..'II', iJ SAU' ZES OSAS, DA ELOQUÊNCIA, DO ESPIR ITO , DO ZELO ; E EMINENTE SABEDORIA D O P A D R E ANTÓNIO VIEIRA, Da Companhia de Jefus, Pregador de Sua Mage(lade , e Primipe doi Oradores EuangeJuos : ACOMPANHADAS Com hum fidelifíímo Echo , que fonoramcntc refulta do interior da obra GLAVIS PROPHETARUM. Concorda no fim a ííiavidade das Muíàs era elogios raros. Tudo reverente dedica AOPRINCIPE NOSSO SENHOR OP.ANDRE' DE BARROS, Da Companhia de Jefijs , Académico do numero da Academia Real da Hiftoria Fortugueza. LISBOA OCCIDENTAL. Na Officina de M I G U E L RODRIGUES, IrapreíTor do Senhor Patriarca. " M. DCC, XXXVL Com toâas as licenças mceff árias. '\â 5ͧob:áíJS' 8EÍuMf;sb sbfifcivÊJ J'i -J- : ■:- ■^1 i»ii3í'~t invdmao (\ml K. ^.Vll vS vo:^es do Tacire Jntonlo Vteha anti- gamente dearticuladas foraÕ ouyidas com admiração m mundo , e merecerão f cr feVc^mente attendidas pe^ los ^aes fredecejfores de F. Alteia. EJlas agora ejcritas fohem aos pés daquelle mefmo throjio , onde efperao a mejma felicidade y que as primeiras, ^an- do ejie grande homem fallaya , era tal áfua energia^ que parece , que as mefmas yoi^es fe ViaÕ : a/Jimfo- raÕ as Vo,^ei de Deos no monte : Cun<5lus autem ^l[ populus videbât vocês j eeftasyo^es agora efcrl- tas tem tal viv^^^, que parece que fe ouyem» ^e ma- raVúhafeja mayor ^ fique nos difcretos por matéria de prohlema. Mas ou as yú:^es de Vieira fejao yiftas quando falia, oufejaÕouVtdas quando e/creye,fa:^em fempre taÕ harmoniofa çonfonanda ^ quefófaÕ dignas de ^eaes olhos , e entendimentos fuhlimes, Filippe o i Gran- Exod. Grande de Macedónia tinha per felicidade , que Ale- ^^\^^]:xandrefeu filho foJfeouVinte de Arifiotdes : ofadre António Frieira na Vida immortnl ter d a gloria de que V. Alteia o Veja, ou o ouça nas fuás Vo;^fí, depois da morte v/vo, depois da fepultura eloquente. Saõ os thro- nos {fendo a tudo fnperlores) fuj eitos a ouVir Vo^eí Sen. Tr^g. enganadoras : Fraus fiiblimi resnatjn aula , diíTe Aft. 3. inO i ragico : contra ejte atrevido veneno achara V, Al- Choro, f^^^ j^^^i^^ ^^^^^ ^ triaga , e nafua variedade o de- leite, ^emaffim ajuntou o utll com o deleltaVel, ex- cedeo a tudo 5 por IJio ninguém f aliou como Fieira, em quem tudo admlraÕ junto ainda av^uelles , que 7iaÕ fe coíiumaÕ admirar. Sendo pois taÕ altas , e taÕ vivas èUas vo:^es y.a protecção de V, Altei^a , que as ' fa^ fuás y as fubllmard de forte , que elevadas ama- yor ponto JaraÕ glorio fo brado no Unlverfo : toma- rão fem duvida eítas Vo>es de taÕ/oberana protecção mais valentia de Vo^ , e veremos aqui repetida aqueU praim. <í7.^^ admiração de Davld : Ecce dabit voei íuse vo- 3 5- cetn virtutis. t>ejla maneira fe Verá crefcer o que ^,. naÕ podia crefcer mais , e começará a ver o mundo o que anojfaefp^rança, e o nojfodefejo pronoíiica de V, AltCi^a , novos augmentos aos vaffallos y novos ef: maltes d Coroa , e nova grande:^a de Império , e Mo- narquia, André de Barros. ;vi NOTI- «S# 1* ^* #- $ *?* rf * 4 «t* 1|^ ^t^ ^T^ : ^%>% ^f f *^ 4 4í :4^ i^ NOTICI PREVIA. Padre António Vieira , que nos do- tes da alma com immortal gloria o da noíTa naçaõ apenas teve igual , foy fem duvida aquelle heróico Sá- bio , c]ue em feu entendinientoionTíava o ma.- yor de todos os Eftoicos Séneca. Temeoíe effif grande Filofofo de que foíTe tido por impòí- livel hum Sábio taó prendado , como elle o confíderaya 5 mas taó longe eftava de o ter el^ le porimpoffivel , que ainda que confeíTou fer coufa j que em muitos feculos , e largas idadíí.$ fe naó via, quaíi o achava no íeu t,empQ. no int tegerrimo , no forte , e no conftante Marca Cataó. Aflim o efcreveo a, Sereno no, tratada incomparável á^ Conftantlafapimtls câp. 7. No7í eíi qíwd dlcús ( naó fe podem omitcir as íuas pa- lavras) TSÍon eH quod dkds ai a nt fales , hunc far pe?r ':1; 'ptentem noftrum nufqudm híVentrL TSlon fingmus ÍJhid hu}7ia7Ú ingenii 'vanuni decns , nec wgaitem ima^ ghiemfdlfí^ rei CGndpímv.s y fed qualem confirwamus , exhihuimus , <Ú^ exhihdnmus. ^jo forfitan , . mã' gnisqiie £tâtmn inter yallií inVenitur , neque enhn ma- gna , <ísr exiedentia folituní , ac Vulgarem modum crebro g:gntintu}\ C^rerum hic ipfe MdrcíísCato j a cujus mentíone h^c diíputatio procefjtt , Vereor ne fupranoftfum exemplar Jit, Entrando pois neíta claíTe de Homens o grande Vieira/julgarao íempre os mais difcre- tos , e fábios , que ctido quanto foíle obra de entendimento taó raro, devia fahir a luz para accreícentar mais luz á pátria ; que anaò ter outros efclarecidos fikbos , baílavaé as luzes de hum fó Vieira para darem a todo o Portugal o iUuftre nome de Luíitania. ' ' ^Levados defte commum parecer, antes que áèrtios ao publico aHiftoria da vida de Varaó taõ raro , oíFerecemos eftas relíquias dos cuida- dos, epení amentos daquelle grande entendi- mento. Pomoslhe o titulo de Vo^es Saudofas^ porque outra vez nos falia o íempre faudoío, e defejado Vieira ; e como poderáô andar por outras m aos eftas meímas obras com alguma o diííeren<^a, declaramos, que conforme agora as óíFereceniòs ao publico , affim eftaó nos teus pri- primeiros originaes. A razaõ da diverfidade ( íem fer corrupção ) pôde ler, porque os mef- mos Authores ao pôr em limpo o que primei- ro- efcreveraó , vaõ mudando , e chamando outra vez á lima o que com fegunda infpec- ^âó lhe pareceo menos polido , e elegante. Só na F^o:^ HíHorica y por fer a relação comprida, fizemos a divifaô dos §§. e titulos, que feu Au- thor naõ fez , para defta forte ficar mais fuave, e divertida a lição delia, fem que no texto vá palavra , que naõ feja fua , e alguma , que faU tava, naó quizemos fubftituir com outra ncíTa. O parecer , ou juizo fobre o Clayis ^rophe- mm juttamente merece o nome de Echo De-* íejavamos oíFerecello aas doutos mais expre& fivo de toda aquella grande voz , ifto he , mais correfpondente ao que dearticula buma obra/'";'^"'^,^ que antes defervifta, tem dado taõ valente brado ; mas julgamos por melhor naó moftrar ao publico contrahida a luz de farol taõ gran- de , nem dar refumida em huma concha a vaf- tidaò de hum profundo Oceano de erudição , e íjoutrina. Virá tempo , em que efte mefmo Oceano fah indo do reci noto, em que agora o detém a providencia , faça apparecer novas terras, enóvos Ceos: naó fiado, e prefumido nas luzes do engenho humano, mas guiado pe- pelas luzes das Efcriturás divinas , em que cora eftupenda , e nunca aíTaz admirada torcia fe itavieir.inf^"'^^^' ^S^íí/y^m (palavras iaò do grande Vieira) ^yy^^ Lice- ad fcrnthnum. ip/ormn tempbrum aícedmnus non alto rarum re-ducc , dut lucB , quâM "Vcrbo Domhú y de quo Hlumi- '^^^'''\!^l^^'.-,natlf/imus ^rofbeta: Lucerna pedihus mds^Verhum (ww/í. Encaó íe verá ter o elevadiffimo enten- dimento de Vieira, o novo Tiphys, que vele- jando felizmente pelo profundo mar das Ef-- criturasi moflrâra naõ lerem ultimas aquellas balizas, quefe cuidavaò íer os termos do mua^ do quanto áíuâduraçaó, felicidade, e gloria nos feculos futuros. Bem lhe podemos accom- modar a efta Voz , ou a efte Écho a confonan^' cia do choro de Medea-cm Séneca i ..... F^emmVãnnls ^(taãa feris , quibus Oceanus P^incula rerum laxet , 6^ Ingens í^ãteatttUuSyTiphys.quendvvs2f..[Tt^ Detegat Olhes ^ me fitterris nkimaThuleo,: A eftas Vozes ajuntamos huns Sufpiros, com que a pátria , e a Companhia de Jefus expref-, íou a fuâ dor na perda de raS eftimavel ;yidai> variando defta forte efte pequenoí Volume •, .-O ajuntando com razaô, e com a natureza ásfau* dade o pranto. Agora com mais verdade po- ^(^?^' ^' ternos dizer : Eft qu*edmi fJere mluptas\ e^efta-: par- parte meffor áe noíía^ lagrimas poderá accen- der o fogo, e fazer , que corra ao publico toda a corrente delias, ha tanto tempo reprimida , e por toJos os eruditos deíejada. O primeiro , por cuja penna fallou neíld dor a eloquência , foy o P. Jeronymo de Cafti- Iho (entaó Meftre de Latinidade) fugeito, de cfâ}a fã:|ta ainda naó temos en xutas as lagrimas, c^ de quem ntinca as enxugarão as Mufas, a Real Academia , e todas as boas letras. Elle foy ( co- mo direrííos ); o Auíhor do Bpíenotapfn&H , que aqui leráà os curioíos , compofto em eípaços breves , e volarwe penna. Damos' em fegundo kigac o extraâ:o da ebra, com qu€! o- Collegio de Coimbra da Compaíifeia dejeftis, feliz domicilio das Mo^ fas, quiz com vario género áe Poemas Latinoâ fázep as^fupremas honras ao mayor Orador der roáas as i^ osPoe- § fe fe encommendarao ao R. P. M. Manoel de Oliveira , por aqueiies annos Lente de Theolo- gia Moral , a quem no íeu tempo ninguém igualou nas letras humanas ; e nos mayores eí- tiidos , qye profeíía a Companhia, ninguém venceo. Seja licita aqui á obrigação de difci- puloefta grata memoria-. ■ Damos em' .teroe iro lugar z Kmia cjuarta y ( unica , que podemos haver) e nella as lagri- mas da Officioa Typografica, cjuç chorou: a falta do P. António Vieira; porque já nos naó poderia mandar em cada frota do Brafil hum tomo para a impreiTao, como coftumava, ain- da que a mefma nao , que trazia a noticia da morte de Varaó tao. iiluftre ;. trazia também a tomo duodécimo das íu as obras. Efta Elegia foy compoíiçao do R. P. M. Henrique de Car- valho, (agora GonfeíFor doPrincipe noflo. Se- nhor > ' qu€. Deos guarde ) de quem tpmánnos âhtigamenre entre a cultura dasMufás ospi^^c eeitos da Rhetorica. í)! Oe toda a obra podemos dizer , que foy, Juthor hum tnagnjficeAtiffimo Mecenas, y,^ Exeellentifflroo Senhor: D. Françifeo Xavier de Menezes Conde da Ericeira , a ctyas inftan- GÍasi e por cuja èxhoríaçaõ fe compoz , e a querp ella toda fielmeii£€í;fe entregou. . UÍyflfe^s c ó na- naquelUfua tâõ celebre declamação contra ó valente, e esforçado Capitão Ayax , para fer herdeiro das armas de Aehiiles , allegava conóío rneredmentos próprios as façanhas, que o mef- mo Aehiiles fizera no cerco deTroya, porque elleocinhaexhortado, elevado a guerra: • Uate Dea {dixi) Mi fe peritum referyant ■ ^ _ ^^^^ ■ Tergãma : quíd âuhitas Ingentem evertereTroiam: -Inge [fique manum ,fortemque ad for tia mifi. Ergo opera illius mea (unt* Com muita m ay or razaó podemos dizer fer a obra mais dè quem. a mandou fazer , e exhor- tou os ânimos a ella , do que dos entendimen- tos , das ideas, e dos difcurlos dos que neila fe empregarão 5 porque nefta paleftra deMii nerva feus foraò os efpiriros , e çs alearos^^iitíf do adiante com o exemplo, muito melhor que UlyíTes nas campanhas de Marte , e exhorcaçaã de Aehiiles. <í Efte pois ExcellentiííimoMecenas he aquelf- le grande Aiumno da fabedoria, a quem entre a Nobreza illuftre de Portugal , a Poetiça , a Oratória , a Filoíofia , a Hiftoria , e a noticia dq todas as ciências , e Artes liberaes fizeraò naó já imitavel , mas íó admirável : a quem a gran- de alma do P. António Vieira nas mefmas hon- ras funeraes, que recebeo , celebradas com ' ' 'M § ij íum- i^M fiimmarnagnifícèiTcia j immomiitón á fâmaj e colioeou dentro da esfera dos Heroes ; e a quem a Gompanhia de Jefus , reconhecida a eíte, e muitos outros beneíicios, fe confeíTará obrigada, e fem nunca íe poder íokar , im- morralmente preza , e devedora. Naó fallo na- quella tâó principal parte das raefnnas Honras fima-aes , c^yail he a feiecçaô do Orador , par- que tev^ nefte paiticahr mò prompcâ ^ e por- tentoía o ExcellentiffimoConde aOivanaPro- tidenm 5 c^ue^ oraijaÕ daqiucilc dia iminorta- ííéou Jiaó fÓ4^ feju deâii^to^^e chorado chp' ^o , masaotti^fo o Orador^ ô qual deixou íhi- poffibi&a-dâ a eloquência , a jeriidií^aõ , c a f a?- bedork ãioilencârfe em >autro algum dicaím ttiãisgfet^iofà. 'ji. Em ukittio lugar ofterecemos oElogio^^ GOfíi^iíe honwu víovvimçmt a fouiofa memo- ria do fennpre grande Vieira oR. P. M.. Níc»- iàx> ât Segura, em «cujõdDÍequio (tpaefiimca pôde fer paga ) proc^aratiios iínmortalizar , j)e- k repetida 'impreffâó dd Eiogi© , a íaa mcfuna [ueficia. LICEN- mM f.Í. LICENÇAS. Da Religião. JOaó de.Menezes Ja Companhia de Jeíus, Provincial da Provincia de Portugal , por particular commiíTaó , que cenho de noí- fo muito R. P. Franciíco Recz , Prepofito Geral, dou licença, para que fe imprima efte livro intitulado Fo §iv ^tS^^^ dí£nus afierire líhrum^ eícrtvco o Láureto. Más reparo, que naó admictindo a.Mufica mais que íeis vozes , eu para o canto , ou para a la- mentaíjaõ , o doutifliuno P. André de Barros fa- ca em dez vozes a fua ^ e a noíla lamentação. Masaílinrj devia defer , porque fó no numero mais perfeito, que todos: Denarm inter omnes eít perfeSií/Jimus , como eícreve Philo Hebreu, dez dev^iaó fer as vozes da naais bera fentida , mais eioqueme , e mais^difcreta faudade, e co- mo neftasd^ez vozes fer^âó defconcerte a har- monia das linhas da fé , e bons coftumes , me parece fenaó- devera fuípender , antes fazer pu>- blicas pelas regras da; impreíFaè* , para que fe pedie a prefente licença, V^ Eminência orde- «afá , o que for fervida; Convento deS. Fran- eifcode Xabregas aos 2|. de Agoílo de i/^ç. Fr, Ignacto da Qra^a,. Jfiproyaçaõdo%f M Fr. Manoel Coelho , \^u Uficador dofmtaOffim , 0*c. eminentíssimo senhor. ESta hc a terceira vez , que V. Eminenda me continua a honra de mandar , que cx- preííe o^izo^^ que formo das obras daquelle gran# grande Heroe , luftre de Lisboa , credito de Portugal , e admiração do mundo todo , o Pa^ dre António Vieira ; e fendo ojuizo , que for- mey lendo os primeiros dous livros das cartas , que deixou efcrítâs , de que todas as fuás obras eraó filhas da Tua eloquência,, e nobililTimos partos da fua íabedoria^i eque naquellâs cartas parece tinha deixado copiada a fua alma: len- do hoje efté livro intitulado Vo^^s faudofas da eloquencia-y do e/ piri to, do i^elo , e eminente fabedor ia do T, António Vieira da Companhia dejkjus , fresa- dor de SudMageBade , e í^rincipe dos Oradores Eu- angélicos , que compilou o R. P. André de Bar- ros , filho da mefma Companhia ,. Académico da Academia Real da Hifòoria Portugueza^ me confirmo naquelle mefmopenfamenro, cem queentaó meanimey a dizer, qae com razaõ íe podia julgar naó tinha , ao que parece , aca- ' bado a vida o P. António Vieira , attendcnd© á eleganciay com que cada dia eflá fallando, dei- xando perceber nos feus eícritos a harmoniofa confonaneia das fuás vozes, Nefie livro fe ad- miraó novamente as fuás vozes cem© dtíper- Câdoras da noíla faudade j mas fervindelhe de alivio o ferem vòzcsj que depois da morte eftâ dando, como vivo , o P. António Vieira. Sin- gularmente as admiro articuladas nefte livro j,. Ir, quando pelo R. P.André de Barros compiladas: íóniente nos deixaó o rencimenco de que fe ou^aó as vozes, e fe calle o echo , fendo efte taó 1 ufpirado , como echo de raó alta voz; mas por iíTo mefmo , que foy caó aka a voz , naõ ÓQO lugar a que fe percebeíTe o echo : fícanos com tudo a efperauí^a de que chegará tempo., em que fe perceba efte echo, e fe admire o ele- vadiffimo do entendimento doP. António Vi- eira fobre o C/^íV/í frophetarum , a que o R. Pa- dre André de Barros dá o titulo de Echo. Bm íim, EminentiíTimo Senhor , nefte livro naó leyo coufa alguma contra noíTa fama fé , ou bons còftumes, e nne parece digniffimo da li- cença, que pede. S, Domingos de Lisboa 13. de Setembro de 17^5. Fr, Mdmsl Coelho, Víftas as informações, pódefe imprimir o livro intitulado F'o:^es f ando f as ykinhor o P. André de Barros ; e depois de impreíTo tor- nará para fe conferir , e dar licença que corra, fem a qual naó correrá. Lisboa Occidental i>6. de Setembro de 17^5. Fr. !í^. de Lancajiro, Teixeira» Soares, Jken, DO Do Ordinário. POdefe imprimir o livro, de que fe trata, e depois de impreíío tornará para íe confe- rir, e dar licença , para que corra. Lisboa Oc- cidental 1 8 d^ Outubro de 17^5. Gouvea, Do Paço. jípproyacaò do Conde da Ericeira, do Concelho de Sua Mageftade, Cenfor da Academia ^al da Hif- torta TortU£ue;^a. SENHOR. Aféce, que para agloriofo reynado de V/ Mageftâde reíervou Deos os mais precio* í os thefouros , porque o nao íaó menos os que defcubrío por influxo de V. Mageftâde a laBo* riofa inveftigax^aó d-ds eruditos nos Archivos, do que aquelies , qi>e nas opulentas minas def- entranhou íi infatigável diligencia dos que tri* butaraô a V. Mageftâde as pedras , e osmetaes mah ricos , para que o generofo animo de V, Ma- ■■MnHHMaHMgBaaHHHBIMlíMIiaHI Mageftade os diftribuiíTe para o culto de Deos, para a defenfa da R^eligiaó , e para a gloria , e legLirança do Rsyno. Naò fe contentou o R. P. André de Barros da Companhia de jefus com bufcar na Academia Real os monumen- tos, de que vay form anilo as fuás excellentes Memorias Ecclefiafticas do Bifpado do Algar- ve , mas quiz também enriquecer, e illuftrar a Republica literária com as veneráveis reli-, quias de alguns efçritós do iníigne P. António Vieira , dando nelles o melhor exemplar para todos os eftylos a quem , ainda que de longe, confeguir a felice imitação , que todos devem procurar para eícrever com acerto. Juftamcn- ce chamou vozes a eftcs difcuríos , porque to- dos faõ efpirito , e todos fao harmonia , que ha de ouvirfe , e admirarfe em todos os tempos , e em todas as naçoens. Naô he diíTonante a dif- Creta frafe , com que fe explica efte Académi- co nos féus elogios , moftrando nelles, que fou- be feguir o eíèylo do incomparável Orador , de quem nos promette eícrever a vida , aflumpto, que eu tinha emprendido , e principiado , e de que dignameate lhe cedo a gloria , e fó defeja- ra dizer , que náó li a noticia previa defta col- lecçaõ , porque nella fó naó poflo approvar os mal merecidos louvores , com que renova a me- mcimoriaclefiuiBâ act^ô obfef4s da da ãoc^MnÚA , <^c\ viftas as fuas approvâijoens. Lisboa Occidental 31. deMgyode 1736. O Marque:^ de Falenca. O Conde da Ericeira, TSLuno daSjhaTelles» Stá conforme cono o feu original. Lisboa Occidental na Cala de S. Rocjiie aos 5. de Junho de 1736. Lourenço Ferreira, Vlfto eftar conforme com o feu original pode correr. Lisboa Occidental 5. de Junho de 1736. Fr, 3^ de Lancajlro, Teixeira, Silva, Cahedo: Soarei. Jhreu, P :o'^f Ode Correr. Lisboa Occidental 10. dê Junho de 1736. Gouyea, Uepoffa correr, e taixaõ em 480. reis, Lisboa Occidental 14. de Junho de ^ereiray Teixeira,- tó^l^ ^ 'ã® ^k' '^? '^ 'âí' í^ '^ -^ "^-^^ --jg' *ticf ^- - • ^-J'^- " ' ■)\t^ -.!«v *to ojí. ij.;j'i^ ^'- là^; tStó 'i i -■ CájiíSjYfti. IN D A_S V OZ E S , ÇXU E S E contem nefte livro. "^ 7" Oz Hiftorica. \^ Vo^ Pafitica. Voz. Defenganadb. Pag. 3. 95' 117. Vqz DoiitririnaL 143. Voz Agradecida. nàp. Voz Generofa.. 181. Voz Pareaetica ^ otiÉxIkírtato- ria. J^p. VozMetrica'. 20J. VozZelofa. 3 217. Voz Elevadiífima. 235- Icha da Va^ ElevaéiíHmaí ^5> Sufpfros Eticomiaíticos; 2'4^-j& feq^ voz ESTJ vo^ fe admira afuavi^ dade , e doçura de cjlilo , a pu- reza da linguagem , o ajujlado das palavras , o fluido f cm precipitação : hum f aliar cajllgado , e fempre innocente^ tad claro , que parece fácil , mas tao dif- ficultofo , como he tudo , o queje eleva ao perfeito j e como nao continuou ejla vo^ Por mais dilatada narração , no ponto, em que acabou , deo principio as faudadcs de (imefma , que nunca hao de acabar^ RELA- I r ;'.'UM#iIã(S 1'/ v'^»^»^^ í-í i^^ãW.il . RELAÇÃO DA MISSÃO DA SERRA DE ÍBIAPABA, FSCRITA PeloP. ANTÓNIO VIEIRA, E TIRADA DO SEU MESMO ORIGINAL. Primeiros Mlffionanos da Companhia de fefusy que do^Brafil pagarão por terra ' ao Aãarankaoif eus trabalhos. Mor- re na empreita o F. Tadre Fran- cipo Tinto , e outros. Elos annos de i6oç. fendo já paci« ficadas as guerras , que em Pernam- buco foraó mui porfiadas da parte í dos naturaes pelas violências de certo Capitão Portuguez^ Te tornarão a por em armas todos os índios a vaíl aliados, que havia A ij def- ^■K 4 VOZ HISTÓRICA. defcle o rio Grande até o Ceará; onde ainda naò tínhamos a fortaleza , que hoje defende aqiieile íítkx E como em todo o Brafil tinha ^^^ft^^^^ ^experiência o particular caienro ,e graí^a, que Deos deo aos Religiofos da Com- panhia de jeÍLts para compor os ânimos defía gente , a peti(^aó do Governador do tftado , que entaõera Diogo Botelho^ foy nomeado para efta empreza o Padre FranciYco Finto, varaó de grandes virtudes , e mui exercitado, e eloquente na lingua da terra , e por feu com- panheiro o Padre Luiz Figueira. Era o Padre Francifco Pinto muito aceito aos índios pela fuavidade do feu trato , e pelo modo , e induP tria ^ com ciue os fabia contentar 5 e fobre tu- do o fazia famoío entre ellei hum novo mi- lagre; com que poucos dias antes indo o Pa- dre a huma mjífaó, acompanhado de muitos, e morrendo todos á fede em huns defcrtos , fendo as mayores calmas do Eftio , com huma breve oração, que o Padre fez aoCeo,- pon^ dofe de jJoelhos, no meímo ponto choveo com tanta abundância, que alagados os lugares mais baixos daquellas campinas, que eraõ mui- to dilatadas, houve em todas eílas por muitos dias de caminho agiia para todos : com eftas àíliften- voz HISTÓRICA. ^ 5 âfliftencias taó manifeftas do Ceo foraó rece- bidos os Padres, como Embaixadores de Deos, é naó do Governador do Brafil , e fem haver entre todos aquelles índios , pofto que âggra- vados nas vidas , nas honras , e nas liberdades, quera puzeílb duvida a tudo, o que o Padre lhes praticou , puzeraó logo em fuás maòs as armas , e nas delRey , e de feus Governadores a obediência , a que dalli por diante nunca fal- tarão. Concluida taó felizmente efta primei- ra parte da fua miíTaó, traziao os Padres por ordem , que intentaíTem os certoens do Mara- nhão , que naquelle tempo eftava occupado pelos Francezes , apalpando a difpoíicaó dos índios feus confederados , e vendo fe os podiaó inclinar á pureza da fé Catholica , que entre os Francezes eftava mui viciada de heregias , e á obediência , e vaflallagem dos Reys de Por- tugal, a quem pertenciaó aquellas conquiftas. Aífim o fizeraõ logo os Padres , fendo elles os primeiros Pregadores da fé , e ainda os pri- meiros Portuguezes , que do Brafil paffaraõ ás terras do Maranhão. E marchando por terra com grandes trabalhos , e difficuldades , por irem abrindo o meímo caminho , que fe ha- via de andar,chegara6 em fim ás ferras de Ibia- A iij . pába. VGZ HISTÓRICA. pába.onde vi viaó, como acaPcelladas, três gran- des povoacoens de índios Tobajarás debaixo do principal Taguaibuniiçi , que cjuer dizer Demónio grande ; e verdadeiramente fe expe- rimentou depois fempre nefta miíTaõ , que re- lidia , ou prefidia naquelle íitio naó fó algum demónio , fenaõ grande demónio , pela gran- de força , grande aftucia /grande contumácia, com que íempre trabalhou , e ainda hoje tra- balha por impedir os frutos^ e progreílos delia : levantarão os Padres Igreja na mayor povoação da ferra fem contradicçaó dos natu- raes y antes com grandes demonftraçoens de contentamento, e em quanto infiftiaó quoti* dianamente na inftrucçaó dos adultos , e decla- ração dos myfterios da noíTa fanta fé com grande fervor dos Meftres , e dos ouvintes, co- nhecendo huns , e outros de quanta importân- cia feria para a coníervaçaó , e augmento defta nova conquifta de Chrifto ter pacificadas , e quietas as naçoens barbaras de Tapuyas , que cercavaó , e mfeftavaó os orredores da ferra , tratarão os Padres no meímo tempo de trazer a h com dadivas todas eílas naçoens feras , e fizeraó pazes enrre elles , e os Tobajarás, fen- do os mefmos Padres os medianeiros, efican- do voz HISTÓRICA. 7 do como por fiadores oe ambas as partes. Mas debaixo defte nome de paz , tracando-o affim o demónio , íem mais occaíiaó , que a fereza natural deftes brutos ,, entrarão hum dia de re- pente pela Aldeya , e pela igreja os chamados Tocarijus; eeftando oPadre Francílco Pmto ao pé do Altar para dizer MiíTa , fem lhe po- derem valer os poucos índios Chriílaos , que o âffiftiao , com trechâs , e partazanas , que ula- vao de paos mui agudos , e pezados , lhe de- raó três feridas mortaes pelos peitos , e pela ca- beça , e no mefrno Altar , onde eftava para or- ferecer a Deos o facrificio do corpo , e fangue de feu Filho , oftereceo , e confagrou o de feu próprio corpo , e fangue , começando aqueila acçaó Sacerdote , e confummando-a facrificio. .. Com a morte , ou marcyrio do Padre Fran- cifco Pinto , cuja fepultura Deos fez gloriofa com\o teftimunho de muitos milagres , que fe deixaó para mais larga hiftoria , o Padre Luiz Figueira , ficando fó , e fem lingua , por- que ainda a nao tinha eftudado , fe retirou por ordem dos fuperiores para o Brafil , taó fenti- do porém de naó ter acompanhado na mor- te, como na vida , ao Padre, a quem fora dado por companheiro, e com tanta inveja da^uella \ Aiv glQ-! . k A)l 8 VOZ HISTÓRICA. glonola forte, cjiie logo fez voto de voltar, quando íhe foíTe poíli vel , a levar por diante a meífíia empreza , e bufcar nella o mefmo ge- ;iero de morte , que Deos entaó lhe ne^rara , ao queelle dizia, por indigno. Mas ambos eftes dei ejos ciimprio Deos depois a efte grande ze- iâdor de feu fervi(jo 5 porque no anno de 1 62 2. lendo ja de mayor idade o Padre Luiz figuei- ra , e tendo occupado çom muita fatisfacaó os niayorçs lugares da Província, veyo outra vez a miílao do Maranhão , onde trabalhou por ef- paço dequatorze annos com grande proveito das almas dos Portuguezes , e dos índios ; e le- vando-o o mefmo zelo a Portugal a bufcar hum grande foccorro de companheiros, que o ajudaífem a trabalhar nefta grande feara, partindo de Lisboa, e chegando á barra do Grão Pará no anno de 1645. com onze de quinze Religiofos , que trazia comfigo, foy cahir nas mãos dos Tapuyas Aroas da boca do no das Amazonas , onde elle , e os mais forao primeiro mortos com grande crueldade , e de- pois aíTados, e comidos daquelles bárbaros. §JL voz HISTÓRICA, 9 Vingao os Tobajards d morte dofeu T^âj^, tor.Entraoos Holandeses em Ternamhu- CO : reduzem afeu partido os índios y que com ejla comunicação je corrom- pem mais nos j eus CO (lumes. Sua barbaridade. ESte foy o glorioío, e Apoftolico fim, que tiveraó os dous primeiros Miffionario^ do Maranhão , e da ferra de Ibiapába , e os que puzeraô as primeiras plantas nefta nova vinha. Dos frutos, que nella deixarão os Pa- dres , parte em flor , parte em agraflo, nao fe logroamais > que o nome dé Chriftaós , com que alguns ficarão , e outros depois receberão^ continuando em tudo ornais, como gentios. Tiveraô porém lembrança dç vingar a morte defeu Paftor, na qual fe moftraraó raó caval- leiros , que fazendo guerra em toda a parte aos Tocarijus , apenas deixarão defta naçaó quem lhe confervafle o nome , ^e a memoria, affim yiveraô os Tobajarás da ferra gentios fobre ca- teeu-» li'.. i-iô3'- tp VOZ HISTÓRICA. tecumenos até o anno de 16:^0, em que os Holandezes occuparaó Pernambuco, e pou- CO depois fe fízeraó fenhores da fortaleza do Ceará , e reduzirão a fi todos os índios daquel- Ia vizinhança. O trato, que os da ferra tiveraó com os Holandezes^, naó foy iempre o-mtf- mo j porque até o anno de 1642. foraó feus confederados; e aeíle titulo os acompanha- rão na guerra do Miaranhao , pelejando nella contra os Portuguezes , e contra osTabojarás, que lá havia de íua própria nação ; mas volta- rão deftá guerra taõ pouco fatisfeito do valor , ç fortuna; dós Holandezes , que fe refolvéraó a vingar nelles as vidas , dosiq^e naqíiella em- preza tinhaó perdido, e o fizeraó com tanto fucceflTo, e refoluçaó,, que na fortaleza, que íinhaQ feito no Camucí por engano , e na do Geará áefcala vifta paflaraó todos áfrecha , í é fícfpada. .^ Pode com tudo tanto a induftria , e manha dos Holandezes , que com a diííimulaçaõ , e liberalidade tornarão depois a reconciliar os ânimos defta gente , enaófó a fizeraó amiga, mas a renderão , e fujeitaraó de maneira , que quafi fe deixarão prefidiar delles em fuás Al- deyas , naó havendo nenhuma, em que naó ef- . tivef- voz histórica: ir tiveíTem , como de fencinella alguns Holan- dezes. Com a comrnunica^aò , e exemplo, e doutrina deftes hereges naó fe pôde crer^ a miferia , acjue chegarão os pobres Tobajaras, porque de antes , ainda que naò havia nelles a verdadeira fé , tinhaó com tudo o conhecia mento, e eftima delia, a qual agora naó fó perderão , mas em feu lugar foraó bebendo com aheregia hum grande deíprezo, eabor- recimento das verdades , e ritos Cacholicos, e louvando , e abra<^ando em tudo a largue-, za da vida dosHolandezes, tao femelhante â fua , que nem o herege íe diftinguia do gentio, nem o gentio do herege. Os males, que fahin- do defta fua Rochella fizeraó em todo efte tempo osTobajarás da ferra, naó fe podem dizer, nem faber todos , queellesos fepulta-^ vaó dentro em fi mefraos. He toda tfta cofta chea de muitos baixos, que com o vento^i e correntes das aguas fe mudaó frequentementej e foraó muitos os navios de difFerentes na(joês, que aqui fizeraó naufrágio , os quaes eraó def- pojos da cubiíja, da crueldade , e da gulla dos Tobajarás , porque tudo, o que efcapava do mar, vinha cahir em fuás maós , roubando aos miferaveis naufragantes as fazendas , tirando>« lhes ^w ^■t::^: 12 VOZ HISTÓRICA. lhes as vidas, e comendolhes os corpos. E de- pois que a experiência eníinou aos mareantes a fe livrarem dos perigos da cofta , inventou nella a voracidade , e cubica defta gente ou- tro género de baixos , emais cegos, em que muitos faziaó o mefmo naufrágio. Hiaõ os mais ladinos delles aos navios , que paíTavaó de largo, promettiao grandes theíouros de âm- bar pelo refgate das mercadorias , que leva- vaó , e quando íahiao com ellas em terra os compradores, fuccedialhe o que neftes últi- mos annos aconteceo ahuma nao da Compa- nhia da Bolfa, de que era Capitão Francifco da Cunha , o qual debaixo deftas promeíTas de âmbar mandou á terra trinta Toldados, e ia- hindo da praya ao rolo do mar outros trinta índios forçofos para os tirarem ás coftas, affim atados comfigo os meterão pelo mato dentro , e os mataraór, ecoíinharaõ com grande fefta, eos comerão a todos , nao vendo os que fica- rão na nao , mais que o fumo dos companhei- ros, que naô cheirava ao âmbar, porque ef- peravao. Eftaera ávida barbara dosTobaja- rás de Ibiapába , eftas as feras , que fe creavaó, ^ efcondiao naqu ellas ferras , as quaes foraõ jâinda mais feras , depois que fe vieraó a ajun- tar voz HISTÓRICA. 13 tar com ellas outras eftranhas , e de mais refi- nado veneno, o^ue foraoos fugiciyosde Per- nambuco. §. IIL T) anos y que recebe Pernambuco ^ efua di- latada campanha da confederação dos In-' • díos com os Holandeses. EJirago ef pi- ri tu ai dos Índios da J erra de Ibiapá- ba com a companhia dos que para lá fe retirarão. 7^ Ntrep^ou Deos Pernambuco aos Holan- dezespor aquelles peccados , que paíTaó os Reynos de humas na(^oens a outras , que faó asinjuftiças. E como grande parte das injufti- ^as doBrafil cahiraódefde feu principio fobre os índios naturaes da terra, ordenou a juflic^a divina, qtie dosmefmos índios juntos com os Holandezes íe formaffe o açoute daquella tao fiorente Republica. Rebellaraófe muitos dos índios , e Chriftaós , e yaffallos , ( pofto que outros obrarão finezas de fidelidade) e unindo íuas armas com as do inimigo vencedor , nao fe r f., 14, VOZ HISTÓRICA. fe pode crer o eftrago , que fizeraõ nos Portu- guezes, em íiias mulheres , e filhos , exercitan- do em todo o fexo , e idade deshumanidades feiffimas, fendo os índios , como inimigos do- meílicos , os guias , que franquearão a campa- nha aos Holandezes , e os executores das cruel- dades , que elles politica, e hereticamente lhes commettiao, deículpando coin a barbaridade dos Brafilianos o que verdadeiramente naó fóeraó confentimentos, fenaó mandados, e refoluçoens fuás , para aííim quebrantarem a honra, e conftancia dos Portuguezes , que de outra forte nunca podèraò render. Vinte an- nos teve Deos fobre as coftas dos Pernambuca- nos efte rigorofo açoute , porque nos primei- ros quatro da guerra eftiveraõ todos os índios pelos Portuguezes , até que no anno de 654. fe deo por fatisfeita a divina juftiça com amila- grofa reftituiçaõ de todas aquellas fortiflimas praças á obediência do feliciflimo Rey Dom Joaó IV. Entrarão os índios rebeldes nas capi- tulaçoens da entrega cora perdão geral de to- das as culpas paffadas ; mas clles como igno- rantes de quaô fagrada he a fé publica , temen- do que os Portuguezes ^ como taõ efcandaliza- dos, applicariaó as armas viótoriofas á vingan- voz HISTQRIG^. tS ça^jque taô merecida tinhacó, e obrigados-de cerco rumor falfo, de que os brancos hiaõ le* vando tudo á efpada , lan^araõíe cega , e arre- baradamente aos bcíques com fuás mulheres , e fifhos y onde muitos perecerão á mâó dos Ta- puvas , e os demais íc encaminharão ás ferras de Ibiapába , como refugio conhecido , e va- lhacouto feguro dos malfeitores. Goma che- gada deftes novos hoípedes ficou Ibiapába Ver- dadeiramente a Genebra de todos os certoens doBrafil , porque muitos dos índios Pernam- bucanos foraó nafcidos , e creados entre os Ho^ lândezes fem outro exemplo , nem conheci- mento da verdadeira Religião. Os outros mU litavao debaixo de fuás bandeiras com a difcis plina de feus regimentos , que pela mayor par- te fâ6 formados da gente mais perdida , eçòr* rupta de todas as naçoens da Europa. No Re- cife de Pernambuco , que era a corte , e em- pório de toda aquella nova Holanda, havia Ju- deos de Amfterdaó, Proteftantes de Inglaterra, Calviniftas de França , Lutheranos de AJema* ilha , € Suécia , e todas as outras feitas do Nor- te , e defta Babel de erros particulares íe com- punha hum atheifmo geral , e declarado , em que naô fe conhecia outro Deos , mais que o in- i6 VOZ eiSTQRICA. intereíTe , nem outra ley ,,mais que o appeticcj e ò que tinhaò aprendido neftá eícola do infer* flo , he o que os fugitivos de Pernambuco trour xeraõ , e vieraô eníinar á fera , onde por muícoi delles íaberem ler ,e trazerem comfi* goalguns livros, Foraõ recebidos ^ e venera- dos dos Tobajarás , como homens letrados , e íabios , ecriaõ delles /co|Tlp: de oraçulp, q^iari-' CO liies queriâõ m^eterfem cabeça. 4 ? -;: '■ cn'\: DeiJa m»aneira dentro em poucos çlias fo- raó huns , e outros femelhantes na crença , é nos coPcumes ; e no tempo , em que Ibiapába deixava ide íer republica de Baccho , ( quêerá poucas horas , por feren; as borracheiras conti- nuas de noite , é de dia ) eraó verdadeiramen- te aquellas Aldeyas huma com pofi<^a6 infer- na! , ou nniftura abominável de tpdas as feitas, e de todos os vícios, formada de rebeldes, trai- dores, ladroens, homicidas, adúlteros, Judeos, hereges, gentios, Acheos, etudo ifto debaixo do noiiiede Chriíiap^, e das obrigaçoens de GaçhplÍQOS. DDÍ.KÍD: 'i mm' §.IV. voz HISTÓRICA tj §. IV. Chega jfigunda ve^ oT. Jntonio Vieira ao âdarmhaOy e o (governador André Vi- dal de Negreiros intenta huma fortaleza na boca dorioCamucí^empre:^a^que depen- dia. da vontade dos habitadores dajer^ ra. Efcrevelhe o T. Jntonio Vieira. ^^Suceejfo darepofiada çttmacay que coi)í mater iae s y ejoldados partio a levantar afor- ->g ^.tóu..:i;!^ -tale^a. - E"^'Ste era o miferavel eftado da Chriffandá- ^deda ferra,quando no annode i655.che- \ goii íegunda vez ao Maranhão o Padre António Vieira.com ordens de Sua Mageftade, para que a doutrina , e governo efpíritual de todos os índios eftiveíTeá conta dos Rcligio- fos da Companhia 5 e pofto que o eftado referi- do daquelles Chriftaós , de que já entaô havia noticias por fama^ promettia mais ofaftinaçaõ, que remédio; confiderando porem os Padres, B que ''''M\ IS Arõ2í HISTORÍCI. cjue a fua primeira obrigação era acudir á re- formação dos índios já bautizados , e que eíles da ferra tinhaófido os primogénitos defta mií- faõ , è de quaò perniciofo exemplo feria pá- ra os que fe houveffem de converter > e para os já convertidos a vida efcandalofa , em que eílavaó, e muito mais a immuriidade delia,. Era ponto efte , que dava grande cuidado a to- da amiíTao, e que muito feencommcndava a Deos, efperando todos, que chegariaó ao CJco as vozes dofangue do feu Abel p Padre Francifco Pinto , e que aman fadas aquellas fe- ras , que já eftavaõ marcadas com o cara(5ler do bautifmo , tornariaó outra vez ao rebanho, de que eraó ovelhas. Ajudou muito efta efpc- rança hum novo intento do Governador An- dré Vidal de Negreiros, o qual chegou nó mefmoanno ao Maranhão, refoluto a levan- tar huraa fortaleza na boca do rio Ca-mucí,que hc defronte das ferras , para fegurança do com^ mercio dopao Violete, que fe corta nas fral- das delias, e do refgate do âmbar, que a tem- pos fahe em grande quantidade naquellas prayas. Efta he a fuavidade da providencia divina tamas vezes experimentada nas mif-* foens de ambas as índias, onde fempre entrou^ vez HISTÓRICA- jg c fe dilatou a fé levada fobrc as azas do inie- reíTe. Gommunicados os peníamenros do Go- vernador, e Superior das miííoens, julgarão ambos , que primeiro fe efcreveíre aos índios \3a ferra , decjuem naò fó dependia o commer- cio, mas ainda a fabrica, efuflento da forta- leza. Mas difficulcava, ou impoffibilitava de todo a embaixada adifficuldade do caminho de mais de cem legoas , atalhado de muitos , e grandes rios , e imeílado de di verfas na^oens deTapuyas, feros, e indómitos , que a nin- guém perdoâó 5 e confirmado tudo com a ex- periência da mefma viagem , intentada outra vez coníi grande poder de gente de arraas ,, e náó coníeguida. Com tudo houve hum índio da mefma naçaó Tobajará , chamado Francif* CO Murereíba , o qual coafííado em Deos , co- mo elledí(re> fcatreveo, eoffereceo a levar as cartas. Ó teor delias foy oíFerecer o Gover* Dador em nome delRey a todos os índios , que fe achavaó na ferra , perdão , eefquecimento geral de todos os delidos paíTados, e darlhes a nova de ferem chegados ao Maranhão os Pa- dres da Companhia , feus primeiros pays , e Meflres, para fuadefenfa, e doutrina. E o mef- mò efcreveo ©Padre fuperior das miffoens , *V : f B ij dan- ^ •/««- '— ^o voz HISTÓRICA. dando a fi , ea todos os Padres por fiadores de tudo, o que o Governador promercia ; e refe- rindofehLimaSje outras cartas ao menfageiro, que era homem fiel , e de entendimento, e hia bem inftruido, e aíFedo ao que havia de di- zer. Pârtio Francifco com as cartas em May o de 1655. e como foííem paffados nove mezes fem nova; delle , defefperado de todo efte pri- meiro intento, no Fevereiro do annoíeguinte, que fao as moníjoens, em que de alguma ma- neira fe navega para barlavento , defpachou o Governador humaçumaca com hum Capitão, e quarenta Toldados ,eos:ma,teriaes , e inftruj mentos ncífeíTarros à faferica da fortaleza do Camucí , e nâmefmaçumaca hia embarcado oP. Thomé Ribeiro com hum companheiro, para faltarem em terranomefmofítio^ié pra- ticarem aos índios, e darem principio áquelk miílaõ. Animou também muito a refoluçaò do Governador, e intentos dos Padres a paz , que por meyjo delfcs vier^o Lufcar ao.Mara- nhaõ os Teremembés , que faò aquelles gen-?. tios , que frequeríceniente fe nomeaó no rotei- ro deíla cofta com o nome de Alarves , cuja relação nós agora deixamos por irfegpindo a çumaca , e naó embaraçar o fio defta hiftoria. §,V. Ét^Ú^i^ VDZ HlSTORIiCâJ «I 'Ti '■"> §. V. f ; ■ j.slJ .(iíT 'íló ) ■' MavegaçaÕ defde . O Alaran^^^ Ceara MfficultoJtJ/ima: Arriba à çufnaca.^T^árte o 'T^ António Vieira , e intenta a def^eitó dos mar es ir a ^ahia a bujcar. Ailfjuma' -fios. Tj)emoraSy que tem^ ecomo encon^' tra os índios com a reponta da jua carta y e. 'vpltaQ ta^^^^ íw::: kí^ií^}^^, . Maranha^ tTWiUmá das maiidiíEeultofas , etrabalhcv- f» ifasnavègaçoens derè^o .o mar.Oceano < iií >:> iiey a que íe faz do Matanhaõ áte o Gea:* rá por Gofta , naÔ fó pelos nciuicos , e cegos ba- xíos, de que coda eftá cortada, mas muito mais pela pertinácia dos ventos , e per petiia corre n-* teta das aguas. Vem eíía correnteza feita def-^ de o cabo da Boa Efperançacom todo o pezo das apuas doOceano na traveíTa , onde elie he maisdargo, que he entre as duas coftas de Afri? ca:;, eíAsn eriça, e começando a deícabeçardeft de. cabo de Santo Agoftinho até o cabo do ' Biij Nor- 1 li'] m lâ mX? HISTÓRICA/ Korte, he notável a força , que em todo aqtiel- ]e cotovelio da cofta faz o ímpeto da corrente, levando após fí naò fó tanta parte da mefma terra, que tem comido , mas ainda aos prdt prios Geos , e os ventos , que em companhi^ das aguas , e como arrebatados delias, ^correm perpetuamente de Lefle a Oefte. Com efta còntràriedadecontínua das aguas, e dos ventos> que ordinariamente faó brizas desfeitas , fica toda a coftá defte Eftado quafí innavegavel pa- ra barlavento j de forte , que do Pará para o Maranhão de lienham modo fe pode navegar por fora, e do Maranhão para o Ceará com grandiflima difficulda^e , e fó em certos me- zes do anno , qiie faõ os de mayor inverng; e:L- Naviegaíe v Partio nefta mefma moríçaô em hutna em- barcação Latina o Padre Manoel Nunes para d Ceará , e o Padre António Vieira para a Bahia: hiâ hum a cultivar os índios daquelle deftri- óto, outro para trazer fujeitos , que podeffem acudir aos demais j e pofto que vencerão mais legoas da cofta pela melhoria das velas , e per- feveraraó mais tempo na mefma porfia , tei^ mando contra o mar, até fe verem quafi comi^ dos delle, em fim defenganados houverao tá«ibem de arribar 5 mas na hora , em que fe acabava de tomar efte acordo para fe leva- fem asajacoras, eifque vem huma embarca- \Miun B iv ^^õ í^ )l ?4 voz HISTORIGA: 06 vpequena á vela , ercorrendo a cofta , e gente veftida decores, marchando pelapraya. Ao principio cuidaraQ , ; qbe eraó eftrangeiros ^ícapados de,algp0T:OTufiagÍQ , ;.mas ciSganT do m^s|ye0a,í?írtóonlieeerâfecjue era «a J&i^ Francifco , que acompanhado de joutròs da ferra vinhaóntrazei^ airepoíla das cartas, com que havia quafi hum .aiino tlsha partido do Maranhão. Recebidos «som rafbfta, eafer©- ço , que merecia talencontro ) e taó ipouco efi perado , e dandojá por bem empregado o tr^- bâlho da dilação, deo Francifco por caufadl lua pardança o haver encontrado pelo cami- nho grande variedade de naí^oens de Tapuyas, que o detinhaõ, e traziaó comfigo muitos dias. Eperguntâdo, como efcaparadelles com vi- da, fendo gente, que a ninguein perdoa j ref- pondeo , que lhe infpirara Deos, quando fe vio nas maós dos primeiros , ofFereccrlhe vo- luntariamente tudo , a q«e levava comíigo , e fobre li ,efperando, que como naó tiveíTem que roubar ,na6 o quereríaó matar inutilmen- te, e que affim ofaziaòj antes ao derpedirfe lhe davaõ fempre algumas couías das íuas em agradecimento das que tinhaô recebido ; e que proíeguindo na mefma forma dando a huns, voz HISTÓRICA. 25 tons ,0 que recebia dos outros , le livrara das fnaos de todos, traó dez índios os da ferra^que acompanhavaó a Francifco,dos quaes o q vinha por mayoral , apreíentou aos Padres as cartas, que traria de todos os principaes , metidas, co- mo coftumaõ , em huns caba<^os tapados com cera , para que nos rios , que paíTaò a nado , fe naómolhaflem. Admiraraõfe os Padres de ver as cartas efcritas em papel de A^eneza , e fecha- das com lacre da índia ; mas até deftas miude- zas eílavaó aquelles índios providos tanto pe* la terra dentro pela communicacjaõ dos Ho- lándezes , de quem também tinhaò recebido as, roupas de grâ, e de feda, de que alguns vi- nhaó veftidos. Deíla maneira íabem os politi- cos de Holanda comprar as vontades, e íujei- caõ deíla gente , e paíTallos da hòíTa obedicn- cia á fua ; o que nós poderamos impedir pelos mefmos fios com muito menos cufto, mas fempre as noffas razoens de eftado foraó ven- cidas da noíla cubica , e por naò darmos pou- co por vontade , vimos a perder tudo por for- ^3'. A letra, e eftilo das cartas era dos índios fPernambucanos, antigos difcipulos dos Padres, € i a íuftançia delias era daremfe os parabéns de nóíTa vinda , e íignificarem o grande alvo- c ^p roço. i R'ii"l 'li 2í VOZ histórica: roço , e defejo , com que ficavaõ efperandé para viverem como Chriftaós , naó fe efque- ccndo de lembrar aos Padres , como elles ti- nhaó fido os primeiros filhos feus , e quaó vh- Vâ eílava ainda em feus coraçoens a memoria, efaudades do feu fanto pay o Paí-Pina, que affim chamavaó ao Padre Francilbo Pinto. §. VI. Tartem ámifiao da ferra de Ibiapdha o ^ . Jntomo %ibeiro^ e o T. Tedro deTedro- " í^a. T)ifficHldadeSyperigos^e trabalhos j - quepajfao ejles JpofioHcos Mifjto- narlos. Favores do Ceo, que ex^ perimentaÕ antes de chegar a Ibiapdha. CHegada ao Maranhão eíla repofta taó conforme ao que fis defejava , fe refol- veo logo , que a viagem fe fizeíTe por terra , e foraó nomeados pára efta miíTaô o Padre António Ribeiro , pratico , e eloquente tia lingua da terra, é o Padre Pedro de Pedroza, que voz HISTÓRICA. 27 que pouco antes tinha chegado de Portugal. Até o rio das Preguiças levarão os Padres huma boa efcolta de í oldados PortuguezeSjCom que paliarão vinte e cinco legoas de perpétuos, areacs, chamados vulgarmente osLanc^oes, por íer efte paffo mui infeftado dos Tapuyas. Def* pedida a efco!ta,ledercobrio logo quanto o ini- migodafalvaçaó das almas tratava de eftorvar efta viagem , como fe experimentou mais no difcurlo delia. Como em todo efte caminho naó ha povoa^jao , nem eftalagem , he hum dós grandes trabalhos, e diffículdades delle ha- ver de levar o mantimento ás coftas , que vem a íer a farinha , que chamaó de guerra , que he o biíeouto deftas terras , o qual ao uío delias fe leva em huns como íacos de vimes tecidos , ou embaftidos de folhas. Succedeo pois , que os que levavaõ eftes facos ás coftas , affim por íe aliviarem dòpezo, como por fcr gente ;> que €ome fem nenhuma regra , em treze dias , que tinhadurado a viagem , os ttnhaó defentranha- do de maneira, que quando os Padres foraó a dar balanço á farinha, naõ acharão mais, que o vulto da folhagem , e que toda a tropa , que conftava de feíTenta bocas , efta va totalmente fem mantimento. Todos vocavaó, que voltaf* fem 2B voz historiga: fem outra vez para o Maranhão , pois na5 ti- nhaó deqne íe fuftencar , e lhe reftavaó por andar as três partes do caminho, eeílas do ma-, yor trabalho , e detença. Mas os Padres refol- veraò, cjLie ocjue fehavia de padecer tornan- do acraz , fe padeceíTe profeguindo adiante, e animando aos índios, fefezafljra, e fe íuf- tentaraõ todos fomente de carangueijos com algum pouco peixe , que lhes deraó os Tere- membés em dous dos íeus magotes , que en- contrarão. Governava hum d eftes magotes Tatuguaçú; hum dosquaes tinha ido ao Ma* ranhaò , e que era o interprete dos demais , ao qual , como logo entaó fe colheo de íuas pala- vras , nunca lhe pareceo bem , que as , fuás prayas foflem francas aos Portuguezes , e deva- çadas de paíTageiros ; e como efta era a pri- meira viagem, tratou de cortarnella o fio , e os intentos a todas ; as dem ais , dando de noite hum bom aíTalto nos noOÍ os. A efte fim con- vidou huma boa parte dos índios a certa pef- caria, que fe havia de fazer de noite em hum pofto diftante, e aos Toldados Portuguezes, que eraó, oito, cambem os procurou retirar, to- mando para iflo huma traça , que bem fe via ferinfpirada pelo demónio j e foy prometter- ' lhes m voz HISTÓRICA. T9 lhes, que lhes mandaria algumas de fuás mu- lheres, para os ter longe dos Padres, e diver- tidos, tendo nomefmo tempo efcondido no mato o mayor corpo da fua gente para reben- tar com eila nas horas do mayor defcuido. De tudo ifto eftavaó os Padres bem innocentes , fa- zendo exame da conícienci a , como he coftu- me, para fe recolherem a defcanfar, quando no mefmo exame lhes veyo hum efcrupulo, fem duvida inípirado pelo Anjo da Guarda , começando a duvidar da fé do Teremembé, e inferindo do mefmo bom agazalho , que lhes fizera , a traicaó , que debaixo delle tinha , ou podia ter arm'ado. Com efta fuípeita fem ou- tro indicio, nem averiguação ordenarão, que fe fizefle logo a marcha , que eftava difpofta para fe fazer de madrugada , abalando com todo o fileneio , e marchando toda a noite , e defte modo amanhecerão livres , e vivos , os que tinhaó decretada a morte para aquella noite. Aííim odefcubrio depois aos Padres hu^^ 4iíia velha da mefma nacaó, , a qual tinha ido ao Maranhão na occafiaó das pazes , onde fora mui bem tratada dos noííos ^ e agora em agra- decimentoíveyo efcondidaraehte a trazer lhes aquelle avifo , que ainda foy bom para a cau- tela 3 o VOZ HISTÓRICA. tela, poílo quefenaó acabarão aqui os pe-^ xigos. §. VIL "Kws caudalofos , que fe atraveJJao nefia jornada. "B^fco da canoa y em que hia o T. Jntonio '^Ribeiro. Livrao miiagrofa^ mente. Chegao eHes Mifjionarios ddefejadaferra de Ibiapába. H Um dos perigos, e trabalhos grandes, que tem efte caminho, he a paíTagem de qiiatorze rios mui caudalofos , que o atraveíTaó, e fepaííaó todos por meyo da foz, onde confundem , e encontrão Tuas aguas com as do^ mar j e porque naó ha neftes rios embar- cação para a paíTagem , he força trazella do Maranhão com immenfo trabalho , porque íe vem levando as mãos por entre o rolo, ea reíTaea das ondas, fempre por cofta braviffima, âllagandofea cada pa(ro,e atirando o mar com ella , e com os que a levaó com rifco naó fó dos índios , e da canoa , íenaó da mefma via- gem , que delia totalmente depende. ' ^ Mui- voz HISTÓRICA. 31 Muitas vezes he cambem neceffario arraf- tallâ por grande efpaço de terra, e montes para a bnçar de hum mar a outro , e talvez obrigaò eftas difficuldades a tomar a mefma canoa em pezo ás eoftas com toda a gente , e levalla aflim por muitas legoas ; de modo que para haver embarcação para paPTar os rios, fe ha de levar pelo mar , pela terra , e pelo ar , e bem fe vê quanta feria a moleftia , e afflicçaó dos Padres nefta fua viagem em períuadir , e animar a hum trabalho taó forte a homens, quequaíi vinhaó fem comer , e mal podiaó ar- raftar òs corpos. Na paíTagem do rio Parámi- rim, que he o mais torí^ofo de todos , foytal o Ímpeto da corrente , que arrebatando a ca- noa , a levou rodando mais de três legoas pelo mar alto dentro , dando já todos por perdidos ao Padre António Ribeiro, que nellahia, e fete índios. Chamarão todos nefte aperto pe^ ia Virgem noffa Senhora da Concei(^a5 , in- vocando feu nome a grandes brados , cama fuccede na ultima defcípera<*a5 dos remédios humanos; e por milagre da Senhora, depois de cinco horas de lutar com as ondas , omef- f^iò^niãr os trouxe á terra,naó havendo jâ quent tiVèííe animo , nem bra^jos para poder fuften^ tar ■"hl m voz HISTÓRICA. tar os rernos , nem o governo. Succedeo neftc perigo huma circunftancia de trabalho nunca viíta, nem imaginada; hia o rio em partes profundamente entrando por entre morros de área mui altos, dos cjuaes com o perpetuo re- moinho dos ventos era taó efpeílo o chuvei- ro da área , cjue cahia fobre a canoa , que tra- paihanJo amayor parte dos que nella hiao €m a lançar fora com as maõs , com os remos , comoschapeos, ecom tudo o que podia fer depreílimo, naó baftavaó a alijar , edefcar- regar opezo delia, que por momentos os hia alagando , e levando a pique ; mas de cudo os livrou a protecção daquella divina Senhora , a quem tudo obedece As outras moleftias , e in- commodidades , que padecem nefta viagen) homens creados no retiro da fua cella, faõ muito para agradecer, e louvar a Deos j por- .que o caminho, que he de mais de cento e trinta legoas pelo rodeyo das enfeadas > ofa- z^m os Padres todo a pé , e fem nenhum abri- go para o Sol ,1 que nas áreas be o mais arden- te; porque em todas ellas na5 ha huma fó ar- VOT^^ce até aienha ajdá nao a terra , íemo o matem alguns/paos,,fecos > que.deitaôas ondaíi apraya. A cama era aonde os tomava a noite 'i fb- voz HISTÓRICA. 33 fobre a mefma arêa , e também debaixo delia; porque marchavaó no tempo das mayores ven- tanias , as qtiaes levantaó huma nuvem , ou chuva de arêa taó continua , que em poucas horas de defcuido fe acha hum homem cu^ berto, ou enterrado; até o mefmo vento (cou- fa^ que parece incrivel ) he hum dos mayores trabalhos , e impedimentos defta navegarão por terra , porque he neceíTaria tanta força pa- ra romper por eíle , como fe fora hum homem nadando^ e naõ andando. Em fim , como ef- ta era a primeira viagem , que fe fazia , ou abria depois de tantos annos por eftas pravas, a falta de experiência, como íuccede em to- das as coufas novas , fazia mayores os traba- lhos, e os perigos. Mas vencidos todos com o favor de Deos, que da fraqueza tirava forcjas, 3054. de Julho de 1656. em que íe contarão trinta e cinco de viagem , chegarão os Padres á fua defejada ferra de Ibiapába fem alento, pem cor , nem femelhaníja de vivos , que taes os tinha parado o caminho , e a fome. Quaó accomraodado porém fofle efte lugar , onde chegavaó , para defcanfar , e convalecer de todos eftes trabalhos , fe verá pela breve rela- ção, que agora daremos da terra. C §.VI!I. I K â4 m^Z HISTQRIGA. ^^^'"""$. ^ VIU. T)efçripção dojítio da ferra de Ibiafáha : fua difficétofa^Juhida : fua altura ^ que exceda df nuvens: condição de /eus mo- radores : e chegados a ella os MiJ- fonarios \ quanto obrao. IBiapába , que. na língua dosnatnraes quer dizer Terra talha ;, naó he hama íó ferra , como vulgarmente fe chama , íenaõ mui- tas ferras juntas , que fe levantaó ao certaó das prayas de Camueí, e mais parecidas a ondas de maralrerado , que a montes, íe vaõ fuceeden- da:^^ e como encapeilándo humas após das ou-, trás em deílriólo de mais de quareíita legoas : íao toJas formadas de hum fó rochedo duriffi- mo, eem parces efcalvado,, e medonho, em outras cubercas de verdtíra , e terra lavradia, coma fe a natureza recracaíTe neftes negros pe- nhafcos a condição de feus habitadores , que fendo fempre duras , e como de pedras, ás ve- zes daõ erperanças , efedeixaó cultivar. Daal-^ tura deftas ferras naó fe pode dizer coufa cer- ^ ta ,^*^:.JP'^''^'- ta ,, mais c]i>e faó akííTimas , e que fe fobe , ás que o perrnittem , com mayor trabalho da reí- piracao , que dos rr>e imos pés , e maós , de quei be forcoío uíar em muitas partes. Mas depois" que fechega ao alto delias , pagaó muito bem o trabalho da íubida , moftrando aos olhos hum dos mais formofos painéis , que por ven- turapintou a natureza em outra.parteKdo mun- do , variando de montes , valleg:, rochedos , e^ picos, bofques, e campinas dilatadiíTjmas, e doslonges do mar no extremo dos horizontes,. Sobre tudo olhando, do ako.para. o^fundo das ferras , eftaofe vendo as nuvens debaixo dos pés , que como he coufa taó parecida ao Geo, naõ fó caufaõ faudades , mas já parece, que eftaó promettendo ,o meímo , qáe fe y^m buJi car por eftes defetgs* f ' r, . , ;:j r - : , :: Os dias no povoado da ferra faò breves , porque as primeiras horas cjp Sol cobremíe com as névoas, quefapcontinuaSi.e muita eípeOTas. As ultinrias efcondenifé anticipada^ mente nas íombras da ferra, qu^ para a parte do OccaÇo faó mais viz^inhas , e levantadas. As noites , com íer taó dqntrp;da zona Tórrida , faó frigidiffimas em todp p anno , e nq Inver- no cora tanto rigor , que igualap os grandes Cij frios m 5á VOZ HISTÓRICA: ■friQs do Norte, e íó fe podem paíTar com a . fogueira fempre ao lado. As aguas faó excel- hníQs , mas muito raras , e a eíTa careília attri- buem os naturaes fer toda a íerra muito falta de câ<^a detodo o género; mas bailava para roda eftaeílerilidadefer habitada, ou corri- da ha tantos annos de muitas naçoens deTa- puyas, que fem caía , nem lavoura vivem da ponta da frecha , matando para fe fuftentar , naó fó tudo , o que tem nome de animal , mas racos , cobras , çapos , lagartixas , e de todas as outras immundicias da terra. Quafi na mef- ma miferia vivem igualmente os Tobajarás , pofto que poderão fem muita difficuldade fup- prir a neceffidade dá terra com os foccorrosdo mar , que lhe fica diftante vinte e cinco legoas, e fobre fer mui abundante de todo o género depefcado, eftá ofFerecendo de grâ(ja o fal nas prayas em huma falina natural demais de duas legoas; mas hetaó grande a inércia defta gente, e o ócio, em que excedem a todos os do Brafil , que por milagre fe vê hum peixe na ferra , vivendo de mandioca , milho , e alguns legumes, de que também naó tem abundân- cia ; com que he entre elles perpetua a fome^ é parece que mais fe mantém delia, que do fuf- tento. Naõ )mu voz HISTOiaCÁ^ 3f Naóforaó novas aos Padres as incommocii- dadèsdoficioj de que já tínhaô certas noticias, cómodos coftumes dosnaoradores^ os quaqs acharão em tudo no eftado , em que acima os defcrevemos , pofto que forao recebidos dei- les com grandes demonftraçoens de gofto , e feumanidâde , e com aquella admiração , e ap- plaufo , que fempre achao nefta gente todas as couías novas. A primeira, em que entende-. raó os Padres, foy em levantar Igreja , de qufe elles naô fó forao os Meftres, fenao os officiaes, trabalhando por fuás próprias maós , a flím pe- lo exemplo , como pela neçeíTidade, porque era pouca a diligencia, còm que os nioraqo- res fe appliçavaõ á obra; A do edifício efpiri- tual fe começou juntamente, porque defde o primeiro dia começarão os Padres a enfinaí a doutrina no campo, a que concorriaó prin- cipalmente os pequenos, que muito brevemen- te tomarão de memoria as orajoens , e refpon- diaò cora protrfptidaó a todas as perguntas do Catecifmo. Mas depois, que os Padres lhes enfínaraó a cantar os mefmos myfterios , que compuzeraò em verfos, etons muito accom- modados , viofe bem com quanta razão dizia o Padre Nóbrega , primeiro Miílionario do .Zi, Ciij Bra- bs vozhistoricc Braíil, que com mufica , e harmonia de vozes fe atrevia amzer a fi todos os gentios da Anie- rica. Foraó daqui por diante muito mayores osconcurfos, e doutrinas de todos os dias je mayores também as efperanças , que os Padres conceberão de que por meyo defta mufica do Ceo queria o divino Orfeo das almas encantar cftas feras deftas penhas , para as trazer ao edi- fício da fua Igreja. A primeira pedra, que fe lançou nelle , e o primeiro fruto , que fe come- çou a colher, foy o bautifmo de muitos adul- tos , e de todos os innoccntes , porque nenhum pay houve , que naó trouxedc a bautizar todos os fcus filhos, dos quaes muitos foraô logo cha- mados , ou arrebatados ao Ceo antes dos annos do entendimento, para que a malícia dos mef- mos pays lho naô perverteíTe. Í.IX. .*Cvj|(Ç.i, iw-c^-^V- VOZ HISTÓRICA. 59 §. IX. Impedimento, que foem o demónio d fé, Adeyos, de que ufa. Vef acerto de hum Cafttao Tortugue;^. Terigo da for- tale^a do Ceara. SOffreo mal o demónio , que fe lhe tiraíTem das mãos eftes defpojos tenros , que elle defde o nafcimenco tinha já marcados por feus,e temendo deftes principios, que viria pouco a pouco a fer lanhado daquelle caftello infernal , que he a chave de cantas outras na- çoens , que taó abfolucamente eftava dominan- do , determinou fazerfe forte nelle com todas as fuás for<^as , e aftucias , e com as mefmas fa- zer a efta miíTao a mais cruel , e porfiada guer- ra , que já mais fe tem experimentado até ho- je na conquifta èfpiritual de todas as gentilida- des doBrafil. Tinhaò vindo os Padres a Ibia- pába com ordem naõ de fazerem alli refiden- cia , mas de verem a difpoíiçaó da gente , e do lugar, ecomavifo aos Superiores eíperarera a refolu^aó do que haviaò de feguir. Daqui C iv to- i "'5Ííi1« 40 VOZ HISTÓRICA, tomou occafíaó o demónio , e daqui forjou as iuas primeiras armas , metendo em cabeça a todos os pnncipaes; cjue os Padres naÓ vinhao a tratar da fua ialvaçaó, fenaÓ da fua ruina, e queerao efpiasdiffimulados dos PortuPuezes para avifarem do que paíTava na ferra , e quan-' do eítiveíTem mais defcuidados os entremearem a todos em fuás maós , os mayores paralerera juftiçados pelos delidos paíTados, e os outros para íerem vendidos por efcravos em perpetuo cativeiro. Naófefabe de qual nafceo primei- ro eíie diabólico penfamento , mas como to- dos eílavaô criminoíos , e, deviaÓ tanto á jufti- ça do Ceo , e da cerra , a própria confciencia lhes ^aíToprava efte fogo dentro dos coraçoens, e os de Pernambuco , cm que eraó mayores as culp^as, e mayor o temor , eraó os que mais Griao, e eonfirmavadtudo, naÓ havendo ac- ção, nem movimento, nem palavra^ nem ainda filencio dos Padres , de que naó fizeffem novo argumento, e converteíTem no mefmo veneno Ifto íd fe fallava entre todos , fobre líto fe dl fcorria , e fe bebia , que he o tempo , e o lugar de feus mais vivos difcurfos. Eftas erao as profecias dos feiticeiros , eftes os con- Idhos dos velhos , eftes os temores / e os pran- tos mrirfmariTTTiTiíi •^w r- i VOZ HISTÓRICA. 4t tos das mulheres , olhando todos dalli por di- ante para os Padres, naó conno pays , e defen- foresfeus, mas como efpias inimigos , e trai- dores de fua pátria , de fuás vidas , e de íuas li- berdades, ecomo taes íeretiravaó, e retira- vao a todos da caía , e converfa(^a5 dos Padres^ fugindo até da Igreja, da doutrina , das préga- coens , e ainda da mefma MiíTa , que era o que o demónio pertendia. Succedeo por efte tempo fazer viagem o Governador André Vi- dal do Maranhão para Pernambuco por terra com avifo, que lhe fizeraó os Padres, que ef- tava fèguro o caminho ; e como o Governador traria grande efcolta de toldados, e índios , tiveraó por certo os de Ibiapába , que aquél- leapparato fe encaminhava a conquiftallos , e diffimuladamente chamarão todos os Tà- puyas dá fua confidencia y e òs tiveraó era cila- da em quanto ©Governador paffbu pelas íuas praya$ 5 e depois que efteve em lugar , que já naó podia voltar atraz , tornarão à desfazer efc ta prevenção com tanta diffimulaçaõ , e íecre- to, que naó chegou a noticia dos Padres, fe- naó dahi a annos. Quafi começarão a fe aquie- tar com efte defengano os temores dos da fer- ra^ e a verdade dos Portuguezes também eo- 4a VOZ HISTÓRICA. meçou a triunfar das falias , e indignas furpei- tas^, que delles dnhaó; mas o denaonio, c]ue naó aquietava , levantou em outra parte hum novo incêndio para tornar a cegar com o fu- jno delle, aos que já parece queriaõ abrir os olhos. Nos orredores da fortaleza do Ceará , diftante de Ibiapába feíTenta legoas , vivem duas naçoens de Tapuyas gentios , confedera- das ambas com os Portuguezes , mas inimigas entre íi j huns fe chamaó Ganacés , outros Ju- guaruanas. Eftavaó eftes occupados no mato em cortar madeira do preciofo pao Violete para o Capitão da fortaleza, quando os Gana- cés, levando com figo alguns índios Chriftaós de duas Aldeãs avaítalladas , que alli temos, deraõ de repente fobre elles , e tomandolhes as mulheres , e filhos, fe vinhaó retirando com a preza. Fizeraó ayiío os Juguaruanas ao Capi-r taõ da fortaleza , em cujo fervido eftavaó , o qual lhes mandou defoccorro vinte e quatro^ Toldados Portuguezes com ordem , que os aju- dâíTem , epelejaíTem contra feus inimigos, po- dendo níais nefte cafo , como fempre pode , a; razaó da cubica, que a do eftado , a qual di* (ftava , que fe guardaíTe neutralidade com am-» bas as naçoens , pois ambas eraõ noffas aliadas. Che- Á M voz HISTÓRICA. 43 Chegarão os Toldados aos Ganacés , que fe ti- nhaó feito fortes em huma reboleira do bof- qiie, e deíordenando mais a defordenada or- dem j que levavaó , hum delles , que naó era branco , perfuadio aos fortificados , que entre- gâíTcm em confiança fuás armas em final de paz, para fe retirarem debaixo das noíTas. Mas os Juguaruanas , quê já tinhaó recupe- tanto que viraò a feus inimi- rado preza gos defarmados , feni lhes poderern valer os foldados Portuguezes , deraó fobre elles , e em hum momento quebrarão as cabeças a todos, que he o feu modo de matar, fem ficar de quinhentos , que eraõ , nem hum fó com vida. Foy efte hum cafo , que grandemente alterou os ânimos de todos os índios do Ceará , e mui- to mais os vaíTallQs , e aliados , vendo qiíe i fombra de noíTas armas , de que elles efpera- vaó a defenfa , fora a raefma , e por eftilo taó indigno, que os metera como cordeiros nas maòs de feus inimigos, Clamavaó contra os intereíTes do Capitão , e contra a lealdade dos íoldados, o que lhes enfinava a dor , e jufta ira, e talvez fe precipitavaõ em ameaças contra a fortaleza , e contra as vidas de quantos eftavao nella. 'nf\ Ji 44 VOZ: HISTÓRICA. ' § X- SaÕ chamados os Tadres para focezarem OS Inatos : dtfferenças entre e fie s\ acode no mayor fervor da briga o T. Antonto %tbeiro , a cujas vo^^esfuf pendem todos as armas j e ficao em pa^: reformatu^ ^' do ejle grande Miffwnar aTernambuco em bufe a dereme- dio y mas fem e^eito^ a.^jv- POftã a fortaleza nefte aperto , e receyo^ receberão os Padres cartas doCapellaó, ■ ' ' e áLtooxarifc, emci|uèlhe reprèfentavao o eftádo áe tudo , e lhes pediaó , que por fer- viçodeDeos, e delRey quizêíTem acodir com toda a preffa áquella for(ja , pois fó a fua pre*- feiíça , e a muita authoridade , que tem com os índios j poderia obrar em feus ânimos , taó juftamente irados , o que importava a corifer- va<^a5 de todos. Por efta caufa , e por perten-» cerem também aquelles índios a efta miíTaõ ^ refolveraó os Padres partir logo ao Ceará .j mas ^^ ■ ven- voz HISTÓRICA. 45 vendo, que com a noticia defta jornada torna- vaó a reverdecer as fufpeitas dos de Ibiapába , houve de ficar alli hum dos Padres, como em reféns do outro, e foy fó áquella empreza o Padre António Ribeiro , que como taó elo- quente nalingua, e exercitado em conhecer, e moderar os ânimos defta gente , fobre tudo ajudado com particular favor de Deos , poz tudo em poucos dias em paz. Primeiro aquietou , naó fem difficuldade, os índios Chriftaós das Aldeyas^que como vaf- fallos delRey, e creados em mayor poHtica, fabiaó melhor íentir , e encarecer a caufada fua dor; e com elles ficarão também quietos os Ganacés , primeiros movedores defta trage- dia , ajudando naó pouco a fua mefma culpa a fe comporem com ofucceíío. Só os Jugua- ruanas, como provocados fem cauía , c ccmo infolentes com a vi<5loria , naó cePrav»'5Ó de ameaçar continuamente a ambas asAldeyas,em huma das quaes deraó de repente ao tempo, que o Padre eftava levantando a hcftia ; mas acabada a MiíTa com a preíTa , que pedia o pe- rigo, eftando já alguns da Aldeya mortos, e fe- ridos quafi todos , que naó chegavaó a quaren- ta , fendo quatrocentos os bárbaros , que com- batiâS •A'%\. 4.6 VOZ HISTÓRICA. batiaõ huma fraca eftacada , de que eftava cer- cada, o Padre fe íiibio intrepidamente febre ella por meyo das frechas , e naó pedindo pa- zes, nem rogando, fenao reprehendendo , e ameaçando o cafl-igo de Deos aos bárbaros, deo Deos tanta efficacia a eílas vozes , e ao im- pério delias , que fuípendendo os arcos , e frçt chás , fe retirarão logo todos. E daili a três dias em prefen^a do Padre , e do Capitão da forta- leza vierao a fazer pazes , que fe celebrarão folemnemente entre eftas, e as mais nacoens oíFendidas. Em quanto ifto fe obrava , naó ac- tendia o Padre com menos cuidado á doutri- na dos índios Chriílaòs , os quaes achou na mefma confufaõ, e miferia , em que eftavao osdelbiapába, efefe pode; cuidar , ainda rpar yor pela mayor vizinhança , e çommunica- çaó , que haviaó tido dos Holandezes , fe bem orefpeito da fortaleza, e o prefidio os tinha feito menos rebeldes , einfolentes , que os ou- tros. Enfínaraõfe os innocentes , ebautizaraó- fe todos os herejes , e fe reconciliarão coma Igreja muitos, que eftavaõ cafados ao modo de Holanda, eíe receberão com os ritos Ca- tholicos. Em fim as duas povoa(^oens , que eraó comportas de gentios, e hereges, ficarão detodoChriftãs. ^ Rei- voz HISTÓRICA. 47 Reftãva fomente a fortaleza por fender ^ onde em cerco modo fe pode dizer, que efta^ va, e eftá o demónio mais force pela cubica dos Capitães/ etorpeza dos foldados. A eftes tirou o Padre crinta índias, as mais deilâs ca- iadas , de c]ue fe ferviaó com publica offenfa de Deos , efem pejo dos homens , indo- as buf- çar livremente ás Áldeyas, e tomando- as/e era neceílario , por força a feus maridos. Dos ma- ridos fe eftavaó fervindo igualmente os Capi- tães para íeus intereííes com canta oppreflaó dos miferaveis , e taó pouca , e taõ engai\qfa fatisfaçao do continuo trabalho , ou cativeiro, cm que os trazem, fem defc^far já mais, que ie podia duvidar , quaes eraó dignos de mayor laftima , fe as mulheres no torpe fervi- do dos foldados, fe os maridos no injuRo dos Capitães. Tratarão os Índios com o Padre de pôr remédio a eftes danos , que naõ eraó me- ros confideraveis para os mefmos Portuguezes, fe aquelles vícios deixarão olhos abertos. Re- preíentoufe por meyo mais efFcótivo retira- remfe aquellas Aldeyasdalli para Pernambuco, donde todos os annos , aííim como vem , e íe mudaó os foldados Portuguezes, aílím vieíTem^ e fe mudaíTem os índios neceflarios ao ler viço dâ voz HISTÓRICA. ^a fortaleza, e com eíla propofta paííou o tnef- mo Padre a Pernambuco , pofto cjue naó foy âdmittida , como nunca feraô aquellas , em que o bem temporal , ou efpiritual commum fe encontra com o intereííe dos particulares, que governaó. Na viagem vifitou o Padre as relíquias das antigas Aideyas de Pernambuco, Paraíba^ e Rio Grande, que achou efpalhadas por aquelle largo, e trabalhofo caminho, e tor-* nou a vifitar as do Ceará , bautizando, dou- trinando , caiando , e confeflando a todos aquelles defamparadiffimos índios , os quaes davaó graças a Deos , de que tudo ifto fe lhes fizeíTe de graça, quando muitos delles viviaó como gentios por naó terem com que pagar os Sacramentos, §.XL J voz HISTÓRICA. 49 §. VI. T)efconfiança dos da ferra de Ibiapdba , tendo aos Miffionarios por traidores. Quanto padece o *?. Tedro TPedro- ía^ que ficou fo na ferra : necef- fidade , a que chega , e difcom- modos deftas mtjfoens. EM quanto o Padre António Ribeiro íe de- teve nefta comprida nriiíTaó , efteve o Pa- : dre Pedro Pedrofa padecendo as con- feqiiencias delia , que foraó perfuadiremfe de novo os de Ibiapába , que a jornada ao Ceará, e de Pernambuco foraó fó a prevenir dobrados foccorros , com que os arrancar a todos das Tuas ferras ;, chegando a defconfiar das mefmas muralhas inacceffivas , com que as fortificou a natureza , e fazendo , como foldados velhos da guerra doBrafil , huma eftrada occulta pe- jo mato , que no cafo , que naó fe podeíTem defender , lhes íerviíTe para a retirada , a qual já tinhaó difpofta para partes taó remotas do interior da America , que nunca lá podeíTe chegar o nome , quanto mais armas dosPortu- ■L.....í.:s D tugue- ^<" ; m 5p VOZ histórica: tuguezes. Sendo efta a opinião, que eftes ín- dios tinhaó de hiinn dos Padres , já fe vê , qual feria o tratamento , que fariaó ao outro. Fi- cou o Padre Pedro Pedrofa entre elles íó , e fem faber ainda mais que poucas palavras da língua, mas a mefma neceííidade , e naó ter outra , com que fe dar a entender , lha fez aprender copiofamente dentro em poucos me- zes, eftudando mais ainda, que a meíma lín- gua, as razoens , com que havia defallar, e perfuadir a efta enganada gente o pouco futií- damento de feus temores , edas defconfiançià, que tinhaó concebido contra os Pndres, que por elles eftavaó padecendo tantos traba- lhos, e tinhaó arrifcado tantas vezes as vidas. Mas nenhuma razaó, nem demonftraçaó baf- tava, para que viífem , ou quizeíTem ver a fua cegueira. Affim eftava o Padre aqui mais eomo prizioneiro das fuás ovelhas, que to- mo Paftor delias , continuando porém fempre em lhe dar o pafto da verdadeira doutrina, a que acudiaó poucos , e os mais pequenos , fo* gando por todos a Deos , e ofterecendo por fua converfaó os mefmos aggravos , e ingra- tiJoens, que deles conciíuamente eftava re- çebeado. Alguns mezees naó ceve o Padre , queni voz HISTÓRICA. 51 quem lhe foíTe accender hnnoa candeya , dei- tandofe todo efte tempo febre ter comido duas eípigasde milho iecco , que affava por fua própria maó; mas nifto eraó menos cul- pados , os que tinhao obrigação de o fuftcntar, pelas efterilidades do íitio. Muitas vezes a ho- ras de jantar mandou com hum prato pedir huma pequena de farinha peias portas , lendo elle , o que fazia o fogo para cozer humas her- vas agreftes , e o que varria a pobre cafinha com as mefmas maós íagradas , com que a ti- nha feito. Defte tempo he que ficarão ao Pa- dre as noticias , que nos dá , de ferem tanto ía- borofas as lagartixas pela parte de alguma, que algum mais mifericordiofo lhe oftereceô por grande caridade. Talhe am.iferia, ou O-^ caftigo do fitio , em que vive efta pobre gen- te, e por cuja confervaçao fazem tantos extre- mos Quando aqui chegámos, havia quatro mezes, que os Padres naó comiaó mais , que^ folhas de moftarda cozidas em agua , e ía^l , mas eftas com pouca farinha , porque nem os que a lavraó, a tinhao. Alguma jornada fizeraó de mais de íeíTenta legoas , em que levavaó a matalotagem na algibeira ^ que era hum pou- co de milho debulhado , que a nao ir taó bem D ij guar- i'i,i, 52 voz HISTÓRICA. guardado , fe naõ poderá defender á fome dos companheiros, eiftohe, o com que fe jejuaó as C^areímas , e com que fe feftejaó as Paf- coas; mas he já boa de contentar a natureza, ( e muito mais a graça ) e dá Deos tantos fabo- rcsaeftes manjares, que naõ fazem cáfauda- des os regalos da Europa. Dias houve também caminhando , em que paffaraó os Padres fó com os cardos do mato, e outras vezes com as raiz^es de certa arvore agrefte , cavadas por fua maó , a que chamaò Mandu rapo , por fer mantraento das emas, que digerem ferro. Mas tinhao os Padres muito mais, que digerirna dureza , e rebeldia dos coraçoens da gente , com que tratavao , os quaes com nenhum ex- emplo fe compungiaó, com nenhum benefi- cio fe abrandavaó , e com nenhum defengano queriaó acabar de íe defenganar , permittin- do-o affim Deos ou em caftigo da fua mef- ma obftinaçaó , ou para outros mayores fins da fua providencia. $. XII. voz HISTÓRICA. 5 3 f Che^â o 'P. António Ribeiro de volta d 'ena : ale-la , com que he recebido : nova dej confiança dos índios ^ que determinao matar aos T^aders : Jabem eftes da traição^ e fer^ ítíiem ainda na ferra, FOy mais feílejada a vinda do Padre Antó- nio Ribeiro j quando o viraó entrar pela principal Aldeya íó, e fem os exércitos innaginados, que o demónio lhes tinha forma- do nas fantafiâs. Mas durou pouco aos Padres o gofto defta viótoria da fua verdade; porque no mefmo tempo receberão huma carta do Padre Antó- nio Vieira , em que lhes dava noticia de have- rem refoluto os Superiores , que aquella míf- faô, viftas fuás iaipoífibilidades , íe naó conti- nuaíTe , e que os Padres fé voltaffetn outra vez aoMaranhaõ, notificando efta ordem , e a cau- fa delia aos índios , e levando comfigo aos que os qiíizeíTem feguir. Naó chegou á ma5 D iij dos 54 VOZ HISTORIGÂ. dos Padres nenhuma deílas ordens, one erao do Padre Provinciai do Brafíl , c do Padre Vi- iicador defta mifíaó, como adiante íedirá^ mas era ordem á execução delias declarou o Padre Pedro Pedrofa aos principaes oaviío, que tinhaò recebido , reprefentandoihes o fer-- viço de Deos , e de Sua Mageftade , que conti- nha aquela refoluçaó , e quão conveniente lhes era nao íó para a falvacaó , fenaó ainda para as commodidades da vida a mudança do lugar. Naó tinha acabado de dizer o Padre , quando já eflava lida a repofta no femblance de todos, os quaes rebentarão , dizendo : Eis- aqui como era yerdade , o qm atégora todos cuidava- moí ; e como os ladres naÕ tiver ao nunca outro inten- to , fenaÕ de nos arrancar de mjfas terras para ?ios fazerem efcraVos de f eus parentes as brancos. O ma* yor principal , que tem grande fagacidade , relponJeo direitamente a propofta defta ma* neira : òe por [ermos VaJJallos del^ey , quereis que Vamos pjya o Maranhão , eíias terras tamhem faÕ did^y j ele por lermos Chrfftatis , e filhos de Deos ^ Deos efld em toda aparte. Com efta repofta fuc- cinta le recolherão a feiís concelhos íecretos , nos quaes íe decretou , que por meyo dos Ta- puyas tiraíTem á vida aos Padres , como já ti- nhaò VOZ' HISTÓRICA'. 55 nhao feito osmeímos Tapiiyas ao Padre Franr cifcoPintoj e que para diffimulacao dodeli- ífto íahiriaó elks fingidamente á íiia defenra.;^ e fariao grandes prantos por íua morte. Der crerada efta cruel lentença , íem os Padres te- rem delia a menor noticia , com omefmo íe- ^redo defpediraò aosTapuyas , quem lhe fof- íe declarar o intento , e os eníayaíre para a tra- gedia. Eraò os Tapuyas , que foraó eícolhidos ^^ para a execução os ....... e o dia o de quin-crií^naief- tâ feira de Endoenças, em que os Padres eftao^'""™''' mais occupados ; e elles concorrendo também para os offícios dâquelia íemana , íe queriaó também fingir mais divertidos. Tudo eftava já:preparado para o facrificio, e fó as viótimas eftâvaò innocentes de tudo. Qiiando Dcos, que nunca defampara , aos que o fervem , to- cou o coração a hum dos principaes , e adjun- to na mefraa confulta , o qual foy fecretamen- te avifar aos Padres de tudo , o que contra el- les eílava traçado. Com efteavifo, que bem fe via era do Geo, fe apparelharaó os Padres com grande animo para dar a vida por taõ . . . F^'fa no ..... caufâ , e dalli por diante , pondofe maismá ^í^vra' aíFecítuofamente nas maõs de Deos com con- tinuas oxaçoenSj e penitencia, eftavaó efpe- D iv rando i^ t'V% $6- VOZ HISTÓRICA. raado a todas as horas do dia , e da noite , que a morce lhes entrafle peks porcas / tendo ajuf- tado entre fi de a receberem de joelhos , e com as mios jevantadas ao Ceo. Brn quanto che- gava , ou tardava o dia aprazado ^refolveraó- fe os Padres a nao eíperar mais por ellè. Deí- cubriraó ao principal , como lhes era manifef- ta a traição , que lhes tinha armado j que para matar dous Religiofos fem armas nao erao neceíTarias as frechas dos Tapuyas , que em fuás mãos os tinhaó , lem poderem refiftir j nem quererem fugir, que baftava hum velho o mais fraco da Aldeya, para lhes tirar as vidas, eque eUes as dariaó por bem empregadas, fe Deos pelo faa"i fiei ode feu fangue perdoaíTe aos Tpbajárâs è peccado , e todos os outros, de que fe niò queriaó emendar j que eftivef- fem cerros , que do Ceo naõ baviao de pedir para eiles caíligo, fcnaó mifericordia. Ficou afTombrado o bárbaro de ver, que os Padres íabiaó, o que elle tinha por taõ fecreta, negava com a boca tudo j mas confeíTava-o Gon o cora(^aô , o qual lhe dava taes pan- cadas no peito, que naõ fe eftavaó vendo, mas parece, que fe eftavaó ouvindo. Em fim Gomo as traças eraó do demónio, que fd cem for- voz HISTÓRICA'. 57 força, em quanto eftaó encuberras , neftedia deiarinou em vaó toda efta maquina. O infer- no ficou confufo , e os Padres deraó infinitas graças a Deos , e os autores ficarão corridos, e arrependidos, mas nem por iíTo emendados^ tendo íempre altamente fixado na memoria, e no entendimento o ponto de os cjuererem tirar de fuás terras ; e pofto que os Padres tinhaó tao juftas caufas , e taó baftante motivo nas cartas, que receberão , para facudirem o pó dos çapa- tos , e deixarem taó ingrata terra , reíolveraó- fe com tudo a naó deíam parar o pofto , a que a obediência os tinha mandado, fem verem primeiro a ordem ^ em que a meíma obediên- cia os mandalTe retirar. §. XUl. Eííado pcrmciofo dos índios daferra:fuas ignorâncias yheregias , e trato com o demónio* SErá muito para louvar nos tempos víndou^ ros a conftancia deftes dous Miflíonariosí mas elles tem para fi, e com razaó, q naó íó deviaó ifto ao amor de Deos , por quem o pa* deciaS* ■■MaaMMm y8 VO2: HISTÓRICA. deciaS, fenaõ ao exemplo^ que o mefmo Deos lhes dava; porcjiie ainda que foy muito, o que os Padres foíFreraó a eftes Índios , muito mais era o que Deos lhes eftava foíírendo. En- tre todos eítes fó hum velho houve, que de fi pedio aos Padres , que o cafaílem para fahir demaoeftado. Nenhum dos principaes, fen- do todos três Chriftaòs , era caiado em face de igreja , nem o quizerao nunca fer, por mais que os Padres os admoeftavaõ , e todos além da que chamavaó mulher , tinhaó a cafa chea de concubinas. Alguns eftavaá cafados juntamen- te com duas irmãs , e muitos com fuás cunha- das , porque receber o irmaò vivo a mulher do irmaó defunto he ley tao judaicamente obfer- vada entre elles, como fe ativeraó recebido de Moyfés, aquém também fabem o nome. Aquelles , de quem o Profeta diz, que fizeraó concerto com o inferno , parece que forao ef- tes. HumdiíTe, que antes queria íer irmaõ de Caim, do que de Abel, por eftar no inferno com elle ; outro , que fe lhe naó dava do fogo do inferno , porque fe fofle lá , elle o apagaria; outro , que já fabia , que havia de ir ao infer- no pelas maldades , que commettera em Per- nambuco, e affim naó queria tratar do Ceo; ou- voz histórica: 5^ outros chegarão acanto, que blasfemarão de Deos como de tyranno , e injufto , por os ha- ver de mandar a elles ao inferno: Mande ao inferno , diziaõ, aos índios, que o matarão , mas a nós , que lhe naó filemos nenhum mal, porque nos manda ao inferno fem razaó ? Em fim foraó taes as coufas , que diíTcraó , e fíze- raó fobre eíte ponto , que os Padres íe retira- rão de lhes fallar no inferno , acé que o conhe- cimento da grandeza de Deos , e de fuás cul- pas lhes moftraíTem quaó dignos faó , os que o oíFéndem , de taô temerofo caftigo. Por outra via tinha já procurado o demónio cirarlhes do penfamento a fé, e temor do inferno, efpa- Ihando entre elles hum erro aprazivel feme* Ihante a fabula dos campos Elyííos ; porque dizem, q os três principaes das Aldeyas da ferra tem debaixo da terra outras três Aldeyas muito formoías , onde vaó depois da morte os fubdi- tos de cada hum , e que o Abaré , ou Padre , que lá tem cuidado delles , he o Padre Francií- co Pinto , vivendo todos em grande defcanfo, feitas, e abundância de mantimentos ; e per*- guntados donde tiveraõ eíla noticia , e fe lhes veyo algum correyo do outro mundo, allegao com teftimunha viva , que he hum índio mui- to W I" 1 6o VOZ HISTÓRICA. to antigo , e principal entre elles , o qual diz, que morrendo da tal doença , que teve, fora levado ás dirás Aldeyas : por íinal , que huma íe chama Ibirupignaya , outra Inambuapixoré, a terceira Anhamarí , c que lá vira todos , os que anres delle haviaó morto, e entre elles a íua mulher , a qual o naó quizera receber , e pelejarão com elle por ir deita vida íem levar hum efcravo , que a ferviíTe , e que depois dif- to tornara a viver. O índio por íua pouca ma- lícia parece incapaz de haver compoft-o efta hiftoria , e affim julgaó os Padres, que foy íem duvida illufaó do demónio para o enganar a elle , e por meyo delle aos outros, e quando menos para pôr em opinioens hum ponto taó importante como o do inferno. Na veneração dos Templos , das Imagens, das Cruzes, dos Sacerdotes , e dos Sacramentos eftavaõ muitos delles taó Calviniftas, e Luthe^ ranos , como fe nafceraõ em Inglaterra , ou Alemanha. Eftes chamaò á Igreja Igreja de [oanga , que quer dizer Igreja falia ; e á dou- trina Morandubas dos Abares , que quer dizer Patranhas dos Padres > e faziaõ taes efcarneos, é zombarias dos que acudiao á Igreja a ouvir a doutrina , qiie rnuitos a deixarão por efta cau- VOZ^HISTORICA. 6Ír caufa. Hum diffe , que de nenhuma coufa lhe pezava mais , que de Ter Chriftaó , e ter rece- bido o baucifmo. O íacraraento da confiíTao he o de que mais fugiaõ , e mais abominavaój e também havia entre elles , quem lhes prégaí- fe , que a confiíTaó Te havia de fazer fó a Deos, e naó aos homens. Foraó teftimunhas certos Portuguezes , que vieraó á ferra , que a tempo, que o Padre levantou a hoftia , hum por zom- baria dos que batiaó nos peitos , fe poz a ba- ter na parede da Igreja. Eftava outro para commungar em occa- fiaõ, que hum principal lhe mandou recado^ para que foíTe beber com elle , e como ref- pondeíTe , que eftava para receber o Senhor , diíTe o principal;, que naó conhecia outro Deos íenao o vitiho ; porque elle o creara , e o iuÇ^ tentava. Outras muitas coufasdiziaó, que he certo lhas naó enfinaraó os hereges, fenaó o demónio por íi mefmo. Exhortava o Padre a certo gentio velho , que íe bautizafíe , e elle refpondeo , que o faria paraf quando Deos in- carnaffe a fegunda vez , e dando o fundamen- to dofeudito, accrefcentou , que aííim co- mo Deos incarnara huma vez em huma don- zella branca para remir os brancos , affim ha- via ''\.fí 'úi é^i voz HISTÓRICA; viã de incarnar outra vez em huma donzella índia para remir os índios , e que entaõ fe bau- tizaria. Confoante aefta profecia he oiura, que também acharão os Padres entre clles; porque dizem os íeus letrados , que Deos quer dar huma volta aefte mundo , fazendo , que o Ceo fique para baixo , e a terra para cima , e affim os índios haõ de dominar os brancos , af- fim como agora os brancos dominaó os ín- dios. E com eftas efperanças fantafticas , e fo- berbasos traz o demoniotao cegos, taó def- âtinados , e taó devotos Teus, que chegou a lhes pedir adoração , e elles a lha darem. Naó ha muitos annos , que hum velho dos de Pernam- buco feiticeiro, levantou huma ermida ao dia- bo nos arrabaldes da povoação, e poz nella Iium Ídolo compofto de pennas , e prép^ou , que foíTem todos avenerallo, para que tivef- fem boas novidades , porque aquelle era, o que tinha poder fobre as fementeiras; e como a terra he mui íwjeita a fome , foraó mui pou- cos osqueiicaraó fem fazer fua romaria, â er- mida. Eftava o velho aflentado nella , e eníí- nava, como fe haviaó de fazer as ceremonias da devaçaó , que era haverem de baiihar con- tinuamente de dia, e de noite, ate que as oíd- vida- voz HISTÓRICA. ^ vidades eftiveíTem maduras , e os que canla- vaó, e fâhiaõ da dança, haviaó de beijar as pen- nas do Ídolo, no qual affirrnavaò alguns, que ouvirão ao demónio fallar com o velho , e ou- tros , que fe lhe moftrou viíivel , veftido de ne- gro. Tiveraô os Padres noticia do defaforo , fbrao logo queimar oidolo, e levantar em P'! ieu lugar huma Cruz dentro , e Outra fora , mas ao dia íeguinte amanhecerão ambas as Cruzes feitas pedaços : tanto fofíre Deos , c tanto tem foffrido a eftes impios contra (u^ Igreja , contra feus Sacramentos , contía íirl divindade , e contra luas Cruzes 5 e tanto eníi- na a foffrer com o feu exemplo , aos que tam- bém enfinou com íua doutrina , cue deixaf- fem creícer a cizânia > para^ue fenaó perdef- íeo-crigo* r.::i^m.( I. XIV. 6^. voz HISTÓRICA. §. XIV. tfuto 5 ^ue fe colheo nefle ejleril campo^ i proveitos temporaes ^ que refultarao dejlas duas mijloensijuccejfo extra- ordinário^ e cajligos del)eos em s índios. O Fruto, que fe tem colhido no meyo def- ta efterilídade , naó cem fido taõ poucO;, que fe hajaó de dar por mal emprega- dos tantos trabalhos , quando os mefmos tra- balhos per íi naõforaò hum grande fruto.. Em quanto os grandes viviaô na obftinaçaó , e re- beldia , que diíTemos, os pequenos , de quem he o Reyno do Ceo, o hiaó povoando em tan- to numero , que faó já mais de quinhentos os innocentes bautizados pelos Padres , que com a graça do bautifmo eftaõ gozando da gloria. Ao principio ti verão os Padres três Igrejas nas três Aldeyas, e depois fizeraó outra , em que uniraó todas três. Eftas quatro Igrejas faó ho- je relicários preciofiffimos , em que naõ ha lugar, onde naõ efteja engaftado algum cor- po AOZ HISTÓRICA^ $f po com toda a certeza fántos, que he grande confolaçâõ, e ainda devaçaò , para os q vieraò a eftas ferras cavar eftes chefouros ; e vê-fe cla- ramente haver Deos inviado os dous Miffiona^ rios da Companhia fó a colher eílas flores pa- ra as meter , como diz, a Efcritura , no rarna- Ihete dos predefti nados ; porque no tempo, em que morrerão mais de quinhentos innocentes, nao chegarão a morrer quinze dos adultos /al- guns dos quaes acabarão com os Sacramentos daquella hora y e com grandes efperanças de fua falvaçaó 5 e outros para temor dos mais com evidentes íinaes de fua perdiç.a& i^úU"! E ao 6S V02: histortga: ao bem erpiritual deftès Índias , nem de me- nor utilidade ao efpincual , e temporal de to- do o Eftâdo. O caminho do Maranhão ao Cea- rá, c a Pernambuco, que eftava totalmente fechado pelas hoftilidades defta gente, eflá ho- je franco , e feguro. As prayas , e navegação de toda a coíla eftá livre , e melhorada com o feu commercio. Sobre tudo eftaõ reduzidos os Tobajáras á obediência , c vaíTallagem de Sua Mageftade fem armas, nem defpezas, e ef- taõ jnimigos jurados dos Holandezes , em cu- ja confederação era a ferra de Ibiapába oma- yor padrafto, que tinha fobre íi o Eftado do Maranhão, e o que lo temerão todos os foda- dos velhos defta conquifta. Nos vicios da fe- reza, edeshumanidadeeftaó também muito d^madoàj já nao mataó , já íiaõ comem car- xae humana , Já naõ fazem cativeiros injuftos, jáguardao paz, e fidelidade ás naçoens vizi- nhãs , tudo por beneficio da aíEftencia dos Pa> ' Haverá dous annos , que exhortarao os Pa* dres aos Tapuyas Curutís, quequizeffem dei- xar a vida de corfo, e viverem aldeados com os Tobajáras com cafa , e lavoura , e quando , |â vinbaõ os Curutís com fuás famílias para fe í meter ííSít^è. VOZ HISTÓRICA. ^^7 meter nas i\ldeyas , que os mefmos Tobajarás lhes tinhaõ ofFerecido , eftava traçado entre eU les de os efperarem em cilada dalli a duas le- goas , e os matarem , e cativarem a todos. Sou- be o P. Pedro Pedrofa a traição três horas an- tes, quandojá os Tobajarás eftavaó j untos, e armados j e baftou faberem os principaes , que o Padre o íabia , para deíiftirem da em preza, e ainda para cobrirem , e negarem os inten- tos , que tivcraó nella. Foy efte o mayor argu- mento do refpeíío , que tem aos Padres , ainda quando parece, que nos nao refpeitaraô, por* que naó ha mais forte tentação para efta gen- te , que a de matar , e fazer cativos. Aííim va5 defpindo os vicios da barbaria , com que co- meçaó a fer homens , e fe efpera , que renun- ciarão também os demais , para: que acabem deíerChriftaõs. > ; - íi Confirma muito efta efperança o terfe vif- to em muitos cafos , que naó fó chama Deo5 éffia geniie por meyo ordinário de feus mínif- tros os Pregadores , mas que parece quer ren- der per fi mefmo fua rebeldia , como a de Saulo. -^ • , , jw ■ .: •,<:;.. - Eftava hum dia ouvindo Miffia o maycyi? frinçipal^^e ao tempo, que! o Padre levantou o Eij ' Se- í 8 VOZ HISTÓRICA. Senhor , e todos o adorarão ,el!e vio fomente os dedos do Padre , e naõ vio a hoília , com cjLie ficou aíTombrado; recolhcndofe a cala tre- mendo , examinando a caufa de Deos felhe naó querer moftrar , occorre olhe, que devia de ler fem duvida , porque em o dia de antes tinha dito hutnas palavras de pouco refpeito ao mefnqo Padre , que diffe a MiíTa, q era o P. Pe- dro Pedrofa : paíTou a noite fem dormir , veyo ao outro diaouvir a MiflTa do mefmo Padre , e pedir perdaó a Deos do que tinha feito , c quando fe levantou a hoftia , vio-a , mas com a cor mudada , porque lhe pareceo envolta em huma nuvem negra, e lhe metia horror, pofto quenaó taó grande como o dia de antes, em que fe lhe havia totalmente efcondido : foy no mefmo dia contar ocafo ao Padre , pedindo- Ihe perdão da pouca reverencia , com que lhe havia faílado , e dalli por diante tornou a ver a hoília branca , e como d'antes a via. 'Mum dos blasfemos, de que falíamos aci- ma , chegou a dizer em prefença de muitos , que naò tinha outro Deos , fenaõ o diabo , mâs permittio logo Deos, que experimentafle era G mefmo , quem era aquelle, por quem o tro- cava , para caíligo íeu , e dos outros , que o ti- nhao voz HISTÓRICA. 69 nhaõ ouvido. Entrou nelle ó demónio taó fu-. rioU , e deíefperadamence , que íe defpedacja^ va a íi , e a quanto encontrava , fugindo todos> delle , e naõ havendo quem lhe paraffe diante.; FizeraólKe os? Padres os exorcifmos por efpâ<çO> de oito dias , com que o largou o demónio por» entaó , pofto que depois tornou por vezes a a atormentar , mas já com menos fúria. Ficou taó eníinado com efte çaíligo , que dajli por diante naó íahia de cafa dos Padres , ncrp da] Igreja; e andando fempre armado com as contas ao pefcoíjo , deo publica fatisfacao ao : efcandalo, que tinha dado , proteftandp , que. eftava fora de fí , e pregando em toda a parte, que a divindade era fó de Deos , e o demónio a mais mofina de todas as creaturas, e amais abominável. Quando os Padres logo chega- rão a ferra, receberão hum índio com huma fua cunhada , com quem eftava amigado , cal- lando elle o impedimento , e naó havendo quem acudifle a o defcubrir. Nafceraó defte matrimonio hum minino, e duas minifias, e todos crés fahiraó mudos. Admiraó os mef- mos índios a cftranheza do cafo, e tem aíTenta- do entre íi , que a caufa de ferem mudos os fi- lhos he , porque o pay também foy mudo , Eiij ca!- a voz HISTÓRICA; callaftd e achou que a in- chação verdadeiramente eftava rebentada , c brevemente cerrou, e em breve ficou faó. Ou- tra vez tornou a fonhar efte índio coufas fe- melhantes , ordenadas todas á íua falvaçaó , e fendo fempre ominiftro, ou inftrumcnto del- ias aquelle mancebo feu conhecido, que ao primeiro entendeo feria o feu Anjo da Guarda, mas ultimamente lhe appareceo em veftido de Pa- 74 VOZ HISTÓRICA. Padre da Companhia. Finalmente Deos tem nefta feara muitos efcolhidos, e íe o demónio trabalha tanto por arraigar a cizânia, que tem femeado nella , he porque teme ^ e prevê , que ha de fer lançado fora , de que parece deo hum manifefto final no mefmo dia , em que chegar raõ os Padres ; porque ao ferrar da noite fe ou- vio de repente hum eftrondo taó p^rande , co- rnodecouía, que rebentava, que deixou af- fombrados a todos. Succedeo ifto junto á ca- fa,onde os Padres eftavao agafaihados, e dizem os índios , que alii fe coftumava ver de noite huma figura medonha , e afogueada j e daquel- le ponto em diante nunca mais foy vifta; o que podemos affirm ar com toda a certeza, he, que a miíTaó deftes dous Padres á ferra de Ibiapába foy ordenada por particular providencia de Deos 5 e que he vontade do mefmo Deos , que aíBftao , e continuem nella , de que nos tem dado tantos teftimunhos , e taõ claros , que fe naó podem duvidar. Já deixamos dito, que aííim ps Superiores da miíTaó , como os do Brafil ordenarão , que os Padres da íerra vol- tafiem outra vez para o Maranhão*, manda- raófe eftas ordens aos Padres por muitas , e re- petidas vias, mis fempre Deos eftorvou, que che- VOZ*tílSTORICÁ. 75 chegaíTem , e por meyos , em que na5 fó en- trou a fua providencia , fenaõ também o bra- ^o do feu poder. A primeira deftas ordens man- dou o Padre Francifco Gonçalves , que aca- bando de fer Provincial do Brafil , veyo vifitar efta miflaó , e mandou-a no mefmo barco, em que tinha vindo da Bahia ; mas porque o Mef- tre eftava defgoftado do Padre por certa cou- fa , em que lhe encontrou a vontade , tomou as fuás cartas, em que vinha a ordem , e lan- çou-as ao mar em vingança , e entregou as dos outros Padres. A fegunda ordem foy enviada pelo Padre Provincial do Brafil Simaó de Vaf- concellos ao Padre António Ribeiro , que ef- tava em Pernambuco , e cbegou ella ordem na tarde do mefmo dia , em que o Padre pela manhã fe tinha embarcada; e partido para a fua MiíTaõ. Em Pernambuco deo o mefmo Padre Provincial duas cartas cora a meíma or- dem ao Padre Ricardo Careu , quando de lá fe embarcou para o Maranhão; huma,para que fe déíTe no Ceará j outra , para que íe déíle em Jurilquáquára , que faó os dous portos , que communicaó com a ferra ; e íenco que efta viagem fe faz íempre vento apopa, rcman- dofe todos os portos com grande faciHdade, ode p 1'' \"\H j6 VOZ HISTÓRICA. O de Ceará nunca o pode tomar o barco. O de juruqiiáquára tomou-o.; mas tanto que lan- hou ferro para mandar á terra , foy tal o vento, e mares, que fe levantarão fubitamence , que a requerimento de todos fe houvcraó de fazer á veila para fe naò perderem. Nefte mefmo tempo quizerao os Padres ir efperar nas prayas pelo Padre Careu , de cuja vinda tinhaò notín cia , e no dia , em que eftavaó para partir , che- garão á ferra alguns foldados mandados pelo Gapitaó do Ceará , que detiveraõ os Padres al- guns dias, eneftes paíTou o barco. Do Mara- nhão tornou o mefmo barco a partir para Peré nambuco, vindo nelle huma via das mefmas cartas , para qu^e volta chegafTem ás mãos dos Padres; mas depois de dous mezes , em que por muitas vçííi^s intentou a paíTagem, tor- nou arribado aoMaraahaô. Com efta tardani ça, e a primeira noticia de ter paffado , trata? raò os Padres demandar correyo por terra ao Maranhão ,e depoiis de hum mez de caminho voltarão com as mefmas cartas, q levarão, por- que os avi faraó os Teremembés , que nas áreas havia muitos Tapuyas de guerra. In íiftiraó ou- tra vez os Padres com fegundos correyos , e in* do eíles paíTando o rio Temóna em buraa ca-. noa voz HISTÓRICA. 77 noa pequena , que levavaó para as paíTagens, acomeceo-os hum tubarão de taó eftranha grandeza , e fereza , que perfeguidos h ou ve- rão de encalhar em terra , e foy entre humas pedras , onde a canoa fe fez em pedaços ^ e fe tornarão com as cartas. Finalmente le reíolve- raõ os Padres a levarem em peíToa as mefmas cartas até tal parte do caminho , e entregaJlas a tanto numero de índios, e de tanto valor, que naó voltaíTem. Eftes foraó por fim os que che- garão , depois de haver anno e meyo , que por nenhuma via fe fabiaó novas daquella miíTaó, Eflavaó detidas no Maranhão todas as ordens dos Superiores , as quaes haviaó de levar eftes mefmos portadores dalli a qilp dias , que foy o termo , que pedirão para defcaníar , e o que tinhao limitado pelos Padf^íl Mas quatro dias depois da fua chegada chagou o Governador D. Pedro de Mello , e com elle taes ordens de Sua Mageftade, e do Padre Geral, que ficou fufpenfo por ellas o efFeito, e execução das outras. De Sua Mageftade vieraõ três cartas, em que encarregou ao Governador , que o feu primeiro cuidado foffe procurar , que na ferra de Ibiapába eftiveíTem alguns Religiofos da Companhia para terem á fua conta , e obe- dien- rú^ :i!|i 78 VOZ HISTÓRICA. diencia aqnelles índios, e para fegurança dos ditos Miíííonarios fe fizeíTe o forte de Camucí, que o Governador André Vidal tinha intenta- do. Do Padre Geral vieraó patentes de Viíita- dor , e Superior da dita miíTaó ao Padre Antó- nio Vieira, que íempre fora do voto, que a miíTaó da ferra fe continuaíTe , tendo para ido razoes de tanto pezo,que mandando-as logo ao Padre Provincial , fe conformou elle , e todos os Padres da Provincia com ellas. De forte , que procurandofe com tanto cuidado por no- ve vias differentes do mar , c da terra , e em ef- paço de anno e meyo , q chegaíTem aos Padres da ferra as ordens, por que eraó mandados reti- rar , Deos as iínipedio , e eílorvou todas por meyos tao fora do curfo natural das coufas, fervindofe para iffip dos ventos, dos mares, dos rios, dos Portuguezes , dos índios, dos Tá^ puyas , e dos mefmos peixes , para que fe vi (Té, ^ue era vontade fua , que os Padres naõ fahif^ 'fem daquelle lugar ,; e que os meyos , que fua íprovidencia tem pedeftinádos para falvaçao 'aas almas, fe haó de confeguir infallivelmente, ainda que feja neceíTario para iffo tirar de feus eixos a coda a natureza. §:xvi. ^^:i•^i<:■:. VGZ HISTÓRICA.^ jS $• XVL Efcreve o "P. Jntonio Vieira aos de Ibia^ fdba : refpondem os índios , e mandão vi- fitar o novo (governador do Ffiado ©. Tedro de Mello , e ao Superior das rnijfoes o T. António Vieira : to- ma tudo melhor formate o pro- cura arruinar o demónio, COm as novas ordenS;,qiie (e mandarão aos Padres , foraõ também cartas aos princi- pães do novo Superior da miíTaójem que lhes dizia , que o Teu intento , e gofto era dar-^ lho em tudo , o que fofle jufto , e que íuppof- to o amor , que tínhaó ás fuás terras /que nel- lasfícariaó com elles os Padres para os doutri- nar , com tanto, que aeíTe fim íe uniíTem to- dos/ e fe ajuntaíTem em huma fó Igreja. Foy efla nova recebida em Ibiapába com grande applaufo , c feftas j e logo mandarão todos os princípaes , huns a feus irmaõs, outros a feus fi- lhos, acompanhados demais de cincoenta ou- tros índios a vifítar o novo Governador , e Su- perior ', '^ •' r|L',li I r 8 o VOZ HISTÓRICA}/ perior da rniíTaó j e hum delles, que hoje íc chama D.Jorge da Silva, filho do principal mais antigo, para que paíTaíTe ao Rcyno a bei- jar a maõ a Sua Mageftade em nome de todos. Foraó recebidos eftes Embaixadores com grande fefta , q lhes fez o Governador em fua cafa , e os Padres em o Collegio por muitos dias , e tornarão contentes , e prefenteados el- les com outros mais prefentes para íeus prin- cipaes, que he coftume mui cuftofo , e ás ve- zes mal empregado. Levarão tambcm promef- fa do Padre Superior da miííaó , que os iria vi- íitar pelo S. João do anno feguinte, com a qual efperança , e com a rela(^a6 , que deraó os Em- baixadores de quaõ benévola , e liberalmente forao hoípedados dos Padres , fe applicarao to* dos á uniaõ das Aldeyas , e ao edificio da nor va Igreja , concorrendo para ella com grande continuação, e cuidado j em fim parecendo, ou podendo parecer , que já eílavaó defenga- nados das fuás fufpeitas > e feguros dos feus te- mores , e que tomavaó todos de veras a dou- trina dos Padres. Mas o demónio ainda fe nap deo por vencido, e fobre eíla táõ differente ordidur a tornou a tecer, e continuar amef- ma teya de defconfiancas , que também lhe ti- ■^ ■ ■' ; , * *T ^^W e»'^í^W-í»ir'iiK.-j,.V-^ j-fc. ; VOZ HISTORICA/r tf tinWó íâhido. Parcio D. Jorge para Lisboa, ficandolhe no Maranhão por dei cuido as car- tas , que o Padre António Vieira lhe tjnha da- do, mas baftou fer conheeido por índio da miííaô do Maranhão , para que o Conde de Odemira, que foy fempre grande protedor , como obra íua , o mandaíTe recolher em íua cafa, e prover de todo o neceflario com mui- ta largueza, e o prefentou depois a ElRey-, que Deos guarde, e o enviou outra vez para o Maranhão cheyo de mercês de Sua Mageíla- de,eíuas. b uoimc::^ Alguns mezes antes do S. João do rniefmo anno mandarão também os principaes de Ibia- pába muitos Índios de fua naçaó , e outros de Pernambuco , para trazerem á ferra ao Padre António Vieira na forma, que lho havia pro- mettido j mas como o Padre por enfermidade, e pela expedição das miffoens do mefmo an- uo fe deteve no Pará até o fim delle:, e prin- cípio do íeguinte , fobre eíla tarda n<^a tornou o demónio a introduzir em Ibiapába , ou re- fuíeitar as rriefmas defconfianças dos Padres^ fçmeando ehpre elles por boca de certos Ta- puyas , que Jorge nâô fora mandado a Portu^ gal , fenaõ afogado no mar por ordem dos Por- F tugue- mÈm '^1 w l. f'':!" • 1 ' ■ ■' 1:1 i ;'l ; i 1 1 í ! h' 8i V02: HÍSÍORíCX.^^ - tiiguezes, eque os demais os éRavaó já fervin- do, repartidos por íuas caías , e fazendas, como eícravos, eque avinda do Padre feria com grande poder , e acompanhamento de folda- dos para lhes fazer a elles o mefmo. Creraó fa- cilmente todas eftas traiçoens , os que taó cof- tumados eftaó a fazellas 5 e de huma povoação, que pouco antes fe tinha feito de três , fe fíze- raó logo mais vinte povoaçoens, para que aí- íim divididos naó podeíTem ícr cercados , nem apanhados juntos. Efta foy a refoluçaó , que fe executou de publico , debaixo da qual efta- Vã diflimulada outra de mãyor defatino , que era cerem aíTentadp comíigo , que fe até a Paf- coa lhes naõ conílaíTe de certo ferem falias aquellas novas , como os Padres Ihesdiziaó, deffem por averiguado o cativeiro dos Teus , e tomaíTem fatisfaçaô, e vingança delle nas vi- das dos mefmos Padres. Tal era a vida , que aqui viviaó eftes dous Religiofos , morrendo ^ e refufcitando cada dia ; antes morrendo fem refufcicar , porque o perigo fundavafe na in- gratidão , e crueldade d efta gente , que he a mayor do mundo , e a fegtírânça fundavafe na íua fé , que nunca guardarão. §. XVIL *'*«.'g*»á ^ií4'^»VfO .*à\Wa) r iií' informação; Que por ordem do Concelho ultramarino ãeo fobre as coufas do Aíaranhao ao me/mo Concelho CP. ANTÓNIO VIEIRA. SENHOR. m SECRETARIO Manoel Barreto de Sampayo me remetteo por or- dem do Concelho as cartas irciu- fâs do Governador do Marar.haò, e-Officiaes da Camera da Cidade de S. Luís , para que fobre as noticias delias por ferviço de Sua Alteza informe com meu pa- ^4 VOZ POLITICA. parecer. E pofto que eu o nao po0b fazer fem muita repugnância, por haver neceflTariamen- te de fallar nos Relígiofos da minha profiíFaó, obedecendo porém ? como devo , direy com toda a fínceridade o que entender, fegundo as prefentes noticias, e alarga experiência, que tenho daquelle Eftado. E para o fazer com mayor clareza , dividirey efte papel em três partes : na primeira proporey algumas máximas cercas , e infalliveis, deq fe feguem, e feguiráó os danos, que fe padecem: na íegun- da referirey os meyos , que apontaó o Gover- nador , e Officiaes da Camera, examinando fua conveniência , e jufl:ifica(^aò , e na terceira direy , o que me parece fe deve obrar. Primeiramente he certo , que o Eftado do Maranhão eftá na ultima miferia , e nifto con* vem o Governador , e todos j e bafta a mefma miferia para acabar de deflruir , e desfazer o dito Eftado; fe houver alguma na^aó da Euro- pa, que o queira invadir, íeperdará infalliveí> e irreparavelmente. He também certo , que a cau fa da fobredi- ta miferia he a falta de índios , afiim livres, co- mo efcravos, fem osquaes os moradores íe na5 podem fufteníar , nem applícar á cultura à^s no- voz POLITICA. pf ríovas drogas , de que a cerra he capaz , e itiiii- to menos defenderíe em occafiaò de inimic^os. por lerem osPortuguezes poucos , os portos , e lugares , por onde podem fer invadidos , mui- tos , e a cofta vaRiííima , aberta , e fem defen- fa, principalmente tendo já aprendido, e fa- bido os índios, ( defde o tempo , que o Ceará efteve dominado dos Holandezes) que he mui- to mais fuave o jugo dos hereges , que o de taes Catholicos. Com a mefma certeza fe deve fuppor , que os rnefmos índios , que taò neceíTarios íaó , já os naó ha , por eftarem todos os certoens a(jou- tados , e deípovoados em diftancia de trezen- tas , e quatroceiítas legoas , e os poucos , que fe poderão ainda defcubrir , eftaó taõ efcanda- lizados do mao tratamento dos Portuguezes , e taó defenganados de fe lhes naó guardar , o que fe lhes promette , edas tyrannias, que com el- les fe tem ufado , que fera muito difficultofo arrancallos de fuás terras, e mais tendo tantas experiências , de que deícendo para as noffas , todos morrem , e (e tem confumido. Sobre tudo he igualmente certo , e certifli- mo , que ainda que os índios foífem muitos , e todos vieífem fácil , e voluntariamente a vi- ver .:'■!;■ ir>t;)ÍM 94 VOZ POLITICA/ ver entre nós, ou na noffa vizinhança, nenhum numero , ou multidão delles feria baftante ao eftabelecimento do Eftado , e muito menos no augmento, que íe lhe defeja. Aííim o tem mof- trado a experiência ; pois fendo o Maranhão conquiftado no anno de i6iç. havendo acha- do os Portug■ue^es defta Cidade de S. Luiz até o Gurupá mais de quinhentas povoa<^oens de índios, todas muito numerofas , e algumas del- ias tanto, que deitavâó quatro, e cinco mil arcos , quando eu chegue y ao Maranhão , que foy no anno de 1652. tudo ifto eftava defpo- voado , confumido , e reduzido a mui poucas Aldeotas , de todas as quaes naó pode André Vidal ajuntar oitocentos Índios de armas , e toda aquella immenfidadc de gente fe acabou, ou nós a acabámos em pouco mais de trinta annos, fendo conftante eftimaçaó dos mefmos conquiftadores , que depois de fua entrada até aquclle tempo eraõ mortos dos ditos índios mais de dous milhoens de almas , donde fe de- vem notar muito duas coufas. A primeira, que todos eftes índios erao naturaes daquellas mef- mas terras , onde os achámos , com que fe nao pode attribuir tanta mortandade á mudança > e difFerençâ do clima , fenaõ ao exceffivo , t defa- voz POLITICA. P7 defacoílumado trabalho, e a oppreíTaõ , com que eraó tratados. A íegunda , que nefte mef- itio tempo eftando os certoens abertos , e fa- zendofe continuas entradas nelies , foraó tam- bém infinitos os cativos, com que feenchiaó as cafas , e as fazendas dos Portuguezes , e tudo fe confumio em taõ poucos annos. Seja a ultima máxima a caufa única , e ori^ ginal de toda efta deftruiçaó , e miferia , a qual naõ foy , nem he outra , que a infaciavel cu- bica ,e impiedade daquelles moradores , cdos que lá os vaó governar , e ainda de muitos Ec- elefiafticos, que fem ciência , nem confcien- cia ou julgavaó por licitas eílas tyrannias , ou as executâvao , como fe o foíTem , naó valen- do a muitos dos triftes índios o ferem já Chrif- taós , ou vaíTalIos do meímo Rey , para naS lhes affaltarem fuás Aldeyas , e as trazerem in- teiramente cativas , fem mais direito , ( como eu ouvi aos mefmos Capitães daquellas tropas ) que o de poderem mais que elles. E naó era poflível , nem parece o fera , que a juftiça di- vina naó acuda por fua providencia , e que o câftigo de hum Eftado fundado em tanto fan-" gue innocente pare íó na prefente miferia. Suppoftas eftâs máximas , em que naó ha G duvi» h Mi ^8 VOZ POLITICA. duvida, c vindo ás cartas do Governador, ve- jo nellas , cpe as informaçoens , que de lá man- da , faó as mefmas, que de cá levou 5 porque huma das couías , que reprefentou a Sua Alte- z , foy , que naó fana entradas ao certao , íe- naó a pedimento das Cameras ; e ifto mefmo he o que a Camera do Maranhão pede , ínvol- vendo eftes hortiens em tudo , o que dizem os preíuppoftos das mefmas injuftiças , que mais^ Gu menos capeadamente querem profepruir , e tomando por pretexto a coníervaçaó fua , e do Eftado , e augmento da fazenda Real, ^ Dizem , que fem índios forros , e efcravos naó fe pode fuílencar o Eftado , nem cultivar as terras , e affim he , e foy atégora j mas efte meyo por íi fó , quando totalmente foíTe lici- to , naó he fufficiente \ porque fe o mefmo Ef- tado, havendo tido tantos índios de hum, é outro género , tem chegado á fumma miferia, em que hoje fe acha , como he poffivel , que fe polTa reparar da mefma miferia, nem ter íegu- ro , ou provável o feu augmento, eflandoqua- íi extinguidos os índios, e naò os podendo ha- ver ^ fenaó em numero , e proporção incom- piravelmence menor? Dizem outrofi , e pedem , que fe façao en* voz POLITICA. 99 entradas ao certaó;, como nos tempos palia- dos , para trazer eícravos , e que os ditos eicra- vos fe facaó por conta da fazenda Real > a qual avançará'nefte contrato mil e quatrocentos pof cento , vendendoíe aos moradores por pre<^o de trinta mil reis. Também a conta defte avan- ço he certa , e feria muito útil, e com pouco rifco; fe o primeiro contrato, em que íe fun- da o fegundo, foííe licito; mas os mefmos Gffi- ciaes da Camera confeíTaó nas fuás cartas , que os índios de corda , quando muito, poderão fer vinte , ou trinta , fendo certo , que ainda fe alargaó muito ; donde fe fegue , que perten- dem como d^antes os cativeiros injuftos , aíTim como também pertenderaó , que os forros foC- fem trazidos por força , e para iíTo fe ofFere- ciaó aos gaftos da tropa; propoíiçoens ambas mui indignas de fe aprefentarem a hum Prin- cipe tàó juílo , e pio , como Sua Alteza. Dizem mais, que os gaftos di dita tropa, dandofe as muniçoens dos armazaens Reaes, montariaó três , ou quatro mil cruzados ; eií-. to nao poíTo entender ; porque o Padre Fran- cifco Vellofo fez huma miíTaô pelo rio dos To- cantins demais de trezentas legoas , na qual trouxe os Topinambás em numero de mais de Gij mil if * 'ffitii ICO voz POLITICA- mil almas j e eu fiz outra ao Póquís com ou- tros Padres, em que trouxemos mais de oito- centasj e outra a pacificar, e reduzir os Nheen- gaíbas, Anajás, e Mamayanazes , que havia vinte annos nos faziaó guerra , e outra á ferra de Ibiapába , dond^ trouxe todos os índios Per- nambucanos , que fe tinhaó metído cora os Holandezes, naó fallando nas mifloens dos Guajajaras , e dos Catingas , e dos Juruunas , c outras menores , que fizeraó outros Padres , e levando nós aeftas entradas grande numero de índios , e canoas , porque fó no certao dos To- pinambás fe fizeraó de novo cento e vinte, em nenhuma das ditas mifloens entrou a fazenda Real com defpeza de hum fó vintém, exce- pto na da ferra de Ibiapába, aonde o Governa- dor mandou hum barco, que condozio agen- íe , o qual barco nao foy fó a efte fim , íenaó também a refgatar âmbar. E a razaó de nao íer nçceflaria efta defpeza , he porque as ca- noas faó dos índios , e osreraeiros os índios , e as farinhas dos índios , que tudo fazem fem ef- tipendio, e os meímos índios faó, os que ca- ção , e pefcaó para fuftento dos poucos , ou muitos Portuguezes , quando vaó a qualquer entrada. E fe a entrada he a, trazer gente livre, en- voz POLITICA. loi entaõ tomaó os índios codo eíle trabalho com muito gofio para fornecerem , e augmenca- rem com ella fuás Aldeyas. Dizem , e pedem finalmente os Offieiaes da Camera, que Sua Alteza feja fervido de os aliviar do Eftanque do ferro, e mais géneros, que pedíraó os do Pará , allegando para iíTo , que o intento de fe procurarem os taes géneros naquella Capitania he o commercio dos ef- cravos , que nelia fe fazem pela vizinhança do rio das Arriazonas ; e ceifando , como deve de ceíTar, o dito trato por fua manifeíla injufl:i como Capitães Generaes; e aílim o fízeraó femprenas entra* das de refgate, que eraó mui diferentes das outras , pofto que foíTem Padres nelias. E porque nao fique fem repoíb a caíu^ itinia verdadeiramente ridicula de hoje naó fa* zerem os Padres milToens, he neceíTario diftin- guir dous tempos. Defde o anno de 1655. até o de 1661. em que os Padres por ordem del- Rey tiveraó á fua conta todas as Aldeyas, e ín- dios, fizeraó com elles todas as miíToés, q tenho dito , em que defceraó grande quantidade de gentio de diverfas naçoens , e povoarão com ellas as Aldeyas do Pará , e fundarão a da ilha do Sol , que era a mayor , e melhor , que en- tão havia. Depois do dito anno tiraraófe as Aldeyas aos Padres , e ficarão em poder dos Governadores , e das Cameras , que fe ferviaS dos ditos índios, e os puzeraó a elles , eásAl* deyas no eftado , em que hoje as tem. E fe os Padres naó tinhaò índios , com que haviaõ de fazer as miflbens, e levar , e remar as canoas neccffarias á condução da gente ? Naó deve de Li'*' »t.1 .^1 '. iai I , ^ : : li '") ' io8 VOZ POLITICA. de eftar informado o Governador, que tudo ifto fe faz por rios , nem de que a terra he im^- penetravel de bofques , e talhada de lagoas , e incapaz de fe fazer em outra forma. Com tu- do , nem por iíTo deixaó os Padres de trabalhar i||} íenripre , e cultivar do modo , que podem , as l|;l||! relíquias das pobres Aldeyas, nas quaes naô achaó mais que velhos, e velhas inúteis, e cri- anças, e doentes, aos quaes doutrinaó, ead- miniftraõ os Sacramentos j e onde ha commo- didade de defcerem alguns gentios fem tanto apparato , também o fazem , como no Itaquí, Guru pi , e outras partes. Na ultima carta propõem ©Governador a mudança do Capitão mór do Pará para o Ma- ranhão , e íuppoem , que a fua afliftencia ha de íer no Pará. As afliftencias dos Governadores ^ tio Pará fempre foraó fufpeitofas , e mal ava- liadas , moftrando a experiência, que muitos delles queriúõ aflíftir naquella terra menos fá- dia , por eftar mais perto da vindima , e do la- gar, quehe o rio das Amazonas , e as peças, que delle fe tiraõ ; mas como o prefente Go- vernador tem opinião de taõ reólo , e definte- reíTado , e hc taó cuidadofo da obfervancia i das ley5 Reaes , como moftra nas fuás cartas, pare- voz POtlTICA. lop parece , que a fua affiftencia no Pará terá effei- tos contrários , e dalli poderá vigiar melhor, fobre os queoccultamente va6 fazer reígates, e caftigallos com afeveridade e em piar, que convém. No tal caio fera útil a mudança do Capitão mor, porquanto com a affiftencia do Governador no Pará fica ociofa a fua , a qual fe pode empregar melhor no Maranhão , e nao fe lhe faz injuria , fendo o pofto , e o ordenado omefmo. Sobre a introdução da moeda , que tam- bém fe propõem na mefma carta com o avan- ço de cento por cento, naõ me atrevo a dar jui- zo. Reprefentaíeme , que por efte modo íu- birá mnito o preço das drogas de fora, e aba- terá igualmente o das drogas de dentro, com que antes diminuirá , do que crefcerá hum Ef- tado , cujo augmento fe procura j porque ven- dendofe v. g. hum negro por cem patacas , as rr.eímas cem patacas para o mercador feraó fcíTentâ mil reis , e para o morador cento c vinte. E ainda quedehuma, e outra parte fe queiraò pôr as dogras em equilibrio, confide- randofe reciprocamente o valor intrinfeco, ou extrinfeco da moeda , nunca íe podem evitar OS danos, que com o íevantamento da ncíTa fe tem iS; ,;!; i^íii iio VOZ POLITICA. tem experimentado O dinheiro corrente do Maranhão naó faô fó novellos , e pano , íenao tabaco, aíTucar, cravo , e os demais géneros, que fe comraiicaõ j e em qualquer refolucao , que fe tome , fempre íe devem prohibir os no- vellos , como moeda verdadeiramente falia. De tudo o que fica dito , fe colhe , que os meyos apontados pelo Governador , g Came- ra , ( excepto o de que logo fallarey ) nem ca- da hum per Cí j nem todos juntos faõ fuffi cien- tes para o eííícaz remédio do Maranhão. Quando a primeira vez cheguey ao dito Eftado , o achey enfermo defte mefmo mal , e logo avifey a Sua Mageftade das caufas , e apontey os remédios ; e porque parte delles fe na6 applicarao , e os que fe applicaraó, naó fó fe impedirão depois , antes fe elegerão os con- trários , em vez de cobrar faude aquelle cor- po , eftá hoje efpirando , e quafi morto. O mi- lagre de o refuCcitar fó o pôde fazer o poder de Sua Alteza , e o maduro , e acertado confelho de feus Miniftros , a quem repreíento os meyos feguintes. Primeiro ; que Siia Alteza por con- ta de fuaReal fazenda, pois naó ha particula- res , que o façaõ , mande meter no Maranhão competente numero de efcravos de Angola, os voz POLITICA. III OS quaes fe vendaó por prec^o moderado aos moradores , e com largiieza de tempo, em que os poííaõ pagar pelo rendimento dos géneros, que fabricarem. Ffte meyo he apontado pelo Governador , e Officiaes da Camera, e appro- vado por todos os Concelhos ;, e juntas , e con- firmado com os exemplos, e experiência de todo o Brafil , que fó crefceo a opulência de- pois que foy cultivado com os taes efcravos j nem Sua Alteza , e íeus Miniftros devem diffi- cultar íemelhante empenho, edefpeza, pois fe emprega em matéria certa , e naó contin- gente , e na conferva^aò de hum Eftado de quatrocentas legoas de cofta , o mais vizinho de todas as conquiftas , e que pela fertilidade de fuás drogas he appetecido das naçoens eí- trangeiras, as quaes folgarão de difpender pe- lo adquirir muito mais do que fe pede para o confervar. Segundo , e naó menos principal ; que o refgate , ou lacrocinio dos índios chama- dos efcravos totalmente fe prohiba, e que cita prohibi(^a5 fe obferve , e as penas commina- das íe executem inviolavelmente, porque fé o caftigo da terra pode applaear^, e iulpender o do Ceo , como nos enlinaó tantos exemplos da Hiftoriafagradap lendo certo , que em to- m \ 1 §1 . '.', i *' ; i 1 112 VOZ POLITICA. do O domínio de Portugal naõ ha ontra terraj onde tanro langue innocente efteja clanoan- do, e pedindo juftií^a aoCeo, como a do Ma- ranhão. Terceiro ; que na converfaó das almas dos gentios , e cultura dos já bautizados fe ponha o mayor cuidado, para que tenhamos da nof- fa parte a Deos , de quem depende tudo. E pofto que efta cultura feria mais natural , e def- embaraçada nas terras próprias dos gentios, fa- zendoíe nellas Colónias pelos mefmos rios aci- ma ; ( o que já naó he poííivel por eftarem def- povoâdos) ao menos em qualquer outra parte, onde eftiverem j nem os Índios, nem feus Pá- rocos fejaó moleftados dos moradores, o que naó pode fer fem o favor mui declarado de Sua Alteza , e dos que eftaó em feu lugar , fem o qual todos fe lhe atrevem, e tudo fe confunde. Quarto ; que por meyo dos MiíEonarios pacificamente , e fem violência fe procure defcer para a vizinhança densas povoaçoens todo o numero de índios , que fe poderem def- cubrir ; e que defde logo fe appliquem a efte fó minifterio todos os índios , que ha das Al- deyas , em quanto fe naó acabaó de todo , e que eftes fe naó divirtaó a outra alguma occu- paçaó VÕZ POLITICA/ líj pa^áõ, fehâo depois que as Aldeyas antigas efti verem fornecidas , ou edificadas outras de novo. ^ i -;ntí Quinto;que a efte fim fereponhao todas as Aldeyas , e Índios livres delias no antigo efta* doV emqueSuàMágeftade as poz debaixo da ádminiftraçaó dos Religiofos da Companhia^ ou de outra Religião , que melhor, ou ^igual- mente o faça , a qual Religião devefer fómen* te huma pelos grandes inconvenientes , que dõ contrario Ce íeguem , naó fendo poffivel^cori- fervâríe de outra forte a uniaó , e fujeiçaò dos Indiò^, que por ferem taõ poucos, neceíTaria- mente fe haò de tirar de todas as Aldeyas para ô fim , que íe pertende. ' " ^ -^ Sexto ; que depois de fornecidas ,e povoa- das as ditas Aldeyas, entaó fe repartaó os I»i diõs f>arà feryixjo dos moradores v e que nâ di'-» ta repartição naó ténhaó júri fdiòçao, ou exer- cício algum os ditos Padres , e fique toda á dif- pofiçaò do Governador , ou de outra peíToat ou pefloas defíntereíTadas á eleição dos povos, para que fe evite toda a occafiaó de queixa. Sétimo; que no entretanto (e fempre, fe parecer) osvelhos, e mulheres, emoçosdas Aldeyas incapazes de irem ao certaô fe occu- ^GT H pem ^m 114 VOZ POLITICA. |?em nodefl:rid:o delias em lavrar cacao, e chj- t:ras dtogas , de que forem capazes as terras, para que todos, fegundo as fuás tornas , traba- lhem para o bem temporal publico, e augmen- to do Eftado , e rendas Reaes. Ifto he , Senhor , diante de Deos , o que me parece pelas razoens apontadas , e outras , que fe naó podem reduzir em taó breve efcrituraj e quando a fuftancia do que digo fe approve, e fe ofFere^aõ algumas objecções em contrario, creyo , que poderey fatisfazer a ellas , fendo VoÍTa Alteza fervido , que o Conde Prefidente, € o Concelho me ouça, proteftando , que no que toca aos Religiofos-^a Companhia^ fallo com íinceriffimo Ziélo do mayor íerviço de Deos , e de VoíTa Alteza , entendendo , que et les faõ , os que com íii^nores defeitos podem obrar, o que reprefento. CoUegio de Santa Antaõ 31. de Julho de 167 S, .Ç;xhr > '-r, r. .:íj í;o í> Oi ÒknTJ Ou • ■ r A V02 voz DESENGANADA. QVem ainda nao conhece o Jpojlo* Iko efpirito do Tadre^ Jntonio Vieira , ouça efia vo^;^ , efaberd qualfoy o [eu def apego do mundo , equan^ to mayor^ que omefmomundo, ofeu herói- co coração. Saberá o pouco^ que o prendiao as ejlimaçoens dos Trimipes í como entre o encanto das Cortes , que a tantos enfeiti- ça , jouhe terfempre ifento o animo , li- vres os ajfeãos , efuperiores a tudo , o q^e os homem tem por felicidade. r '- ,i m m GAR- ■■''vi . \ f:- > 'à^' .¥ \&...^/'sí:> ''%..^.^^ ^:% •» %-' ^ UA\\> n IKõ Íi\\ DoP. ANTONiO VIEIRA, e heróico defengano , com que deixou a Corte. i Muito Reverendo Padre Provincial do Brafil. Pax Chrijlu 01 Orno eu fazia conta de partir junta- mente com a armada da Bolfa , e as occupaçoensdaquelles últimos dias foraó taó grandes, reíervey o efcre- ver para os dias , cjue nos detivcíTemos na Ilha da Madeira ; mas como Deos difpoz outra coufa> e a armada haverá chegado íem carta Hiij mi- (I ' m 'Uri ii8 VOZ DESENGANADA. minha , ntfta darey conca a V. Rev. de tudo, o que tem paíTado acerca da miíTaõ do Mara- nhão , depois cjue V. Rev. partio defta Corte. A primeira çoufa, em que entendemos, foy em continuar o requerimento da fundarão da milTaó , o qual Sua Mageftade defpachou w na mefma forma , em que lho aprefentámos, ^^ ordenando , que fe nos deííem trezentos e cin- A coenta mil reis para dez fujeitos , a razaô dç 4 trinta e cinco para cada hum , pagos ametade nos dizimos da Bahia, e a outra no contrato do tabaco defta Cidade. Da parte tocante aos I dizimos da Bahia íe nos pafíbu logo provi- faó , fobre a qual replicámos , para que fe fí- zefle claufula , que fe nos pagaria independen- te dos Governadores , como aoBifpo/e Cle- ro da Sé , e nefte requerimento fe trabalhou mais , que no primeiro , porque tivemos quaíi todos contra nós, mas ai fim fevenceo como V. Rev. veria do teor da provifaó. A do taba- co naô íe paíTou logo , porque achámos, que eftava confignado a outros pagamentos , e por- que todos os do Reyno hoje faó mui incertos, e aflím nos pareceo o pedir eftoutra ametade nos dizimos do Rio de Janeiro , como fe con- cedeo , e tamben; fe paflaraó as provifoens, nas És X^y»!"*-^*" -í^iV VOZ DESENGANADA, np nas^quaes naó deve fazer duvida o dizerfe , cjue fe pagará dos fobejos dos dízimos , porque fe entende , do que fobejar dos ordenados , e or- dinárias , que nelles eftaõ confignadas , e naó do paçTamenco de Toldados, a que cambem fe applica , como de muitas claufulas damefma provifaó fe deixa entender. Alcançada a fun- dação , que era a condií^ao , Jim qua non , da miíTaó j conforme as ordens , que trouxe o Pa- dre Francifco Ribeiro , tratámos do modo , com que breve , e commodamente , e fem gas- tos da Provincia podeflem ir para o Maranhão os fujeitos delia , e fe expedirão as cartas para o Conde Governador , e para V. Rev. em que Sua Mageftadc manda , que aos Padres da dita miíTaó fe dê todo o provimento neceífario , e fe tome hum caravellaò á cufta tudo de fua fa- zenda , em que os Padres partaó em compa- nhia da armada até a altura do Rio Grande , em que pode haver perigo , e dalli figaõ fua derrota. Eftas cartas foraó por via do Porto com Filippe Bandeira ; e porque na5 tenho avifo de haverem chegado ás raaós de V. Rev. farey , que fe multipliquem as vias. Sobre ef- tes dous fundamentos refol vemos o Padre Francifco Ribeiro , e eu de tratar da miíTao em H iv for- 120 VOZ DESENGANADA. forma, e íeguindo os defígnios do Padre Luiz Figueira, e as ordens de Sua Mageftade , em que manda , cjue edifiquemos caías , e Igrejas pas três Capitanias do Maranhão , Pará , e Gu- rapa. Alcançámos primeiramente , que em cada huma das ditas Capitanias fe nos défle huma Aldeya para termos índios, e que nos acompanhem , e firvaò nas miíToens indepen- dentes dos Governadores , de que levamos pror viíoens de Sua Mageílade , cujas copias tam- bém remetto a V.R. e de mais dos viaticos, que montarão quatrocentos e vinte mil reis,nos fez mercê Sua Mageftade de fetecentos e cincoen- tâ e féis para provimento das Igrejas , de que logo fe arrecadarão mil cruzados, com as quaes duas efmolas , e outras fe aviou a raiíTaò de tur do o neceílario ás Igrejas , cafas , e refgates na forma, queV.Rev. verá pelas liftas , que com eftavao. Oslujeitos, que nos pareceo admita tir para a miíTaó , foraó os feguintes : O Padre Manoel de Lima , cujos merecimentos V.Rev. muito bem conhece , o qual defefperado de poder profeguir a fua miffaó do Japaõ , dedi- cou/e , (tsr^fua omnla a efta do Maranhão. O Pa- dre Joaõ de Sctomayor , e o Padre Manoel de Soufa /os quaes por judos rçfpeitos eíliveraó occul- t^&v»jiaa»w«it; iíd^ >N> •£' >\^. VOZ DESENGANADA. i2r occulcçs até a vefpera da partida , e o fegiindo p com as ordens tomadas dons mezes havia , íem ninguém oíaber, nem íuípeitar. O Padre Franciíco Veliofo , e o P. Thomé Ribeiro , íem embargo de terem em Coimbra muitas opinioens, ainda de Padres praves , e efpirituaes, que os aconfelhavaó a naô irem á miíTaó, fenaõ depois de acabada a Theologia; mas ellescom grande edificação fe renderão I logo ao que entenderão fer vontade dos Supe- I rioresdeíraProvincia. O Padre Gaípar Frap^o- fo , que leo efte anno a Nona , e he fujeito de grande virtude , recolhimento , e refoluçaó , acabou o curío , e tem muito bom talento de Pregador. O Irmaó Agoftinho Gomes, olim Agoftinho das Chagas, da Irmandade de Santo Ignacio y chamado vulgarmente o Eítudante íanco , porque verdadeiramente o he , e cuido, que V. Rev. o confeíTou algumas vezes. Entrou no Noviciado dia do Efpirito Santo, e foy com cinco mezes de noviço. Além deftes recebe- mos dous irmaós , Joíeph de Mena , e António de Mena, a quem mudámos o nome pela equi- vocâçaó da língua da terra , e hoje íe chamao Jofeph , e António Soares , o primeiro he Clé- rigo dos de Santo Ignacio Cafuifta , homem de -^ gran- / ttm 122 VOZ DESENGANA da; grande orac^aó, o fegundo he Curfifta, mas a melhor habilidade , e o melhor Humanifta do paceo , e febre tudo Anjo de condição , e coí^ tumes , também da Irmandade de Santo l^na- cioj com cpe ficarão fupprindo a menos eftrei- teza do noviciado , que teraó no Maranhão, onde., ou no navio fe lhe haó de deitar as rou- petas. De mais deftes recebemos dous Irmaós Coadjutores, hum dosquâes he Francifco Lo- pes, que fervia eíle Collegio , de cujo efpiri- to naò digo nada , porque o conhece V. Rev, outro Simaó Luiz, píicial de Carpinteiro, homem de muito boj^s coftumes, e preftimo. Naõ conto aqui o Padre Luiz Moniz, porque o levou Deos para fi com grande fentimento noíTo 5 nem ao Padre António Vaz , porque deo caufas para naó ir nefta occafíaõ , das quaes dou conta a V. Rev. em carta particular, e com approvaçaò do Padre Provincial ficou até no- vo aviío de V. Rev. De maneira , que faò os fujeitos, deque fe formou a miflaõ, por todos doze , oito Sacerdotes , dous Irmãos Eftudan- tes , dous Irmaòs Coadjutores. Pareceo-nos ex* ceder tanto o numero, principalmente fuppon- do , que defla Provincia haò de ir , os que Sua Mageftade ordena , porque havendo de fer as Re- fSbgU S^y^i^ d^^^/»^^. ^N VOZ DESENGANADA. 123 Kefidencias três , e havendo de le tratar das miíToens, e converloens do Graõ Pará, e rio das Amazonas, que he o que principalmente fe pertende, naó íè pode acudir a ifto tudo, co- mo convém , com menos de dezoito , ou vinte fujeitos , os quaes Deos fuftentará com a pro- videncia, quecoftuma , aos que por íe empre- garem todos em feuferviíjo, naó reparaó era commodidades próprias; hum punhado de fa- rinha, e hum caranguejo nunca nos pode fal- tar no Brafíl, e em quanto lá houver algodão, e tujucos , também naó nos faltará , de que fa- zer huma roupeta da Companhia ; e efta he a refolu^aó, e defejos , com que imos todos; e confiamos na gra^a de noíTo Senhor , que nos ha de ajudar a perfeverar nelles. Quanto mais^ que lembrado cftará V. Rcv. que na confulti- nha, que V. Rev. fez no íeu cubículo fobre a côngrua , que fe havia de pedir para cada hum dos Miffionarios , em que nos achámos com V. Rev. o Padre Francifco Ribeiro, e eu, íe refol- veo entre todos , que para íuftentar no Mara- nhão hum fujeito baftavaó vinte , ou vinte e cinco mil reis , com que da fuftentaçaó dos dez fica fobejando para quatro , ou cinco ; accref- cem mais os cincoenta mil reis do meu orde- nado II- li M( 124 VOZ DESENGANADA. nado , com que nos remediaremos dous , e co- mo a renda íe nos ha de pagar na Bahia , e Rio de Janeiro, tomando-a os dous Coilegios em íi , e mandandonos afíucares da fua lavra , com que nos façaó efmola dos melhoramentos da fua liberdade , empregandofe tudo aqui nos géneros mais neceíTarios ao Maranhão, íempre virá a chegar lá muito accrefcentado. Bem vejo , que os riícos do mar faó gran- des, mas alguma coufa haó de deixar a Deos, os que dedicaó tudo a dk. No Maranhão, co- ip.o de ]á nos avifaó , também temos ainda al- guns eícravos, e criâ^aó de vacas, de que íe poderáõ ajudar os daquella caía, e fe nas outras, € nas miíToens fe fizer o fruto , que fe efpera, logo Sua Mageftade, como tem promettido, accrefcentará mais renda, enaó faltarão pef- foas particulares, e devotas , que nos ajudem com fuás efmolas. E quando naó haja outras, refolvermehey a imprimir os borroens de meus papelinhos , que íegundo o mundo fe tem en- ganado com elies , cuida o Padre Procurador Geral, que poderá tirar da impreíTaó, com que fuftentar mais dos que agora vaó ; aflim que por falta de íuftenta^aó naó deixe V. Rev. de mandar o numero dos fujeitos , que Sua Ma- sefta- :!!lil!i»wiii.i.i,«« i«*-a»i«B*«!í*"- VOZ DESEÍÍQANADÀ. il$ -geftade pede ; etiéfta confiança , como digo^ refolvenios , que de ca foí?em logo os doze. Difpofta aflim â mifiFaõ, e tomado no navio ò mais largo , e commodo lugar , qíié pdde fer, (òqual também deo ElRey) em 2 z. de Setem- bro começou a partir a frota , e os noíTos Mif- ^Gonarios fe foraò embarcar todos, e eú dosul- ,ti;mos com o Padre Ffancifco Ribeiro , como que nos hiamos defpedir delles ao naviò.^'»'^^ ^ Chegado3 a S. Paulo foubemos , que partjn- Jo os demais , fó o do Maranhão ficava por or- dem do Concelho Ultramarino , para podet levar hum Sindicante , que dous dias antes íe defpachara. Eftava ElRey naquelle dia na C^intâ, fuy lá, e alcançey hum decreto da fua letra, para que o Sind^icanté ficaífe em terra i e o navio do Maranhão partiíTe com a frota; Jndo já para elle com taõ bom deípacho , fou- bemos, que os Gapitaés Mores do Maranhão, c Páránao eftavaõ embarcaídos fpela mefitiá caufa^ Torno a Lisboa aoCofídede Gdefí?i-ifa] doulhe a noticia da nova ordem delRey, e conforme a ella fe mandou aos Captaês Mó- «es ^ que aquplla tioite > fe embarcaííem para darem á vella pela manha , iporque já naò ha- md, terapo^nem maré j ecouj. cftareíbluçaa ''' nos ^M ■ g-W i / iaiÉi !. m l ' U^ VOZDESElSfâANAOAí nos tornámos para caía o Padre FrancifcoRí- bejrp ^ € eu^ deixando os demais embarca ios, ,e pjarecendoíips , qiie com efta diffiiruila^aó íe eiípubriaó rríeltior pscrtieus taEemos.^^^^^M Xo que geralnnence fiíccedeo aflim, naó fal- Xpu.quem entraíTe nas rurpeitas , c déífe ponco 40 P^S^A^^^^íe em amanhecendo ir\e n^eyo re- ^dp„ paraquefoíTe foliar a Sua Altezi; fny, € porque eftavaô para ó íangrar , diííeme , que eíperafle para depois da fangria , tudo a fim .de ii^e deter j roas eu me íahi ^ e me fuy enl- tarcar a toda 4 preffa. Chegando ao navio; íòu- be , que ElRey tinha mandado chamar õMeí*. tre , de que os Padres eftavaõ mui defconfola- dos entendendo, o que podia Cer. Naõ havia já enitpdo o fio paca partir j mais do que huma nao , quçeftava eo^ Paço d^Arcós : pedi ao Pa- dre Francifco Ribeiro, que quizeíTe ir faber, íe hayiadetam^i! aillha:da|Madeira , e íe leva*- j:i^Lh}MJTi paflagéiro j fereu èom o Padre Luiz P«0oa tómey mulas em^Belém , e me parti â ÍLisboa: á porca do Paço achey o Meftre do na- vio do Maranhão , que mediCTe o mandara chamar ElReypara.lhedÍ2:er,; que o:ha|VÍa de mandar enforcar, fç em: ofean^vio foíTe^o Pa« d^eAnconio Vieira. Também aqui ibube^que '?Q£| ti- VO^ DESENGAHADAr fzy tinha mandado Sua Mageftade ao mefmo. na- vio o Padre Biípo do japaó , e o Gapicaó do Pará ; o Bifpo , para que me trouxeííe , e o Ca- pitão conm ordem , que tantoc|ue eu lá naó ef-^ tivefle, partifle jpgop.navio. Gom eftas noti- cias taó declaradas entrey a Sua Alteza , ( por- que ElRey eftava comendo ) e lhe diíí e reíolu- taraente , que eu hia, e havia de ir para o Ma- ranhão , procurando rediiíillo, a que o hou- veíTe por bem , com todas as razoens, e extre- mos, que em femelhantes occafioens cofluma enfinar a dor , e a defefperaçaó ; mas nenhuma baftouj antes me defenganpu Sua Alteza , que me naôcanfaflc , porque ElRey eftava na trief- ma refoluçaó, e nenhuma coufa haveria, que osapartaffe delia. Spbreeflçderengano coníi- derey,„que íe fallafle aSuaiylageftade me po-/ dèria deter rniJito,.e perder a nao dePaço d'Ar.- cos j, e juntamente , (^e partindo, fobre ElRey cxprefla, c prefenciahuente me negar a licen- ça, ficaria a fugida menos decente , para quem a nap quizeffe efcufar com a JMftificaç^& da cauíaj peloque fem lhe failaír, me torney a Belém , onde também chegava de volta o Pa- dre Françifco Ribeiro com repofta , que a nao partia para a Bahia, e que havia de tomar a Ilha f i i 128 voz DESENG ANADÂí Ilha da Madeira , eque tihá lévãria^ PaíTeimá logo á fragata , deixando em terra aos dous Pa- dres , os quaes ambos me diíTeraõ, que naó ap- provavaó aminhâ ¥^íbliíçaQ| ptiftô q' òPâdré Ribeiro' mais fria ménçe,' da á'génte !ÍJl^ji'';SfVw.i;o .«...«•"•T. .«■£ voz DESENGANADA. 131 befle declarar o rneu fentimento , eas jufías ra- zoens delle , que affirmo a V. Rev. foy o ma- yor, q tive em minha vida , com me ter vifto nella tantas vezes com a morte tragada. Ao amanhecer do dia feguince me baceo á porta do CLibicuIo o Padre Francifco Ribeiro corn hum eícrito do Padre Manoel de Lima , fei- to nos almazens , em que o aviíava , como fem embargo de fe paíTar a hum a barca peíca- reja , e haver feguído o navio quaíi todo o dia muitas legoas pela fcarra fòra , o naó podéra al- cançar , e que a,\li eftava prevenindo huma ca- ravella para dentro em vinte e quatro horas fe embarcar até a Ilha da Madeira a tomar lá o navio do Maranhão» Vinha o Padre muito fentido com efta arribada dos Padres , mas ella rne animou de maneira , que no mefmo pon^ to fe me aflentou no coração , que eu havia de ir com elles; eaffim ocomecey logo a inten- tar , metendo o negocio em confciencia , e defcarregando fobre a de Sua Mageftade, e Al- teza a condenação, ou converfaó de muitas almas, que de eu ir, ou ficar, fe poderia íe- guir. 5ua Alteza eftava doente , e neftes dias com futpeitas de perigo > e foy mais fácil de f eríiiadir j q que importou muito , para qu-e I ij tam- éi ^ J . í)»*" 132 voz DESENGANADA. também fe vieíTe a render ElRey , o qual mé levou á Rainha noffa Senhora j, para que me diíTuadíffe ; mas como a piedade em ambos Suas Mageftades he taò grande , ai fim podé^ raó mais as razoens do mayor íerviço de Deos, que todos os outros refpeitos. Se algum facri- ficio fiz a noíTo Senhor nefta jornada , foy em aceicar a licença a ElRey , quando ma conce- deo, porque a fez Sua Mageftade com demonf* traçoens mais que de pay , e affim eu a naõ ti^ ve por íegura, até que ma entregou por eferka, e firmada de fua Real maó na forma da copia, que com efta remetto , em que tenho por par» tícular eircunftancia íer palTada em dia das onze mil Virgens Padroeiras deíle Eftâdot Moftrey-a aos Padres, eos poderes , que nella Sua Mageftade nos dá em ordem á converfaô^ eaflentámos todos, que onaõ partir o navio do Maranhão com a frota , havendo féis me^ zes , que eftavaefperando por ella, o defcobrir- f e a minha jornada > o naó (e poder levar a an- cora, o mandarme ElRey tirar do navio, o fi- car em terra o Padre Manoel de Lima , e o aí'- ffibar depois, e tantas outras coufas particula- res , . vlâíl? ;IjÉ>ltril[JM9kl^.-*.-Iift.^'jk%<.^/-!<'t.' vV ',. VOZ DESENGANADA. 133 que eu foííe , mas que foíTe com approvaçaó, e beneplácito delRey , e com taó particulares recommendacoens luas aos Governadores , e Miniftros daquelías partes , que eíles meyos humanos podem ajudar , e íacilicar os da con- veríaõ , iervindoíe delles a grac^a divina, como na índia fe experimentou pelos favores, com que ElRey D. ]oaó Ilí. aííiftio aos da Compa- nhia contra o poder dos Capitaens das fortale- zas, e outros pouco zelofos Portuguezes , que por feus intereííes os impediaò. Informados eftamos , que em todos os lugares do Mara- nhão ha muito difto , mas quererá Deos noíTo Senhor , que poíTa com elles alguma coufa o medo, já que pode taó pouco a chriftandade. Ficamos para partir em huma caravella, em que também vay hum Defembargador por Sindicante, e o Vigário Geral , e Provi for, am- bos os quaes fao muito noflos amigos ; e efpe- ramos, que com o trato da navegação o íejaó ainda mais, eque como peíToas, que verda-í deiramente faó muito zelofas do fervi ço de Deos, nos ajudem muito ao bom fueceflo^e introdução de noíTos minifterios. O Padre Ma- noel de Lima leva commiffaó do fanto Offi- cio para oque naquelle Eftado íe oíFerecer -:.; liij to-t il)^ 4 134 VOZ DESENGANADA. tocame a efte Tribunal ; e também no Conce- lho Ultramarino lhe quizeraó encarregar o of- hcio de Pay dos Chnlhós , que agora fe cria de novo no Maranhão á imitação da índia , para cjue os índios recorraó a elle , como a feu Confervador , contra todas asvexaçoens, que lhe fizerem os Portuguezes ; mas como o exercício defte cargo he de mui difficultofa execução , e mui odiofa , naó nos pareceo, que convinha, que a levaíTemos , principalmente quando imos fundar de novo , para o que nos he taó neceíTaria a benevolência dos povos 3 e também porque fendo o noflfo principal inten- to abrir novas converíoens pelo certao , e rio acima,na5 ferviria efte officio,mais que de em- baraço, e impedimento a outros mayoresfer-* viços de Deos j e aílim replicámos ao Conce- lho , e a Sua Mageftade , que a rogos noíTos foy fervido aliviamos defte cuidado , como tam- bém do de íermos repartidores dos índios, que por provifaõ antiga eftava encarregado ao Pa- dre Luiz Figueira , e feria hum feminario de ódios , e contradiçoens. Os do Concelho Ul- tramarino , e todos os mais Miniftros , por cu- jas maós paíTaraó eftes dous requerimentos , fe edificarão muito delles, e efperamos que conf- tan- 'X,yÈ.s^^jtí^fiÊÊÁi. ' >AKâjlÉ/^9.^Á'Jt\ 'Tn '. VOZ DESENGANADA. 135 tandolhe , como ha de conftar aos moradores do Maranhão, e Pará, deílas noílas reíiftencias, erephcas , acabaráó cje entender a verdade do zelo, que lá nos leva , e defenganaríe quaó er- rado he o conceito , que tem de nós , em cui- darem , que queremos mais os índios , que fuás ahnas . muico refolutos imos a procurar arran- car eíla pedra de efcandalo dos ânimos dos porcu^uezes, e a na5 fallar eníi índios , mais que no confeíTionario, quando o peqa o remé- dio de luas conlciencias, e a fatisfaçaó das nof- fas; e os índios , que de novo convertermos, deixalloshemos ficar em fuás certas, com que elles , e nós vivamos livres deRes inconvenien- tes, e de todos os outros, que com a vizinhanc^a dos Portuguezes le experimentaó. A diípoíi- ça5 , que fazemos conta d^e feguir neftes prin- cípios, heque o Padre Manoel de Lima fique no Maranhão , eeu com os companheiros, que parecer , palie logo ao Pará a tratar da funda- ção daquella caía , e depois de a deixar em or- dem com os Padres , que a continuem , ir fa- zendo o meímo ao Curupá , e eftar alli mais de âíTento , como a principal Fronteira da conver- íaó, e onde fe ha de aííiftir , e animar efta conquiíla eípiritual. Bem conhecemos „ que os 1 iv prin- Tm 13^ VOZ DESENGANADA. príncipaes foldados delia haó de ftr, os que V. Rev. nos ha de mandar deíTa Província, como mais experimentados , e mais práticos na lín- gua , e mais exercitados nos coftumes defta gente, e modos, por onde fe haó de reduzir. Muito eftimara eu , que meu condifcipulo do Gurío o Padre Franciíco de Moraes quizera, ao menos por alguns annos , vir fer Apoftolo def- te novo mundo , onde naó fó com íua grandg eloquência , eefpirito nos facilitalTe, e vencef- fe as primeiras emprezas , e com feu exemplo nos foíTe diante, enoseafinaíTe, oqtae haver- mos de fazer. Verdadeiramente feria efta ac- -çao mui própria do íeu zelo , eque com gran- de edifícac^aó de toda a Conipanhia coroaria os gloriofos trabalhos , que pela falvaçaó das al- mas em cantas, outras partes tem padecido. O íBefmo defejo de outros fujeitos , grandes lin- guas , que conheci nePTa Província , e o efpe- ro delles , e de outros muitos , que naõ conhe- ço. AíTaz pouco numero he o de féis para tao grande feara. A Província do Bralíl foy prin- cipalmente fundada para a redução , e conver- faõ dos gentios, e naõ havendo nella hoje outra miíTaõj fenaõ efta> jufto he, que naó faltem fu- jeitos paraella^ equeeftes fejaótaes, que a PfO- / e^VÍ-':' !w*'íeaBÍ£íi3 áai34í5^.3M? ,s^^ VOZ DESENGANADA. 137 Província finta muito perdellos , corno acoií- 'tecia a S. Franciíco de Borja, porque nunca melhor ganhados, nem mais bem empregados; que Deos , a quem fe daó , dará outros por el- les , e quando a Província de Portugal , a quem toca menos, naô repara em fe privar dosíujei^ tos de mayores eíperanças para os dar ao Ma- ranhão, mayor obrigacjaõ corre a do Brafil em naó faltar, com os que fónella fe podem achar, que faó os línguas. Bem conhecemos todos o zelo de V. Rev. e ei] o dos Padres Confultores da Província, e affíro naó encarecemos mais efta matéria ^ ten- do por certo , que já que na frota defte anno naó pode fer , na do que vem nos mandará V. Rev. eftes tao defejados , e taõ importantes companheiros, por quem ePcaremosefperando com os braços , e coraçoens abertos. Quando todos féis naó poílaô fer línguas, venha embora algum Irmaó Coadjutor , e fe for ofíicial de carpinteiro, melhor. Também fe todos os línguas naó forem Padres , e houver algum Irmaó Eftudante emi- nente nella , venha embora , que no Maranhão terá eftudos, e Ordens como os demais, que lá vap j que tudo ha de facilitar , e compor o tem- ■ P^ 138 VOZ DESENGANADA. po , e com os primeiros Bifpos , que tiver Por- tugal , o ha de cer cambem aqueliei ovo Elia- do, e fe a converíaó for pordianre, naò íó hum , fenaó muitos 5 e quando roci?lmente o naó haja, faremos o que fazem hoje os, do Bra* fil , que todo o outro inconveniente he menor, que come<^ar huma converíaó íem homens muito práticos n? lingua , principalmente en- tre gente, que mede por ella o rei peito. O Pa- dre Mattheos Delgado nos ediHcou muito com fe paíTar da nao , em que chegou , á cara- vella do Maranhão , em que íe embarca comno^co , naó querendo pela naô perder nem chegar a fua terra , fendo taõ perto , e tendo lá negócios de muita importância j mas deolhe Deos a conhecer, que o que íó impor- ta , he falvar a a'ma própria , e a dos próximos, e por eíle íeu diòt.-me , e outros , que lhe te- nho ouvido, me parece , que nos íerá mui bom companheiro na miflíaó , e mui capaz de dar boa conta de tudo , o que fe lhe encomen- dar. Dou a V. Rev. muitas graças por tal fu- jeito, mas com condiçió, que V. Rev. no lo naó queira djfcouar no numero dos íeis , o qual efperamos muito inteira, e antes actref- cmcado, que di^iinuido. Os noveyque par- ti- '.í! ■A^A^v- I^MSS^^^f^^^^'^^^:'^-^??^^'^^ >-'' voz DESENIGANADA. 135^ tirão no navio doMaranhaõ ^ já lá ePcaráó ho- je com o favor de Deos , e o niefmo Senhor parece, que nos tem dado prendas, de que fem duvida os quiz levar lá , porque ao fegun- dodia, que daqui fahirap, foraò feguidos de bum Turco, que os inveftio, e abalroou, e quando já eftavaó ou rendidos , ou quaíi rendi- dos , vieraó duas fragratas de guerra Francezas, que os livrarão , e tomarão o Turco , e vieraó vender os Mouros ao Algarve. Aflim fe conta por certo, e dizem yque ha em Lisboa Mou- ro, dos que eftiveraó dentro no navio do Ma- ranhão, pofto que eu o nao vi. Bemdito feja o Senhor, que por meyos taò extraordinários acode aos que o bufcaó. Por fim defta y como proteftacaõ da fé , quero dizer , e confeíTar a V. Rev. que tudo, o que nos bons princípios defta miffaó fe tem obrado, fe deve mui par- ticularmente ao zelo , diligencia , c induftria do Padre Procurador Geral Francifco Ribeiro, e tudo faõ efíeitos de fua grande caridade , e pontualidade , com a qual nos aíliftio , encami- nhou , e fiiperintendeo a tudo de maneira , que femelle fcnaó poderá fazer nada. Deos lho pagará, e a V» R. pedimos todos lhe dê y. Rev. por nós as graças. No particular dos ne- w ' i u f>[u\ ■ i-J W 140 voz desenganada: negócios , e demandas da Província , e das ba- ralhas^ que ceve com os Padres defta, e de quão prudente , e conftante fe houve nellas , naô re- firo nada a V. Rev„ porque os effeitos o dizem: fao tudo frutos do feu zelo, ejnizo, eda fua muita religião , e trato familiar com Deos, com que tem edificado muito efta Província, e acreditado a noíí a, V. Rev. depois de o deixar trabalhar aqui o tempo, com que elle fe conformar , lhe dê por premio oirnosajudar na noíTa feara, que; he o que defeja , e a nós por alivio , e confola- çaò o ir emendar , o que tivermos errado , que nao pôde deixar de fer muito ; e verdadeira- paente a grandeza daquella miffaó pede o feu talento , e efpirito. Entretanto V. Rev. nos mande encommendar muito a noíTo Senhor , para que nos faça dignos infl:rumentos de feii mayor fervíço , e gloria 5 e particularraente pe- dimos todos a benção, e fantos facrificios de V. Rev. Lisboa 14. de Novembro de 1 65 2. De V. Rev. filho em O Senhor, António Fieira. 'or:. :twj voz .Vljí'-' ^pjpr^í;;^iw%»t»â!;'».M£ ;í ja^^ v.v ■, ^ VOZ DOUTRINAL Chamou fempre o Tadre António Vieira feia liberdade dos índios j por ella declama nejla vo^. Feí^ fe huma junta na TBahia , e nellajepropu- ^erao algumas duvidas , de que pediaõ de-* cif ao os moradores de S> Taulo , fobre a adminijlraçao dos índios. Deo [eu pare-- cer por mandado de Sua Mageílade o 5^. António Vieira. Qual elle fojfe ^ aqui o ver d , e ouvirá o mundo 5 que ainda que nao leva ff e agora ofeu nome , eãa voi^ hemfe daria a conhecer de quem he^ •S5pi T '%■:.. X ã' ff . .'^""V LJL í, !<: í/ ^^ma ívje!ai»r*|t*»^4!;'»^ tk.<;4>'w/'*r- -.vi 41 nTvin/T x-^/^:r - > - s ..- 4. J '-.. ^f \. .i_ V ■>,. , .. r VOT DoP. ANTÓNIO VIEIRA fobre as duvidas dos moradores de S. Paulo acerca da adminiftra- çaó dos índios..,.. . .,./ .!!:: ■■^f^v Ara fallar com o fundamento ^ /è clareza, c]ue convém em matéria taó importante,€omo da confcien- _-_^. -_Í' cia , e taõ delicada , como da liber- dade , he neceíTario primeiro que tudo fuppor, que índios faó eftes , de que fe trata , e que ín- dios naófaó. . - ,; ... cr-: Saópoisos ditos índios aqiielles/ qiífe vi- vendo livres , e fenhores natàraes das fúas ter- ras, foraõ arrancados delias por fumiDa violên- cia, etyrannia, e trazidos em ferros tom a crueldade , que o mundo fabe , morriendo nsi- /^ §'á\i]i T 144 VOZ doutrinal: tural, e violentamente muitos nos caminlios de muitas legoas até chegarem ás terras de S. Paulo , onde os moradores deilas ( que daqui por diante chamaretnos Pâuliílas) ou os ven- úia:ô, ou lê lerviaoVe fervetti delles como èf- cravos. Efta he a injuftiça , efta a miferia , efte o eftado prefente , e ifto o que faóos índios de S. Paulo. O que naõ fao , fem embargo de tudo ifto, he que naõ faó efcravos , nem ainda vaíTallos, E fera vos naó , porque naó faó tomados em guerra jufta ; e vaOallos também naó, por- que affim como oHelpanhol, ou Genovez cativo em Argel he com tudo vaíTallo do feu Rey , e da Jiia Republica , aílim o naõ deixa de fer o índio , pofto que forc^ado, e cativo , como membro , que he do corpo , e cabe.f,/»fj^'lr'j.-r.j.-*.t:- <.> VOZ DOUTRINAL. 145 feu arbítrio os poffaó obrigar com leys , pen- foens, ou tributos, nem limitar, diminuir, ou alterar a inteireza da fua liberdade , antes pela mefma oppreííaó, c]ue tem padecido, e padecem, Ihesíaó devidas aos dicos índios duas fatishíjoens , numa da parte dos Reys , outra da parte dos Pauliftas. Da parte dos Reys, que como Principes juftos os devem pôr a todos em fua liberdade natural , naó coníentindo em feus Eftados cal tyrannia, antes caftigando íe- veramente os de}inc|uentes nella. E da parte dos Pauliftas , cjue lhes facisfacaó os danos re- cebidos , e lhes reftituaò , e paguem o pre^o do feu íervi(^o , a que por forí^a os obrigarão. E fao taó preciofas eíías duas obriga(;oens primeiro na falta da reftituicaõ dos ditos ín- dios á fua natural liberdade tantas vezes pro- curada pelos Reys Caftelhanos , e Portuguezes, e fempre refiílida pela rebeldia dos Pauliftas, que fó pode efcufar as confciencias Reaes a grande difficuldade de o confeguir. A qual ira- poflibilidade porém fó pode fazer licita ás di- tas Mageftades a diffimulaçao de tolerar feme- Ihantes injufti^as , mas de nenhum modo he baftante a lhe dar direito , ou authoridade de ^ approvar em todo , nem em parte debaixo K de ^ ÉÊÊÊÊi T^6 voz DOUTRINAL^ de qualquer pretexto, conveniência, ou accó- modamento , como o da prefente adminiftra- í^aò , falvo fomente fe for com expreíío, volun- tário, e livre confentimento dos ditos índios, iem força , dolo , ou fímulaçaÓ alguma ; como também fó do mefmo modo podem íer per- doados por elles aos Pauliftas os d.:inos acima referidos, e a fatisfaçaô , e paga do feu fervi- ço , onde muito fe deve advertir , que naó fen- do o dito confentimento totalmente livre , fincero , e verdadeiro , e os índios confentirem na adminiftraçâó , de que fe trata , fó por re- mir lua vexação , nem por ilTo os caiifadores delia hcaráó íeguros cm confciencia, nem po- deráó fer ãbfoltos das violências, que na dita adminiftraçaó, ou debaixo de qualquer outro efpeciofo nome fe continuarem. E ifto fuppofto, depois de venerar quanto devo as refoluçoens , que fe tem dado ás duvi- das dos moradores de S. Paulo , havendo de declarar o meu parecer, como Sua Magefta- de, que Deos guarde , foy fervido de me man- dar ordenar, farey nefte papel duas coufas. Pri- meiro proporey as diíficuldades, e efcrupulos, que nas ditas duvidas , e fua refoluçaó fe me oíFerecem , e depois repreíentarey fegundo as ex* :Kf^'<3tts«a^99dV-' VOZ DOUTRINAL. 147 experiências , que tenho , os meyos , com que facilmente , e Tem eícrupulo fe pôde conle- guir , o que fe pertende. O primeiro efcrupulo, em que fe naó aquie- ta o entendimento fobre o modo, ou modos, com que fe tem por licita a preíente adminif- traçaô, he, que todo o onerofo delia cahe fobrc os índios , e todo o útil íe concede aos Paulif- cas ; todas as conveniências a eftes , e aos índios ferapre miferaveis todas as violências. Na6 he violência , que fe o índio fenhor da ima liber- dade fugir, o paffaó licitamente ir bufcar , e prender, e caíligar por i(ío? Naó he violên- cia , que fem fugir haja de eftar prezo , e ata- do , naó fó a tal terra , fenaó a tal famiha ? Naó he violência, que morrendo o adminiftrador, ou pay de família , hajaó de herdar os filhos a mefma adminiftraçaó, e repartiremfe por el- les os índios? Naó he violência, que fe pof- fãô dar em dote nos cafamentos das filhas ? Naó he violência, que naó tendo o defunto herdeiroSjpoíTateftar da fua adminiftraçaó , ou entre vivos fazer trafpaffo delia a outro , e que experimentem , e padeçaó os índios em ambos os cafos , o que fuccede na differení^a dos fe- nhores aos efcravos ? Naó he violência, que K ij ven- h I T 148 voz DOUTRINAL. / yendendofe a fazenda do adrainiftrador, fe venda cambem a adminiftracaó , e que os !n^ dios com ella, poftoque íenaó chamem ven- didos, reavaliem atai, e cai preço por cada cabeça ? Naò he violência em fim , que im^ portando a hum índio para bem de ína conr fciencia cafarfe com índia de outro morador, o naõ poíTa fazer , fem efte dar outro índio por elle? Eftas faó asclaufolas, que com nome de licitas , e fem nome de violências leva a nova .adminiflraçaó comíigo , baftando fó a primei- ra, para que os.lndios fiquem eni muico peyor eftado , do que agora eftao ; porque agora íe* fugir hora índio, naó íe pode prender licita» mente, nem cí^ftigar por iíío , nem fer obri^ gado â que íirva , íe nao quizer , nem queren- do, que feja mais a eRe, que áqueile ; e do mefmo modo , nem que teftem delle , ou o traípaíTem a outrem ^ nem que Teus filhos , fe os tiver o índio , fiquem com a raefma obriga- ção , &c. E fendo tanto peyor eíf a nova fortu- na , a que os ata , e obriga a adminiílraçaõ, co- mo fe pode crer, nem prefumir, nem fuppor, que a aceitem voluntariamente ? O fegundo efcrupulo da adminiílraçaõ nefta 'ly-CTTjpyyiytV '^ItTtt*-*^'^*^*"' -'— -^■^■'- í*'ij«^>'..y. j(íi VOZ DOUTRINAL. 14^ neíla forma he da parte dos adminiftradores, os € nenhuma fe achará , cpe naò íeja efcrupulo- fâ. Primeiramente o veftido, o íuftento, a cura , e a doutrina , efta obrigação tem todo q legitimo fenhor ao efcravo mais vil , e até aqui ficaõip^uaes os^ndios aos eícravos. O demais, que le reputa por fuíficiente paga, he alguma coufa, ou mimo pelodiícurfo do anno E que fignifica , ou que recebe o índio nefta cha- mada paga fufficiente , a qual o mefmo Paulif- ta ha de avaliar como quizer, e executar, fe quizer? O que alii fe chama alguma coufa , íi^- gnifica coufa pouca , e incerta , fendo que a paga deve fer certa, e determinada, ou taxa- da pela ley , ou pela convenc^aó do trabalhador com quem o aluga fegundo aquillo : Honne ix denario cenyemfUmecuml O mimo fignifica fa- Kiij vor. m !! f i;''' vor, benevolência, ougràçaV e naó juiliça ,,e obrigação je bailará parara imo de hum índia kima faca, ou húafira vermelha. Ifto fe repuca por paga íufficiente dado de quando em quan- do, que em outra parte íe explica por huma, ow áuas vezes no aiino. A pagadeveíe proporcio- nar naó fó ao pezo dotrabalho, fenaó ao tempo je fendo o trabalho do índio de cada dia , como pode a paga fer fufficience , e jufta^ fé naó foi' também de cada dia ? Pôr iíTo fe chama jornal, e por iíTo ameaça Deos fevera- Ênente naó fó aos que a naó pagarem > fenaó âosque a deixarem de hum dia para o outro. iijpÀ razâõ , ou efcufa, que fe dá de fer efta chamada paga taó rara , e taó cenue , he ferem €s índios naturalmente preguiçofos , e de pou* CO trabalhos masas pefloas muito praticas da* quella terra 5 e muito fidedignas affirmaõ, que ds Pauliftas geralmente fe fervem dos ditos ín- dios de pela manhã até noite, como o fazem m negros dó Brafil , e que nas cáfilas de S. Pau- io a Santos naô fó vaó carregados como ho- mens, mas fobrecârregados como azémolâs^ quaíi todos' nus ^^u cingidos com hum trapo, e com huma efpiga de milho por raçaó de ca-^ da dia. Para que fe veja, iie he matcria de ef- í- cru- ^^0Z DOUTRÍNAIi. 151 ^jfrupuló deixar, 9 fuílento, oyçftidp; e tra- balho (pofto que muito recoiuendada a mode- ração de tudo ) no arbitrio dos homens^ que (HO mefmo fuftento > que no mefmo vertido y e ao mdtnom?^Mi^r^íí\m..cf^ índios. ^' ^•'. ;n. í^-.fw. :..:.- r:-- ^-^ orr-í';-!- o terceiro efcrupulo he fundado naleyda liberdade j . e o quarto no exemplo das licitis adminjftraçoens çonfornie a eUa, A definição da liberdade , íegundo as leys , he efta : Natu- ralis facultas ejus , quod de fe , er rehus futs quif" ^m f acere yelit,, E coníiftindo a iiber4âde np direito , e faculdade , que cada; hunci tem de fa- 5z;er de fi , iílo he , de fua peíToa , c de fuás coti- ias, Qquequizeri combineíe agoratudo/ro ^quç na fobredita adminiftraçaó fe permitte^r/^ concede aos adminiftradores^e julguefe>fe çoni mais razaó fe devem chamar cativos, que li- iVres : cativos nas peíloas , cativos nas acçoens, :í:ai;i vos nos bens , de qiie eraó çapazçs , fe tra- balharão para fí. De forte , que de íi> e de feu naõ lhe fica coufa alguma, que por toda a fua .vida naô efteja fujeita aos adminiftradores ;i3)aófóenc^ quanto eftesíviveren), fenap ainda ,(dçpQÍs.dé mortos. vfoiitíí:' r>n 'jft 3uj> / .. .oibnl Eftas/ que nos ctiamafnos ádttiíniflr^çoens, Kiv ti- ■ llj f I S! (li \ Íú\ í 15^ VOZ doutr^aê: tiVeraó íeíj principio em todo orefto díi Amé- rica com nome de Encommendas , por ferem encommendados os índios aos adminiflrado* *es , e porque entre elleè fe forao introduzind^ò vários abufos contra a liberdade dos índios,na5 bailando o caio quarto da Bulia da Cea para os refrear^ como nota em próprios termos dos Índios o venerável, edoutiílimo Padre Joíeph da Cofta, que efcreveo na mefma America ^ depois do Concilio , que fe fez em Lima , c fe examinar a matéria nos Tribunaes deHefpa- nha pêlos Juriftas , e Theologos de mayor no- me, fízeraó os Reys Gâtholicos para defcargo de fuás confcienciâs as leys , de que porey* aqui algumas, referidas , e confirmadas com muitos textos, e Authores por D. Joaó Sò]o!> zano' Pereira, em bum appellido Caftelhanõ,. e em outro Portuguez, e por todos os titulos merecedor do elogio, quelhedeo Madrid na 'âpprova^ao do t^mo -de Indiarum guhernatiomy9L fshct: ^emnaji/a Hi/pama lènemlepp-ieeemíy tem agmfcit?^: ^^'V ' -'^^'^tnlr. il^- ;> :.-.;-^ -Al '- -.n. No primeiro livro pois do dito tomo ca p. i . ». 1 2. prohibindo a ley o fervido peflToal dos índios , ( que he na definição da liberdade a ckuítíla defe^ diz áffim : fará cuja remeSo or- dena, •^^it^^^^fm VOZ DOUTRINAL. 4 5 ^ dém,yntanJo , que daqui adelante no aj4y nife con- /tenta en e(Jas TroVíndas , ni eu ningutia pane ddlas los ferVtctosperfonaleSy que fe reparttnpor yia deiri- hutos a los índios de las Emomiendas , j que losjue- :^es , opírfonas t que hifiertn las tajfas de los tribu- tos , no los tajfenpor ningun cafo en ferytdo perfonal, ni le aya en ejlas cojasy Jin embargo de qua quiera in- trodudon , coftumbre , o cofa, que cerca de ellofe aya permitúdo , fobpena , que el Eficomendero , que nfare de ellos , y contraVmiere a ejlo , por el mifmo cafo aya perdido , y pierdafu Encomienda : lo qual es mi >;o- íuntad y que affije cumpla , y execute , j; que el tribu- to de los dichos ferVicios perfonales fe commute , y pague como fe tajjare en frutos de lo que los mifmos índios tuykren y y cogíèren enfus ti erras , en dinerOy lo que defio fuere para los Indhs mas commodo , y de menos "Vexaciort, Até aqui a dita ley enoendando como contrario á liberdade dos índios oufode elles fervirem peíToalmente aos Encommen- deiros j que faô os adminiftradores , e mandan- do , que o cuidado^ que tem dá adminiftraqaõ^ fe lhes facisfâça dos tributos , que os mefmos Índios coflumaõ pagar a ElRey dos frutos das fuâs lavouras , &g. e paraqtie em nenhum eaf© fé eonfíntaõ os ditos fervií^os peíToaes , declara ótòaley ibid. n. 14. ^ue nòpuedan ks :íI ■1 ■ÉÉÉi 154. VOZ DOUTRINAI. fus deliSíos fer condeiwdos a ningun ferVtdo perfoml de particular es. Debaixo do qual nome de fará- culares fe entendem , além dos me fm os Vice- ReysexpreíTados em muitas provífoens , todos os demais , que nomeadamente fe contém na inefmâ ley citada cap. z. n. 8. a qual manda, ou prohibe : ^e no fe den índios anadie en par' ticular ; fino que , Jipareciere convenir , compelan a los índios a que trabajen , yfe falgan a alquilar a las placas , y lugares públicos ypara que los quehuVteren meneUer , affi Hefpanoles , como atros índios ^ ora fean Minifiros ^ales , o TreUdos , ^ligiones , Sa- cerdotes , DoSlrineros , Hofpltales y y otras qualef-^ quiera Congregaciones yj per fonas de qualquier efta- do que fean , los concierten , y cogan alli por dias , o por f emanas y y ellos Vayan con quien quifaren yypor el tiempo , que lespareciere de fu yoluntad , yfin que nadie los pueda tener contra ella, tajfandole losjor- Males , <(src, ' E/allando outra ley particularmente com osMmiílros cap. 2. n. 4. he notável amiúde* za dos fervidos peíToaes , e domefticos dos ín- dios, que os Reys lhes prohibem, naõ com me- J30S penas , que de perderem os offieios , por ef- ías palavras : Tíi os firvaes de los índios de agua , nl^erya, ni lena,motrQs aproyechamientQs ,nij€ryi' cios : .'^^ySit^SMA-Á^^^. . ■ : . V -. ,.. ■ -v voz DOUTRINAL. 155 cios direSía, ni indireSlamente /ohpena de la nueíira mercedy y deperdmlmtos de Vueíiros officios, E fi- nalmente os meímos Reys num. 9. daõ a razão defte , que parece demafiado aperto , dizendo : forque aunque ejlofea de algnna difccmodidad para los Hejpanoles , pe:^amas la libertada y conferya' clon de los índios, Ifto he o que acerca da dita liberdade dif- poem os Reys Catholicos , como lenhores da America, para fatisfaçaó de fuás confcienciasf, c dos Hefpanhoes , que habitaò aquellas ter- ras , ou as vaó governar , e ifto o que como fu- premos adminiftradores naõ concedem, mas prohibem nas adminiftra^oens dos índios, en- tendendo com todos Teus Concelhos , que de outro modo naó podem fer licitas, E porque o mefmo heomcu parecer, teu*- do quando menos por eftrupulofas as largue* zas, com que fe refponde ás duvidas dos ho* mens de S. Paulo , refta refponder aos funda- mentos delias , como agera farey. E começando por onde começaõ os mef- mosPauliftas, dizendo, que Sua Mageftade lhes concede a ad mi niftraçaô dos índios, íup- poftonaó ferem os ditos índios capazes de fe governarem por íi , nem de fe confcrvarem cm huma MM Tfé VOZ bOUTRINAL; huma vida de algum moJo humana, e políti- ca, nem de Te eItdbeleGerera de outro modo na lanta fé , fe ficarem Tem adminiftradores fobre íi ; efta fuppofiçaó na generalidade , em que íe coma, de nenhum modo fe pôde veri- ficar nos índios de S. Paulo , por quanto os que. os Pauliftas craziaó do cercaó , naó eraó Ta- puyas bárbaros , fenaõ índios aldeados, com cafa , lavouras , e feus mayoraes , a quem obe- deciâó , e os governavaõ com vida defte mo- do humana , e a feu modo politica. E quando menos fe naó devem efquecer das muitas mil almas , que trouxeraó de duas redu(joens de Paraguay, onde todos eraõ Chrif- taós , e os vieraó feguindo , como feus pafto- res, o Padre Simaô Maceta, e o Padre jufto Manzilla , e procurarão no governo da Bahia a fua reílituiçaó , e liberdade , mas fem efFeito. E do meímo lote eraõ aquelles , que cercados em huma grande Igreja em dia de fefta, os me- terão em correntes , matando á efpingarda o feu Pároco , porque osquizdefender , e outros muitos defte género. »:f}^ Mas pofto que com mais piedade , que ex- periência, haja quem os queira medir a todos pela fujeiçaó de pura mente men ores , fa i baõ X :. os Pau- ■..f:^i$t(!i^íg^-y.. voz DODTRINAL. 157 OS Pauliftas , que por iíTomermo, ainda que i voluntariamente íe queiraó os ditos índios íu- jeitar ater a uniaó perpetua acima referida, que a tal íujeiçaó , e a tal vontade he nulla , e invalida. Aííim o eníTna com muitos textos , e Dou- tores o já allegado Solorzano de Indiamm gu» hernâtlone lih, i. caf), 3. n, 55. <(^ 56. onde diz : Et "voluntas hidorum , qui minorum jure \ <6^ priVi^ legiis utuntur , in pernkiem lihertatis ipforum traU non dehety luque impediri , ut eam reMocent j que as L mu- ■M lôi voz DOUTRINAL. mulheres, e os filhes íeGriaõ miílica, e dç^ meííicamente , e a lingua , que nas ditas famí- lias fe falia , he a dos Índios , e a Pomigueza a vaó os mininos aprender a efcola ; e deíunir ef- ta taó natural , ou tâò naturalizada uniaô fe- ria género de crueldade entre os que affim fe criarão, e ha muitos annos vivem. Digo pois, que todos os índios , e índias, que tiverem tal amor a feus chamados fenhores , que queiraoi ficar com elles por fua livre vontade , o poflao fazer fem outra alguma obrigação mais, que a do dito amor , que he o mais doce cativeiro,, £ a liberdade mais livre. Fundafe eftareíoluçaõ no exemplo, e ley expreffa do mefmo Deos em íemelhante cafo^ O cativeiro dos Hebreos na ley antiga durava até féis annos , como confta do cap. 21. dé Êxodo, ediz aíRm a ley : O feryo Hehreo naÕ ferVírá mm , que até o fexto annOy e no principio do fitimofahirá li'Vre ; mas fe elle dijfer : Eu amo a mett fenhor , e mulher , e filhos , e naÕ me quero fahir d& fua ca/a , nem ufar de Uberdade j em tal cafo o ditm firyo fique ferVmdo a [eu fenhor perpetuamente : ^odfi dlxerit feryus : Diíigo dominum meum, uxo--- rem tr liberos , non egrediar likr . . , Erk eiferyu^ O ■ at^"íte,. VOZ DOUTRINAL. 1^3 G mefmo digo eu , mas com certa limita- rão ( que também a tinha aquelle fervo até o anno do Jubileo. ) A limitarão no noíTo cafo he , que fe o índio fe arrepender pelo tempo adiante de eílar na mefma caía , o poíTa fazer , e paíTarfe para alguma das Aldeyas de admi- niftraçaó , de que logo fe tratará , e defta limi- tação fe feguiráó dous grandes effeitos. O pri- meiro ;, que affim fe confervará a inteireza da liberdade dos índios. Ofegundo, que o fe- nhor , ou amo com receyo de o perder , e que fe lhe vá de cafa , o tratará com tal benignida- de, e fatisfaçaó fua , que conferve a mefma vontade , e amor , com que fe quiz perpetuar em fua companhia , e por efte meyo de tanta fuavidade ficaráó os homens , e familias de S. Paulo com grande numero de índios , e os me- lhores, e mais úteis , dos quaes licitamente fe polTaó ajudar , e fervir fem outra paga, ou eílipendio, que o bom, eamoravel trato, de que clles fe contentem. O fegundo meyo he , que todos os outros índios, que naó tiverem efte amor afeus cha- mados fenhores, divididos pelos lugares mais accommodados , fe ponhaó em numerofas Al- deyas cora feus Párocos, e adminiftradores, Lij onde !•'! ■ í "'. Í'l li"! li k :2l 1^4 VOZ DOUTRINAL. onde no erpiricual poíTaó fer doutrinados, e viver á ley de Chriftaós , e temporalmente fer governados de níiodo, que ellesYe confervem e firvaó por feu eftipendio aos Portusuezes pe- lo modo feguinte. Quanto aos Párocos ; que eftes íejaó re- guiares , ou feculares , e que os índios dos dí- zimos, que naÓ pagaó das fuás lavouras, lhes fa- ^ao a côngrua conveniente , com que teraó a doutrina neceffaria , e quem lhes adminiftre os Sacramentos a toda a hora , e lhes diga MiíTa nos dias de guarda , e naõ vi vaó , fendo bau- tizados, como muitos hoje, que apenas huma vez no anno vem á ígrej a . Quanto aos adminifiradores 3 que ponha SuaMageftade hum tributo aos índios (como vaíTallos, que já feraó) nas fuás lavouras, o qual tributo íirva de fallario aos adminiftrado- res.e que eftes fejao alguns daquelles morado- res de S. Paulo 5 os quaes foraõ taó timoratos , que no tempo das entradas ao certaó nunca quizeraó ter parte nellas , merecendo por iíTo efta confiança , e premio ; e digo, fallando def- tes índios , vaffallos , quejdJeraS, porque o eftilo dos pados , que fe fazem com os ifentos , he jurarem elles juntamente vaffallagem a Sua Mageftade. ^ ^ q^an* voz doutrinal: Ws (Quanto ao fervido dos Portuguezes ; que os índios das dicas adminiftraçoens fiquem obrigados aelle alternativamente quatro até féis mezes no anno , como no Maranhão o aceitarão com applaufo de todos ; e que o ef- tipendio , ou jornal década dia feja, o que for maisjufto, eaccommodado a contentamento das partes, fendo a eípecie da paga em pand de algodão , como he eoftume aos Índios , e de mais commodidade em S. Paulo, no qual pà» no teraó fufficientemente , com que fe veftir a fi , a fuás mulheres , e filhos. E quanto ao exercicio dos índios nos me- zes livres 5 que os adminiftradores os naó dei- xem eftar ociofos , obrigando-os cem a mode- ração de livres a que trabalhem , e façaó fuás lavouras,de que abundantemente fc fuftentem, eftando a prefente repartição, para que licita, e fuavemente fe configaõ os quatro intentos fan- tos , e verdadeiramente Reaes de Sua Magefta- de , a faber , a liberdade dos índios , a confci- encia dos Pauliftas , a confervaçaõ de fuás po- voaçoens , e ferviço , e remédio de fuás famí- lias. E porque naõ ha leys taõjuftas, eleves, que naó neceffitem de quem as faça executar, L iij ^^uâÇ- ' iJ w :..:t x66 voz DOUTRINAL. guardar ; para efte fim parece conveniente , que aílim como em Pernambuco , e no R io de Janeiro houve antigamente adminiftradores Ecciefiafticos, affim haja em S. Paulo hum de conhecido zelo , e juftiça , que todos os annos Vffíte aquellas Capitanias , e tenha cuidado , de que tudo o dito fe obferve , e nos cafos, que fe oíFerecerem , os polTa , e faiba decidir. Efte he o meu parecer , falvo meliori judi- cio. Bahk 12, de Julho de 16(^4. VOZ AGRADECIDA. ESta vo^ he já dos últimos annos do immortal Vieira , taÕ vegeta ainda^ e t ao ciar a^ como a dos an-' nos mais robujlos : nao caducou aquella ^ ao cabeça , e em toda a idade foy fem- pre firme , e igual o feujuií^o. Jqui com ref peito/o objequio dá graças ao Sereniffe- mo ^ey D. Tedro de continuarlhe a hon-' ra de fervirfe delle , e da Companhia de fefus naquella America ; e com aquella inimitável fuavidade de eftilo^ e rara cem- prehenfaode tudo^ informa a Sua Magef- tade (obre o que foy fervido mandallo con^ fultar. ' , Li7 CARTA ,1^ i '0»^^#M.- ■'»:..:?!?:; Íj Roftrado aos Reaes pès de V. Ma- geftâde, depois de dar infinitas gra- das a Deos pelos extremos de pieda- de, ezelo fem duvida inípirado do Ceo, com que V. Mageftade nefta Conquif- ta , e em todas naó fó manda , mas por fua Real peíToa com o primeiro, é principal cuir dado íe digna de attender á propagação da fé , íal- m ^ íÊÊÊmm i^o voz AGRSADECIDA. € falvaçao das almas, naò igualando fomente, mas excedendo o exemplo dos Senhores Reys predeceffores de V. Mageftade , qvie fobre ef- tes fundamentos mais proajraraõ augmentar oReyno de Chrifto, que a própria Monarquia prometcida pelo mefmo Senhor , de que cUe os fez íenhores :í com o mefmo reconheci- mento em nome de toda a Companhia be- jo asmaõsa V. Mageftade pela raerce incom- parável de íehaver dignado íervir delia em obra de tanto agrado , e gloria de ambas as Mageftades. Dando conta' das miíTóerisV além da rela- ííít^>Í!*W-'-'v VOZ AGRADECIDA. 173 emtres, ou quatro bárbaros , conformandoíe todos os outros com a mudança , eraó dez Mif- íionarios, cjue affiftiaó com elles namefma , e nas outras Aldeyas da mefma naí^só, que ef- tavaõ expoftos ao perigo , e mais perto delle, quando o houveíTe ; e eu , como quem íe tem embarcado trinca è íeis vezes a Franca , Ingla- terra , Holanda , Itália , Maranhão , Brafil, ( to- das em fervido de V. Mageftade ) julguey , que em duvida antes devia feguir o parecer dos pi- lotos, que o dos paílageiros , naó fallando na minha experiência de cinco annos nas Aldeyas i do Brafil , e nove nas do Maranhão , Graó Pa- rá , e Rio das Amazonas , de dtverfiílimas lín- guas , e naçoens , em que fiz muitas mudan- ças com grande focego , e felicidade , ajudan- dome , quando era neceftario , do nome , e au- thoridade dos Governadores , e nas mayores Gccaíioens de féis foldados fomente , como pode teftimunhar Manoel Guedes, que ainda he vivo , Sargento mór do Pará. A efte pmpofito naõ deixarey de reprefen- tar a V. Mageftade, por fer exemplo próxima^ o que os dias paffados fuccedeo nas Cabecei- ras do rio deS. Francifco em diftancia mais de eento e cincoenta legoas defta Cidade , on- 174 VOZ AGRADECIDA. de dous Miffionarios doutrinavao varias na- ^oens de Tapuyas novos , e muito menos do- mefticos, queeftes. Houve huma notável en- chente naquelle rio , que alagava , e levou ca- ías 5 e como os Padres oíFereceíTem MiíTas , e oraçoens , para que ceflaffe a inundação , fem effeito , entenderão os bárbaros , que o Deos dos Chriftaos naÓ era taò poderofo , como os Padres lhes prégavaô , e fe refolveraò alguns a fazer outro Deos, que os livrafle, efcolhendo para iíTo o que entre elles tinha melhor pre- fença , e mais avultada eftafura. Para o confti- tuirera na divindade o incenfaraó com fumo de tabaco , que elle recebia com a boca aber- ta , e logo lhe fizeraõ fua Igreja ao modo das noíTas , Fabricada com ramos de palmas. Sa^ bendo ifto hum dos Portuguezes^ Sargento Mór dos Curraleiros daquelles campos , acomt panhado de hum fó mulato feu fe foy aonde eftavaó os novos idolatras, e mandando amar- rar com as maós atraz ao Deos , obrigou aos demais , que queimaííem a Igreja , que lhe íinhaó levantado , amea«kAÍ.»rSi'''''-^ 7 VOZ AGRADECIDA. 17 les dedicado fomente a aprender a fua linpiia , diflficiildade , que fó conhecem , os que a ex- periniientaó. Eftes fujeiros fazem fe muito de vagar , e fó na menor idade faò aptos; para o que mais enfina a natureza , que a arte , principalmente onde a naó ha. Por efta caufa foraó para o Ma- ranhão muitos moços , e porque fendo novas as naçoens , e novas as linguas , naó podiaó os velhos tellas aprendic?o antes; quanto mais, que os velhos em tempos taó trabalhofos mais depreíTa fe achaó nas fepulturas, que entre os vivos. Em dous mezes morrerão agora nefte Collegio da Bahia oito de todas as idades , e principalmente hum , que tinha vinte annos das miíToens com ciência de muitas linguas barbaras , e outro já baftantemente pratico nellas, com perda irreparável. Só Deoscom- prehende os feus juizos , e nós os devemos ad- mirar , e venerar, e naó defmayar, como fa- zemos, confiderando, que dos Apoftolos ef- colhidos para converter o mundo fó hum chegou a fer velho. Iftohe, Senhor, oque poíTorefponder á carta de V. Mageftade , que torno a pôr fobre a cabeça , ficando todos os defta pequena , e M di- MH lÊÊm 178 VOZ AGRADECIDA. dilatadiffinya Província rogando ao Author da vida nos conferve a de V. Mageílade por lar- gos , e feliciffimos annos , como a Chriftanda- de , e ps vaíTalIos de V. Mageftade havemos mifter. Bahia i. de Junho de 1691. Jntonlo Fieira. VOZ 4*«CL.?^P(l|ij|pSBI»^-*,. .; VOZ GENEROSA. M pouca efcrhura da grandifji' mo brado ejía vo^. O T. Antó- nio Vieira , que em toda a Europa foy o credito de Tortugal , merecia dpa^ tria em cada terra hum a ejlatua , mas vio o mundo muito contrários effeitos , e pare- cer barbara contra elle huma nação culta. Queime embora Hcro^írato o templo de T>lana^ ( que era huma das maravilhas do mundo ) que o incendiário ficardinfame^ e o templo Jempre celebrado , e illuftre : 1 1- la 5 ( di^ia o mayor jui^o da antiguidade Séneca ) quae fapienrem tuentur, à fla- ma , & incurfii tuta funt : nullum in- troitum praebent excelfa, inexpugna- bilia , Diis aequa. Quem nem com os pri- meiros movimentos fe altera nos aggra'- vos , eíld/obre a esfera ordinária dos c^" raçoens humanos. tjK^ioúit*^ CARTA DoP. ANTÓNIO VIEIRA PARA O MARQUEZ DE GOUVEA. hb si M vb SENHOR MARQUEZ. Parrandofe António Vieira .dos pês do fenhor Marquez Mordoma Mor, cabido de ftiagra^a, como fe havia, ou devia tratar dahi por diante, ícnaõ como morto? Affim o fiz em hum cafo taó fero remédio , depois de appro- vado , e confirmado por quem fó o podia im- pedir , nao me deixando a íua aufencia lugar para orecurfo, nem a fua reíoluçaó liberdade para a emenda. Alongarme tanto da prefeni^a?, c favor de Y. Excellencia he certo foy para M iij coníi f^^ i Negííufe o Marquez , quando o P. António Vieira o buícou, pa ia íe dcípe- dir na au- fencia , que fazia para o Biaíil. Foy fumma a amizade, que com o Padre Viei- ra teve o Marquez, e igual a pe- na de que deisaíle Portugal. 182 VOZ GENEROSA. çom Deos o mayorfacrificio, naó tendo eu na vida outra coLiíâ, quelhe facrificarj mas nao me perfiiadi, cjiie para com V. Exccllencia fof- fe tâ^ grande culpa. Com tudo a confeíley na ultima hora a quem podia manifeftar a V. Ex- celjencia a minha caó grande, como jufta dor, naó fem baflantès íinaes de arrependimento. PuyidofQ do perdaó , pelo que tinha experi- mentador, nem apedílío a V. Exceliencia me atrevi. Efta fov a caufa do meu filencio , to- ipan;dd por caftigo a perpetua fepultura.^ Q Agora me referem taes demonftraçoens da clemência de V. Exceliencia , e da antiga mer- cê, e afFedo j com que V. Excellencil fe di- gnava honrarme , que naó poíTo duvidar , me tem V. Exceliencia reílítuído , ou refufcitado i fua graça^ E conto poderey eu declarar o exceffo de alegria, eeftimaçaó, com que re- cebi efta nova, fenaó com dizer proftrado aos tpés de V. Exceliencia, que já vivo , e que já Deos me tem pagado o meímo facrificio, com quedefejey deixar tudo , e a mim mefmo por íeu amor ? Pague o mefmo Senhor , que fó po- de , a V. Exceliencia eílataó mal merecida ca- ridade , que naó tem outro nome , e fejâ em conferVar , ê augmeatar a V. Exceliencia por mui- ip VGZ GENEECbãX. 183 mtfitos annòs a inteira faude , e vida , como eu fiefíca eeíTo de rogar a fua divina Mapeftade em todos os meus facrificios^ e ora<^"oens, oue •fiefte deferro , aqueeílcu retirado ;, fenaóíaó mais fervorofa^ , faõ mais continuas 5 e fempre Côfti tanta fuípenfao, e cuidado, oue naó me àáúáo nenhumas novas do mundo , fó as de V. Excellencia procuro , e foliei to em todos os líâ VÍ6s , qu e vem de ffe R ey n o. ' OiHras chegarão cá , (para que dê conta de mim a V. Excellencia ccmo dantes as cuaes fe me quizeraó encubrir ao principio ; mas de • ráfo taitiànho echo , que foy forca chegarem- ftiê aos ouvidos. Náò merecia António Vi ei- ^iiudeao ra iaos Portuguezes, depois de ter padecido tan-rríojoTom to pbr amor da fuâ pátria , e arriícado tantas?"^ "''°' • 1 11 11 . . /^ homens vis vezes a viêâ por ella , que lhe anticipaíTem as^o povo cinzas, e lhe fiz^efrem taó honradas exéquias. fnltí° a! Fézme porém 'D^õs tanta merce,q nem com ós^^^^y^jJ"*^'- primeiros movimentos fenti hum tao exorbi- Coimbra cante aggravo, o qiial fe me naó havia de fazer, l;,"^";'^^^ feosexecòtòresV ou motores naó eRiVeíTem^^^"^'^"^^" fííerfti^di aos , que antes lifongeavaó, que^^^^^^^ dfàô, aquém haõ fez a ddmoríftra^aó, que de- rerá Quizeraó muitos, que a fízeffe eu , è que ntí^ primeiro Áavio maadâfle impedir a impref- -^''' Miv íaõ iS4 VOZ GENEROSA. faó do livro , que lá tinha chegado , e que naõ efcreveíTe mais na lingua de huma nação, que affim me tratava , antes o fizeíTe na Caftelha- nn, Italiana, ou outra eftrangeira , em cuja piedade tinha mais feguro o credito, que na íuria dos meus naturaes. Eu com tudo tive por mais conforme á vida, ou morte, que pro^ feílo, naó alterar nada do exercicio, em que me tomou efte cafo ; e affim continuarey em quanto me naõ conftar , que V. Excellencia approva o contrario. Aqui naò ha outra novidade, que a mu- dança do governo, em que a inteireza, defin- tereÓTe , e exemplo de vida , e conftancia até o fim de Roque da Cofta deixara canonizada pa^ ra fempre fua memoria , e pode V. Excellen- cia dar credito a efte meu teftimunhoj porque fazendome as poucas vezes , que nos encontrá- mos , todo o favor , os que demais perto me to-» cavaó j Ihonao deviaõ. Elle fe embarcou na mefnria hora , em que entregou o baftaó , e af- fim naõ tenho lugar de eftender mais eftas re- gras, efperando naó feraõ hoje menos aceitas a V. Excellencia , que no tempo, e fortuna, de que nunca perderey as faudades. Excellen- tiffimo Senhor. Deos guarde a Excellentifli^. ma ^^^^S^l^^i^-: ■> i-i VOZ GENEROSA. 18$ sna peíToa de VoíTa Excellencia muitos annos, como eíle Reyno , e os criados de VoíTa Ex- cellencia havemos mifter, Bahia 25. de Mayo dei6Sz. Àntmo VUlra. VOZ ií' .\ ?8i .áaoaiiídD sov ^:í,:1 liíloV ^b aobsi :- ^ 'T^oÍ '$ÍI'? orno- ã:(viv\ Ú^Ji\ú:^ '£'^' 5;o/ voz PARENETICA, OU EXHORTATORIA. Eejla vo^ hum alto pregão do valero/o animo , e forte efpirito do grande Vieira. EJlava na embarcação , expul/ado da terra , e das mijfoens do Maranhão pela fúria de re- voítofos amotinadores , que violentiamente o arrancarão do CoUegioy e o remettiao pa^ ra o %eyno por fe oppor , e clamar contra os cativeiros injuBos. T>alli lhes deo o ul- timo brado y e entre pri^oensfempre livre j do navio , em que o tinhao reclujo , de/pe- dio mais rayos de lu^/obre os que ejlavao em terra , do que o celebrado Jrchimedes das torres de SiracuJJa vibrou com [eus ej- pelhof fogo [obre a armada dos "I^omanos no mar. PRO- ^ilii Oa ^ii^^>\^ yU.i u'.vtó ;i,\j'.j- u-t\j -., '^^ \')\:i f 'O \Jí-i 0. Ci^i íy ií5\^> U^^Ç^^^I^^ i PROTESTO. iolo' aUE O P ADRE ANTÓNIO V1EIR,A FEZ A' CAMER A , E MAIS NOBREZA '"''-* D A CIDADE D E BETHLEM D o P A R A'> ^ Tara nao ferem expdfos dãqmííâ Con^ quífia os ladres Mijjionarios da Com- panhia defefus. Efta hora , que faó as féis da ma- nhã, tive noticia, que V. Mercês fe ajunravaõ ás nove j e pofto que atégora ( a exemplode Chrifto nof- fo Senhor em fua paixaõ ) tomey por repof- ta de tudo , o que comigo fe tem obrado , oíí- lencio ; por ultimo defcargo de minha confci- encia , e pela obrigação , que me corre de pro- curar ií\ 1 ipo voz PAREN ÉTICA, CLirâr tapbem p das confciencias de V . Mer- cês me refolvi a repreíentar , e lembrar a V. Mercês o que psrmítce aeílreiteza do tempo. Primeiro que tudo pe(^o a V. Mercês quei- râóier-; o que diOFernefte papel , com os olhos poftos ,eqi Deos , eem fuás confciencias, e na conca> que lhe haó de dar , e com os corações limpos de toda a paixaó , e afFedto , e defejofos fomente de acercar, como V. Mercês faò obri- gados. Com efle prefuppoíto lembro primeira» mente a V. Mercês, que faó Chriftaõs, eque naõ ha exemplo nas hiílorias de que homens Chriftaõs , eCathoUcos fizeíTem , o que nefte Eftadodo Maranhão fe tem começado a fazer,' evay continuando. Os Padres da Companhia de Jefus, que.rdidimos nefte Eftado, nao fó fomos Religiofos por profiíTaó , como os de- mais, mas por officio fomos Párocos das ígre- jasjjoslndios, donde fomos ex pui fados ; e tirar os Párocos ás Igrej as he exceííb , que temem commetter ainda aquelles , c[ negaó a obedi- ência á Sé Apoftolicà , como le vê em muitas Cidades, e Paroquias de Alemanha, que haven- do, mais de cento e cincoenta annos, q nega- rão a obediência aoSummoPomifice, coníer- vao ou EXHORTATORÍ A. ipi vaõ com tudo es Párocos , e Paftores nas Tuas Igrejas , contra o que fe tem feito nefte Eftado. Lembro a V. .Mercês ^ cjue a refidençia dos ditos Párocos em Tuas Igrejas , e muito mais o terem as Igrejas Párocos he de direito divino indiípenfavel , e que nem o Papa os pode ti- rar delias. Pôde o Papa tirar hum Pároco^ e pôr ©atro 5 mas tirar os Párocos ás Igrejas , co- mo riefte Eftado fe tem feito, naó pode omef- mo Papa. E ainda ,que V. Mercês digaó, que em iugar dos Padres da Companhia poderáó fupprir outros Párocos , hecoufa , quenaópo* dem V. Mercês fazer, nem hâf nefte Eftado quem tenha poder para iftb ; porque o Summo Pontiftce tem commettido elle poder íó a Sua Mageftade , e Sua Mageftade tem pofto ppr Párocos das Chriftandades dos índios aos Pa- dres da Companhia , como confta de fuás leysj e quaefquer outros , que fe naó puzerem pelo dito Senhor, feraó ilkgitimos , e naó feraó Pá- rocos, de que fe íeguem graviffimos abfurdos, e/ainda nullidades nos Sacramentos. Lembro a V. Mercês , que naó ha naçaõ inò mundo , que mais neceffite da affifteneia dos Párocos^ que os Índios natúraes défla terra por fuâ natural inconftancia , e rudeza j eque da ipi voz PARENETICA, da falta , e aufencia dos ditos Párocos fe fegue,' e fe vay já experimentando a ruina de muitas almas ^ de todas as quaes Y. Mercês haó de dar conta a Deos. t Lembroa V. Mercês, que além dos Chrif- . taõs antigos tem os Padres Miííionarios de prçfente á fua conta as na(joens dos Topinam- bás , Poquig^arás , Catingas , Bocas , Mapuás, Anajás , Mamayanás , Aroans , Paricis , Tapa* jós , Ururucus , Marias , Juruúnas ^ Nonhúnas, è os Pocnjds , Aroaquís , e outros, em que fe come(ja a introduzir a pratica da noíTa fanta fé; das quaes naçdins muitos eftao já bautizados, e outros fe vaó catequizando , e bautizando ; e com eílas novidades taó alheyas de tudo , o que fe prometteo ás ditas naçoens, naó ha du- vida , qUe fe tornarão os mais delles para o mato I e para fuás gentilidades , em que fó o inferno fica de ganho , e o Eftado affim no temporal, como no efpi ritual com grandiífi- ma perda , além de tanta infinidade de almas, de que também Deos ha de pedir conta a V. Mercês. nr í Lembro a V. Mercês , que todas eílas na- çoens eftaó na5 fó reduzidas á Igreja, mas também â obediência , e vaíTallagem de Sua Ma- 1 OU EXHORT ATORI A. 153 M^eftade v a qual obediência, e vaíTallagem aceitarão por felhe promeccer, ejiirar em no- me do dico Senhor , que viviriaó debaixo do- pãtrocinio dos Padres y e que em tudo o mais^ íe. Ibeguardariaõ as leys , e reginfientos de Sua Mageftade; que lhe foraó declaradas , e fc fize- raó difto papeis auchencicos , que foraô remet- tidos á Corte , para fe lançarem na Torre do Tombo conforme as ordens de Sua Magefta-^ de 5 e quebrandbfe , como fe quebraó _, as ditas' condiçoens aos dicos índios, ficaõ elles livres das obrigac^oens da dita vaíTallagem, e nós fem direito de lhe fazer guerra , antes elles no la po- derão fazer, e ainda matar aos Padres (co- mo fe teme ) por lhe haverem promettido ^ o que fe lhe naó cumprio. #í Lembro a V. Mercês , que no modo , com que fe procede , e tem procedido contra os Pa- dres , íe tem quebrado , e quebraó todas as immunidades Éccleíiafticas , e que notoria- mente eftaó excommungados por efta caufa muitos moradores defte Eftado , osquaes naó- podem ouvir MiíTa, nem confeffarfe, nem receber o fantiffimo Sacramento, e fe o fazem, he com novo peccado. B f e acafo Ha algum ConfeíTor , que lhes naã advirta efla verdade,] N . . fera"' %^ ¥az parenetigaj;) f^i-âportemoiv 4e adizer>; ou porqufijiaQ tcÉk: lido çom accençaó , o gue diípoem os fagra- x3ò5 Cânones neftes caíos , os cjiiaes fagcadoSi Cânones; e os Ooutores , que tinifortn emente QSjdedaraõ, fendo y. Mercês fervidos, feunoí^i traráólogo, para-que V. Mercês conheçaóo filado , em que eftaó íuas almas. o' Lembro a V. Mercês, que os Padres dá Companhia nefte Eftado , além das fuás im- íjiunidades çommuas a todos os Religiofos, faó oeíToas mandadas ao dito Eftado por SuaMa- g^ílade , e podas nos lugares , em que eftavaó, líor^SuaMageftade, e quefem ordem , e autho- ridade dò dito Senhor , ainda que foraôhuns quadrilheiros , nao podiaó íer tirados dos ditos lugares j no qual ponto fe deve outrofi confi- derar ( ex:onfiderar muito ) que V.Merces tem mandado ao Reyno Procurador a dar conta a Sua Mageftade , e antes de fer ouvido o dito Procurador, e haver repofta de Sua Mageftade, fera muito mal contado a V. Mercês executav tem , e innovarem eouía alguma. ^ Lembro a V. Mercês , que o fim, por que Sua Mageftade mandou os ditos Padres da Companhia a efte Eftado, foy para defcacre* gar nelles, e com elles íua confcienciáypor-> que :»í,V.-i •- '♦ . OUBXHQRWADTDRm. kwS icom que os Senhores Reys de Portugal poffuem èf- tas j e as demais Conquiftas , epor defcargo da -dita obrigaíjaô de fua Goníciencia mandou Sua Mageftade aõs Padres da Companhia aefte •Éftado , como confta das m^fmas leys ^ e da caíta de provifaó paíTada aos ditos Padres» Jtil- guem V. Mercês agora , como poderá fer acei»- to a Sua Mageftade tirarem V». Mercês das Chriftandades os miniftros da dita doutrina , e fe lhes eftá bem a V. Mercês tomarem fobre íí> e impedirem por taes meyos os defcargos dá ^ ■ confciencia delRey. Lembro a V. Mercês, que fomos Miííiona- rios do Summo Pontífice, e Pregadores da^^^ fé, e miniftros da propaga<^a6 delia, equaó grande macula , e afronta fera do nome Por- tuguez dizerfe no mundo , que os que tem dilatado a fé por todo elle , faó agora , os que prendem , c defterrao os Pregadores da mefma fé , e os que os tem ido bufcar , e tirar por for- ça de fuás miflocns, e de entre os gentios , e novos Chríilaós , que eftaó convertendo ; e que csasmplo he efte-para as gentilidades, e que ;.. Nij ref- reípeito Eeraãpsiáídi^síaosSafcef dórès-y xjuaip- do affim os vem tratar peiosiPortupuezes ? ííeípezas da fazenda de SuaMageftâde/ e da iGompanhia; porque nenhurâ Padre ha eftran- geiro , í^u€; até cliêgar. ao .Maranhão nao fiança de gafto rriais. dè qidnhbntos umisdoi ; , e :a?pi:ii- íMéira^ miíTaó , em.que eu vira ^ foz; de gaíio dez rnil cruzados, e a fegunda cinco mil crEtr zados/ e a do Padre Manoel Nunes doíisf.mii cruzados ,.e. a do Padre Francifco Gon^çalves mil d quinhentos cruzados. E fendo os ditos Padres ora embarcados para o Reyno , hefoc^ ça, que fe façaõ outros muitos gaftos}efefo^ rem tomadoís pelos Turcos^ (comoàefjpoííivel) ainda ferap exceffiyamènte muita moy otes^^ B V. Mercês devem coníiderar, a quem pretencè a refticuiaaõ de tudo ifto, e por cuja fazenda íe ha delwer., tendo ellesiBadres fem^^re reque^ rido >> e pTOteftado ,^ que vaó violintatiiendéf^ com.O>he.notori-o;; ji^^l co òi/rívii. ':• ^ , ni:ir)íi-yi''^ Lembro mais a V;:^ Mértesv qoê eu vim i sita Cidade p tendo í:apiíuladjO>co.iía m túbto^ dores do Pará 3 quèivieffe a ejlaf ajúftár^atíTíV; Mercês , o que íoflTe para quietarão ,^ e mayor íi^ bem OUEXHORTATORIA. 1^7 bem de todo o Eftado, a quem me offereci em cKegándo, e me torna a offerecer de novo ; e que V. Mercês me tem metido em humacara- vella cora guardas mui apertadas , fendo ifto naó fó concratodoo.outro direito divino , e humano, mas ainda contra o direito das Gen- tes, fegundo o qual V. Mercês tinhaõ obrigar çaó ou de me ouvir , ou de me deixar em mi^ nha liberdade. . Lembro mais a V. Mercês , que quando V^ Mercês naõ queiraó vir em o ajuftamento fo- bredito, ficaráó V. Mercês naò lo com ©en- cargo, do que fe fizer no Maranhão, fenaó eambern de tudo o que fe fizer nas Capitanias do Para , onde eftâ o pezo da gentilidade , e chriftandades ; por quanto aquellas Capitanias fe tem compromettido a feguir o que V. Mer- cês fizerem ; e entre os inconvenientes , que fe podem feguir proximamente nas ditas Capita- nias, advirto a V. Mercês, que defde vinte e dous de Abril defte anno eftava ordenada no Paca huma entrada ao certao ,, para íe fazerem peças para o ferviço do Eftado , e que as ditas peças, fe fe fizerem fem oMiíIionario, eCa* bo , que requerem as leys de Sua Mageftade , fiâõ ficarão legitimamente cativas , p queiíçrâ - í Niij èm 'ú.i I íl li ip8 VOZ PARENETIGA, J €iti grande dano de todos. í%. - ^ -; ^5 Lembro outroíi a V. Mercês, cjue fendo eu oPrelado da Companhia de Jelus nefte Ef*.^ fado, e fendo todos os oucros Religiofos da Companhia fubditos meus , e os Prelados fei- tos por mim, e eftando em mim fó os poderes, e a jurifdicçaõ , V. Mercês fizeraò tudo , o cjué fe cem feito, e o vaó continuando, fem me fal- larem , nem ouvirem huma fó palavra , que he contra toda arazaó, e direito. Lembro a V. Mercês , que fe acafo ha al- guma queixa contra mim ,-ou contra os outros Religiofos da Companhia, que confiderem V. Mercês , que os homens , ainda que fejaó R.e^ ligiofos , naó faó Anjos , e que com razaõ , ou (em ella he força , que fem pre haja queixas, e que dos mefmos Apoftolos de Chtifto as hou*» ve ; e que quando liouveíTe as ditas queixas, ti* nhaõ V. Mercês obrigação de mo advertir, ou requerer, oquenunca fizeraõ, tendo o eu pe- dido a V. Mercês , tanto que a efte Eftado vie« raõ as ditas leys ,: como fiz em preíença do Go- vernador André Vidal de Negreiros aos fenho^. res Officiaes da Camera daqoelle anno , pedin* dolhe , que fe houveíTe alguma queixa^ ma fc ZQÍÍttúj porque eu daria fati^çao a todas > coo • (íí^í mo ou EXHORTATORIA. \99 mo no mefmo dia dey , e havendo, cjue emen- dar , o emendaria. Lembro a V* Mercês , que eu naô tenho outro Juiz , mais que o Summo Pondfice , e o Padre Geral da Companhia, e (no tocante ás kys) a SuaMagelhde ; com tudo pelobeni da paz , e quietação defte Eílado eftou promptD> e me offereço naó fó ao ajuftamento , que te- nho dito , mas a dar racisfaí^aó a V. Mercês de todas , e quaefquer queixas, que contra mini, ou contra os ReligioÍGS da Companhia haja acerca dos índios , e obrigac^oens delles áRe*- publica , de que fe trata \ e nefte ponto me of- fereço a moítrar com evidencia a V. Mercês AS féis coufas /eguintes. Primeira ; que em nenhuma coufa tomey, nem tomou a Companhia mais jurifdicçaó, que aquella, que lhe daó as leys , e regimen- tos de Sua Mageftade. -ii Segunda ; que fempre interpretey as ditas leys a beneficio do povo , e que £e fe quebra- rão por nofla parte em alguma coufa, foy fem- pre a favor do povo, e contra os índios. Terceira ; que muitas vezes difle aos Offi- çiaes das Cameras defte Eftado, e a outras pef* foasmayores, que fenas leys, e regimento de Niv Sua ' íi soo voz PA RENETIG A, Sua Mageftade , ou na intelligencia delias ha^ via alguma çouía, cjue moílraíle a experiên- cia fer menos útil ao bem do Eftado, que as conferiffemos entre nós , e que em tudo , o que naò houveíTe peccado , eu me affignaria , e fa- ria , que fua Mageftade omandaíTe confirma- do 5 e que fe em alguma coufa nos naó ajuftaf- femos , fe remetteflrem as razoens de ambas as partes ao dito Senhor, para as mandar rcfol- ver. Lj ;;íiQuartâ ; que em todo efte Eftado naó hou- ve nunca morador , nem Miniftro algum Ec-, defiaftico, ou fecular , que procuraíTe o bem ainda temporal do dico Eftado , nem com ma- jor zelo, nem com mayores effeitos, que eu; e que todo o bem temporal , que ha no Eftado, foy procurado , e confeguido, e confervado por minha diligencia ; e que houvera no dito Eftado outros muitos bens temporaes , que eu quiz accrefcentar nelle , fe houvera quem qui- zeffe concorrer para iffo , e que os naó ha, por- que naó quizeraó. Quinta; que na matéria de interefiíe naõ adquiri , nem adquirio a Companhia nefte Ef- tado , depois que eu vim a elle , coufa algumaj ances cedeo fempre a Companhia de muitos OUEXHORTATORIA. 201 intereíTes , que licitamente lhe com petiâó ; e deo íempre muito do feu , e tudo quanto tinh^ com grande exceílo. i Sexta ; que nunca efcrevi a Sua Mageftade, nem a Miniftro , nem a peflba alguma , coufa , que foffe contra o bem temporal , nem efpiri* | tualdefteEftado, equeaflim omoftrarey nas jV mefm as cartas , de que fe cuida o contrario, í'^ as quaes eftaó entendidas aveíTamente ; e fe ifto , e o demais íenaó crê , experimentefe , e ouçaóme. Finalmente, fenhores , lembro a V. Mer- cês, que vim para efte Eftado , deixando em Portugal a quieta<^aõ da minha cella , e o mais, que lá tinha , ou podia ter , (6 com zelo da fal- , vaçaõ das almas , e que procurey a de V. Mer- cês nas doutrinas , nas praticas , nos fermoens com a vontade, que V. Mercês poderiaõ en^ tender da efficacia , com que o trabalhava pelo períuádir ; e no minifterio da falvaí^aó dos ín- dios , e propagação da fé naó perdoey a ne- nhum trabalho , nem rifco da vida por mar , e por terra, e como a todos he notório j pofto que tudo ifto mifturado com grandes imper-» feiçoens , como taó indigno Religioío , que íbu. E pofto que naõ poflb lembrar a V. Mer- cês 2 o 2 VOZ P ARENETIC A, ces a confiança , que Sua Mageílade fez fem- pre da minha fidelidade , e por fer a mayor parte defta confiança em negócios occukos, baila a dos públicos, com que Sua Mageílade me enviou a Holanda , França, Icalia, pondo em minhas maós as mayores dependências da fua Coroa , para que V. Mercês devaõ prefu- mir, que naó pode caber no Padre António Vieira coufa, que feja contra eíla fidelidade, e zelo , como he dizerem , que me quero unir com os Holandezes contra eíle Eflado, e ou- tras coufas taó ridiculas , como eíla. Nem obíla , que fe diga , que as coufas alheyas defla verdade vem provadas, porque papeis feitos por inimigos , e por Miniílros in- competentes , e com tantas outras nullidades naõ fazem prova alguma, e muito menos em terra , onde todos V. Mercês fequeixaò de fal- fos teílimunhos , e em tempo , onde os Padres | da Companhia , e eu particularmente eftamos tanto no ódio de todos , como V. Mercês , e os eíFeitosodizem. E fe iílo fe naò deve prefumir de mim, também fenaó deve prefumir dos Religiofos, que eílaó nas Chriílandades do Gurupâ , Nhe^ engaíbas , e Rio das Amazonas , em que ba tan- ou EXHORTATORIA. 20^3* itantas peíToas de tanta authoridade , letras , e virtude , e que deixarão fuás pátrias , e fe vie- raó meter naquellas brenhas, padecendo tan- tos trabalhos , e perigos pela falvaçaó das al- mas. Por remate lembro a V. Mercês , que tu- do o que V. Mercês pertendem , ou podem l||íi|i pertender com eftas inquietaçoens da Republi- ™P ca , encargos de confciencia , e incommodi- dades dos moradores , e tantas outras moleftias, e cfcandalos do Eftado , tudo iílo digo fe pode confeguir com paz , e quietação , e em grande fervido de Deòs , e de Sua Mageftade , e utili- dade de todos; e deftes dous meyos parece , que dióta o mefmo Deos, e a boa razaò, fe deve ef- Hjl 1; colher o fegundo. 111^ ^ Ifto digo , fenhores , a V. Mercês por def- çargo de minha confciencia , ficando prom- pto , e ofterecido para refponder , e íatisfazer lllfe a qualquer objecção , ou duvida , que haja con- tra o dito nefte papel, ou contra qualquer cou- fa , das que correrão neíle Eftado por minha conta ; e para me accommodar na melhoria delias a tudo , o que for jufto , e conveniente , como fempre quiz, procurey , e pedi , V. Mer- cês refolveráó , o qne forem lêrvidos , fobre o SOt que 204 voz PARENETICA, que naõ peço > nem exhorto , nem perfuado- coufa alguma , e fó fico rogando a Deos inípi- re a V. Mercês , o que for mais ferviço feu , è' gloria fua. Se Deos quizer , o que eu pertendia, elle o difporá , e fe elle o naó quizer , também eu o naõ quero. O raefmo Senhor , que ha de pedir conca a V. Mercês , os alumee , e lhes dê muita de fua graça, como Y. Mercês bao mifter. Defta caravella em 1 8. de Agofto de i66i. Jntonio Fieira. VOZ '"íT*B?iií,- VOZ MÉTRICA. FOy alJumpto defta vo^ huma Cuf- todia de cortiça , que comfumma miudeí^a , afte ^ e perfeição fe:^ o engenhofiffimo *?. Sebajliaõ de Novaes da Companhia de^efus^ obra-^ que foy na^ queile lempo , e o feria nejle de ajfomhro pela fubtile^a do ferro , que a lavrou , e muito mayor pela perna do grande Fieiray que miúda , difcreta ye elegantijjimamen^ te a defcreveo em idade jd , em que , ef- quecidas as Adufas y levaÕ todas as atten- çoens mais graves , e elevados ejludos. -V;-;ii. - ^^ :si^ ' ■ *• - «i ■1:^1 ^IW^' V.lU UU' SEU CÓRTEX EUCHARISTICUS. Pyxidem Eiicharifticam è fuberis cortice miro artificio fabrefaólam, ôc íciilpturae artis legibus ingeniofiffime inventam , conditamque à Pacre Sebaftiano de Novaes Societatis jefu , canebat modulatiffimp, merum fundens ab ore me- ios, P, Antoniiis Vieira , ut in divinis , íic in biimanioribus litteris apprime excLíltus. QUo me Mufa raptt } Lmgrniíj^ rellSlus JpoUo Extmiios ítetum, juVenes,qnos hjímusj ignesy Frigentemque íetate^phet recalefcerefiãmam^ Corticls eft qu^ forma /enem pulchenima yatem Concípere Aonios effieta mente furores , SufpenfanKim lyram ,fra^umque refumere pleBrum Cogít, •* ^p '* 208 voz MÉTRICA. Coglt , eum» Stat cortke firmou j^ái Àra "1 voz MÉTRICA. 20^ Jrafacro fuhjeSia oneri , (^t^am textilis extra Circumdat bomhixy <^ diVite cortice ycjíit . Jrte lahoratus Thjgiíe. De corttce fapra Candelahra putes duro tornata metatlo, Hinc y atcjue hinc longts funalihus ai ta corufcanty Sufi entant que faces , ardetfine lumlne cor ttx. Ceraflult , gutt^eque h^rent , O* flammea furjum Lingua tremlt , ánere/que cadunty fumique \apcran$ Indemni flamma : ignis erat y/iflamma nociret. Litertexta no^o dijcurrens fajcta Indo Totumjerpu opus , feu ViVi cortkis anguts : Hic latet y hk exit , certoque errore meantet Jmplkaty acfolVtt nodos , quos plurima cudit Llttera , O* arcanos aperU doSllffima feníus, Cortkeamque animat molemj reddkque loquentem» Ipja caput tollens camerato ccrtkejfjfik, Í)imldíumque cay^o athm de cortkepandk , Ccnvexoque tholo claudk. Super emtnet ako Vertke Crux triplkl clayo , tkuloque trilingui, Et terno pendemls adhuc torrente cruoris, Stypkeque intonfo , mdifque fimilllma Vera, /ícfola levttate mtnor, Stat plena doloris Hinc Mater , Matrifque myusfiatfilmlnãe^ Et tortex inutroquegemk. S^o tender et ultra Tslon halm fufpenfa manus. Stetk hkopus, hk ar si Ais operifimm impomns , finemque opus artu O w^ m ' i 2 IO VOZ MÉTRICA. MiKântur totam ^ mírantur lumlna partes y Et molemjtm moleflupent ; nam rmchina tanta Se mlnor , <(9* maior ( diBu mirahile ) tota Cogitur tncubltum : duhketne Cíecafatert ^Itígío Immenfum, partfo qui claudttur orbe, Tíon vifumque Deum Vifa de pyxlde credat, Síc ténues olim telas ducehat Jrachie, 'Dlfcernens digito {fi Vera efi fama ) fagaci, ^icfugerent óculos y formas Vif neque negarent ^ojfe videri, lllic ingentes Hamine parVo Cernere erat muros y urbes , monte/que gigante/que. Et marta , <^ terras yajtifjima corpora mundi, Ac mundum late totum , non mole minorem, Sed magnum , dequ tlemque/ui , nubefque volantes ^efuper y atque altas claudentia fydera nubes, ISlec premitur natura loco y/e tota. , fua/que Agnofcit partes , fpatiifque extendltur requis, Hoc opus y hos aufus , quos efi mentita Vetufiasy FTiC noVitas mamfeíia probat : fit fabula VeraXy Non tenmfilo Verax y fed cortice crajfoy, Materiaquejrudi : tanta efi in cufpide Vir tus ^ Subtiliqué manu ludentis gratia ccc//; Materiam non vincit opus, fed crefctt ab tila. Sic manus omnipotensy qu^e cocU exfragmlnefolem-^ Cmdiderat , de limo hominem formaVit , ut ip/e Ultima fama fuícforet, ^ labor ultimusartis. Ergo voz MÉTRICA. 211 Ergo Age magne Deus,qm paryo magnus In orle ey, Teque fores maior , /tpojjes cr e/cere j fedem Gaude implere datam Joliumque a/cende yerendum, Tslonferh hdC óculos radlanúbus mia columnis, Clara mkante auro , flammasye Imitante pyropo^ Sed ftupor , Cr pallor Veneranda palatia yejiit\ Kimirum decet hízc ohfcurum regia /olem. Corticeam ne fperm domnm , concede renatum Excipiant , quales natum excepere Penates. Efi pjínis domus ifia tui, ^r^efepe tegehat, Arcehatqm niyes córtex yfuh cortice prima Uberafuxijii , ^fletu maduere recenti CorticeíC tahuUy tanti cunahula ^gis, Vellerefuh niyeo paflorem te ejfe memento^ Cerne tuas , qui pai cts, oyesy <^ fanguine Jígnas. Gaude habitare humilem [Crfaíius damnabis uhi^m) ^ajloris de more cafam :fub cortice pajlor v^t" Defendi ty toieratque hyemes , de cortice fontem, Lacque bibit , córtex paflorum ^Jl tota fupellex, ;; 1 fn}sque animte generofa cohors, quas lawpade Cétcã Almafides praity 0* mentem, fenfuj que fequent es ií ir Você catenatosobfctit as ftíiit ad aras, P*f? Didcis ubi fine fraude Mus , pne corpore candur \ Attonitos idem guíiatus Indít y i^ idem Kon guíiatus alit , "Vos certe numine plenu m, Corticem adorate , éitque noVts accumbite mtnps : , O ij Gran-' à 212 VOZ MÉTRICA. Grandla In exíguo conViVta corttce clauclit , Sacramentum tngem : pani/que, caroque, Deufque ( JZuíe trla diVinae funt omnia fercula menfte ) Omnla fuh trí/>líCí VeUfitur tegmtne , nam fub ^ane caro , fuh carne Deus , /uh corttce fanis MeBa^ obteSla latent : yocat ad conVma córtex : Córtex nutrit apes , <(s* apes ad dulcia caHas Telia yocat córtex. Huc crebro examine mentes Injiigateptasy circumque "Volate frequentes, Cejf ate exfuccos rores de flore caduco Sugere , claufa llquant alium hcec ahearia florem, Etfragrant meliore thymo. Vos.fuglte mella, T^os haurite fa^os ^ yohis hdtcctauUra redundant : Now rarí^ hk Uerilifudant de corttce guitoe^ Melle ftuit córtex , currunt de corttce fontes^ ^terni fontes , àrmellea flumlna manant^ Huc aylda properatefitt y(ítttlf)fejitm fons,, Haurirlque ardet , eeu turgeat ubere mater. TSloSle , dieque pdtet , necjanua claudkur ulli-, ^od Jt j quas pofuk folahk re^erentla^ Vaha^ Cardine conttngat reyohto cernere claufas , Horrefce , o quifquís jpalknfque , atque ore trementl Intlfum {fie mandat amor ) legc cortke carmen. Sifte gradum infelix , latec hic mors : non ego meníam, Mens tua mucavitj faftum eftex melle vcnenu. Efta . '2E?'dísÇ,- VOZ MÉTRICA. 213 Ti Efta engenhofiffima ,' e divina Poefia anda pelas maós dos curiofos , efcrica com grande variedade: três exemplares vimos da mao, e letra de feu incomparável Autor , todos tam- bém com mudança varia, na5 fe contentando efte engenho fummo, e elevadiffimo , do que primeiro tinha eícrito , para que naô o mudaf- fe , ou eraèndâíTe no outro. Daqui nafceo, qu^e conforme o exemplar, que cada curiofo vio^af- fim tirou a fua copia. AÍlim fuccedeo ao Autor das Ephemeridâs Eucharifticas o P. António Maria Bònucci da Companhia de Jeíus, o qual no feu terceiro Trimeftre deo a luz efta Poefia com alguma diverfidade, do que aqui a pomos, para a qual nos valemos de todos três origi- naes. Houve quem elogiando o/fobredito Poe- ma fez o íeguintc Epigramma. ' j i i' » b , , ^ Oiij TI- 4, ... a 14 VOZ MÉTRICA. tímida musa Talem Apollinem reverita , veniam poílulat, E P I G RA M M A. D Um canis, attoUts /imul, <^ rem deprimis-, ipfá Cre/cit ah intento, yileí^ipfatuo, Jrtis opus leSium longe fuperemimt artem ; ^umque artem oflendis, qu^^ue alia ars fit inersl Sed quia mens h^eret dubitans , yideatne , legatne, ^^^ Sitne tua , incertum eft , ars aliena minor. '-'^ Crederf fas unum : Ji taliafcribere talis ' jírspotuit , nihiL eft , quodf acere ars nequeatf Auólore Anonymo. yo23 '^rmÈÊSm-: voz ZELOSA. O Intento dejla vo^ foy expor ao Sereniffimo %ey D.Ajfonfo VI. que de novo tinha impunhado o fceptro de Tortugal , a obrigação , que a Coroa tem de propagar a fé nas Conquijlas. JÍqui move com as Efcrituras [agradas : aqui allega o acerto das leys %eaes , jd pojlas para ejle fim : aqui ardentemente pede , quefe nao mudem : aquife oppoem d cubica dos que per tendem fe revoguem* Falia em fim com os olhos najalvaçaõdas almas , no augmento dos bons coíiumes , e quanto he decente d Aíagejlade nas fuás maduras refolupoens a conflancia. CARTA, QUE AO SERENÍSSIMO REY DE PORTUGAL D. AFFONSO VI. E S C R E V E O fobre as cpufas do Maranhão o PADRE ANTÓNIO VIEIRA- SENHO R. Providencia divina, que por fees^ alciflimos juizos poz nas maós de V. Mageftade o fceptro de Portugal em tâò tenros annos , fe fervirá de âffiílir^ c aiumear a alma de V. Mageftade ^,1MA 21 8 voz ZELOSA. com tiópartiçiiiares auxílios de feu eípirito, e graça, como o pezo de taõ dilatada Monarquia ein^aes çircunftancias de tempo ha mifter j e nósos.Religio(bsdeftâ miflaó de V. Magefta- de naó úeíTaremos de affim o pedir coatinua- mente a Deos , offerecendo por efta tençaó , e pela vida , e felicidade de V. Mageftade to- dos os noíTos facrificios, oraçoens , e trabalhos. Sua Mageftade , que eftá no C2eo ^ me tinha ordenado pelo Real zelo , e piedade , corti qiie defejava ver adiantada a fé neftas Conquiftas do Maranhão , enviaíTe fempre avifar a Sua Mageftade do que os Miíííoharios dâ Compa- nhia foíTem obrando, e do que foíTe neceíTa- rioparabem, e confervaçaõ das miíToens, e augmento da Chriftandade , como fiz larga- mente nos navios do anno pafl^ado , efperando as refoluçoens de algumas propoftas de muita importância , as quaes fe deviaó perder no naufrágio defta ultima embarcação , de que efcapando as pefloas , e outras couías de menor importância , fó os defpachos de V. Mageftade naó appâreceraó. As mift'oens, Senhor, continuao, como tenho avifado, com mui conhecido proveito efpiritual , e falvaçaó de muitas almas aflim de ^i. de gentios novaincnte convertidos, como dos que já tinhaó nome de Chriftaós. Só a miíTaã dos Pacajás , v o igar«iente chamada a. Entrada do Ouro , teve o fim ; que taô mao nome lhe pronofticâva. Gaftaraó nella dez mezes qua- renta Portuguezes , que a ella foraó com du- zentos índios. Deftes morrerão a mayor parte pela fome , e exceííivo trabalho ; e também morreo o Padre Joaó de Sotomayor , tendo jâ reduzido á fé , e á obediência de V. Magefta- de quinhentos índios, queeraó, os que na- quella paragem havia da naçaõ Pacajá , e mui- tos outros da nação dos Pirapes , que também eftavao abalados para fe defcerem com elle. Eftas, Senhor, faô as minas certas defte Efta- do, que a fama das de ouro, e prata fempre íòy pretexto; com que daqui fehiao bufcar as outras minas , que fe achaó nas veas dos índios, e nunca as houve nas da terra. Ô mao fucceíTo , e tardança defta miíTao fufpendeo outra , que eu havia de fazer pelo rio das Amazonas, onde eftive três mezes, ef- perandopela efcolta dos Portuguezes , e fe re- ferveu para a Primavera defte annoj fica-fe apreftando para partir. Aos índios livres das Aldeyas , e aos efcra- VQS "■lii 220 VOZ ZELOSA. VOS dos Portuguezes affini das povoaçocns , como das fuás lavouras fe acode com grande continuação, e trabalho, catequizando-os, bau- tizando-os , confeíTando-os , e adminiftrando- Ihes todos os. Sacramentos , e fupprindo pela mayor parte o officio dos Curas , c^ue naó ha, ou naõ podem acudir a lugares tao diftantes; iiern tem a intelligencia da lingiaa, fem a qual íe naõ pode obrar nada com efta gente. Sao raivi poucos já , os que naó tcnhaõ noticia dos principaes myfterios denoíTa íanta fé , quanta bàfte para a falyaçaõ j . e os das Aldeyas , com quem principalmente affiftimos , eftaó taô bem inftruidos em toda a doutrina Ghrifta, co- mo os Portuguezes , que melhor a fabem. Em fim vivem , e morrem os índios , cojno Chrif- taos , o qiie fe naó ufava antes de virmos a ef-- tas terras , morrendo quafi todos fem confif- faó, e muitos fembautifmo. A injuftiça , que fe ufava: com os índios li- vres , fervindoft^ delles os Portuguezes , fem lhes pagarem feu trabalho , ie tem evitado em grande parte com o modo da repartição , que fe difpoemnp regimento 5 poilo que asoccar fioens do ferviço , ou chamado ferviçodeV, Magfiftade; tem^fidú tantas eílesdoiisaonos, que I voz ZELOSA. 221 que naó tiveraô os pobres índios lugar de lo- grarem os féis mezes , qne V. Ivíageftade lhes manda dar para acudirem a ftias lavouras , e cafas , e para conhecerem, que naó fao cativos. Raro he o índio das Aldeyas , que em cada bum deftes dous annos naó tenha fervido mais de dez mezeK e com tudo ainda os Portugue- zes fc queixaó , como fe poderão os índios no mefmo tempo fervir aos particulares, emais ào commum» O anno paflado mandey as lif- tas , para que por ellas conftafle , e também kaô as defte anno , fendo neceííarioi Gs refgates dos efcravos (que he outro pon- to do intereíle dos moradores defte Eílado ) fe fizeraõneftes dbus annos com pouca fortuna, porque fe quizeraò fazer com mayor cubica. Logo que cheguey do íReyno, diíTe ao Gover- nador André Vidal ,.que feria bem fe fizeíle Z' miíTaõ alugar^onde houvefle muitos efcravos, que refgatar , para que a Republica experi- mentaíTer as utilidades , que tinha na. nova ley de V. Mageftade ; mas todos os moradores af- íim do Maranhão , como do Pará quizeraò , que a entrada fe fizeíTe a dar guerra á na^aó dos.Aroans, eNheengâíbas, deque fc deo con- ta a V» Mageftade , querendoí antes efcravos toma- t 222 VOZ ZELOSA. tomados , que comprados ; mas fahíolhes tan- to pelo contrario , que indo a efta empreza cento e dez Portuguczes , e todos os índios do Maranhão, c Pará, voltarão de lá com perda de gente , e reputação , e fem efcravos , por-; que os naõ quizeraõ comprar por taõ caro pre- ço. Apoz efta jornada íe fízeraõ duas , huma ao Pacajá pela cubica do ouro , e outra ao Ca- mucí pela do âmbar , e ambas fem efFeito. Para que a do rio das Amazonas fofle com mayor utilidade dos moradores, propuz ao Ca- pitão Mor do Pará Feliciano Corrêa , e ao Sar- gento Mor Manoel Gomes, e ao Cabo da tro- pa Vital Maciel , que elles efcolheffem o tem- po , e o lugar , por onde lhes eftiveíTe melhor fazer a entrada , e por onde entendeffera , que haveria mais efcravos , eaílim eftava aíTenta- do; mas fufpendeofe a jornada pelas caufas,que tenho referido , mandando o Governador , que a tropa naõ partifle em quanto a do Pacajá naó chegava , e que com a mefma gente , e canoas foíTe foccorrida, como foy; e por fe ter paíTado naquelle tempo a monção de entrar pelo rio , fe dilatou até efta Primavera. Aflim que , Senhor , á caufa de nao fc haver feico refsate confideravel neftes annos ^ ' foy voz ZELOSA. 25 5 foy, porque o Governador, e os os do gover- no do Maranhão , ePará quizeraÕ, que as en- tradas fe fizeíTem a outras partes , donde efpe- ravaó mayores interefles ; e para que feja prd- fente a V. Mageftade quanto os Religiofos da Companhia zelamos naó fó o bem efpiritual das Chriftandades , fenâó ainda o temporal do Eftado, edos moradores, pelo papel inclufo poderá V. Mageftade mandar ver as primeiras inftrucçoens , que dey aos Padres, que foraó ao certaó , e as que levaó , os que agora vaó, (que faõ as mefmas) fcguindo nellas em tudo, o que pode haver duvida , as opinioens mais lar- gas , e favoráveis aos Portuguezes , como tam- bém procurey , que íe feguifíem na junta, que fe fez em Lisboa. ^íx^*^' Com as almas dos Porcuguezesfe haó tra- balha menos , que com as dos índios , e dá Deos tal força de efpirito aos Miflionarios nef- ra parte, que affirmo a V. Mageftade, que com ter corrido tanto mundo, e ouvido tantos ho- mens grandes delle > nunca ouvi fermoens, que me pareceflem verdadeiramente Apofto- licos,fena6 no Maranhão. Como os coraçoens faõ taó obftinados , e envelhecidos nos vicios^ parece que concorre Deos IP't f'/Í mÊÊiÊÊm HMHHi i 224 voz ZELOSA, Deos com mayor efficacia ou para fua emen- da , ou para fua condenação. Houve homem deites , que diíJe , que o diabo trouxera eftes Padres da Companhia ao Maranhão , para os divertir de outras partes ; porque fe fcmelhan- tes íermoens fe fizeraó em Inglaterra , haviao de converter aquelles hereges. Elles com fe- rem Catholicos , naõ fe convertem todos, mas faò muitos, os que fe emendao , e trataó da reformação de fuás vidas , e nenhum houvera, que naó acabara de fe defenganar , fe ouvirão fó eftas prégaçoens ; mas. Senhor , ha peíToas Ecclefiâfticâs , que prégaò , e apregoaõ o con- trario, e que de publico , e de (ecreto fazem cruel guerra a Jefu Chrifto , e como huns def- fazem , o que outros edificaõ, naõ pôde a obra ir muito por diante. Procurcy nefte Eftado, que todos os Rcligiofos nos conformaíTemos na doutrina ; e porque o nao pude confeguir , paffey ao Rey no : pedi a junta , que V. Magef- tade mandou fazer dos raayores letrados de to- das as pro^Uoens: procurey , que na mefma junta fe achaíTem os Provinciaes das Religiões defte Eftado, para que fendo teftimunhas de tudo, e dando também feu voto , ordenaíTem a feus fubditos , o que deviaõ guardar , e tam- bém voz ZELOSA. 22 5 bem efta diligencia naô aproveitou* Efte. he o mayor , ou o único incipedimen- to deíias miffoens, íervindo efta deluniaó de pareceres de grande confufaó, e perturbação das coníciencias , nao fabendo os homens a quem feguir , e íeguindo na vida , e na morte a quem lhe £aila mais conforme a íeus interef- fes. Com tudo , Senhor , he tanta a for(^a da verdade, e da razaó,que o partido deChrií- to fe tem já muito melhorado , e todos os mo- radores eftaó quietos , e pacifícos , e quaíi ro- dos defenganados, que nao podem prevalecer nefte Eftado contra a evidencia da verdade , que nelle he taõ manifefta , e conhecida , e fó appellao alguns para o recurfo do Reyno, don- de efperaó , que poderá haver alguma mudan- ça , no que V. Mageftade tem ordenado , por fe nao conhecer lá taõ claramente a verdade, e: por eftar longe , e por cuidarem , que fe pode efcurecer , e embaraçar com os papeis , que os mefmos Ecclefiaflicos tem levado, e folicita- do , e cada dia mandaó , e folicitaó. O remédio de tudo he hum fó , e muito fa- çlVy e que muitas vezes tenho reprefentado a V. Mageftade ;, e he , que V. Mageftade refolu- tamente mande fechar a porta. a todo oreque-^ - .:a P - rimen- ^^6 VOZ ZELOSA. rimento em contrario, doq V.Mageftadecom tanta coníideraçaó mandou refolver 5 e que quem o encontrar , ou impedir, feja caftigado com a demonftracaó , que a matéria merece. Tudo o que fe aílentou acerca dos ladios do Maranha6,foy com conrulta dajuntadeTheo- logos, Cânoniftas, e Legiftas, em que fe acha- rão os trçs Lentes de Prima , e naó houve dif- crepanciâ de votos: foy com noticias de todas as leys antigas , e modernas, e de todos os do- cumentos, que fobre eíla matéria havia: foy ajuftâdo com os dous Procuradores do Mara- nhão, e Pará, ecom o Governador de todo o Eftado , que eftava neíTa Gorte , e com o Su- perior dos Miffionarios, que tanibem era Pro- curador Geral de todos os Índios, e ultimamen- te com parecer de todo o Concelho Ultrama- rino, que tudovio, examinou, e approvou. Donde parece, que naó fica lugar a innovar coufa alguma fem grande prejuizo , e menos autoridade das leys Reaes , e perturbação de tudo. Sobre efte ponto enviey o anno paílado papel particular, q V. Mageftade pode mandar ver , fendo fervido , em que fe apontaõ muitas outras razoens de gtandc pezo , egraviffimos inconvenientes, que do contrario fe feguem, ain- voz ZELOSA. 227 ainda ao credito da meíma fé , que debaixo dos termos da dita ley fe tem publicado por todas eftas géntilidades. E digo , Senhor , que além da firmeza da ley, he neceííaria demonilraçaó de caftigo nos violadores delia, naò íó peio que importa ao eftâbelecimento da miílaó , e augmento da fé, fenaó ainda ao de toda a Monarquia. E dáme atrevimento para fazer eRa lembrança a V.Ma- geftade o pezo de taò grandes obrigaçoens, e o nome , ^ ainda tenho de Pregador de V. Mag. Senhor , os Reys í aó vaíTailos de Deos, e fe osReysnaô caftigaõ os íeus vaíTallos, caftiga Deos os íeus. A caufa principal de íe naó per- petuarem as Coroas nas mefmas na^oens , e fa- mílias he a injufti^a , ou faó as injuílic^as, como diz a Efcritura fagrada ; e entre todas as injufti- ças nenhumas clamaó tanto ao Ceo , como as quetiraò a liberdade aos que nafceraó livres, e as que naõ pagaó o fuor aos que trabalhão ; e eftes faó , e foraó fempre os dous peccados defteEftado, que ainda tem tantos defenfores, A perda do Senhor Rey D. Sebaíliaó em Afri- ca, e o cativeiro de felTenta annos , que fe fe- guio a todo o Reyno , nocaraó os Autores da- quelle tempo, que foy caftigo das-cati veiros^, Pij • que !l!j 228 VOZ ZELOSA. GLie na cofta da raefma Africa começarão a fa- zer os noíTos primeiros Conquiftadores com taó pouca juftiçâ, como aque felê nas meímas: 'iiiílorias. As injuftiíjas, e tyrannias, que fe tem executado nos naturaesdeftas terras , excedem muito ás que fe fizeraõ na Africa: em efpaço de quarenta annos fe matarão , e íe deftruiraó por efta cofta , e certoens mais de dous milhões de índios, e mais de quinhentas povoaçoens, como grandes Cidades , e difto nunca fe vio caftigo. Proximamente no anno de 1655. fe cativarão no rio das Amazonas dous mil Ín- dios , enrre os quaes muitos eraó amigos, e aliados dos Portuguezes , e vaííallos de V. Ma- geftade, tudo contra adifpofiçaòdaley, que veyo naquelle anno a efte Eftado j e tudo man- dado obrar pelos mefmos , que tinhaó mayor obrigação de fazer obfervar a mefiiia ley ; e tarnbem naõ houve caftigo; e naõ fófe reque-. re diante de V. Mageftade a impunidade deftes delidos , fenaó licença para os continuar. Com grande dor , e com grande receyo de a renovar no animo de V. Mageftade, digo, o que agora direy , mas quer Deos , que eu o diga. A ElRey Faraó, porque coníentio no feu Reyno o injufto cativeiro do povo Hebreo, dec- .voz ZELOSA. 2 2^ deolhe Deos grandes eaftigos , e hum delles foy tirarlhe os primogeiíicos. No anno de 1654. por informação dos Procuradores defte Eftado fe paffoLi huma ley com cantas largue» zâs na matéria do cativeiro dos índios , que de- pois fendo Sua Mageftade melhor informado, houve por bem mandalla revogar ; e advercio- fe, queneftemefmo anno tirou Deos a Sua Mageftade o primogénito dos filhos , e a pri- mogénita das filhas. Senhor , fe alguém pedir, ou aconíelhar a V. Mageftade mayores largue- zas, que as que hoje hanefta matéria , tenha-o -V. Mageftade por inimigo da vida , e da con- fervaçaó, e da Coroa de V. Mageftade. Dirão por ventura ( como dizem que def- tes cativeiros na forma , em que fe faziaó , de- pende a confervaí^aó , e augmento do Eftado do Maranhão ; e ifto', Senhor , he heregia : fe pornaó fazer hum peccado venial fe houver de perder Portugal , perca-o V. Mageftade , e dê por bem empregada taó chriftã , etaóglo- riofa perda; mas digo , que he heregia , ainda politicamente fallando , porque fobre os fun- damentos da injuftiça nenhuma coufa he fe- gura , nem permanente ; e a experiência o tem moftradonefte mefmo Eftado do Maranhão^ Riij em m m ■i 23 voz ZELOSA. era que muitos Governadores adcjuiriraõgran* des riquezas , e nenhum delks as logrou , nem elles íe lograrão, nem ha coufa adquirida nefta terra , q permaneça, como os mefmos morado» res delia confeííaò , nem ainda , que vá por di- ante, nem negocio, que aproveite, nem navio, que aqui fe faça, que tenha bom fim ; porque tudo vay miílurado com Tangue dos ppbres, que eftá fempre clamando ao Ceo. Se o Tangue de hum innocente deo taes vo- zes a Deos, que fera o de tantos ? E mais Abel, Senhor , falvoufe , e eftá no Ceo. E fe huma aU ma, que íe íalva, pede vingança, tantos milhaí- res, e milhoens de almas, que pelas injuftiças defte Eftado , e mais ardendo no inferno, ten- do Portugal obrigação de juftiça de as enca^ minhar para oCeo, que vingança pediráò a Deos ? E fendo ifto adi m , Senhor , fó ós qúe defendem efta juftiça , faõ perfeguidosj fóos que falvaó eftas almas, faõ afrontados , [6 os que tomarão áíua conta efte taõ grande fc|r vi- ço de Deos , tem contra fi todos os homens. Sirvafe V. Mageftade demandar confiderar., que ern quanto as fobreditas tyrannias fecKe- cutavaó no Maranhão, nenhuma peíToa hou- ve Ecclefiaílica, nem fecular , que zelafle o re- voz ZELOSA. 231 remédio delias , nem da íalvaçaõ deftas almas j e depois que houve , quem tomou por fua con- ta hum , e outro fervKjo de Deos , logo houve tantos zelofos, que fe armarão contra efta obra^ final manifefto de fer tudo traça, e inftigaçaò do demónio para impedir o bem efpiritual tanto dos Portuguezes , como dos índios , que huns com os outros fe hiaõ ao inferno ; e feria defgraça muito para fentir , q os miniftros do demónio prevaleceffem contra os de Chriílo em hum Reyno tao chriftaó , como Portugal, Os outros Rey nos da Chriílandade,Senhor,tem por fim a conferva(^a6 dos vaíTallos em ordem t j á felicidade ^t^mporal nefta vida , e á felicida^ de eterna na outra. O Reyno de Portugal , de mais defte fim univerfal a todos , tem por fim particular ;e pfõprio a propagação, e a exten- faó da fé Catholica nas terras dos gentios, pa- ra que Deos o levantou , e inftituio j e quan- to Portugal mais fe ajudar com efte fim , tan- to raab certa , é fegura terá fua confervaíjaó , e quanto mais fe defviar delle , tanto mais du- vidofa, e arrifcada. Nas fegundas vias dos defpachos de VoíTa Mageftade efpero , que V. Mageftade haverá mandado deferir a tudo , o que reprefentey Piv nos ■■1 232 VOZ ZELOSA. DOS navios do anno paíTâdo j e porque naõ fey^ o que poderá ter fuecedido , reíumo outra vez aqui tudo, o que de prefente he neceflario para a confervaçaó, augmento, equietaçaói deíla Chriftandade, qne faó principalmente! as quatro couías feguintes. Primeira ; que na ley , e regimento de V. > Mageftade fobre os índios , e miíToens fe nao altere coufa alguma, e que a efle fim fen^iõ admitta , nem defira a requerimento em con- trario. Segunda j que os Governadores , e Capi- taens Mores , que vierem aefteEftado, íejaq peffoas deconíciençia ; e porquejeftas naó cof-, tumaó vir cá , que ao menos tragaó entendidOj que mui de veras haò de íer caíligados , fe ènii qualquer couía quebrarem adita' ley > e regi- mento. . ^Terceira ; que os Prelados das Religioens fejâó taes , que as fa^aô guardar a feusReligio- fos , nern çonfintap ^ quede publico ,Qufecr€r' ío as contradigaõ ■, efe houver algum Religio- fo defobediente nefta parte, feja mandado para fóra do Maranhão. i Quarta ; que V. Mageftade mande vir ma- y or numero de^leligiofos da Companhia , pa- ra voz ZELOSA. 233 ra que ajudem a levar adiante , o que tem co- me(^ado , os que cá eftamosj porque he o meyo único, ( poftoque mui trabalhofo para os ditos Religioíos) com que fó íe podem reduzir eftas gentilidades. E porque à noíla noticia tem chegado, que contra os Mifljonarios, que nefte Eftado fervi- mos a Deos , e a V. Mageftade , e contra o go- verno da dita mifTaõ fe tem prefentado a V. Mageftade algumas queixas , pedimos humil- demente a V.Mageftade, feja V.Mageftade fer- vido mandamos dar vifta de todas , ( ainda que fejaó das que tocarem ao Eftado ) porque a todas efperamos fatisfazer de maneira, que fique conhecido com grande clareza , quaó úteis faò os Miffionarios da Companhia naó íó ao melhoramento efpiritual dos Portugue- zes , e índios , fenaó ainda ao temporal de to- dos. A muito alta , e muito poderofa peffba de V. Mageftade guarde Deos , como a Chriftan- dade , e os vaflallos de V. Mageftade havemos naifter. Maranhão 20. de Abril de 1657, António Vieira. -o^ frr:i ^i>c boq s>i,oi,3o- .. .acyíoíi .¥ je'''obr;i'nrí'ia nm i). èíC^lr:: íivh r ístvf.V I^JD ■ /Kl": iiifot33:iib SIÍÍV3I;; Dnsmobiv :r;;'^ > I I .^i i l^^ voz elevadíssima. A Mais alta vo^ do T. Jntonio Vieira^quamo d fabedoria^ foy aportentofa obra dofeu tao de- Jejado^ como exquijtto Clavis Propheta- rum : nella jubio a tao alto ponto , quefó afuafamafufpendeo aos mais doutos ho- mens de Europa. Dejejavamos dar mais individual noticia do que percebemos def* ta vo^ ; mas podemos ouvir ^ e nao pode- mos f aliar , comojuccedeo a S, Taulo com osfegredos , que vio , e ouvio : Audivit*' ^^^ ^° arcana verba , quae non licet homini loqui. Daremos porém o echo defia ele- vadifjima vo!^ , que foardcom tanta ad- miração pelo mundo , que excitara em to- do elle eternas faudades de huma obra^que podia fatigar todas as linguas da mais clamqfojafama. \lViifLiC 1"^V> V- l'lí ? f fr*.- ■ i '^'tV'! » ' . *''> • .<\ ECHO SONORO, OU CORRESPONDENTE JUÍZO, Que formou da obra Clavis Trophetarum do "P. António Vieira o domijjtmo T?. . Carlos António Cafnedi da Compa- nhia de fefus depois de repetida ponderação^ e exquijito exa- ^ me delia, r i ^ Peris Auí5lor efl: incomparabilis P. Antonius Vieira , vir heróica illimi- tatse mentis comprehenfione huma- ^ ni intelleâius mécas longe tranfcen- dens: nann prascer hoc, quod admirandi inge- nii fui acumine íingula quaeque anatonncetj «quod 2 3 8 VOZ elevadíssimas quoJ non viías ha(5tenus laces ubique diíTemi-' nec ; quoi ík in omni minori , Sc maiori facul- tate verfaciííimus ; quod tenaciílimse adeo me- moriae , ut quidquid in fandlis Patrrbus , in 1 heologis , in Hiftoricis facris, & profanis , in' Graecis , ôc Latinis Inter precibus, & in qnociim- que fcriptore naturalia , politica ^^aut moralia tractante , vel femel duntaxat legit , íemper/ pr^ oculis, mente , <& raanibus liabeat i quodj in perfuadendo efficaciffimus ; quod in cex-» tULim allegatipnefeleótiííi mus; quod florentif-^ íimus in elocutione ; quod res rebus non ina- , ni amplificer verbofitate ; praeter has, inquam, & alias fupremae mentis excelias dotes , qua^^, rum quaelibec latis foret formare Heroem omni hum^ano plaufu fuperiorem; quod ego in hoc viro nunquam fatis miratus íum , eft pe- rennis illa ingeniofarum , & novarum reflexio- nam affluentia , necnon anatómica facrorum textuum concifio , qua verba omnia , & têm- pora; hiftoriam omnem , & figuram ; prophe- tiam^omnem , & fymbolum ; vocem omnem, apicem , & átomos ita eviCcerar ,^ & exenterat, uc qupd çaeceri primae magnitudinis viri , tam- qaiirn,exfuccum , ôc aridum delpexerunt , vel u|::QMçiirÍMÍsjceine,brisi,nvolucumoQn ioí^lle- xe- .5jO ja voz elevadíssima. 13^ xerunc, à Patre Vieira myfteriis luidequa^ué foctum oftendarur , puteturqiie nova íemper opinari , & quaíí non incluía in íacra Pagina, cum tamen nonnrifi vetera in ipfo facro cextu latentia ab aliis vel negleóla , vel non inteíkda opinetur. Hoc vero tnirabili adeo Prophetariim , & prophetiarum confonantia praeftat , ut dura auditur , & legitur , neceíTe íit prx ftupore ob- mutefcere. Inde eftquod incomparabilis Au- 6lor , íicut infra omnes Interpretes locandus foret, fi nova ediceret in facro textu non con- tenta, ita íupra cseteros evehendus, quod oux in Scripturse thefauro latentia erant , lyncea fua mente eíFoderit , & publicai lucis fecerit, Aurum, & gemmse, quaseducit, nova non funt, fed facro textu i coxva 5 effoffio eft no- na, quia mentis acumen novum. Portderans igitur ftupendus vir, ut de fe tef- tatur in tradatu de Pace MiíTíse, quatcrnione tertio , per pentinax triginta annorum ftudirm: ( en ejus verba ) Sic ego tngefimo ahhínc mm co- gltare capipoH longam/cnpturarumperjírutationem, certe magno , e^ fertlmei Jiudio yeritatls tndagan* Ponderans, inquam , ftupendus Aiãot per- r 240 voz elevadíssima. pei^tinaci triginta annorum ftudiò quidquid Propheçae íive verbis, íive fymbolis , five figu- risde Chrifti Dornini regtio prophecarunc , & advercens plures ob fui obícur içarem aut omif- fas, aiit nonnifi moraliter , ôc myftice inter- pretatas , nempe dp E ceie fia Triumphante , ia hoc tottis incubuic eas omnes Ijteraliter expo-^ nere , caíque conrumraando Chrifti Domini in terris regno fuo Milicanci Ecclefix appli^, care. Hac de caufa Auólor mirabili fuo operi prsefixit ticulum : De re^no Chriííl in terris con/wn-^ mato, qui coincidic cum hoc : Clavi^^ Ttopheta^ rum , ut ab ali is vocatur , quacenus plura in Pro- phetis adhuc occuka, & nondum completa in- genii fui luce literalicer exponendo detegic , ôc ingenipGs adftuporem rationibus in facra Pa- gina fundatis oílendic , quod propUetiae non- dum completas , fint in Mílitanti Ecclefia, quas efl: Chrifti Domini in terris regnum^ ante ejuf- dem Chrifti Domini, uc Judieis, adventum,, feu ante finem mundi eomplendaejdecec enim,) uc Chrifti Domini jn terris regnum fie ante ejufdem, ut Judieis, adventum undequaque jconrummacum , feu perfeólunb. Hoc uc eon-. ff quatur nisçus prophetiis >npndum compJetis, eaf- i voz ELE VADISSIM A. 241 èàfdem literaliter exponens , prognofticat plu- rima, quas inMilitantem Eccieíiam eventura funt , & cale Chrifto Domino regnum in terris format, quale Chrifto Domino venturo,non ut Redempcori, fed uc Judiei, convenire poceft. i£quum non eft praeterire verba a me ex Audore aliegaca, nempe, íe indefeflo triginta annorum fpacio huic operi texendo incubuiííe.^ Porro íi Audor ( teftes oculares appello ) in quolibet fuo foluco fermone fceta ftupenda la- ce femina ubique ferie , fuosque auditores per tentatas a nuUo Concionatore admirationis vias deducit, quae lux, quae eruditio, quae ratio- num emphacica energia, quse harmónica con* fonantia , quae illimirata mentis latitudo , hoc in opere triginta annorum ípatio concinnato, & digefto , in quo res eft non de completis , fed de complendis prophetiis , ôc quidem literali- ter, non vero myftice expoficis , in futuro Ec- clefe Militantisftatu, quse eftChrifti Domi- ni regnum omni perfeótione confummandum, quae, inquani, luxhoc in opere, in quo Au- âot futuram Milicantis Ecclefise perfeáionem prophetizare conatur, non eíFulgebit ? Quod tam profpero alTequitur eventu , uc vel neceíTe íit ab hoc opere legendo abftinere , vel legen-. CL do 242 voz ELEVADÍSSIMA. do in ejus rententiam demiílb capite pedibus^ ínani busque ire. Dividitiir hoc ftupendum de regnoChrif- ti in tçrris confummato volumen in três libros, \\t Aviótor ipfe initio fui operis indicat. In pri- mp agit de natura , êc qualitatibus regnj Çhrif- fi Domini. In fecundo de ejufdem re<7ní ia ierris coníummatiGne , feu ultima. per feólione. |n tertio de tempore, quo confummandum çft , ôc poft confummationem durare debet, Efi^ fy o parecer de hum Varão Verdadeiramente Jahto , e dartfftmo Efaitor ao yer , e ponderar afu' Uimulade do Clavis Prophetarum, Sendo porém $ft4 ohra hum pafadoyerdadeiramente ^al de toda áfabedorla , Jia conjideracdõ , do que lhe falta yfa:^ ferder o gojlo de terVifto , o que nos ficou, I)i:^ía nos últimos annos , que fe tiyejje féis me:^es de Vidjy poderia concluir a obra , porque pelas fuás contas faU tarlhehiaÕ quarenta queftoens por explanar •, e repli- cando ftlhe y fe poderia outro Antorac ah alia y quan- do Dcos IhenaÕ déffe aquelle efpaço de vida, refpon- deo , que o que até alíl tinha compójio , outro qualquer o poderia fa^er ; mas que acahalla , conforme a tinha Ideado , feria necejfario adiVmharíhe o pmfamentOy porque todo o fecho daquella ChaVs ejlava ainda na voz elevadíssima. 243 fua forja Agora {di^ia ) fe feguem as minhas tontices , eftas fó eu as poíTo conceber. E quan- do , o que nos deixou he taÕ/uperior a tudo , onde fe remontaria , o que elle tinha por mayor ? Sem duvida, que tudo ift o fa^ formar hum tao elevado conceito da intelltgencla , de que Deos dotou ao TaJre António Vieira , que na^ parece exaggeracaÕ aquelle ajférto, de que fofa hum Heroe humani incelleótus me- tas longe tranfcendens, aij RE kki^ ' t REFLEXÃO. Stas fao as vozes , que nos excicaó asfaudâdes de hum Varaócaó emi- nente fobre a coramua esfera dos fabios. A Vo:^ HiHorica iguala a gra- vidade de Curíio , e a pureza do Príncipe da Hiftoriâ Romana Crifpo. A Politica a das car- tas do facundo CaíTiodoro. A Delengauada he amefma, que deo no mundo o deíenganado Arfenio , que fendo por feus altos talentos efti- madiííimo do grande Theodofio , e Meílre de feus filhos Arcádio , e Honório , fem dar parte ao Imperador , fugio para o ermo ; e he tam- bém a mefma , com cue refpondeo aos de Ceíarea S. Bafilio Magno , quando íe retirou da pátria, na carta 141. De feajju ^ 'rjH? EPi£NOTAPHlON ENCOMIASTICUM R. ADMODUM PATRIS P. ANTONIl VIElRiE Societatisjefus. E^e y Vtator , ^ luge^ Marare paululum , ,,% i ^ Jn agendo tamen exttttt multo deferttor. • Seremffimumjoaunem I^, enixerogaVitj ■^'" UtiníBra/iliamredeundi ccplmnfacerety T^ andem Votonm réus , <^ yoti compôs, Juy andas fihl Maragnorúi^ populos cojtquifiVít, Ihi Vero proximorum falutlfeje impendmtihtis foctis TSLovennio prcefuit. Tanta anim^e amplitudo Una non claudehatur Europa, TSÍoyum orhem qu^erere Jtecejfe erat, In hoc "Vero ex amplij/ima laborum fegete Vlurhnam merkorum mejfem collegit, Affiduam plane f amem y iVinum mqueo , quod ohkrit, Illud tamen compertum haheo, <^od infe um Complexus ornamenta hommis omnia, ImpleVit ^Idquld poterãt mortalhas capere. Heu\ i^id nunc ex tanto reliquum eJÍVtro ? ^ Magna anlmae cadáver exiguum, Magnl SoUsparya umhra, Magni igrns merus cinis. Hinc nobismaxime eHdolendím, Stiod talem ami/ímus: Jndejamen potius gratulandumrj çp:x^i^uod takm kâhftmusé R Socle- u.\ 1 258 SUSPIROS Socktatts extltit Salomon, Et priorU [apienúam ajfecutusy Eo utique fafnentius Vixit^ Sápientius ohitt, FaB^e erant tum t empar is tenehrcQ Super uniyerfam terram, Vt tenehris átrata natura Tanto cãplti parentaret. Supra Coílegíum dkitur Vtfum fydusy TSÍecmlrum In yeri Soiis occafu, Jfftuentem populum trahere ajfnetus Vel in funere ad fe moVtty Eloquentius fortajje eadayer in féretro ^ ^am oUm infuggeíiu Orator, Excelkntiffmus Dominus T>.]oannes Lancafirius Sra/íliíe Tritura magnns yfe ipfo maior ^ ^dericuí filius pr^eclarifjimus, JlluUrif/imus In/uU à S, Thoma Epi/copus, Jlii infuper nohilifjtmi Tr^efules Corpus extttlerunt ad tumulum. Honor illls profe&o fult , mn ónus. IntegrumCanonteorumColleglum ■Ad exequiale carmen confluxit. Credo etiam 9rotoparentem Ignatium Jgnesfuos allaturum adfmus, m ENCOMIÁSTICOS, z j^ Ni hofpitdm In Coão animam Exclper et Inter piau fu9. ^efickrto tam chari capitis Memo altim dolultj quam Lufitama; <^ed dolore penittis non fatlfceret > . 'Beneficium fnlt orbis : Totus ille Fieira ja&ura condolens Lu^tanlíC dolorem emolliit, J^se camen Experta tot anms alumnumin dulgmtiffimum j^ternum lacrymls parem ahit. lllud doloris acerbitatem cum primis acuet , c^od licet nonagenarius y Non perinde matura morte decejprit, f t^emomortem mature obiity Cujus poffít ViU defíderavu Summum auttm LufitanU deftderium jSLon í€tas tila quantacumque explevit, Fixk quídem diu Antonlus, At non fatis Satis ^ero natura Vixerit , atque glorloe-i Sed quod maxlmum efiy Lujttaní(^ fuee parum Vixk. . ^avum yixit Antonlus ? DiSiljampoenitet , o Viator, Jacet utique viyus , úr yiVit mortms KV) Omnium í ■ r, I!. ! ; .■( 2^o SUSPIROS Omnium in corde mertalmn. Mor tdit atem exuit , non vitam (tniijtt, Ahllt utlque , fed non ohlk : Sola enim f^iekce vha dkenda efi, ^.amheatiffime fruitur apud fuperoSy t^a õlim femper alet poHeritas ^ ^am ipfa íeternkas intuehitur. Vale , Viator , Et , cujus inaudltam pr^Hanttam ohlWifd non potes j^. Memlneris tumulum. Hsec , currente ea'amo , dedit R. P. Hiero- nymus de Caftilho , oiim Primarkis Rhetori- cae ProfeíTor Ulyílípone 5 deinde Conifnbricae; ibidem Philofophise Magifter. tandéttrin Ebo- reníi Academia facrarum literarum Interpres: poftremo Regai is Açademrse Hiftoriae Lufita- nae Alumaus infigtóter eruditus; aedefiderâ- tiííimus. :a>^^\4^*^> \r *,V)\\ El En promiffum damm Jrgumentum to^ tius operis ^ feu potiu\ Indicem matéria- rum , quibus Uquidiovèj , fuavioresque Alufarum cultores in Collegio Conimbri- cenfi ^ocietathfefu defudantes ^ V.T. AntoHium Vieira intimo doloris fenfu ele-* gantifjtme parentarunt, Argumenti Au^ Uorem fi quícras , is fuit %. y. Mathias Corrêa per id temporis fac^arum litera- rum Interpres , vir ad omnes fcientias ad- di/cendaSy docendasque cumprimis confe- renduSj quem immatura morte ereptum doluit nofirafefu Soçietas peracerbe* RiiJ 1 í [u >i CONCIONATORUM FACILE PRINCIPI VENERABILI PATRI P. ANTÓNIO VIEIRA Societatisjefu, Hofpltl quondamfuo Monda* 9 In poWnííorem mgentem adhthet jímerkam. $11*^' ^»> tí?ív IO Cenotaphium ex cryftallo* 11 h cenotaphlt graduf Wpmit Vmutes m'. i Gradus fecundus, Spes. Gradus tertlus Charhas. Pro facibus funereis accendit virtutes morales. i6 Fax frima dietas in Deum. 17 Fax fecunda Zdus animarum» 18 Fax tenta Tatkntia» 19 Fax quarta Conjiantia, 20 . Fax quinta Studíojitas, 21 Fax/eyt^ Honorum çontemptus* ENGOMIASTICOS. léj 22 Sandapilam aptat ex conchis. 23 SandapiU brachlum primum Prudência. 24 SândapiU hrachium fecundum Temperantiat SandapiU brachlum tertium Fonitudú. 26 Sandapílíe brachlum quartum Jujlltla, SandaplU brachlum qulntum Taupertas, 28 SandaplU brachlum^ fextum Obedlemla. ^^^^m^^m^§^m^''^M^í^^^^^^ 29 Pulvinar capiti fupponit Biblia facra. 30 Proíandapilariis íuccollantibus Artes lubmitcit likraks. 1'', ^ ^ f .uJMmM.:-. SUSPIROS Ars prima fuccollans Tbeologia fpeculatrlx. Jrs fecunda fuccollans Theologla moralts, 33 Ars tertia fuccollans Vhllofophla, Ars quarta fuccollrns Mathejts, Ars quinta fuccollans Retórica, 36 Ars/exta fuccollans Toefis. 37 Epicedia praerxiittit. 38 39 Epkedium primum canit Epicediu fecundum pangtt (^pma. 40 ^blfip^y Epicedium tertium decantat ^ahia, Naenias adjungit. 44 TSldnia tertia 42 Ti^nia prima Lacrym£ bmetatis Lacryma MaranomL 43 4J K^ma feamda H^rtia quarta Lacrymct JuU hufiu- 1 : hacrjmcí Officlnd Tyjxh Urnam erigit fepulchralem Ex auro , & argento cselatadi, 47 ^ ' " ' Antica urníC fades ,. ^^ ncif àrtis concimatorU príyríktúfn) 48 ^ 49 Emblema primum Emblema fecundum VleiYài yoUtus fupraom- Meira facrorum Orat&i nesf acros Gratores. 'itmnCjmyfUrk^'^ . Emblema ter titm'' Jrdua VieircQ imitatm Poílica urnae façies QfFert cõcion^íQrias artis prototypa. Emblema , a- Tretiúfà yariarnm com- yidicis concinnatus, cionum yolnmivâ. 270 SUSPIROS Emhkma , ^ proto ypum tertlum ClaVis Trophetarum. Dextra ur'n* faci« Exprimic protxjovendanim miffionum ftudiú. Emblema primim Fieira Jiudlum in colll- gendis fociis ad miffío- nem Maramnenfem, 57 Emílma/ecundum EmhUma tertlum yieir^íardonsjt^ ;^úi in- aementum ex contra- iíElionibus, 59 Emhlma quartum Fieiríe curaaf/ídua in jti- Fteirie fcopus in fâcris Vandis 'Brajilií^ bár- miffionum expeditio- baris, nlbus Deus, 6o Siniftra urnae fácies Oílendic lâboru4ii inter mi íBbnes tolerahtiam. 6i ^3 • Emblema primum E^nhlematertium J^ieir^ na ufragium dum F^ieine fames patlendi au - colleBurns iodos '^ -ívO^ (& íabtirwnSãK\^ Lufitaúiam petit, patientia* ^ :" 'Wj^ ENCOMIÁSTICOS, Emblema fecmdum Emblema quartum Fieira yirtus inter labo- Fieira extremus in feri- res pulchrior y ^O-fortior, knJiciilabor, Cadáver infert urna- repulcbrali. 66 Claudit fepulchralem urnam elogio fepulchralh 67 Urnam fepulchralem florihus exornat, Flosprimus Liltum. . Fiosjecmdus Hyacinthus, Elos tertius Jmaranthus, Juftls rkeperfolutisVenerakU T,Jntonk Fieira^ Extremum yale dictt , <(^ Leyem terramprecatuh\ Man MH 27^ SUSPIROS F UNE BR IS POMP^ INDIGTIO. Qua ttofle obiit Pater Vieira, Vtfa eft ftella (u- pra Colleg. BaKienle. Are7itde múnus, DtndtoConcionatorlízVãrenãy Et communl mbis Ma^ãiro Mtner^ãl dóhrnfolVimus ■> ÍDehetur lacrymarum clepfyâra Oratorwn VrhKtpiy ,^í extrema fua in período UniVer/t orhis fenjum commoyet , » m CLAU^ ■A/^^* in^*i?i^^fcrv yjí^ Sí!^n\>?, CLAUDIT SEPULCHRALEM URNAM ELOGIO SEPULCHR ALI. - ' Seu 'Brafílienfi. V U ter que clarus In Arte.inveniendi,. uJuij Ulenpe patriam fugimdoxekhraVít;^ IlleTeBammtiÃHa^hk^XãClávis,. VtnusqmTejíamentiarcanareferat'. Mie Hceretkornm Malleus, hk Indorum Fahen Illtus língua j hujus calamus irmnortalis. ISLlmlrum Mune háhent fcecula mor em y Ut fingula prodiglum ferant fingulare. Tortentum, <(^ monjlrum, '^uiapr^ter naturam excedi t , ^ excelUt^ ^r^/ensfdculumtuUtmFmray Pe quofas eji dkere, ^od Àugumnus de ingenio Adeodatifui ^ Horrori mihi eratingenium illud. ^as maxlme allkh , <6^ attrahlty Hcírere , <ír horrere maxime mentes fack, , . 4^4yií^rfidinyi^HYv^mQnJlrnrnlngemu ENCOMIÁSTICOS. 277 F^el ex hoc extraordinarium credas , llfejihia darem re divida VoUmina pr^elo, Omnia Leth^eis f cripta darentur aquis, Sj£Ot moitumenta Tatriíf quot nocíe premuntur aVara Dogmàtay digna proha pofleritate legi ? ^leraque , qu£ nunc funt in honore , Molumina nojlra FirmaVtt príelis ars opcrofajuis. Si lateas , clavem quid proderit ejfe magiílram ? Claudere quid poteris ^ quidve aperire vales ? Eia age , pande fores , quid fcrinia clau/a retardant ? Sis memor officii , fts memor ipfa tui. OhViate expeSlant mea pr^ela , notceque gementes y Et quot funt fahric^e pignora chara mcee, Sunt mihi matricesy graphiaria , mappa, tahelU, Sunt, quibus neternemfcripta legenda, typi, Ss^ ^'^^^t infano jaceant confufa dolore : Ar ti fieis féretro femijepult a tui) CunBa reViVifcent animâta cadáver a , egoque Exurgam , quce jampcne cadáver eram, ^ Exurgam rur/us ,Jí tu mea prdla recludas , Et vitíty com. ENCOMIÁSTICOS. 2^5 com que intima ; na fubíimidade de penla- mentos , com que Te remonta. Affim expri- mioefte grande Orador aquelle illuftre Varaó; naõ contente porém nem com o primeiro , nem com o fegundo modo de debuxo , fez com a penna (entregue toda aosmais finos, e delicados affeótos do coração) huma minia- tura rara no elogio do grande Vieira , que aqui pomos, para que os que naó tiveraõ a for- tuna de o alcançar no íeu livro , o vejao , o lo- grem , e o admirem nefte. JffimJuffiTãQ os ejirmhos. .:! ALAILUSTRE, VENERABLE, Y IMMORT ALIMEMORI DEL SAPIENTISSIMO PADRE ANTÓNIO DE VIEIRA De Ia Compania de Jefus, VífitdioY de la Troyincta dei (Brafil , Predicador de los Smores ^ys de Portugal , j de la Senora de Suécia^ O fera cofa eftrana , que ay a quien dedique fu$ humildes penfamien- tos áqueí incomparable Varon , a quien los mayores hombrcs dei mundo^ han dedicado fiempife fus más nobles, y verdaderos aíFeélos. Muchos fon los ticulos, por losquales efta obrilla debió Uevar, como lleva, gravado en fu frontifpici© el immortal, y fiempre iluftre nombre dei Padre António de Vieiraj pêro fobre los motivos, que me exe* tutaa, y las razones ^ que me obligan , me in- '!■ É 2p8 SUSPIROS clina cambien a ello el hazer eíle obfequio a los eílimadores , y veneradores de fu gloriofa memori j, que fon todos los que debíeron a la natiiraleza un fano , y incorrupto juizio , que nõdexaridbíe burlar dèbri Hantes aparências , íolo eftiiuan los íuminofps fondos de los dia- mantes. Los heróicos méritos dei Padre António de Vieira en la fabiduria , y doçílrina fingulares /y inconiparables, y en Ia religion, virtud,piedad, y zelo Apoííolico dei bien de las almas fobré- eminentes, baftarian , y ferian un mui jufto ti- tulo, para que nofolo en, efta pagina, íino.en todo el libro refonaffe el iluftf e nombre de Vi- eira. Alia dezia otro : ovid.iib 5; Te cmerem /olum meriti memr: inquéttbellis Trift.Eieg. ÇreVi^et/ine te pa^mamUa mets. Con quanta mayorrazon lo podre yo dezir ai atender los méritos de íu prodigiofa fabidu- ria , que tís , y fera lanterna admiracion de los íiglos? Porque quiçn fiie aquel hombre,a quien aun por una general conípiracion , y por un confentimienco çomun quifieíTen todqs acla- ,ít)ar , y laurear por el Fénix de los Ingímos , fino $1 Padre Vieira i! Y aun con jefte tan celdr^re, y pjaufible renombi^toda vianó^juedabaftan- te- ENCOMIÁSTICOS. a^Jr temente enfal(^ado,nijuftamente explicado Io mimitabte de lumilagroíoingenio , y lo fin* guiar de fu incomparable agudeza y erudicion^ y doólrina j porque efte no es can Gngiilar , que no aya en cada figlo un nuevo Fénix j pêro qual íerá el figlo tan dichofo , a quien le íiafca, ocro Vieira? Sê , y advierto, que íí !a immortalidad pu- diera laòraríe, y confeguiríe con méritos, ef- tos fin duda le íobran a Vieira para innmortal ; pêro es tan ai contrario , que la mifma fingula- ridad de fus prodigioías prendas es la lapida de diamante , que en fu mifmo movimienco fe- Monuus pultó la efperan^a , de que pudieíTe bolver aqUafíúôeft revivir entre los mortales , porque fi (como di- '''°';""^l^^- xo el Sábio) folo aquel verdaderamente nóreiiquk muere, que dexa defpues defi fu femejante enchí/jof*"' el mundo, lloreel miímo mundo enel Padre Jf^' ^'"^«"^ V. . 1 I r II iicut homi'- leiraun hombre todomuerto: llore eterna-nes moik. mente aquella muerteijiortal , y fin femejan-si"'" ^^^^' ^as de vida , queíe llevó" ai fepulchro el hom- ^" "'^"jo bre fin femejante. Dos efpecies de muertes lee^a/,°& fícut mosen Ias divinas letras, muerte de hombre, y^J'^*^^; muerte de Fénix: ai Padre Vieira el haver ví-pí'^'*) viúo, como Fénix, le hizoelque muriera co-bo dies ^o hombre., Nó obílante llamelo cl mundo ~ 300 SUSPIROS el Fénix de los ingenios, que affi moftrará, que alas alabani^as defte incomparable Heroe no íolo no ay ajudadas verdades , pêro aun le vie- nen cerros los hyperboles. Ni yo puedo dexar de venerar eíle plauííble renombre y con que todos appellidan Fénix a nueftro Vieira, pues ó le nació en la fublime , y eternamente reco- mendable pluma de nueftro Reverendiffimo Padre General Juan Pablo Oli va , ó recebió de- lia mucho de authoridad , y eftimacion el elo- gio. Efte prudenciffimo Prelado , y eloquen* tiílimo Predicador ( fupongo , que ninguno ignora la eminência dei fugeto) ó fue el prime- ro , que dió el renombre de Fénix ai Padre Vi- eira, ó fe lo confirmo, y authorizó convenien- doconelfentimiento comun. Refiero las pa- labras de íu carta efcrita en Roma ai Padre Vi- ^' .^"f^eira refidente entonces en el Brafil : T>ios rdize") 17. AeSet. ^ ^ ^ ^ \ / de i6%o. dot^ a V, \^yerema de UH emendimlento tanfecun- el tom! 14. ^^ ^'2 las reflexiones prodigkfas , como eUerií de iml- fe vfeifJZ^^^^'^^ )yA^^^^^^'y y eíitqnarfelos a los oidos j pêro con que fere- nià^id fe los dexa caer en una carta la íiempre iluftre pluma de Oliva? Sabia, que era Vieira con quien hablaba. Dize, que era Archangel ^ly Serafin , y lo prueba , porque menor inteligen^ cia no podia fazonar eldulce manná de los ef- piritos ( affi llama a fus efcritos ) y con quanta razon? Porque fon fu admirable fabiduria , y fus prodígiofos efcritos maravillofamente pro- porcionados ai gufto , y paladar de todos fin difFerencia alguna de períonas. A la verdad yo no fê de que me deba admirar más , fi de ver un hombre rudo , y fin letras con un libro dei Padre Vieira en las manos , arqueando a cada diícurfolascejas, pafmado, y atónito a cada l^gar d^ la Efcritura ; ó fide ver a los hombres iTíásfabios, y más verfadosen las divinas letras^ los más acofturqbradp^,amaí>ejar, yrebolycr; t los ENCOMIASTÍCDS. 30I los volumenes de los Sancos Padres , y Dòa:o- res , los más llenos de las mejores noticias , y más feleóta erudicion , dexaríe arrebatar de eí- ta miTma admiracion. Oyó el miímo Reverendiílimo Padre Ge- neral Oliva ai Padre Vieira predicar el fermoa de San Stanislao, leyolo defpues de oido: que juizio hizo, lo dice el mifnno en carta , que ef- cribió ai Padre Vieira a efte intento: To admire^'' ^3.^* aV. ^yerencla qmndo le oí ... Aova que con todo i6i][b1- efpaclo tó, y holVt a kerju oracion . cafí quede exta- ^^"^^ '" '} 1 ^ j , -' •' i tom. 14. a tico por el aJJ ombro , que qualquiera defus parrafos ^^^ "hasd ha caufado en mi alma y, las que tamhkn fe dexarçn IZ' '^ '" comcer enmi roftro. Y defcendiendo defpues âl^""^ particular de cada difcurfo, aumenta de efta fu- erte : En fuma aquellas confideradonesy que quando las OT ^ me parecieron relâmpagos y quando Us Vt ef-- crltas , fe transformaron en Planetas , pêro Planetas todos lemejantes a elSol, que no fe podian yeerpor la yehemenela de la tu:^ ^ y con díficultad fe podian medir por el excejjfo dela altura, Efte es el aíTbmbro,de que los hombres ma- yores dei mundo fe llenan ai leer las obras dei Padre Vieira. Decida pues, quien pudiere^en quien es masmilagroía efta admiracion ,, fi en los. hombres doótiffimos , ó en los hombres íim de Vieir. en l&~ gud VoríH",. tm d 304 sus PIRO Sí^^ letras , que yó nó puedo difcernir quales fon más improporcionadas para efle género de fru- to , íi las piedras tofcas , ó las agudas efpinas. Todos admiran las portencoías obras de Vieira, porque nó ay paladar ó delicado, ó groíTero, Alude «/a quien nó le gufte eíle fuavifliixio manná. Pe- ÍTal'^fimJ^ donde bailaremos palabras para alabar fu dei mifmo varícdad , y dulçura , fino las meudiganfios dei Padre. -p t/- • . tt ir • / ^ miimo Vieiraí Hagamoslo lervir (aunque nun- ca lo confentira fu modeftia ) a fus próprias aiabanzas. Alabó Homero a Achiles , Plo.cio a Mário , Thephanes a Pompeyo, Accio a Bruto, pêro a Vieira nunca le podrá alabar quien nó i^^^^yo-tuviere fu ingenio. Sea elrpifmo el Homero, hacionejiA y ç.\ ^chiles, v fcamc licito dezir de los efcritos en el tomo / , ^ ' / % r ■i^.dei íii-de Vieira, lo que el mifmo Vieira dize dei li- ti p*««-bro ^el Padre Diego Lopes , cuyo titulo es >ía. Harmonia de la [agrada Efcritura , ai aprobarlo : Efí eíie libro , dize ( y yo digo en los de Vieira ) o en efta Ubreria ay "Varia matéria de de:^ir , y de aprender, y aiji cada uno fegun la diverjidad de fu génio j y de fu ingenio { que es cofa , que apenas fe fuede lograr en muchos libros ) podrdejcoger el ejly- lo , y el Author : fi hufcas la profundidad de un en'> tendimiento ekyado , ti enes Aqui a TertuUano, a Thi- lon , a Clemente Alexandrino , y a Zenon el de yero' na: ENCOMIÁSTICOS. 305 na '.Jíunjui^ío maduro confutíle:^a, tienes a Auguf- tino , a Amhrojio , a Cyrllo , a Gregório el de Wcea: fi hufcas el rio de la eloquência , encontraras aqui un Nilo : fi el Oceano , a Chryloftomo : fi defeas la ma* geflad de las fentenclas ^ aLeon: (i la agudeza y a ChryfologOyji aperto: fila piedade a bernardo fiuer- rico , Amoldo: fila moralidady a Gregório: fila ale- goria, aAthanafio : fi la letra , y un perpetuo comen- tário , a Geronymo , Hugo , ai Carthufiam , ai Ahu- lenfhy a Cayetano , j a Lyra. Hafta aqui el Padre Vieira ai aprobar el tomo dei Padre Lopes. Merefca en hora biiena el Padre Lopes el de- poííco de eíla alabança , que para mi baila, que fe la diera el Padre Vieira ; pêro luego que vió el mundo el manná fuaviffimo de las âlmas fer- mentado por elArchangel, y Serafin de los Jiombres , perdió ya el libro de la Harmonia el depofito de efte elogio ; pues en quien íe halla con verdad eíTe admirable conjundo , que ef- tá repartido en todos los Dodores fagrados , es . el fecundiffimo entendimiento de el Padre Vi- eira , y en todas fus obras í en las quales , como en un fuaviffimo manná, no Tolamente fegufta la fabiduria, que eftá repartida en todos los fantos Padres / íinó que^tambien fe percibe el fabor de todas las facultades , y cieacias ; por- V que 30^ SUSPIROS que quien le acendiere valerfe fagradamente de la proíundidad de las fabulas , de los veríos de los Poetps j de los didamenes de los Politi- eos , de los fuceflos de ias hiftorias , le julgará íin diida por un fagrado Archivo de roda pro- fana erudicion. Quien le viere formando irre* fr.gibles argumentos, defentranando las más ocJcas propriedades de la naturaleza , pene- trando las más efcondidas effencias de las co- fas , nó podrá negarle la noticia más íolida de la Lógica, Fyíica, y Metafyíica. Quien le coníiderare defentranando las más ocultas queftiones de la Theologia Efcolaftica , ufando de las más oportunas fentencias de la Moral , explicando los más delicados ápices de la Myf- tica, declarando los nriás íolidos puntos denur eftra Catholica Religion , aleijando los más folidos Cânones de los Concílios , le calificará por Theologo eximio , Moralifta conrumado, dieílriffimo Afcetico , y Controverfiíta irrefra- gabie. Y lo que caula más admiracion '>, por parecer facukad totalmente agena de fu conti- nuo eftudio, y minifterio Apoftolico, quien leyere la Poefia Latina , que cpmpufo efte uni- verfal ingenio , y la trae el Padre António Bõ- nucii enfus Ephemerides Eucharifticás en el mez ENCOMI AST í COS. 307 mezde Jiinio, conrazon lejufgará por Ovídio en Ia dulçura , y naciirali Jad dei verío 5 por Claudiano en la límpiezà , y fraíes j por Virgí- lio en el alma , y pureza de la fencencia , y por fin exemplar en ia copia de agudezas , y con- cepcos , con que anima todo el Poema ; v por abreviar, nó ay faculcad , ciência, ni arte algu- na, en que nó fe mueílre íapientiffirno eíle maravilíofo ingenio j de fuerce , que con coda realidad fe debe dezir de el Padre Vieira aquel repetido Hemiftichio de Claudiano, que can- tas vezes ha ufurpado ó la paílion , ó la adula- cion, ó laliíonja: t^^fparguntur in omnes, In te mixtafluunt , ai defcntra- íiai^lo ;, y probarlo tan claro , tan fácil , tan cor- riente , tan intehgíble , tan llano ? Que es efto? Pêro que ha de fer? Efto es fermentar un Ar- changel el manná , ó el Manhu para eterna ad- miracion de los homòres. Pêro aunq todo efto convence fin duda algu- na, con quanta razon íedebe apelidar (uaviííi- mo manná de ias almas la univerfal fabiduria dei Padre Vieira ? Con todo , yo la hallo no- tablemente ventajofa ai manná , porque efte, fin embargo de que contenia en fi los fabores de todos los manjares^caufó faftidio a los Ifrae- litas : TSlaufeat anima nojtra fuper cibo Ifto leViffi- mo\ pêro las obras de el Padre Vieira jamás enfadan , antes fi cada dia excitan nuevo defep de guftarlas. La continua vifta dei manná cau- faba enfado ai Hebreo: TSLihil Vtdmt ocuUnoftriy rúji ENCOMIÁSTICOS. 305^ mfi man \ pêro ks obras dei Padre Vieira nunca fe harcan los ojos de verias, El man na íe toma- ba con medida , y taíTa 5 la fabidiiria dei Padre Vieira fe franquea a todos íin termino, ni me- dida, El manná nó era duradero , ni perma- nente , porque de un dia ai otro fe corrompia^ pêro fobre el manná dei Padre Vieira nó cen- dran jurifdicion aun los figíos. El manná era para alimento de la menos noble porcion dei íiombre, que es elcuerpo ; el manná dei Pa- dre Vieira alimenta la parte más noble ^ que es el alma ; y afli más femejante parece áquel divino Manná , que íazonan los Angeles , que es Pan de entendimento, que quanto más fe come , más fe defea , que alimenta las almas, y que contiene en ^\ coda la fabiduria dei Padre dé las luzes. Todo efto era mucho a nó ferio mayor?''!.^'*'^'' e íu divino talento la aplicacion , y el dQfíií'jry,ueríe,q no a aquel Apoftolico minifterio, a que fe con- ;iLl H í íagró con voto de edad de dies y íiete ânos/«^^^^''^'" Alabe quien quiziere ai Padre Vieira aclamado ^tulZT' en las más famofas Ciudades de la Europa, ve- nerado en las Cortes de Roma , y Lisboa por Oráculo de fabiduria, admitido a la mayor confiança, gracia, y eftimacion de el invi^if- Viij íimo Igfigigillllligigjj-^^jjjj^^jjigggil^^ 'i 310 SUSPIROS limo Rey Don Juan de Portugal , feguido eu todos los concLiríos dela Reyna de Suécia, que yo lo admiro eu los paramos , y defiertos de el Maraííon buíeando , y facando de los bofqties, y grutas a las humanas fieras , que las habican'. Admirenle otros en los congreffos de los fabios profiriendo fentenciasj en los conclaves de los poiicicos diétando máximas de eftado , y de govierno , que yo le admiro entre bárbaros in- dociles^ mal veftido de una ropa de algodon tenida en barro, eníenandoks la doâ:rina. Ad- mirenle otros penetrando los fecretos más ef- condidos , y los arcanos más recônditos de la fagrada Efcritura , cue yo le admiro afanado y congoxado en acomodaríe a aprender , y a pronunciar las aíperas, y incultas vozes de los BrafilJeníes , y Angolas. Admirelo el mundo en aquella eminência , y ofadi^ de fu fin igual talento, que lo hizo acometeria empreza de kbrar llave , con que abrir, y hazer patente los fecretos de los Profetas; yo folo lo admiro Gomponiendo carecifmos en íus diftintiflimas knguas para abrir refquicios a la converfion, f ala inftrucion de los batbaros» Admirenle otros navegando a Inglaterra , Holanda, Francia , y kalia a los negócios importantiíEmos dei fer-« ¥ÍCÍ€!^ ENCOMIÁSTICOS, 511 vicio de fn Rey , y bien de Ia pátria^, encomen- dados ,. y fiados por el mifmo Rey a íu íiempre acertada direccioriyyo lo admiro camifiando más de catorze mil legnas para promover el negocio más importante de la falvacion de las almas. Admiren ocros aquella bonâ^nça , j profperidad, con que el Zéfiro más apacible, y la aura más blanda llevavan fii glori^fo nombre a las regiones más apartadas , y a los climas más remotos de el mundo ; yo admiro w//SrpI- aquella tormenta, en que conftituido en el ex-í'' '''' '[ 1* iiiri n fernion de tremo peli-gr© de la vida íobre el CGÍtado del^- W'»»! traftornado navio, que recebia iguales g^A-tmoZ dí pes de las agitadas olas en la qurlla , y en lâS^''/^/^^f,^ gabias , íolo fe acordaba de invocar a los An-^» ^^«^«^ geks de Guardiã de las almas de el Maraííon ^IT""^**" para cuyo bien fok queria, y eftimaba íu vi- da. Finalmente eelebren oiros Tus aclama cio- nes , fus aplaufos , fus honras , fu fama , fu glc>- ria j que yo admiro fus perfecuciones , fus ca^ lumnias, fus afrentas, fus ignominias toleradas paeientiffimamente , y ocafionadas íol© de cl zelo, con que procuraba el bien efpiritual;, y Eemporal de los pobres , y def^alidos índios. Y porque toda la lliada de fus gloriofosrrabajos; m\à femejanÊes a los de el Doâor de las Gen- tsS^ ««■^■■■■^■■■■■■■■■■■■i ã 312 SUSPIROS tes Pablo, affi como el mirmo Santo Apoftol los refiereen la Epiftola aios Corinthiosj el "Padre Vieira ó para dar aentender la dificul- tad de la miflion , ó para referir el zelo de fus venerables companeros , los refiere en los íer- mones de Epifania, de el Erpirico Santo , y Santa Terefaj ceda mi cortedad a fii admira- ble eloquência, y eílos íermones, aílí como fon el teftimonio de fii portentofa fabiduria, fean el eterno elogio de fus admirabks vir- tudes. A eílos heróicos méritos, que en todos ti- empos íe lievaron trás fi las más nobles volun- tades, affi como les tengo dedicados los afe- (Slos, nopudiera dexar de dedicar los difcur- fos : nó folo es veneracion , fino interés , para que ai falir a la luz publica tengan efta íola fe- licidad de falir nó a la fombra , fino a las luzes de Vieira , y que el que fue cl Aftro dominan- te en fu concepcion , lo fea tambien en efte modo denacimiento. Es el Padre Vieira eljc- feph de los Predicadores, ( a quien dodiffima- mente lo comparo elya citado nueftro Reve- rendiffimo Padre General Oliva en la dicha carta) por eíTo hizcjuizio, que todos losquc eotramos lahoz enefte género demiez, de- bernos nia« ENCOMIÁSTICOS. 313 bémos a nueftro Jofeph efta efpecie de reve- rencia , ó que nueftros humildes hazecillos adoren , óinclinandofe reverencien los fuyos , que de tan abundantes efpigas , y de tan efco- gidos granes han líenado todas las fabias Pro- víncias. Sobre eílos motivos de jufticia para efta Dedicatória el de mi eleccion ( como ya dezia) es hazer efte obfequio alosveneradoreSp^,^^^ de fu iluftre memoria; por eíTo nó dedique eftenoTjiga libro a aquella alma fublime , y ( como creo)rrjol"& íeliciflima , laureada con la eterna corona, iuf-?"''^ •'^^ titlimo premio de lus heróicas virtudes, y fo-nipuium bre la esfera de todo humano obíequio, que "r^°'' ^„,. nó pueden alcançaria nueftros deícos; fino a"'P"^°'"'" fu efclarecida memoria, tanto más iluftre, XiarT" quanto ticne aJasmás nobles almas por pa- ^euTce"; dron gloriofo de fu immortalidad. Efta pues^^^- 3^- 7. es el ara de mi refugio , aquellas gloriofas ef- tatuas , que tantos iluftres Varones han erigido, y confagrado para eterno trofeo a efte finp-ula- riflimo Heroe en el Capitólio augufto de fus elevadas mentes , quienes eípero efcufarán lo dilatado de eftaslirieas, fi atienden a la gran- deza de fu objeólo, y a los tamaiios de mi afe- duofa veneracion. Y porque el feliciffimo fu- jeco de efte corto elogio , gloriofo ( como pie- do- vef- ma. ai f 314 SUSPIROS dofamente creo ) en el Cielo ^ y gloriofo en la cierra , goza bienes fuperiores a todos nueftros defeos , defpues de dar gracias a Dios , (^iie lo crio para luftre , y decoro de fu gloriofa , y fa- pientiflima nacion , para honra de k Compa- niadejeíus, mi ínclita, y amadiíTima Madre^ para bien de muchas almas 5 a todos los que veneran íii memoria, reverencian fus virtudes, âdmiran fu fabiduriâ, les deíeo , y defearé eternas felicidades &g. TSLkolás de Segura PRO- |« : 1^ wy -efí ■^'í ^í \ tfj --íí; Ji -■&% ^ i*» : 1^ -^ ilíí ^ I3S cV. PROTESTAÇÃO 6 DO ESCRITOR DESTE LIVRO. POr quanto nefte pequeno volume fe faz men^aó de alguns Varoens de fin- gular opinião , e eftima , e fc lhes dá o titulo de Martyr, Santo, ou Venerável , naó lhe tendo atégôra a Igreja concedido culco ; protefto , que naõ he meu intento darlho , nem com os taes appellidos íignificar , que o fupre- rao juizo da Sé Apoflolica lho deo: entenden- do fó , que a narração de fuás acçoens tenha unicamente aquella qualificação de fé huma- na,que merece o credito de qualquer prudente Efcricor : obedecendo em tudo ao Decreto do Santiffimo Padre Urbano VIII. e aos que pro- mulgou a fagrada Congregação de Ritos ^ co- mo filho obedientiííimo, profundamente ren- dido em tudo á fanta Madre Igreja , fonte in- fallivel dafé , e da verdade. '^3^2L-f #r-* .ir*% i^mÊÊÊÊÊÊm tífi •'A