5. Dcfem barca nelle, e fe fortifica , 25$ , 35 6. A fua (ingeleza de animo , 257- Torna a enganai fe com a confian- ça dos Tapuyas , 269. Difpoem as fuás Tropas para a oppofiçaõ dos inimigos , 271. Difcurfos militares , e refoluqaõ que toma , 285). Oraçaõ militar , 291. Marcha fobre os Francezes , e ataca-fe com elles, 295 , 299. Fica vitoriofo , 50$. Aceita os artigos da Tregoa , que lhe propõem Ravardiere , 545». Infrac- ção do Tratado, que diffimulaõ os Fran- cezes , ^77. Por novo Tratado oceupa o Forte de S. Jofeph de Itapary , 1,77 , Í7 8 ? W9' Marcha fobre a Fortaleza de S. Luiz, 388. He nomeado Capitão mor do Maranhão por Alexandre de Moura , 402. Funda a Cidade de S. Luiz, e dá à Fortaleza a invocaqaõ de S. Filippe , 411. Accrefcenta aos feus íinaes públicos a antonomafia de Mara- nhão, e morre na Cidade de S. Luiz, 447 > 448- O feu elogio , ibid. Deixa nomeado na fucceíTaõ da Capitania a leu filho António de Albuquerque com affiftencia dos Capitães Bento Maciel Parente , e Domingos da Cofta Ma- chado , 44 (; . Jeronymo torta!. Intenta também o def- cobnmento do rio Maranhão , e funda a Povoação de S. Miguel de Navary , e a de otitros lugares ,45. Jeronymo Fragofo de Albuquerque. Succe- de no governo da Capitania do Graõ Pará ,475. Difpoem novo caftigo para os Topinambazes , e o fucceíío delle , 474 , 47<>. A fua morte , e elogio , 471?. lgapó. Aldeã da Ilha do Maranhão, ió$. Difcurfo de hum Tapuya da meíma Al- deã , 166. Ignacio (Coelho da Silva. Succede no go- verno do Eílado do Maranhão , 1324. O feu elogio , 225 , 1226. Paííà à Ci- dade de Belém para fazer nella a fua re- íidencia , 1228. As fuás afperezás, e o feu novo elogio , 1240. Chega-lhe fuc- ceíTor ^ 1241 , 1242. Igvaáo Corrêa de Oliveira. He encarrega- do de huma Tropa , 1454. O fucceíío da fua expedição, 14^ até 14^7. He prizioneiro dos Caftelhanos , 1458. Ignacio do Rego Barreto. Succede no go- verno da Capitania do Pará , 949. Põem logo prompta huma grande Tropa pa- ra o defcobrimento do Lago Dourado, 5>$o. Afperezás do feu procedimento, "èa fua fufpenfaõ pelas queixas delias , j>5 5 . Entra outra vez no; governo da Ca- pitania, fupprimido o db Eftado , p'6%. Naõ he bem recebido , $(6. As fuás pri- meiras acções , e o que produzirão , 967, 9Ó8 , y6(). Iguará. Rio da terra firme do Maranhão, 25. Tem huma cafa forte, 26. Ingahibas. Tapuyas belhcofos, 6 14. Introduccaõ à Hiftoria , r. Invasão da Capitania do Seara ,671. Joaõ Paes de Amaral , Cápitaõ de Infantaria, defcobre o Padraõ , que o Emperador Carlos V, "mandou levantar nó rio de Vicente Pinçon, 14. D. Joaõ III. de Portugal; Reparte as ter- ras do BrauTem> Capitanias, e dá a do M'aranhaõ ao celebre Hiftoriador Joaõ de Barros , 4.4. Faz de novo a mefma Doaqaõ' a Luiz de Mello da Silva , 82. D. Joaõ, ¥IH. Duque de Bragança. He aoclamado Rey de Portugal. Demonf- traqões dò Maranhão ria felicidade dei- ta noticia, 75 6. He obedecido volun- tariamente em todas as partes do Mun- do , 760. Reflexões catholicas , e poli- ticas fobre o méfmo fucceíío , 761. A fua morte , lon. Joaõ de Banas da Guerra. Succede no go- verno da Capitania do Pará, 1463. A infelicidade da fua morte , 1476. Joaõ Bitancour Moríi\. Vay fazer a guerra ao gentio rebelde da Capitania do Pará, ' 986 ', 087. O íucceflb delia , $88 até p 9 6. Joaõ Cakal de Barros , Defembargador Syndicante no Eftado do Maranhão. Chega à Cidade de Belém do Pará. Af- íifte a eleiqaõ de Capitão mor da Capi- tania , $8?. Joaõ Cornelles , Commandante de huma Armada Hollandéza. Entra com ella na bahia da Ilha de S- Luiz do Maranhão- Recebe huma defearga da noíTa artilha- ria. Faz hum defembarque de mil ho- Uuuu mens !f| 698 índice mens no íitio de Nofíà Senhora do Def- terro, e fem oppoficaõ fe pofta em ter- ra. Marcha fobre a Cidade. Sufpende 1 logo efte movimento , que defculpa com frívolos pretextos , e convida o Governador para numa conferencia , 764 até 767. AfTenta com elle , que fi- caria confervando o mefmo Governo , e daria para quartéis das fuás Tropas al- guma parte da Cidade. Aleivofia barba- ra com que procede , 769 até 771. Buf- ca a Fortaleza de S. Filippe , e o Go- vernador abrindo-lhe as portas, lhe faz entrega delia. Abate as bandeiras de Portugal , e arvora as de Hollanda. Trata o Governador como vil prizio- neiro. Tyrannia com que relaxa nova- mente a Cidade à ambjqaõ dos feus Sol- dados , que continuaõ nos lacrilegios , 774. Abíbluto Senhor de. toda a Ilha , inculca procedimento mais humano com os engenhos de aííucar da terra fir- me do ltapicurú. Contribuição que re- cebe delles, 775. Reedifica o Forte do Calvário , e guarnece . os engenhos , 778. Nova tyrannia defte?.Comman- dante , jjy. Deixa no Maranhão feif- centos homens, e quatro pavios ^ efe recolhe a Parnambuco ciom a fua ^Ar- mada. Leva nella ao Governador Ben- to Maciel , 780. Joaõ Duarte Franco , CapitaÕ mór da Ca- pitania do MaranhaS. Dá auxilio de braço militar contra o Bifpo do Eílado, 1396. Na reunião do governo geral foy o primeiro Capitão mór do Filado , João Moni\ âe Menâoça. Verdadeiro ref- taurador da Fortaleza de Macia pá , 1387. 1 Joaõ Palácios. Penetra o rio das Amazo- nas até a Província dos Encabellados , 6 sy. As fuás acções , e a fua morte , 661. Joaõ Pereira âe Cáceres , Commandante da Fortaleza do Curupá. Aborda hum patacho Hollandez , e o rende valero- famente, 746. JoaÕ Rodrigues Palheta. Peleija com os índios do fio Urubu. Valor com que procede , e o feu merecido elogio ? 1116 ,1117. O Padre Joaõ âe Souttoinayor , Religioso da Companhia de Jefus. Funda o feu Collegio de Belém do Pará, e com que condiqões , 972, 97$. Joaõ Fajco. Traz do Maranhão a Portu- gal feliz nova da reílauiaçaõ daquella ilha com a deferqaõ dos Hollandezes , 926 D. Joaõ Vajques âa Cunha , General na Ci- dade de Quito , fe offerece para acom- panhar a Pedro Teixeira na viagem do rio das Amazonas , 690. Joaõ de VelajcoeMclina. SuccefTor na Ca- pitania do Pará. Naufraga nos feus bai- xos , de que fe falva com algumas pef- foas , 1401. He encarregado do gover- no doEftado, e toma pofie delle , 1437. Por falfos aviíbs , que recebe do Mara- nhão , pafia à Cidade de S. Luiz, 1439. A Tua cóníiernacaõ , e o feu deíatino , 1440 até 1442. A paixaõ do feu animo, e a fua vaidade , 1443. O defengano del- ia como juíto caftigo , ibid. Joaõ Velho do Vafte. He nomeado Capita5 mór do Curupá, Amazonas, e Cabo do Norte , 749. He chamado do Capitão mór Francifco Cordovil para o foccor- ro da Capitania do Graõ Pará , 786. Culpável fleuma com que lhe acode , e foccorro que leva , 787. Toma porto na Cidade de Nofla Senhora de Belém, e fe aquartella no Convento dos Capu- chos de Santo António. Avifa da lua chegada ao Capitão mór , e Senado da Camera , e com grande foberba lhes pe- de mantimentos , e o fuperior governo das Armas , 788. Repofta que recebe do Senado taÕ cheya de politica, co- mo dè zelo , j%y. Defampara de noite a Cidade , e íe retira ao fitio de Una hu- ma légua delia , ibid. Procura juílifícar a accaõ com anediados pretextos , e re- pete a primeira propofta com dobrada arrogância , a que refponde logo o Se- nado com a total repulfaõ do Governo, 790. Recebe avifos dos ameaços dos Hollandezes , com as inftancias de que fe una logo à guarnição da Praqa , para fe fegurar a fua defenfa , e refponde no primeiro fentido , 79 r. Offèrece-lhe quartel feparado para as fuás Tropas, e mantimentos paraellas ; e enais enfure- cido, das coiifas notáveis. 699 eido , defprezando o perigo da Capita- nia do Fará , fé recolhe à fua do Cabo do Norte , 792. Parta ao foccorro da , Capitania do Maranhão com feu irmaõ Fedro Maciel , 845. Vergonhofamen- te volta ao Pará com o mefmo foccor- ro , que tinha conduzido , 16 1. Jorge de Sawpayo. Procurador do Eílado do Maranhão na Corte deLisboa, 1125. O bom fuecefíb da fua commiíTaõ , 1 1 24 até 1 126. A fua pnzaõ , e o feu caíligo com os motivos delle , 1^0 até 1542. Jofeph Antunes da Foujeca , Commandan- te de huma Tropa de Guerra, 1459. O fucceííb da lua expedição , 14Ó t. Jojeph da Cunha de Eça. Succede no go- verno da Capitania do Maranhão , 1464. D Fr. Jojeph Delgane. Succede no em- prego deBifpo do Eílado do Maranhão. O feu elogio ^ e primeiras acções , 148 £ até 1485. Fr. Jofeph de Lima , Vigário Provincial Carmelitano do Eílado do Maranhão. Faz hum douto Papel na defenfa do procedimento dos feus Relígioíos, 141 ?• Efcreve outro igualmente erudito. Re- foluqaõ que toma depois de approvado, 1415 , 14.KÍ- Fr. Jojeph de Santa Maria , Religiofo Ca- pucho de Santo António. Morre às mãos dos Aruans, 1424. Prodígios que fe obfervaõ depois da fua morte , 1425 , 1426. Jojeph de Mello de Soiíja , Donatário da Capitania do Cayeté , 40. Jojeph Velho de Azevedo , Sargento mór Engenheiro da Capitania do Pará. Fica encarregado do governo delia, i?7<>< Reedifica a Fortaleza do?víacapá, 1 589. Succede no governo da Capitania, 1476. O íeu elogio , 1477- Jojeph de VtUarmayor Maldonado. Intenta a entrada do famofo rio das Amazonas 7 $2. hapkurú) Rio da Capitania do Maranhão. Foy povoado de engenhos de aíTucar , e outras lavouras , 24. J-uniparan , Povoação Capital da Ilha do Maranhão, 161. Jaripary , Principal da ferra de Ybiapaba, Suílenta a guerra na oppofiçaõ de Ca- pitão mór Pedro Coelho de Soufa, 100. LAJlre. Cirurgião Francez , ç j 5 . A fua feiencia , e generofidade , 575. Latitude do Eílado do Maranhão, \6. La\aro de Mello , Cidadão da Cidade de S. Luiz. A fua infâmia , e o caíligo delia j 1 }}8 até 1341 , e 1544. Limites do Reino tio Peru ria divifaõ da America Portugueza , 709. Longitude do Eílado do Maranhão , 1 j , Lopo de Jgúirre. Acompanha a Pedro de Orfua. A fua figura 5 e condição , 86. Confpira contra elle , e lhe tira a vida. Faz acclamar Rey a D. Pernando de Gufmaõ , e também o mata , 88 , 80. Conílitue-fe no governo abíoluto , é com elle eomette outros infultos feme- lhantes até perder a vida , 90. Os Padres Lopo de Couto $ e Luiz, Figuei- ra , da Companhia de Jefus. Affiílem a Alexandre de Moura na expediqaÕ do Maranhão, 413. £. Luiz, do Maranhão. Cabeeã do Eílado j 17. A fua defcripçaõ , 18. Lui\ Aranha de Vajconcellos. Chega à Ci- dade de Belém $ e com quê commiííáõ, 499. Sahe daquelle rio, $©i. Succede no emprego de Capitão mór da Capita- nia , 595; He depoílo pelo Governa- dor, Ç94- O Padre Luiz, Fíoueira. Áffiílido do Pa- dre Francifco Pinto , ambos da Com- panhia de Jefus j intenta reduzir ao gré- mio da Igreja os Tapuyas da ferra de Ybiapaba , ioó. O fueceflb deíla expe- dição, ibid. , e 107. PaíTá à Fortaleza do Rio Grande , favorecido do Sargen- to mór do Eílado do Brafil Diogo de Campos Morerio , 108. Luiz, de Guevara. Morre na oecafiãõ de Guaxenduba^ 307., Luiz, de Magalhães. Succede rio governo do Maranhão , 946. O feu elogio , 547. Conhece do procedimento de Manoel Pitta da Veiga na prizaG do Ouvidor Geral , e poerri eíle logo na fua liber- dade. Sufpende do emprego de Prove- dor mór da Fazenda Real a Manoel Pit- ta tí /• ./ ■ I ^ ■* 700 índice ta da Veiga , e fubílitue logo no feu lugar a hum irmaõ feu , 948. Procedi- mento que fe lhe eílranha de Portugal , com ordem para a reíiituícaÕ de Ma- noel Pitta ,954. Supprimido o gover- no do Eílado , lhe fuccedem nas duas primeiras Capitanias dous Capitães mo- res , e recolhe-fe para Portugal ,959. Lai\de Mello da Silva. Navega a coita do Brafil , e paíla a Portugal , onde EIRey D. JoaÕ III. lhe faz mercê da Conquif- ta do Maranhão com o titulo de Dona- tário , 82. Ajudado do mefmo Prínci- pe parte para ella , e naufraga na entra- da da barra. Salva-fe em huma carave- la , e fe recolhe para Portugal. Vay para a índia , e voltando rico com o animo da mefma Conquiita do Mara- nhão , fe perde na náo S. Francifco ,85. D. Liai de Meneses % Conde da Ericeira , no leu Portugal Rejlaurado , 7$ 3. Fr. Luiz. de Miranda , Prior do Convento do Carmo de S.Luiz do Maranhão , na invafaõ dos Hollandezes, faz huma ac- ção taõ cheya de valor, como de chrif- tandade , 774. Luiz. do Rego de Barros. Succede no go- verno da Capitania do Pará , íaç. Quei- xas do feu procedimento , 628. PaíTa á Cidade de S. Luiz fem licença do Go- vernador , ibid. Nomea para á fua fubf- tituiçaõ a Feliciano Coelho de Carva- lho , que a naõ aceita , 629. Volta ao exercício do feu emprego , e naõ he admittido , 6] 1. Defattencões que fen- te, 634 até 6 3.7, Torna a occupar o feu lugar, 639. Naõ reconhece a Jacome Raimundo e Noronha por Governador, 649. Por efte motivo vay emprazado à Cidade de S. Luiz , 65 1 , 652. D4 Luiz. de Seufa. Succede no governo geral do Eftado do Brafil. Nomea Vi- gário da Matriz de NoíTa Senhora da Graça da Cidade de Belém do Pará ao Padre Manoel Felgueira de Mendoqa , 445- D.Lutx.a , Rainha Regente de Portugal. Entrega o Governo a feu filho D. Af- ionío VI. O feu breve elogio , 112 5. AndiocApua , Principal valerofo ? Manoel Bechman. Intenta fublevar a Ca- pitania do Maranhão , e porque moti- vos , 125 6. A fagacidade com que dif- poem os ânimos , 1257 até 1259! Con- tinua no mefmo projedio já como ca- beça, J260. Sabe aprovei tarfe da froxi- daõ do Capitão mór , e determina a vefpera da Procifíaõ dos Pa /Tos para a íublevaçaõ , 1264. Na noite deííe dia convoca os feus fequazes a fitio folita- rio , 126$. A hora que finala , e a in- duftria de que ufa, 1266, 1167. Ora- ção que faz , e a fua approvaçaõ , 1268 , 1269. Sente hum forte accidente , que remedea logo feu irmaõ Thomás Be- ckman , 1270. Vê-fe de novo ameaça- do de mayor perigo , de que também fahe com a mefma fortuna , 127 r. De- clarada já a fublevaqaõ , entra a Cidade ha tefta do tumulto , e infultos que co- mette , 1272 até 1279. Antes de ama- nhecer domina já todos os poftos da Ci- dade, e difpoem o governo delia , 1280. Refoluçaõ que toma , 1281. PaíTa ao Collegio da Companhia de Jefus , e de- facatos em que contimía , 1284, 1285. Novas refoluqões , e a execução delias, 128a até 1288. Eftende mais luas medi- das, mas com menos fortuna, 1289, 1290 , 129 1. Dá nova forma ao Gover- no para ficar nelle com mais authorida- de , mas deixa defgoftofos , 1299 , 1 300. Principia a defconfiar do affe&o do po- vo , e a tyrannia com que procura o feu focego , 8 o 6 até 1305. Suggeflões de que ufa para defviar a communica- çaõ de António de Albuquerque, 1 3 o?. Vê crefcer o numero dos defcontentes, e apura a fua induftria para focegailos , mas com menos fortuna , que lhe me- lhora muito hum novo accidente, 130Í. Nova occafiaõ que lhe moftra bem a declinação da fua authoridade , 1308. A fua couftancia ,131o. Sente a reunião da Infantaria paga , e induílriolamente procura fuftentar o refpeito do povo , das coufas notáveis. 70I i$i^ , 1^14. Mal fatisfeito já dos feus collegados intenta de novo commovel- los , mas com pouca fortuna , 1 5 16 até 15 18. Sente comoruina própria a fuc- ceífaõ do governo doEftado , mas a fua conítancia , até que lé retira do perigo , 1528. A fua prizaõ , e conítancia de animo com que procede nella, 1559 , 154®. He poílo na enxovia , donde ía- he para o vil patíbulo de huma forca , 1542. O feu fiel caracter , 1545. Manoel de Carvalho, Capitão de Infanta- ria. Entra com hum deítacamento na Ilha do Maranhão , e com que fuecef- fo, 885 até 85)4. Manoel Cordeiro jardim. Chega da Cida- de de S. Luiz à de Belém com a noticia, de que os Hollandezes tinhaõ já entra- do na Villa do Curupy , e eíperavaõ foc- corros para paffar ao Pará , 791. He Vereador da Camera do Pará , que o encarrega de huma commiiíao , 1054. O fucecítb delia , e demonítrações do mefmo Tribunal , 1051 até 105$. He nomeado Commandanté de huma Tro- pa de Guerra. V-ay caítigar os Índios . Aruans , 1424. O fueceflo defta expe- dição, 1425 , 1426. Manoel Dornelles. Parta também àllha, e com que felicidade ,_ 894 ,895. Manoel Freire Loujada , Soldado de bom nome. Defce pelo rio Coty até junto à Cidade de S. Luiz , e deicobre hum novo projecto dos Hollandezes , 824. Faz avifar delle a António Moniz , que fe aproveita bem defta informação, 825. Manoel Guedes Aranha. Parte para Lif- boa com a commifíaõ de Procurador da Capitania do Pará , 970. He encarrega- do da admimítracaõ dos índios aldea- dos, 1120. Subítitue o governo da-Ca- pitanía, 1158. Sendo Capitão mór da Fortaleza do Curupá dá numas cafas aos Capuchos da Piedade junto da mef- ma Fortaleza , i?7?».i> Manoel Madeira. Occupa o governo da Capitania do Graõ Pará , 705. Quei- xas do léu procedimento, que olevaõ emprazado à Cidade de S. Luiz ,717. He reftituido ao exercício do léu lugar , e arriba às Índias de Caítella , 75 1. Fr. Manoel da Piedade. Communica. a Diogo de Campos hum novo projecto dos Francezes , 270. Manoel Pitta da Veiga , Provedor mór da Fazenda Real. He encarregado do go- verno da Capitania do Maranhão ,,5142. Por morte do Governador fica inde- pendente no mefmo governo. Conten- das que tem com o Ouvidor Geral An- tónio Figueira Duraõ , até mandallo prezo para o Forte do Itapicurú , 94$. He fufpenfo do cargo de Provedor mór, mas brevemente reftituido a elle , 948 , 954- O Padre Manoel Rodrigues , da Companhia , de Jefus. Eícreve hum Livro , que in- titula : Maranon, y Amaz.onas , 7. I). Manoel Rolim de Moura. Succede no governo do Eítado doMaranhaõ, 1429. O feu elogio , 14^0.. Sufpende o Ouvi- dor Geral Miguel Monteiro Bravo dos cargos que fervia , 14^1. Recebe avifos de Portugal .da guerra da Liga , e djí- , põem o Eítado para a fua defenfa, 1452. Honras que faz a quatro Portuguezes , ' juíliffimamente merecidas, 14? 6 , 14? 7. Ordem que recebe de Portugal , e refi- gnaqaõ, com que a obedece , I4?7- Paf- la à Cidade de S. Luiz , 1458. Volta à Cidade de Belém na companhia do leu íucceííbv, 1448. Recolhe-fe a Lisboa , 1451- Mamei de Soufa. Vay foccorrer o Forte das Tartarugas, 198. Vitoria que con- fesue 100. Diftineue-fe na batalha de Guaxenduba, $04. Succede no empre- go de Capitão mór do GraÔ Pará , $ 66, Vay prezo à Cidade de S. Luiz doMa- ranhaõ, 57a. He reftituido ao feu mi- nifterio , 58a. ODefimbargador Manoel 'Vaz.Nunes. Vay com alqada ao Maranhão , 152^. A in- teireza da fua juítiqa , 1^0. Manois , Pirata Francez. Recebe o Se- nhor de Racily com magnificência , Maranhão , rio. Nome que fe communi- cou a todo o Eítado , ú. A fua verda- deira etymologia , 1 r. Maranhão. Capitania, 17. Marçal Nunes da Cofia. Succede na Capi- tania do Pará, 10 16. O feu elogio, ig >i8. As íuas afperezas ,1019. Chegalhe fuc- Xxxx ceflbr, .; I ;,;• / 702 índice ceflbr, io8j. Torna a occupar o mef- mo emprego depois de doze annos. Marcos Gonçalves- Corrêa. Leva à Cidade de Belém do Pará , por ordem do Go« vemador dos Hollandezes do Maranhão, a copia do Tratado da Tregoa , que a fua Republica tinha celebrado com a Coroa de Portugal ,841. He defpedido pelo Senado da Camera , que>governa- va a Capitania ,-iatisfeito da negociação, Fr. Marcos de Gualadaxara. Hiftoria Pon- tifical , 14. Santa Marta âo Icatú. Villa da Capitania do Maranhão, 23. Maria, de Medices , Rainha Regente de' França. Favorece a expedição do Ma- ranhão , e dá hum Eftandarte Real ao Senhor de la Ravardiere , e de Racily , Commandantes delia, 173. Marquez, de Canhete D. André Furtado de Mendoça , Vice-Rey do Peru ,<$6. Martim Soares Moreno. He nomeado Ca- pitão do Seara , 11$. Chega ao mefmo lugar , onde levanta logo numa Igreja com o nome de Notík Senhora do Am- paro , e hum Forte da mefma invoca- ção , 11 6. Entra' no mar daquélle fitio hum navio pirata dos rebeldes de Hol- landa , e o rende com poucas'horas de combate ,117. A fama da vitoria faz dar outro à cofta da mefma naçaõ com huma grande perda ', 1 r8 . r Dèfampara- do de foccorros , fe chega ^a ver em grande perigo , de que õ livra- a conf- tancia do animo, 119. Segue a Jerony- mo de Albuquerque Ua fua primeira ex- pedição do Maranhão, 192. Vay por ordem fua reconhecer a Ilha deite no- me , 195. Arriba às Índias de Caftclla, depois de feita a diligencia , 205. Volta ao Maranhão com Alexandre de Mou- ra, 585.- He nomeado Capitão das Al- deãs do Cumá, 409. Torna a gover- nar o Seara , 425» , $20. Gloriofa acção do leu valor , 5 2 tf. Fr. Martinho da Conceição, Religiofo Ca- pucho de Santo António. Morre às mãos dos bárbaros Aruans , 1424. Pn> digios que fe obfervaõ depois da fua morte, 142c , 142^. Mattheus de Carvalho de Siqueira. Succe- de no governo da Capitania do Mara- nhão, 1452. Chegalhe fuecefíbr , 1464. Mattheus Dias daCq/la, Ouvidor Geral do Eftado do Maranhão. PafTa à Cidade de S. Luiz , e com que commiffaõ ,159?, 1 594. Refoluçaõ que toma , e o fuecef- fo delia ,1595 até 1597. Volta ao Pará, onde enferma perigofamente , 1398. Declarações que faz , e difpofições com que acaba a Vida , ibid. e 1599. Mattheus Malhart , Capitão Francez. Paf- faa Guaxenduba , 328. Vay por Comr miíTario a Portuga] na companhia do Sargento mór Diogo de Campos Mo- reno , 375. Mattheus Rodovalho. Diílingue-fe na ba- talha de Guaxenduba , 304. Mathias de Albuquerque. Succede no go- verno do Eftado do Brafil, 5 18. O leu elogio , ibid. Mathias de Albuquerque , filho do Capita5 mór do Maranhão. He Capitão dos Topinambazes das Aldeãs do Cumá , 429. Pafia à Cidade de S.Luiz , 4:51. Sublevação dos mefrnos Tapuyas , e os princípios delia , 431 , 432. O feu.jufto caftigo pelo valor do mefmo Capitão , 4-U^4H j41í è Succede no governo da Capitania do Graõ Pará, de que he lo- go deporto, e porque motivos , 480. Mathias Joàõ, Artilheiro na Cidade de S. • Luiz do Maranhão na invafaõ dos Hol~ landezes. Forma hum proje&o cheyo de valor militar , que lhe naõ deixa re- duzir a pratica o defmayado animo, do Governador ,785» Mel Redondo. Hum dos mayores Poten- tados da ferra de Ybiapaba , 99. O feu rendimento pelo valor do Capiraõ mór Pedro Coelho de Soufa , ibid. Miary. Principal rio da terra firme do Ma- ranhão, e a deferi pçaõ delle ,, 2 8 até 3 1. Miguel Bello da Cofta , Sargento mór do • Eftado do Maranhão. Entra na Cidade de S. Luiz ,1309. E fica nella com per- miíTaõ dos fediciofos , 1310. Torna a unir a Infantaria da fua. guarnição de- baixo do feu commando , 13 1 3 . Scien- cia militar com que a difpoem para a oppofiçaõ de hum novo accidente , 131a. Avifo que faz ao novo Governa- dor do Eftado ,1325. SMi- das coufas notáveis. 705 S.Miguel de Navarí. Fundação de Jero- nymo Furtai , 45. Mojú- Rio caudalofo da Capitania do Graõ Pavá , 41. Moradores da Cidade de S. Luiz, , que a tí- nhaõ defcrtado , a tornaõ a povoar. Ju- raõ obediência aos Eílados de Hollan- da r jjj. Defterra Joaõ Cornelles a cen- to e cincoenta, 779. ArribaÕ à Ilha de S. Chriftovaõ , donde paflaõ a Lisboa , ibid. Iutentaõ alguns facudir o jugo dos Hollandezes. Nomeaõ Commandante de tamanha acqaõ a António Moniz Barreiros, 806. A lua fublevaqaõ , com os motivos, e fucçeíTos delia , 1059 até J078. O feu próprio caradler , 1255. As fuás novas alteraqões , e os motivos delias , 1254 até 1524. Muny. Rio da Capitania do Maranhão , rç« N Alimento do Príncipe de Heípa- . nba, $96. Nicolao Heríay , Senhor de Saney. Faz huma Companhia com o Senhor de la Ravardiere para a Povoação da Ilha do Maranhão ,, 121. He nomeado lugar Tenente General das índias Occiden- taes , e terras do Brafil , 12 r. Nicolao Hojdan , Capitão Hollandez, 530, Nicolao Nunes , Alferes do Capitão Ma- noel do Porto , 1323. Noticias dosFrancezes do Maranhão , 20$. Noticias de hum novo armamento par,a a Conquifta , e Povoação do das Ama- zonas , 619. Noticias , que chegaõ aoEftado do Mara- nhão da paz de Portugal com as da mu- dança do Governo do Reino , 1 1^4. Novidades , que inquietao .0 Capitão mór Francifco Caldeira , 420. Novo atrevimento dos Topinambazes do Graõ Pará , e o caíligo delle , 44 r- Novos fundamentos para a Juftica de Por- tugal na Conquifta do Maranhão, 372. Ohlanda. Vide Ho/landa. Ollandez.es. Vide Hollandez.es. Qrelliana. Nome também do rio Mara- nhão , 7. Ovipadve , Principal poderofo da Coda do Brafil. Convida para grandes fortu- nas a hum Pirata Francez Rifault , 5)4. chamado P PAttiti. Rio do Ouro , 8f. Parnahiba. Rio principal da Capitania do Piauhy, 34. . PajcoalPaes de Araújo, Mefíre de Cam- po de huma Tropa de Pauliftas, 1274. O feu procedimento H 127(3. Paulo Martins Garro. Succede no gover- no da Capitania do Fará ,116"?. Paulo Soares de Avela? , Capitão de Infan- taria na Cidade de S; Luiz. Intenta im- pedir a ipvalaõ dos Hollandezes , mas com mais valor , doque fortuna, 770. Procede com muita diftinqaõ em hu- ma fahida , 8. Sendo nomeado Lugar-Tenente General do Governador Ruy Vaz de Siqueira, paf- ía a caítigar os Tapuyas do rio Urubu , 11 54. Os primeiros paflbs defta expedi- rão , 1 1 j y , 1 15Í. O bom fucceííb del- ia , 11 58. Pedro da Cofia Rayol. Succede no gover- no da Capitania do Maranhão , 1471. Pedro de Ferrol , Governador da Ilha de Cayena , Colónia de França. Pretende alargar os limites, 1368 até 1370. To- ma a Fortaleza de Macapá aleivofamen- te, que torna a perder , 1378 , 1387. Pedro Maciel Par ente. Leva ao Maranhão a feliz nova da Acclamaçaõ de Portu- gal , 75 6. Da terra firme de Tapuyta- pera , volta à Cidade de S.Luiz para fe entregar aos Hollandezes. Circunftan-. cias que fazem mayor a infâmia deita acçaõ , 776. Chega à barra da Cidade de Belém do Pará em hum navio Hol- landez , e retirado delia dá fundo no fi- tio do Mofqueiro , 794. Leva na fua companhia quarenta Soldados , 795. Avifinha-fe mais à Cidade , e poílo em franquia, manda prefentar a fua Paten- te no Senado da Camera com huma Carta cheya de foberba. Reporta que recebe , 751o. Defembarca com huma efeolta , e de huma cala aonde le reco- lhe , avifa o Senado , que o naõ reco- nhece por feu Capitão mór , e, com que razaõ, ~ ãas coufas notáveis. 7°í razaS , 797. Impaciente torna a tra.nl- puvtaiTe a bordo do navio , e retroceda à bahia do Sol , donde fe pofia em ter- ra. Forma o (eu alojamento na Ilha def- te nome com a invocação de S. Pedro de Alcântara , 798. Ávila do fucceífo a feu irmaÕ JoaÕ Velho do Valle , que fe lhe une logo com vinte canoas arma- das em guerra , 799. Accufa o feu pro- cedimento o Senado da Camera com vários proteftos, a que refponde com ameaços , 800. Novas defordens do feu procedimento , 800, 801. A inítancias do Senado da Camera de Belém do Pa- rá , com o Governador da Capitania , vay foccorrer a do Maranhão , mas com culpável fleuma , 840. Chega á Cidade deS. Luiz , afíiftido de feu irmaõjoaõ Velho do Valle, 845. Deferta utilmen- te com elle, acompanhados ambos da mayor parte das íuas Tropas, 861 , $62. Defattende os avifos do Capitão Antó- nio de Deos, 8£j. J?e4*Q de Magalhães. Tratado das coufas do Brafil. Succeffo queefereve , 84. Pedro Mascarenhas , Mcílre de Campo de hum Terço de Infantaria no ibccor.ro da Praça de Ceuta ; depois Governador das Armas da Província do Alentejo t e ultimamente Conde de Sandomil. O feu breve elogio, 1450. D. Pedro de Mello. Succcde no governo do Eftado , ioi}. U feu elogio , 10 14. Carta , que efereve ao Padre António Vieira na fublevaçaõ da Capitania de S. Luiz. Avifa a Camera do Pará deita commoçaõ , e lhe encarrega muito o focego dos povos > 1049 até 1051. In- forma a Corte deftes movimentos , 1054. Reclama judicialmente algumas firmas fuás , 1059. Sente juftamente a prizaõ do Padre António Vieira, isái. Reprehende por conta delia o Senado da Camera de Belém do Pará, mas pru- dentemente ie accommoda com as fuás fatisfações , 1065 até 1065. Entrega o governo ao feu fucceíTòr Ruy Vaz de Siqueira, 1078. Recolhe fe a Portugal com feu filho D. António Jofeph de Mello , 1079. Pedro Mendes Thomás. Succede no go- verno da Capitania do Pará, 144^. O feu elogio , 14J0. Chegalhe fucceíTòr, Pedro de Órfica. Intenta novos defcobri- mentos no rio Maranhão» He defpa- chado pelo Vice-Rey do Peru para % mefma empreza com o titulo de Con- quiftador. Sahe da Cidade de Cofco já com muitos Soldados , 86. Alua no- breza , e boas partes, 87. Chega a Qui- to já com mais de quinhentos homens , ibid. Fabrica embarcações , e bufea no- va entrada para o Maranhão , e a con- fegue , ibid. Confpiraõ contra elle , e traidoramente lhe tíraõ a vida , 88. Pedro Teixeira. He o primeiro Portu* guez , que pafla por terra do Graõ Pa* rá ao Maranhão , 418. Perigos deita marcha , de que o livra o feu valor , ib. Ataca hum navio Hollandez , valor com que o aborda , e triunfo que confegue , 421 até 428. Novas occafiões-, e novas vitorias com que fahe delias , 456 até 460, He Adjunto: no governo da Capi- tania do Pará ,481. Fica independente 110 mefmò Governo ^ 48 5 . Ataca os Hollandezes no fitio de Manodiotuba , e a felicidade do iuccefib , 555 , 55Í. Novas occafiões , de que fahe com a mefma fortuna , 5 $7 até 542. Sahe do rio de Belém do Pará fobre o Forte do Torrego , e defembarca as fuás Tropas a pezar da oppoíiçaõ dos inimigos, 586. Pede ceffaõ de armas a fua guarnição , que capitula , e fe rende , 588. Novas occafiões , e novas Vitorias, 590 , 591. He nomeado Commandante 'do defeo- brimento das Amazonas , 66 j. Sahe do Camutá com barria Armada de canoas , 669. Segue a fua derrota até a Ilha gran- de, chamada das Áreas, 670.. Continda a viagem , 679. Faz hum deftacamen-* to , de que nomea Commandante o Coronel Bento Rodrigues de Oliveira ? c fegue a fua poppa , 6%o Deixa na bo- ca do rio dos Encabellados , com a ma- yor parte das fuás Tropas , o Capitão Pedro da Coita Favella , 62i. Honras com que he recebido pelos Magiftra- dos da Cidade de Quito , e magnificên- cia com que lhas continuaõ , 684 até •588. Sahe deita Cidade , e chega ao rio dos Encabellados , onde fe incorpo- Yyyy ra .,.' yo6 Índice ra com o Capitão Pedro da Coíla Fa- vella , 704, Entra na fabrica de novas canoas , e no mefrao íltio afiènta os li- mites de Portugal , 708 , 709. Conti- nua a fua navegação até a Cidade de Be- lém do Pará ,711 até 745. He recebido com grandes applaufos, ibid. PaíTa à Cidade de S, Luiz , 744. He encarrega- do do governo da Capitania do Graõ Pará , 747. Obedece ks ordens do Go- vernador Bento Maciel com repugnân- cia do feu entendimento. Pede fuecef- for para paflar a Portugal , e fe lhe no- mea , 754. Morre no Pará com geral fentimento. daquelle povo. O feu elo- teria. Ilha , e entrada também para a do Maranhão , mas pouco fegura, 22. Tiauhy. Capitania do Eílado do Mara- nhão, 17. Os differentes rumos dos feus confins, 3$. Viúúnche. Volcaõ violento , que fica de baixo da Linha Equinocial , coberto de neve como o Ethna ,, 719. Pmdaré. Rio da terra firme do Maranhão, 2$. He grande creador de gado vacum, e na fua fonte fe entende , que ha mi- nas de ouro ,27. Pongo. Eftreito prodigiofo do rio das Amazonas , 702 , 703. ProviJhÕ Real íobre os cativeiros do Eíta- do do Maranhão , 5)82. R Q QUeixas muito juftas de Jeronymo de Albuquerque , e a generofa fatif- façaõ , que toma delias, 387, 588. Qtteixas dos moradores da Capitania do Pará da adminiftraçaõ dos Milionários da Companhia dejefus, 1020, 1066. Medidas que tomaõ , 1024 até 1056. Novas alterações da Capitania , toas prudentemente fuffocadas com as efpe- ranças do remédio , 1057 até 1039. Quita. Cidade do Reino do Peru , 6X6. Honras grandes com que recebe a Pe- dro Teixeira, d8í , efeg. Mily. Lugar -Tenente General , e Sócio com o Senhor de la Ravardie- re no governo da expedição do Mara- nhão, i2i. Dafundo defronte da Ilha de Upaommery , a que deu o nome de Santa Anna , 144. Põem em terra a mayor parte dos Francezes. Leva aos feus hombros numa grande cruz , que fe colloca em huma planície , e os feus Miflionarios benzem a Ilha com o no- me de Santa Anna , 148. Acompanha- do do Senhor Des-Vaux , paíTa à Ilha do Maranhão , onde he recebido com grandes applaufos , 149. Toma terra , e o Senhor de Manoir lhe dá na mefma noite huma cea magnifica ,153- PaíTa a outro íitio , deftinado já para cabeça da nova Colónia , ibid. Defenha com o Senhor de la Ravardiere huma Fortale- Jeza , a que daõ o nome de S. Luiz , è porque razaõ ,15a, i$8. Sahe a vifitar a Ilha, 159. Segue a mefma viíita , 162. Acha-fe obrigado a fufpendella , e fe recolhe à Fortaleza , 165 , i£ 7 . PaíTa a França, e com que condições , 175 , e feg. Padece na viagem repetidas tor- mentas , 178. Arriba a Avre de Gracia, 175». Padece nefte porto nova tempef- tade , ibid. He foccorrido do Senhor de Vilars , Governador da Praça , 180. Parte para Pariz com féis Tapuyas do Maranhão , 182. Vay com eHes à pre- fença dos Reys , 183. Racify , Cavalleiro de Malta. PaíTa a Gua- xenduba depois da batalha , 228. Fr. Raimundo, Religiofo Miffionario. Paf- fa com huma Tropa ao rio Urubu , iii i» O fueceflb que teve ,1112 até 1115. Ravardiere. Embarca de França para a Ilha do Maranhão , afliftido do Senhor Des-Vaux , e bem examinadas as fuás noticias volta para Pariz, onde dá conta da fua commiflàõ ,113. Concebe gran- des efperanças da Povoação daquella Ilha , e com permiíTaõ da Rainha Re- gente forma huma Companhia com o mefmo projefto, 120. Recebe a Pa- tente das cmifas notáveis, 707 tente de Lugar-Tenente General das índias Occidentaes, e terras do Brafil , lai. He Commandante da expedição , acompanhado do Senhor de Racily , hum dos feus íbcios , 12c. Alteração dos ânimos Francezes , e focego dellcs, ibid. Proteftaçaõ de fidelidade , 128. Arma três navios, e os nomes de todos, 129. Sahe do porto de Cancalle, e hor- rorofa tormenta , que faz arribar três embarcações a outros differentes de In* glaterra ,15o, 1 $.i; JuntaÕ-fe todos em Pleimout, 132. Humano acolhimento doslnglezes , 133. Sahe de Pleimout, e pafla pelas Ilhas Canárias ,154. Con- tinua a fua viagem , e o fucceflo delia até mandar Embaixador aos Topinam- bazes do Maranhão, 13$ até 146. PaíTa à mefma Ilha , e eícolhe íitio para ca- beça da nova Colónia , 149 ', 15$. Fica independente no governo delia pela au- ferida do Senhor de Racily , que acom- panha até os Mangues Secos , donde volta para a Fortaleza de S. Luiz , 17Í, 177. O feu elogio , e Religião , 272. Projecto , que forma para furprender as embarcações de Guaxenduba , 273. Occupa a enfeada do mefmo fitio com fete navios , e quarenta e féis canoas , 285. Faz hum defembarque à ordem do Senhor de Pizicu , feu Lugar-Te- nente General, 284. Efcreve ajerony- mo de Albuquerque, 296. Obferva do mar o perigofo eftado da batalha , e in- tenta fazer huma diverfaõ , mas naõ a pôde reduzir a pratica , 301. Melanco- lia com que diicorre , 515. Carta que efcreve ajeronymo de Albuquerque, 31o. A repoíta delia, 318. Conceito que forma, 320. Efcreve novas Cartas, 3*1, 524, 326. Propõem huma Tre- goa ,333. Ós feus artigos ,334- ^afía. a Guaxenduba, 34o. .Moílra a fua Pa- tente , 348. Defoccupa a enfeada , e fe recolhe à bahia de S.Luiz, 351. Ma- gnificência com que hofpeda a Diogo de Campos , 361. Generofa refoluçaõ, que fe lhe malogra, 390. Propõem o rendimento da Fortaleza , e pafla a Ilha de S. Francifco , 341 , $42. Entrega as chaves da Fortaleza de S. Luiz a Ale- xandre de Moura , 397. Manda para França os Francezes rendidos , deixan- do fó no Maranhão alguns calados com índias da terra, 400. Pafla a Parnam- buco na companhia de Alexandre dé Moura ^ 410. Riftuk Pirata , Francez. Infefta a Coita do Brafil , e communicando-fe com os Índios delia , hum dos feus Principaes mais poderoíbs o convida para grandes fortunas , 94. PaíTà a França com efte proje&o , e volta ao Brafil com três na- vios. Perde o melhor delles , e arriba à Ilha do Maranhão ,93- Na mefma Ilha fe detém algum tempo, e deixando nel- la o Senhor Des-Vaux , com outros Companheiros , palia a França influído de novas idéas , 96. Ruy Va%_ de Siqueira. Sahe do rio de Lif- boa para o Governo do Maranhão , de que toma pofíè na Cidade de S. Luiz , 1078. Primeira acçaó da fua boa capa- cidade , ibid. O feu elogio, 1080. Re-, cebe Cartas do Senado da Ca mera do Pará , e medidas que toma para o foce- go ultimo de todo o Eftado , 1081 até. 1083. Inteireza com que procede , de- pois de rebatidas as principaes forças da fublevaçaõ, 1098 até 1102, e noí , e 1 1 10. Pafla à Cidade de Belém , e dif- tinçaõ com que he recebido daquelles moradores , 1 1 18 , 1 1 19. Entrega a ad- miniítraçaÕ dos índios aldeados ao Sar- gento mór Manoel Guedes Aranha , 1120. Recolhe-fe à fua refidencia da Cidade de S. Luiz , 1121, 1122. Naõ recebe bem a refoluçaõ fobre as queixas do Eftado , 11 27. Chama Procurado- res de Belém do Pará , 1 128. Carta que efcreve ao Senado da Camera de Belém do Pará , 1132 Pafla irritado à mefma Cidade , mas a prudência com que pro- cede , 1 1 34. Toma a refoluçaõ de fazer a guerra peflbalmente ao gentio do rio Urubu ; mas naõ podendo logo defem- baraçarfe , nomea por feu Lugar-Te- nente General a Pedro da Coita Favel- la , 11 34. Vence os embaraços , que o prendiaõ , e com novos esforços pafla a Aldeã do Xingu" •, mas outra vez cha- mado das obrigações do feu lugar , fe recolhe à Cidade de Belém , 1 137» Ref- titue-fe à fua refidencia de Saõ Luiz , 708 índice 1 1 59. Chega-Ihe fucceííbr , e fe reco- lhe a Portugal, 1150, nj 2. SAnâalim , Capitão valerofo dos Hol- Jandezes. Intenta deftruir hum defta- camento de António Moniz Barreiros , de que avifado eíle Commandante , o recebe com huma cmbofcada , S26. O feu valor ainda depois de defamparado, 827. Defpreza a piedade com que An- tónio Teixeira de Mello lhe ofíerece a vida ; e querendo depois aproveitarfe delia , já naõ pode logralla. O feu elo- g'°> 828 Satisfação de alguns reparos na expedição de Gonçalo Piçarro ,77. Seara. Capitania , que íe íeparou do Eíla- do do Maranhão , e verdadeira demar- cação do mefmo Eílado , 1 j. Sebqflíad , índio Catholico. Pratico na lingua Franceza, 161. Lança fogo aos canavjaes dos Hollandezes , 8t> 9 . Sebajiiaõ de Lucena- Succede no governo da Capitania mór do Graõ Pará , 970. Queixas do feu procedimento , 5171. Avifo que recebe , e refoluçaÕ que nel- les toma , 972 até 975 . Muda de proje- cto com grande gloria fua , 97 6 até 97S. Mas perleguido ainda dos queixofos , he iuipenfo do emprego , e extermina- do , 579. Recebe ordem de Portugal para fe recolher a Lisboa fem parlar pe- la Capitania do Pará , 989. Sehtjliad Martins , Piloto Portuguez. Pra- tico na Coita do Maranhão ,2^9. Em- boca a barra do Periá , 242. Navega a Parnambuco o caravelaõ , de que era Piloto , à ordem do Capitão Martim Calado Bitancor , 26 2. Defemboca a barra de S. Luiz do Maranhão ,265. Séájliaõ Pereira Tinoco. He o primeiro que toma terra na Ilha do Periá , e dá ao fitio a invocação de Santiago , 245. Diftingue-fe na batalha de Guaxeudu- ba }°4- Senado da Çamera do Pará. He encarrega- do do governo da Capitania , 747. Me- didas que toma para a oppofiçaÕ dos Hollandezes, 802, S©j. Recebe pela . mao dos mefmos inimigos a copia do Tratado da Tregoa de dez annos , que ajufíou a Corte de Lisboa com a fua Republica, 84Í. Conhece bem a fua politica , 842 , 845. Ufa também de ou- tra femelhante na aceitação da propof- ta do Governador dos Hollandezes, ibid. Defpeue os feus Enviados fatisfeitos da negociação , 845. Reprefentações que faz ao Padre António Vieira, 1075, 1077. Recebe avifos da fublevaçaõ do Maranhão pela Carta do mel mo Padre, 1095 . A fua repofta , e verdadeiros len- timentos, 1096 até 1099. Procedimen- to que tem com o Vereador Manoel Cordeirojardim , 1:05 até 1105. Dá as providencias , que julga neceííàrias pa- ra o focego da Capitania , mas com pouca fortuna, 1 108 até nu. Procu- ra juítificarfe com oGovernador, 1118. O feu procedimento na geral commo- çaõ do povo, 1070 até 1102. Recorre à clemência do Príncipe , 1105 , 1104. O feu procedimento em alterações no- vas, "50, e 1142 até 1149. Queixas que faz ao Governador António de Al- buquerque, 11 59 até 1162. PaíTaõ eftas aos ouvidos do Príncipe , mas apaixo- nadas, 116 f. Novos princípios de no- vas commoçÕes, e os paíTos que deraõ, 1 170 até 1 177 , e 1 192 até 1 1 97. Juftas queixas que faz de hum geral Eílanco, mas a moderação com que as articula , 1251. Recebe avifos da fublevaçaõ de S. Luiz com o convite para a fua uniaõ, 1290. Proteftações que faz na prefença do Governador, 1290, 1292. A repof- ta que dá aos amotinados , 1296. Hon» rofa Carta , que recebe aííinada pela maõ Real , 1554. Simad EJl.icio da Silveira. Efcreve huma relação das coulas do Maranhão , n. TApajox. Rio caudalofo , e naçaõ mui- to bellicofa , 75^. Tapuyas valerofos da Coita do Seara , c Camoffiy , offendidos dos Ho.Iandezes, .tomaõ delles vi' gança , 920 até 925. Taramamkz.es , Tapuyas de coifo , que habi* das coufas notáveis. 709 habitaõ fó tias pravas, 12^1. A lua agi- lidade , 1252. O feu atrevimento, Má. O caftigo delle > 12^,12^5. Xiirmo da entrega da Fortaleza de Si L-uiz, Tlwm.igíca. Grande Principal dos Tocan- tins, 5?4- Themás Beckman. Concorre muito para a fublevaqaõ da Cidade de S.Luiz 4 rijo. Pafía a Lisboa por Procurador dos fe- diciofos , 1 5 ia. Volta prezo ao Mara- nhão ; e valendo-fe do refugio de huma Igreja da Cidade de Santiago de Cabo- Verde , a lua immunidade lhe falva a vida , iH", M42- \ Thomás Guilherme , Inglez de nacaõ. Che- ga à Cidade de S. Luiz , e dá a noticia, de que os Hollandezcs fe difpunhaÕ pa- ra a invafaõ do Eílado ,765. Thomás , Conde de Brechier, 619* limbo. Aldeã da Ilha do Maranhão, t6i* D< Fr, Timoáeo do Sacramento. Succede na Mitra Epifcopal do Eílado do Ma- ranhão , 1590. A primetra acqaõ das luas afperezas , 1592. Declara o Ouvi- dor Geral do Eílado por excommun- gado , 1595. Aggrava as cenfuras , mas obrigado as fufpende logo, ibíd. e i?97* Refolucaõ das contendas que teve com o Ouvidor Geral , 1405 até 14°?. A fua obftinaçaõ , e os èfcandalos , que refultaraó delia, 1406 até 1417. Pagan- do a Portugal o mal que he recebido , e a refolucaõ ultima das fuás contendas, 1527,1428. Ttrannia de Ravardiere com os Portugue- zes , 572. Twa. Rio da Cofta do Maranhão , 210. Titulo novo , para o direito de Portugal nas Conquiftas do Maranhão , 674- Tocantins. Rio celebre da Capitania do Graõ Pará , ^ Tccujús. Ilha da mefma Capitania, 581. TopinamUxes da Ilha do M/ranha6 , que fé fujeitaõ à obediência dejeronymo de Albuquerque , 415. Topir.ambax.es do Cumá , 429. A fua iu- blevaçaõ , e aleivofia , 45a, 4U- ^ oW ' municaõ fe com es da Capitania do Pará , que também fe commovem , 4i7* Tonego Porte da Ilha dos Tocujús , $82. Tratado Provifiohal de 4 da Marqo de 1700 , 1421 ,' e 1472. Tratado de Utrech , concluído em H de Abril de 17M , H7 2 - Trijiaõ deMendoça , Embaixador de Portu- gal na Coite de Hollanda. Ajuda corii cila Republica Tregoa de dez annos , 841. VAux \ Cavalheiro Francez. Entra na Ilha do Maranhão > onde fica com outros Companheiros , 96. Con- fégue repetidas vitorias na oppoficaõ dos inimigos dos Topinambazes , m, Obrigados elles deite ferviqo , e da affa- bilidade do íeu natural , fe fujeitaõ a huma Colónia de Francezes, ibid. Pal- ia aFranqa, e perfuadè ao grande Hen- rique IV. a povoaqaõ daquella Ilha , que eíle Príncipe manda examinar pe- lo Senhor de la Ravardiere , acom- panhado do mefmo Des-Vaux , 112. Volta a Franca com o Senhor de la Ravardiere , 115. Torna com elle ao Maranhão, e chegando â Ilha de San- ta A n na , vay por Embaixador aos To- pinambazes , 14^ He bem recebido , e fe recolhe à íua Armada i 147. Acom- panha aRacily na vifita da Ilha , Mp- Argumentos que tem com hum Ta- puya velho i 166 <, 167. Vicente Yanes Pinçon. Acompanha a Chriftovaõ Cólon no defcobrimento das índias Caftelhanas, á. Sahe da Vil" la de Pálios com quatro navios para no- vos defcobrimentos > 5. Toma a Ilha .; de Santiago , e defcobreo Cabo de Santo Agoílinho, onde defembarca , 4. Entra na boca do grande rio das Ama- zonas , a que chama mar doce , 5. Do- bra o Cabo do Norte , e defcobre hum rio , a que dá o feu nome , e appellido ultimo. Segue o mefmo rumo até o Periá, defcobrimento de Cólon, e vol- ta a Hefpanha com a perda de dous navios , ibid. Vicente Pinçon. Rio, riç. Vicente de los Reys Villalotos. Intenta a entrada do rio das Amazonas , empre- ga que lhe atalha a morte, pa. Zzzz Fítaí °>fà- I 710 índice das coufas notáveis. Vital Maciel Parente. He nomeado Ca- pitão mor da Capitania do Maranhão , j 228. Vay caftigar os índios Taramam- fcezes, 1254. O fucceíTo defta expedi- ção, 12$ 5 até 1 5 57. Urubu. Rio da Capitania do Graõ Pará , 11 11. X ■y Ingú , Rio. Sitio admirável para hu- J\ m» grande povoação, com excellen- tes terras para engenhos de afíucar , e outras lavouras, 7 ?7 ,1157. He ta6 abundante de páo cravo , como de gen- tio , miílionado pelos Religiofos da Companhia de Jefus, ibid. z va "Etó exemplar do Governador do Ef- tado do Braíil António Telles da Sil- Zumaco. Província do Reino do Peru , $£• Tem arvores de canela , 5^. Perreira de Berredo (B.) Annaes históricos do Estado do Maranhão, em que se da Noticia de seu Descobrimento é] tudo o mais que neUe tem succedido até 1718 Lisboa, 1749 < t * This rare work is one of the best executed of the' Pro- I Ymcial Histories of America. I'. -■•&;■> » 9"